"MAIOR É O QUE ESTÁ EM VÓS DO QUE O QUE ESTÁ NO MUNDO." (I JOÃO 4:4)

segunda-feira, maio 04, 2015

"Quem sou Eu?"

- Ramana Maharishi -


Questionador: Quem Sou Eu?

Sri Ramana: O corpo denso que é composto de sete humores (dhatus), não Sou EU; os cinco sentidos cognitivos, a saber: o sentido da audição, do tato, da visão, do paladar e do olfato, que apreendem seus respectivos objetos, a saber: som, toque, cor, sabor, e odor, não Sou Eu; os cinco órgãos do sentido, saber: os órgãos do fala, da locomoção, do toque, da excreção, e de procriação, que têm como suas respectivas funções: falar, mover, agarrar, excretar, e apreciar, não Sou Eu; os cinco ares vitais, prana, etc., que executam respectivamente as cinco funções de inspirar, etc., não Sou Eu; mesmo a mente com pensamentos, não Sou Eu; a ignorância também, em que está dotada somente com as impressões residuais dos objetos, e nas quais não há objetos ou funcionalidades, não Sou EU.


Questionador: Se eu não sou nenhum destes, quem Sou Eu?

Sri Ramana: Após negar todos os mencionados com “não isto”, “não isto”, esta Consciência que resta sozinha, este SOU EU.


Questionador: Qual a natureza da Consciência?

Sri Ramana: A natureza da Consciência é Sat-Chit-Ananda (Verdade, Consciência, Bem-Aventurança).


Questionador: Quando a realização do Ser é obtida?

Sri Ramana: Quando for removida de sua percepção a impressão de que o mundo é real, haverá a realização do Ser que é o observador.


Questionador: Não haverá realização do Ser enquanto o mundo estiver lá (sendo percebido como real)?

Sri Ramana: Não existirá.


Questionador: Por quê?

Sri Ramana: O observador e o objeto observado são como a corda e a cobra. Assim como o conhecimento da corda – que é o substrato – não surgirá a não ser que o falso conhecimento da cobra ilusória se vá, a realização do Ser – que é o substrato – não será obtido a não ser que a crença de que o mundo é real seja removido.


Questionador: Quando o mundo que é o objeto visto será removido?

Sri Ramana: Quando a mente, que é a causa de toda cognição, e de toda ação, tornar-se estável, o mundo desaparecerá.


Questionador: Qual é a natureza da mente?

Sri Ramana: O que é chamado “mente” é um fascinante poder que reside no Ser. Ela é a causa do surgimento de todos os pensamentos. Sem os pensamentos, a mente não existe. Conseqüentemente, o pensamento é a natureza da mente. Sem os pensamentos, não há nenhuma entidade independente chamada ‘mundo’. No sono profundo não há nenhum pensamento, e não há nenhum mundo. Nos estados de vigília e sonho, há pensamentos, e também há um mundo. Assim como a aranha emite a linha (da teia) para fora de si e depois o reabsorve, a mente projeta o mundo para fora de si e, outra vez, processa-o em si mesma. Quando a mente sai do Ser, o mundo aparece. Conseqüentemente, quando o mundo aparece (para ser real), o Ser não aparece; e quando o Ser aparece (brilha) o mundo não aparece. Quando se inquire persistente na natureza da mente, a mente terminará por deixar o Ser (como o resíduo). O que é referido como o Ser, é o Atman. A mente sempre existe na dependência de algo denso; não pode permanecer sozinho. É a mente que é chamada o corpo sutil, ou a alma (jiva).


Questionador: Qual é o caminho do questionamento para se compreender a natureza da mente?

Sri Ramana: Aquilo que, neste corpo, se eleva como “EU” é a mente. Caso se questione a respeito de onde no corpo o pensamento “EU” surge primeiramente, descobriria-se que surge no Coração. Este é o lugar da origem da mente. Mesmo que se pense constantemente “EU”, “EU”, a origem será a mesma. De todos os pensamentos que se levantam na mente, o pensamento “EU” é o primeiro. É somente após a ascensão deste que os outros pensamentos se levantam. É após o aparecimento do primeiro pronome pessoal que o segundo e o terceiro pronomes pessoais aparecem; sem o primeiro pronome pessoal não haverá nem o segundo, nem o terceiro.


Questionador: Como a mente se tornará tranqüila?

Sri Ramana: Pelo questionamento “Quem Sou Eu?”. O pensamento “Quem Sou Eu?”, destruirá todos pensamentos restantes, e como a vareta usada para agitar o fogo da pira funerária, no fim Ele se auto-destruirá. Então, surgirá a auto-Realização.


Questionador: Por que agarrar-se ao pensamento "Quem sou eu?"?

Sri Ramana: Quando surgem outros pensamentos, não se deve insistir neles, mas indagar: "Para que surgem esses pensamentos?" Não importa quantos são eles. A cada um, deve-se indagar prontamente, "Para quem surgiu este pensamento?" A resposta seria "Para mim". Se logo depois se fizer a pergunta "Quem sou eu?", a mente retorna à sua fonte e o pensamento se aquieta. Com a repetição dessa prática, a mente desenvolverá a habilidade, de permanecer em sua fonte. Quando a mente, que é sutil, aflora através do cérebro e dos órgãos dos sentidos, surgem nomes e formas grosseiras; quando permanece no coração, tais nomes e formas desaparecem. Impedir que a mente divague e retê-la no Coração é o que se denomina "interioridade" (antar-mukna). Permitir que a mente saia do Coração é conhecido como exteriorização (bahir-mukha). Assim, quando a mente permanece no Coração, o "Eu" que é a fonte de todos os pensamentos desaparece e o Eu superior que sempre existiu pode brilhar. O que quer que se faça, deve-se fazê-lo sem o "Eu" egóico. Desta forma, tudo aparecerá como natureza de Shiva (Deus).


Questionador: Não existem outras maneiras de aquietar a mente?

Sri Ramana: Não existem meios adequados afora a indagação. Com outros meios, a mente mostra-se aparentemente controlada, mas acabará por manifestar-se. Também através do controle da respiração a mente se aquieta; mas só permanece assim enquanto a respiração está controlada, e quando esta volta ao habitual, a mente também voltará a agitar-se e a vaguear, compelida por impressões residuais. A fonte é a mesma para a mente e a respiração. O pensamento é a natureza da mente. O pensamento "Eu" é o primeiro a surgir na mente; isto é egoidade. Daí originam-se a egoidade e a respiração. Assim, quando a mente se acalma, a respiração é controlada, e quando a respiração está controlada, a mente se acalma. Entretanto, no sono profundo, embora a mente esteja calma, a respiração não pára. Isso se deve à vontade de Deus, a fim de que o corpo possa ser preservado e as pessoas não tenham a impressão de que é a morte. No estado de vigília e no samadhi, quando a mente se aquieta, a respiração é controlada. A respiração é a forma grosseira da mente. Até o momento da morte, a mente mantém a respiração física; quando o corpo morre, a mente leva consigo a respiração. Portanto, o exercício de controle respiratório serve apenas para acalmar a mente;mas não destrói.

Assim como a prática do controle respiratório, a meditação nas formas de Deus, a repetição dos mantras. o controle alimentar, etc., não passam de auxiliares para a calma da mente. Através da meditação nas formas de Deus e da repetição de mantras, a mente é direcionada. Mas sua condição é errante. Assim como quando se dá a um elefante uma corrente para seu tronco, ele segue agarrado à corrente, também a mente se ocupa com um nome ou forma apenas. Quando ela se expande na forma de inúmeros pensamentos, todos tornam-se fracos; mas quando os pensamentos são dissipados, a mente torna-se direcionada e forte; para essa forma mental, a auto-indagação torna-se fácil. De todas as normas restritivas, a melhor é a relativa à ingestão moderada de alimentos sáttvicos; observando-se esse costume, a qualidade sáttvica da mente se acentua, o que será de grande valia na auto-indagação.


Questionador: As impressões (pensamentos) residuais dos objetos surgem interminavelmente, como as ondas de um oceano. Como afastá-las?

Sri Ramana: À medida que a meditação sobre o Eu superior se eleva mais e mais, os pensamentos vão sendo destruídos.


Questionador: E possível afastar as impressões residuais dos objetos provenientes de tempos imemoriais, permanecendo o puro Eu superior?

Sri Ramana: Em vez de entregar-se à dúvida - "É possível ou não?" - é preciso que se atenha insistentemente à meditação sobre o Eu superior. Mesmo quando você é um grande pecador, não deve se preocupar e lamuriar "Oh! Sou um pecador, como poderei ser salvo?"; ao contrario deve renunciar por completo ao pensamento "Sou um pecador e concentrar-se intensamente na meditação sobre o Eu Superior; então, sem dúvida, haverá vitória. Não existem duas mentes -uma boa e outra má; a mente é uma só. As impressões residuais é que são de dois tipos - favoráveis e desfavoráveis. Quando a mente encontra-se sob a influência das impressões favoráveis, é considerada boa; e quando sob a influência de impressões desfavoráveis, é considerada má.

Não se deve permitir à mente vaguear rumo a objetos mundanos e ao que diz respeito a outras pessoas. Não importa o quanto outras pessoas possam ser más; não se deve nutrir ódio por essas pessoas. Deve-se evitar tanto o desejo quanto o ódio. Tudo que se dá ao outro, dá-se a si mesmo. Se essa verdade for compreendida, o que não será dado aos outros? Com o surgimento do Eu superior, tudo brota; uma vez apaziguado o Eu superior, tudo se acalma. Conforme nos comportamos com humildade, daí resulta o bem. Se a mente se acalma, pode-se viver em qualquer lugar.


Questionador: Durante quanto tempo deve ser praticada a inquirição?

Sri Ramana: Enquanto houver impressões dos objetos na mente, deve-se praticar a inquirição "Quem sou eu?". Os pensamentos devem ser destruídos no exato local de origem através da inquirição. É suficiente que uma pessoa utilize repetidamente a contemplação do Eu superior até que este seja realizado. Enquanto restam inimigos no interior da fortaleza, eles continuam a miná-la; se são destruídos assim que surgem, a fortaleza permanece em nossas mãos.


Questionador: Qual a natureza do Eu superior?

Sri Ramana: Na verdade existe apenas o Eu superior. O mundo, a alma individual e Deus constituem aspectos dele, como a prata na madrepérola; os três surgem e desaparecem ao mesmo tempo.

O Eu superior existe onde não existe o pensamento do "Eu". A isso chama-se silêncio. O Eu superior é o mundo; o Eu superior é "Eu"; o Eu superior é Deus; tudo é Shiva, o Eu superior.


Questionador: Tudo não é obra de Deus?

Sri Ramana: O sol nasce sem desejar, sem deliberação, sem esforço; e com sua simples presença, o sol emite fogo, o lótus floresce, a água evapora; as pessoas realizam suas várias funções e então repousam. Assim como na presença do magneto a agulha se desloca, com a simples presença de Deus as almas governadas pelas três funções (cósmicas) ou pela quíntupla atividade divina realizam seus atos e, então, repousam, segundo seus respectivos karmas. Deus nada tem a transformar; Ele não tem karma. Assim como os acontecimentos terrestres não afetam o sol, ou os méritos e deméritos dos outros quatro elementos não afetam o éter difuso.


Questionador: Quem é o maior dos devotos?

Sri Ramana: O que se entrega ao Eu superior, que é Deus, é o melhor dos devotos. Entregar o Eu superior a Deus significa permanecer constantemente no Eu superior, sem permitir o surgimento de quaisquer pensamentos além do pensamento do Eu superior.

Deus suporta todos os fardos que lhe são lançados ao ombro. Se o poder supremo de Deus faz com que todas as coisas se movam, por que preocupar-nos constantemente, sem submeter-nos a esse poder, com ideias tais como o que deve ser feito e o que não deve ser feito e de que maneira. Sabemos que o trem transporta todos os car-regamentos; então, por que levarmos conosco nossa pequena bagagem com grande desconforto, em vez de colocar tudo no bagageiro do trem e acomodar-nos à vontade?


Questionador: O que é desapego?

Sri Ramana: O desapego consiste em destruir inteiramente os pensamentos em seu local de origem e sem deixar vestígios. Assim como o pescador de pérolas amarra uma pedra à cintura, mergulha até o fundo do mar e recolhe as pérolas, também o aspirante deve desenvolver o desapego, mergulhar dentro de si mesmo e obter a pérola do Eu superior.


Questionador: Não é possível a Deus e ao Guru libertarem uma alma?

Sri Ramana: Deus e o Guru só podem mostrar o caminho da libertação; sozinhos não podem libertar a alma. Na verdade, Deus e o Guru não são diferentes. Assim como a presa que cai nas garras de um tigre não tem escapatória, também aqueles que adentram o alcance do olhar complacente do Guru por ele serão salvos e não se perderão; contudo, cada um por seus próprios esforços deve buscar o caminho mostrado por Deus ou o Guru e alcançar a libertação. Só se pode conhecer a si mesmo com o próprio olhar do conhecimento e não com o de outrem. Aquele que é Rama precisa da ajuda de um espelho para saber-se Rama?


Questionador: É necessário àquele que anseia pela libertação indagar qual a natureza das categorias (tattvas)?

Sri Ramana: Assim como aquele que deseja livrar-se do lixo não precisa analisá-lo e ver seu conteúdo, também o que deseja conhecer o Eu superior não precisa contar o número de categorias, nem analisar suas características; o que ele tem a fazer é rejeitar por completo as categorias que ocultam o Eu superior. O mundo deve ser considerado um sonho.


Questionador: Não existe diferença entre vigília e sonho?

Sri Ramana: A vigília é longa e o sonho curto; essa é a única diferença. Assim como os acontecimentos do período de vigília parecem reais enquanto estamos despertos, também os acontecimentos do período de sonho parecem reais enquanto sonhamos. No sonho, a mente toma outro corpo. Tanto no estado de vigília como no estado de sonho, pensamentos, nomes e formas ocorrem simultaneamente.


Questionador: É de alguma valia a leitura de livros para aqueles que desejam a libertação?

Sri Ramana: Todos os textos afirmam que para lograr a libertação deve-se acalmar a mente; portanto, o ensinamento conclusivo é de que a mente deve ser acalmada; quando isso é compreendido, não é necessária a leitura interminável. A fim de acalmar a mente, basta in-dagar dentro de si sobre o que é o próprio Eu superior; sobre como essa busca pode ser efetuada nos livros? Deve-se conhecer o Eu superior com o próprio olhar da sabedoria. O Eu superior encontr-se protegido por cinco camadas; mas os livros não fazem parte delas. Como o Eu superior deve ser encontrado através da investigação, eliminando-se as cinco camadas, inútil buscá-lo nos livros. Chegara o momento em que será preciso esquecer tudo o que foi aprendido.


Questionador: O que é a felicidade?

Sri Ramana: A felicidade é a própria natureza do Eu superior; felicidade e Eu superior não são diferentes. Não existe felicidade em qualquer objeto mundano. Com nossa ignorância, imaginamos obter felicidade dos objetos. Quando a mente se expande, ela experimenta o sofrimento. Na verdade, quando seus desejos são satisfeitos, ela volta a seu lugar de origem e participa da felicidade, que é o Eu superior. Da mesma forma nos estados de sono, no samadhi e no desfalecimento, e quando o objeto desejado é obtido, ou o objeto indesejado é removido, a mente volta-se para o interior e desfruta da pura felicidade do Eu superior. Assim, a mente agita-se sem cessar, saindo e retornando ao Eu superior. Sob a árvore, a sombra é aprazível; sob o sol, o calor é intenso. Uma pessoa que esteve exposta ao sol refresca-se ao atingir a sombra. Aquele que permanece indo e voltando, da sombra ao sol e vice-versa, é tolo. O homem sábio permanece indefinidamente na sombra. Assim, também, a mente de quem conhece a verdade não deixa Brahman. A mente daquele que a desconhece, ao contrário, erra pelo mundo, sentindo-se infeliz e retornando, por um curto espaço de tempo, a Brahman, a fim de experienciar a felicidade. Na verdade, o que se chama de mundo não passa de pensa mento. Quando o mundo desaparece, isto é, quando não existe pensamento, a mente sente a felicidade; e quando surge o mundo, a mente sofre.


Questionador: O que é sabedoria-introvisão (jnãna-drsti)?

Sri Ramana: Permanecer em quietude é o que se denomina sabedoria-intro-visão. Aquietar-se é dissolver a mente no Eu superior. A telepatia, o conhecimento de acontecimentos passados, presentes e futuros, e a clarividência não constituem a sabedoria.


Questionador: Qual a relação entre a ausência de desejo e a sabedoria?

Sri Ramana: A ausência de desejo é a sabedoria. Os dois não são diferentes; são a mesma coisa. A ausência de desejo consiste em impedir a mente de vagar em direção a algum objeto. A sabedoria implica o não-aparecimento de qualquer objeto. Em outras palavras, buscar apenas o Eu superior é desapego ou ausência de desejo; aí permanecer é sabedoria.


Questionador: Qual a diferença entre investigação e meditação?

Sri Ramana: A investigação consiste em reter a mente no Eu superior. A meditação consiste em pensar que o próprio Eu superior é Brahman, existência-consciência-beatitude (Sat-Chit-Ananda).


Questionador: O que é a libertação?

Sri Ramana: Indagar a natureza do próprio Eu superior que se encontra em cativeiro e compreender a sua verdadeira natureza é a libertação.


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