"O que nos conduzirá ao paraíso?" Para encontrarmos a resposta desta questão, precisamos, em primeiro lugar, compreender claramente quem somos nós, isto é, como é o nosso eu. Em segundo lugar, precisamos saber o que é paraíso. E, em terceiro lugar, compreender o que significa ser salvo, e saber qual é a força que nos conduz à salvação.
Aqui, na cidade de Nanao, a seita Shin do budismo é muito difundida, e acho que muitas das pessoas presentes neste auditório são seguidores desta seita. Na seita Shin acredita-se que o homem pode ser salvo simplesmente recitando a oração "Namu Amida Butsu", que significa "Seja conforme a vontade de Buda". Agora, vamos supor que alguém faça aos devotos da seita Shin a seguinte pergunta: "Os senhores crêem que serão salvos rezando Namu-Amida-Butsu, mas expliquem-me o que é ser salvo". Quantas pessoas serão capazes de responder prontamente, e com clareza, essa pergunta? Pessoas ligadas às religiões usam com frequência o termo "ser salvo". Mas quando alguém lhes pergunta o que significa ser salvo, ficam confusos e não conseguem explicar. Alguns parecem pensar que "ser salvo significa a nossa alma ser conduzida a um mundo longínquo, de abundância e conforto, após a morte do corpo carnal neste mundo". Parece que muitas pessoas idosas pensam assim. Com o intuito de comprar, enquanto ainda estão vivas, o bilhete para conseguir um bom lugar no paraíso, trabalham com afinco e levam o dinheiro ao templo ou à igreja, que para elas é como uma bilheteria. Pelo que vejo, parecem pensar que, agindo desse modo, poderão garantir os melhores lugares no paraíso, que lhes proporcionarão sensações sumamente agradáveis; parecem pensar que o paraíso não é um mundo que possa ser alcançado aqui e agora, mas sim um mundo longínquo que só se alcança após a morte.
Os seguidores da seita Shin frequentemente referem-se a si mesmos como pecadores. Até mesmo o fundador da seita, o mestre Shinran, disse num de seus livros que: "A perversa índole custa se modificar; execráveis são meus pensamentos". Em alguns trechos, ele despreza a si mesmo como uma criatura impenitente e miserável, e lamenta-se profundamente. E prega que, apesar de tantos pecados, nós, seres humanos, podemos ser salvos pela misericórdia de Buda; que, apesar de merecermos ser lançados no inferno, somos conduzidos ao paraíso, e por isso devemos ser gratos. Em suma, prega que devemos nos considerar abençoados por sermos conduzidos a um lugar maravilhoso apesar de não o merecermos.
Analisando isso superficialmente, podemos pensar: "sermos levados ao lugar que merecemos é natural; porém, sermos levados a um lugar maravilhoso sem que o mereçamos é uma bênção extraordinária e devemos nos considerar felizes". Contudo, se refletirmos melhor, percebemos que não é bem assim. Alcançarmos o paraíso sem o merecermos seria como ocuparmos um cargo bem acima de nossa capacidade, o que nos faria sentir constrangidos e um tanto infelizes. Por exemplo, se tivéssemos que morar no palácio de um monarca e fôssemos tratados por todos com servilíssimo e atenção exagerada, apesar de não possuirmos as qualificações para ocupar uma posição tão elevada, não nos sentiríamos bem, embora possamos considerar isso um grande privilégio. Certamente nos sentiríamos muito mais à vontade morando numa casa condizente com o que somos, por mais modesta que ela seja. Em última análise, por mais que nos sejam proporcionados lugares maravilhosos ou ambientes paradisíacos, a nossa mente não alcançará o estado paradisíaco e continuará sem paz, enquanto não se elevar o nosso próprio valor. A verdadeira paz e felicidade não se alcançam por sermos conduzidos a um lugar paradisíaco, que nos ofereça conforto e prazeres. Alcançamo-las por nossos próprios méritos. Se nós próprios não tivermos qualificações para merecer o paraíso, nenhum lugar será paraíso para nós, por mais que ofereça conforto e prazeres.
Por isso, a Seicho-No-Ie não ensina que o paraíso exista "aqui ou acolá". Naturalmente, não ensina que ele existe em algum lugar longínquo. Jesus Cristo também ensinou: "Nem dirão: ei-lo aqui, ou: lá está! porque o reino de Deus está dentro de vós" (Lucas 17:21). Não ocorrendo a elevação do nosso próprio valor, a nossa mente não alcança o estado paradisíaco, mesmo que nos seja proporcionado o estado paradisíaco. E, inversamente, ocorrendo a elevação do nosso próprio valor, alcançamos o estado paradisíaco onde quer que nos encontremos. Por isso, a Seicho-No-Ie não reconhece o paraíso como sendo uma "área delimitada do espaço", repleta de prazeres, que se situa num lugar longínquo do espaço.
Pelo que foi dito até agora, os senhores já devem ter compreendido que, para as pessoas alcançar o paraíso, é necessário que elas elevem o seu próprio valor até o nível paradisíaco. Na Seicho-No-Ie, as pessoas não depreciam a si mesmas, considerando-se pecadores, criaturas impertinentes e miseráveis, como fazem os seguidores da seita Shin. Pelo contrário, valorizam a si mesmas, reconhecendo-se como filhos de Deus infinitamente maravilhosos. Na linguagem budista, somos todos filhos de Buda. Nas escrituras budistas consta que Sakyamuni (Buda) apontou para o céu e disse: "Sou venerável no céu e na terra". Jesus Cristo também declarou, publicamente, ser filho de Deus. Como podemos perceber, tanto no Oriente como no Ocidente, é o mesmo estado espiritual dos que alcançaram o verdadeiro despertar.
Segundo os ensinamentos da Seicho-No-Ie, todas as pessoas são filhos de Deus, são filhos de Buda. Filhos de Deus só podem ser Deus. Filhos de Buda só podem ser Buda. Desde o momento em que nascemos, somos seres divinos, seres búdicos. Não é depois de morrermos e sermos levados ao paraíso que nos tornamos seres divinos ou seres búdicos. Estamos salvos desde o princípio. Nosso verdadeiro eu já é divino, já é búdico. Nosso valor está definido desde o princípio. Já somos seres divinos, seres búdicos. Portanto, já estamos no paraíso. Desperte! Desperte! Você já é um ser divino, um ser búdico, Você já está no Paraíso! Aqui e agora - o agora imutável, que encerra em si o passado e o futuro infinitamente remotos - você já é um ser divino, já está no paraíso. Um ser que não tenha a natureza búdica desde o princípio jamais poderá alcançar o estado búdico. Se o homem pode alcançar o estado búdico, é porque ele possui a natureza búdica desde o princípio.
Mas o que é alcançar o estado búdico? No japão, a expressão "tornar-se um buda" comumente significa morrer. Porém, na verdade, tornar-se um buda (isto é, alcançar o estado búdico) não é morrer, mas sim viver. Viver de fato, viver plenamente livre - isso que é tornar-se um buda, ou seja, alcançar o estado búdico. A palavra japonesa "hotoke" (Buda) originou-se do verbo "hotokeru", que significa desprender-se, libertar-se. O estado que se alcança quando se desprende das amarras é o que é o estado búdico. No budismo diz-se que Buda é aquele que se desembaraçou. Quando o homem se liberta das amarras e alcança a plena liberdade, "ele se torna um buda", isto é, alcança o estado búdico. Libertando-nos das amarras que nos vinham tolhendo durante muito tempo, sentimo-nos aliviados. A sensação de alívio e conforto ocorre dentro de nós mesmos, e é nisso que consiste o paraíso. Portanto, o paraíso está dentro de nós mesmos.
Se não fôssemos criaturas livres por natureza, de modo algum poderíamos nos tornar livres, mesmo sendo libertos das amarras. Objetos como mesa, cadeira, etc., não são livres por natureza, e por isso não começam a se mover por si, mesmo que desatemos as cordas ou os cordões com que os tenhamos prendido. Mas tratando-se, por exemplo, de um cachorro, se desatarmos a corda com que o havíamos prendido, imediatamente ele começa a correr à vontade. Isto porque ele tem, desde o princípio, a natureza livre que o impele a correr, saltar, etc. Da mesma forma, se nós, seres humanos, podemos alcançar o estado de plena liberdade (ou seja o estado búdico) quando nos desprendemos das amarras de ilusão, é porque somos seres búdicos desde o princípio. Não somos, de modo algum, seres miseráveis. Somos, desde o princípio, seres maravilhosos, repletos de amor e bondade. Por sermos originariamente seres búdicos, passamos imediatamente a manifestar a natureza búdica, perfeita e livre, a partir do momento em que nos desprendemos das amarras.
A seita Shin exalta a "força salvadora de Buda" e menospreza a "força própria" do ser humano. Afirma que o homem jamais poderá alcançar a salvação por meio de sua própria força. Todavia, por mais que despreze a "força própria" do ser humano, enquanto admitir a existência dela, não se pode dizer que esteja negando-a completamente. Justamente por admitir a existência da "força própria" do homem é que a referida seita conclui que "a força humana é inútil". Se, em vez disso, compreender que "existe unicamente a força de Buda, a força de Deus, e não existe a força própria do homem", e deixar de admitir a existência da "força própria" do ser humano, passará a crer unicamente na força de Buda, na força de Deus. Havendo unicamente a força de Buda (ou força de Deus, para os que não são budistas), é impossível haver "força própria" do ser humano. A Seicho-No-Ie crê unicamente na força de Buda (Deus), que é um com o Eu verdadeiro. A "força própria" que se nega é a do eu falso. Na verdade, não existe oposição entre a "força de Buda" e a "força própria" do homem; existe unicamente a Força Absoluta, que transcende a relatividade. Pode-se dizer, portanto, que a Seicho-No-Ie é a crença na Força Absoluta, que é única. Usando a linguagem budista, podemos dizer que não reconhecemos nenhuma outra força além da força de Buda. Existe unicamente Buda, pois todos somos um com Ele. Portanto, todo lugar do universo é a Terra Pura de Buda, ou seja, paraíso. Não há, em lugar algum, o que se possa chamar de inferno. "Todos já estão salvos. Assim mesmo como são, todos vocês já se encontram na Terra Pura de Buda." Esta é a declaração da Seicho-No-Ie, dirigida a toda humanidade.