Antes da iluminação -- ou seja, enquanto a mente humana atua sobre a nossa visão --, percebemos a existência de pessoas boas e más, sadias ou doentes, forças do bem e forças do mal. Mas, enxergar o mundo desse ponto de vista é ignorância de visão. Alguns exemplos: pessoas ignorantes contemplarão a pintura de um mestre e dirão que se trata apenas de manchas na tela. Para elas, aquilo é o que é e sempre será: não são capazes de apreciar uma obra de arte. Entretanto, quem aprendeu a apreciar obras de arte ficará maravilhado. O mesmo acontece com a música. Alguns, ouvindo uma sinfonia magistralmente executada, acharão o som terrível, enquanto seus vizinhos na poltrona ficam embevecidos. A diferença é a apreciação da pintura e a apreciação da música. Graças a essa capacidade, percebemos o que outros não percebem na música e na pintura.
Quando conseguimos colocar a mente de lado, somos tocados pelo Espírito, e alcançamos a "apreciação espiritual", a qual é chamada consciência espiritual, percepção espiritual ou discernimento espiritual. Graças ao Espírito, o que antes era irreal passa a ser realidade.
A realidade espiritual está presente em todo os os lugares. O Espírito é um; não apresenta divisões. Só que o Espírito não pode ser captado pelos sentidos humanos. Ele é invisível; não pode ser tocado e -- e agora a parte mais importante: -- não pode ser conhecido. Pelo menos, não da forma como nós pensamos. Ele pode ser conhecido; mas esse conhecimento se dá de forma direta e imediata. É um atalho. Ele vai direto; não chega a passar pela mente, pois o fenômeno ocorre logo de pronto; não há tempo para desviar o caminho. É um reto-conhecimento.
O conhecimento se dá de forma direta pois, nós não somos as nossas mentes. Nossas mentes estão situadas muito longe de nós... e o Espírito está "mais perto do que nossa respiração e nossas mãos". No conhecimento reto, o Espírito vem diretamente a nós, ou seja, Ele nos toca antes. Assim, não há necessidade dele avançar mais, até a mente. A realidade espiritual só pode ser discernida espiritualmente.
Uma vez que essa consciência espiritual seja atingida, podemos dizer: "Ó mundo invisível, nós te vemos! Ó mundo impalpável, nós te tocamos! Ó mundo incognoscível, nós te deciframos! Ó inapreensível, nós te apreendemos!" (The kingdom of God, de Francis Thompson)
O Espírito preenche todo o espaço. Quando atingimos um certo nível de compreensão espiritual, percebemos algo a mais: o Espírito é a única existência real. A matéria e a mente não existem; apenas parecem existir, quando observadas do ponto de vista da mente humana. Nossos olhos carnais não vêem isso. Nossos sentidos não são capazes de perceberem isso. Mas, a boa nova é que, não precisamos dos nossos lhos, nem dos nossos sentidos para vê-lO. Se Deus enche todo o espaço ( e isso inclui o espaço no qual nossa mente humana existe), não necessita de meio algum para se fazer perceptível ao homem. O Espírito não necessita que tenhamos olhos para vê-lo, nem ouvidos para ouví-lo... Ele já está presente do jeito que as coisas são agora. O Espírito não depende nem mesmo de nossas mentes. Porque ele preenche inclusive nossas mentes; assim, ele está presente retamente, de modo direto e imediato. A nós, basta confiar em Sua onipresença e reconhecê-lO. Ele tem poder para se fazer reconhecido independente da situação que nos encontramos. Não necessitamos ter muito conhecimento sobre espiritualidade, nem um histórico de muitas horas de meditações ou momentos de oração... Se você permitir, o Espírito de Deus arrebatará a sua consciência AGORA. Só a confiança e a entrega àquilo que, no momento, é desconhecido por nós são suficientes para nos tornarmos iluminados.
"Voará o peixe para alcançar o oceano? Mergulhará no abismo a águia para atingir o ar? Por que investigar o giro das estrelas para saber se ecoam a Tua voz?" (The kingdom of God, de Francis Thompson)
O peixe sai à procura do oceano? Não! O peixe está(!) no oceano. Talvez nem saiba disso, mas certamente o peixe percebe que se encontra no lugar certo e vai levando a vida, sem se preocupar em descobrir o mar. Mas, suponhamos que o peixe, num momento de loucura (se é que existem peixes loucos), perca a consciência de que se encontra no mar e comece a nadar para cima e para baixo, tentando encontrar o oceano! Isso seria muita loucura!
Na nossa busca e no nosso desejo por Deus, sofremos do mesmo tipo de loucura, pois nunca abandonamos a morada do Pai. Nunca estivemos em outro lugar, que não em Deus. Ao procurarmos por Deus, como se Ele estivesse longe, em algum outro lugar, criamos nosso próprio estado de loucura. É preciso pararmos de procurar; e aí, em um estado de descanso, podemos perceber/conscientizar que Deus já se encontra exatamente o nosso próprio ser. Não devemos procurar por Deus. Devemos reconhecer sua Presença: esse é o modo como devemos procurar por Ele.
Com toda a nossa imaginação, não conseguiríamos visualizar o peixe fora da água ou a águia longe dos ares. Se conservarmos essa imagem na mente, compreenderemos como e porque nós não podemos estar fora de Deus. Espiritualmente, nós compreenderemos que vivemos, movimentamo-nos e temos o nosso ser em Deus, e que Deus vive, movimenta-se e tem o Seu ser em nós -- devido à Unicidade. Deus é o Ser Infinito, Deus é a Consciência Infinita. Ora, se Ele é o único Ser e a única Consciência, Deus é a nossa consciência individual. "Tudo o que o Pai é, eu sou". Não estamos separados de Deus, de forma alguma que seja.
Precisamos conscientizar que Deus é a nossa casa, e dizer: "Obrigado, Pai, acho-me em casa em Ti. Encontro-me no lugar secreto do Altíssimo". Quanto mais compreendermos que "sendo o Senhor o meu Pastor, nada devo desejar", mais perto ficaremos da consciência do nosso verdadeiro ser. Não tentem encontrar o Senhor ou fazer do Senhor o seu Pastor, não saiam em busca do Pastor; apenas compreendam que o Senhor é o seu Pastor e a seguir prossiga com sua vida na segurança dessa compreensão. Não é preciso procurar por nada; basta reconhecer: "Obrigado, Pai, está feito!".
No instante do despertar, avistaremos Deus como Ser Infinito e espiritual. Mesmo assim, as aparências percebidas pela mente humana continuarão a ocupar o lugar a que pertencem. A visão espiritual não aniquila as aparências, porque é indiferente quanto à elas. O Espírito de Deus não confronta a existência das aparências vistas pela mente humana, porque Deus é tudo o que existe; Deus é o único poder existente, e assim não guerreia com outro poder: porque não há outro poder. O Espírito é Santo, Sagrado. Eles está separado de tudo. A palavra 'santo' significa 'estar separado'. A Realidade do Espírito não se mistura com a realidade percebida pelos sentidos humanos, embora Aquela habite em meio a esta. A onipotência de Deus não é um poder que pode ser exercido sobre algum outro poder; Deus é o único poder, o que significa que nenhum outro poder existe para ser vencido/aniquilado. Esse é o princípio da Unicidade de Deus. Só há Deus. As aparências não importam. Elas sequer causarão seus efeitos ao portador da consciência sintonizada com a Unidade de Deus. Se a mente humana existe, ou não, isso não deve ser um incômodo. Isso deve ser compreendido.
Depois que essa grande verdade estiver estabelecida na sua consciência, como serão capazes de temer a alguma coisa? Como darão poder aos bons ou maus pensamentos de alguém? Ninguém pode ajudá-lo com bons pensamentos; ninguém, com maus pensamentos, pode prejudicá-los. Nenhum poder exterior os perturará, exceto se lhe der poder. Nós não devemos nos valer da Verdade como uma arma a ser empunhada contra algum poder maligno. Só há a Verdade, eis o segredo. Essa Verdade, na nossa consciência é uma armadura.
Entretanto, a palavra armadura dá a idéia de defesa e, no momento em que pensamos em defesa, criamos problemas. Do que haveríamos de nos defender se Deus é Todo o Poder e Todo o Ser? Deus é um Poder Único e, por essa razão, melhor seria usar a expressão 'armadura da unicidade'.
Assim, não há necessidade de palavras e pensamentos, nem de armadura para nos defender ou atacar. A verdade é que somos tentados a acreditar em outra atividade! Na próxima esquina poderá haver um marginal pronto para assaltar-nos, e a nossa primeira tentação é a de empregarmos a força física ou o poder mental para dominá-lo. Mas a verdade espiritual sustenta: "Ficai em paz. A luta não é vossa." Não há outro poder senão Deus; não há outra atividade a não ser a atividade de Deus. Se a vida de uma pessoa que atingiu esse nível de iluminação é ameaçada, ela simplesmente irá rir disso tudo, porque existe apenas uma única vida, a Vida de Deus. Só a crença em duas vidas -- a de Deus e a nossa -- nos sujeita a perder esta última.
Quando falamos em Unicidade, estamos falando de Deus como o Poder Único: Um único Deus, uma Única Vida, Uma Alma, Uma Mente, Um Ser -- e mesmo Um Corpo. As aparÊncias nos fazem crer que cada um de nós tem um corpo. Todos parecemos diferentes: alguns saudáveis, outros não; alguns mais, alguns menos. Por isso, aceitamos a crença na dualidade, na existência de mais de um corpo. Se a Unicidade é a Verdade, então existe apenas um Corpo, e quanto a isso nada temos a temer. Nossa busca por Deus deve ser empreendida sempre no sentido único de 'querer entrar na Presença de Deus'; não devemos querer utilizar Deus como um meio para obter algum fim. Se Deus for buscado da forma apropriada, os fins que almejávamos certamente se converterão em acréscimos na nossa Vida. Deus é tudo o que há. Deus É.