"MAIOR É O QUE ESTÁ EM VÓS DO QUE O QUE ESTÁ NO MUNDO." (I JOÃO 4:4)

sexta-feira, novembro 06, 2015

"Quem somos" na Realidade e na Representação

- Gustavo -


Na postagem anterior, o nosso amigo SERgio fez o seguinte comentário:

Isso é o que precisamos "treinar"! 
Perceber sem a interferência da mente comum. 
Perceber "além" ou "através" das aparências. 
Perceber, a partir da Consciência que somos, que tudo é a mesma Consciência.
Pode não ser fácil para aquele cuja a Consciência não aparece como "ser humano desperto". 
Até mesmo os tidos como "acordados" (e eu estive com alguns), quando conversamos fora do "contexto de Satsang", como normalmente é chamado, a conversa fluía em termos de visão comum. Claro que para ficar "utilitário" fora (talvez) necessário.
"Alguém" poderia discorrer mais sobre isso.
Talvez o Silvano, ou você mesmo Gustavo... ou "outro". 
Reverências!

Atendendo ao pedido d'Aquele que aparece como o nosso querido amigo, seguem considerações sobre algumas questões importantes relativas ao conteúdo do texto anterior, de Joel Goldsmith:

Caro SERgio,

Este texto de Goldsmith é realmente profundo! Não me surpreende que um texto dessa magnitude tenha chamado sua atenção para nos proporcionar uma reflexão do que ele contém.

Eu escolhi esse texto de Goldsmith porque ele complementa e enfatiza (com palavras diferentes) o que foi dito por Masaharu Taniguchi nos parágrafos finais do post anterior.

Uma verdade essencial a ser assimilada, por nós que buscamos a Verdade, é que a visão do Todo (aquilo que chamamos de Eu) somente emerge em nossa percepção quando conseguimos levar em consideração todos os nossos irmãos (ou seja, o "outro"). A Verdade que buscamos para nós deve incluir em si todos os seres, sem exceção. Somente assim é que surge a percepção do Eu. A mente egoica, visando manter a separação entre "eu" e o "outro", tende a querer associar a Verdade com aquele "eu" e não levar em consideração o "outro". Dessa forma, a percepção do Eu não pode emergir. O sentido de "Eu" somente surge quando nossa percepção da verdade inclui  tanto o "eu" quanto o "outro". Numa equação simples, Eu = "eu" + "outros". Desaparecendo a linha ou fronteira que separa o "eu" e o "outro", surge o Eu que "aparece como" todos.

Manter o "outro" separado do "eu" é uma das estratégias do ego para nos manter presos na mente. 

Por isso, Masaharu Taniguchi disse:

"Para fazermos ressurgir o paraíso, não basta reconhecermos a nós próprios como sendo um 'ser espiritual', um ser divino dotado de Vida eterna e, portanto, digno de habitar o jardim do Éden. É preciso contemplar todas as pessoas como sendo filhos de Deus, dignos de viver no paraíso. Jesus Cristo disse: 'Quem não reverencia o filho de Deus, não reverencia o Deus-Pai'. Aquele que não é capaz de reverenciar o ser humano como filho de Deus, também não é capaz de reverenciar verdadeiramente o Deus-Pai que rege o universo. Enquanto não formos capazes de reverenciar todas as pessoas, não poderemos fazer com que este mundo se transforme em paraíso. Despertar para a Verdade de que 'o homem é filho de Deus' não é conscientizar-se apenas da natureza divina de si mesmo, mas sim compreender que 'todas as pessoas são filhos de Deus' e viver em harmonia com todos, amando-os e reverenciando-os."

Por sua vez, Goldsmith diz que: 

"... dar falso testemunho contra o próximo é declarar que ele é humano, finito, que tem falhas, e que é menos do que o filho de Deus. Violando essa lei cósmica, atraímos nossa própria punição, porque a verdade que diz respeito ao 'outro', diz respeito também a 'mim', uma vez que há somente um Eu e um Ser. A única maneira de evitar falso testemunho contra o próximo é perceber que o Cristo (filho de Deus) é nosso próximo, que nosso próximo é um ser espiritual, exatamente como nós. Ele pode não saber, nós podemos não saber, mas a verdade é: Eu Sou o Espírito, Eu Sou a Alma, Eu Sou a Consciência, Eu Sou Deus Expresso - assim como o nosso próximo."

Essa é a visão que devemos treinar, exercitar, buscar manter sempre conosco.

O interessante a se notar é que: para os que são "acordados" (iluminados), não existe pessoa ou ser que não seja iluminado. Um ser desperto vê/percebe todos os outros seres como estando despertos. Em outras palavras, percebe somente a Si mesmo. Ele pode até conversar frente-a-frente com um indivíduo não-desperto, pode tentar auxiliar esse indivíduo a tornar-se desperto, mas não levará isso a sério. Ele estará apenas "jogando", ou seja, apenas interagindo na representação.

A percepção iluminada é absoluta. Quando ela se realiza em você, simultaneamente se realiza em todos os seres, iluminando tudo. Ao se tornar consciente, você também perceberá todos os seres estando conscientes. Isso ocorre porque você é um universo inteiro e infinito. Por exemplo: suponhamos que eu não esteja iluminado, e me encontre com você que está iluminado. Nesse caso, haverá a presença de dois universos infinitos - o meu universo e o seu universo. Se você estiver iluminado, eu (que estou aparecendo no seu universo) estarei iluminado. Se o seu universo estiver iluminado, eu estarei iluminado para você. Você me perceberá assim porque estará vendo do referencial do seu universo, que inclui a mim. E eu, permanecendo no referencial do meu universo, não poderei perceber a mim nem a você como iluminados, enquanto o meu universo não se iluminar. 

O modo como o meu universo se torna iluminado não se dá de modo objetivo (com mudanças exteriores ocorrendo nele), e sim de modo subjetivo (quando eu obtenho uma certa percepção dele). Se você olhar pela janela e quiser ver a paisagem da cor vermelha, não precisa empreender o duro trabalho de pintar todo o cenário de vermelho, basta colocar um óculos com lentes vermelhas e a paisagem toda se torna vermelha instantaneamente. De modo análogo, é assim que o universo se torna iluminado para nós: quando iluminamos a nossa percepção.

Joel Goldsmith diz que "Deus aparece como o Ser individual", e que o Ser individual compreende o infinito, a totalidade do universo inteiro. É por isso que cada um de nós somos esse Ser Individual, esse Universo infinito. Tudo o que precisamos fazer é iluminar a percepção que temos do universo que somos.

E o que fazer para iluminar a percepção que temos de nosso universo?

Primeiro precisamos compreender uma verdade essencial acerca de Quem realmente somos (quando não levamos em conta a existência da Representação), e também de Quem somos (quando levamos em conta a presença da Representação).

O Ser que verdadeiramente somos existe desde "antes que a Representação existisse", e existe como um Ser absolutamente puro, iluminado, imaculado, sagrado e perfeito. É a nossa Identidade Celestial, em que Deus-Pai (Ser Universal) aparece como o Filho (Ser Individual). Nessa Realidade (que existe antes da Representação), Deus-Pai e o Filho são exatamente a mesma coisa, o mesmo Ser. Tudo o que Deus é, nós, enquanto Filhos de Deus, também o somos. Deus compartilha conosco tudo quanto Ele é e tem. Nossa Realidade e Identidade celestiais é uma existência gloriosa. Essa é a Verdade exata e imutável sobre de cada um de nós enquanto Seres "anteriores à Representação". É a Verdade exata sobre nós, assim como na matemática o 4 é o único resultado correto e possível para a equação 2+2.

Mas, então, eis que surge a Representação. Uma vez que a Representação entra em cena, muitas coisas se tornam possíveis, até mesmo o que não existe de verdade. A Representação tem a característica de ser como um "quadro-negro" ou "folha de papel em branco", e nela é possível escrever aquilo que se quiser. Se você escrever num quadro negro que 2+2 = 4 (ou seja, a verdade), ele irá registrar isso. Por outro lado, se você escrever 2+2 = 5 (ou seja, o erro), ele também irá registrar isso. O propósito da Representação é proporcionar a existência/experiência de tudo o que não é verdadeiro. Mesmo que a matemática tenha o 4 como o único resultado possível/correto para a conta 2+2, o quadro-negro aceitará a presença da equação 2+2 = 5, caso alguém assim queira assinalar. 

Por isso, quando levamos em conta a Representação (o quadro-negro), o Ser que somos não é necessariamente aquela Identidade Celestial perfeita. Ao adentrarmos a Representação, assumimos o nosso Ser como algo absolutamente indefinível, capaz de se revestir tanto de uma identidade correspondente à Verdade, como também de uma identidade correspondente à inverdade. No âmbito da Representação, o Ser que somos é como um vácuo, um espaço vazio e sem forma, capaz de assumir em Si os mais diversos conteúdos. Isso é o que torna possível estarmos no universo da Representação, caso contrário ficaríamos somente na Realidade que existe desde "antes" da Representação.

É por isso que determinados ensinamentos (que não levam em conta a Representação) mencionam de forma taxativa que a nossa real identidade é a de Deus (ou Filhos de Deus), e enfatizam a nossa realidade divina como Verdade definitiva e imutável. Se esses ensinamentos fossem indagados sobre a pergunta "Quem sou eu?", eles diriam: "Você é Deus, o Filho de Deus perfeito, vivendo aqui e agora no reino de Deus".

Por sua vez, se outros ensinamentos (os quais levam em conta a Representação) fossem indagados sobre a pergunta "Quem sou eu?", responderiam: "Não tente descobrir Quem é você, não tente obter uma resposta para essa pergunta. Nem mesmo assuma que você é 'Brahma', ou o 'Atma', ou o 'Divino'. Apenas fique com a pergunta, até que ela finalmente desapareça, e quando a pergunta desaparecer somente então você saberá quem é". E a pergunta somente desaparece quando nós também desaparecemos, ou seja, quando nos percebemos sendo esse imenso Vazio sem conteúdo algum (e, por isso, capaz de todos os conteúdos). 

Em um dos livros de "A Verdade da Vida", Masaharu Taniguchi explica que "o homem é um ser enigmático, misterioso, híbrido, capaz de perambular entre dois universos" (unidade e separatividade). Ao experienciar sua real identidade na Representação, ele desejou expressar ao mundo o seu despertar e assim registrou em forma de poema, dizendo: "Abandono-me ao sabor das ondas, e, completamente entregue a elas, fito o céu azul. Nada vejo, mas tudo existe. Sendo vazio e, ao mesmo tempo, pleno; sendo pleno e, ao mesmo tempo, vazio - um ser que está vivo e flutua, um ser misterioso e extraordinário: isto sou Eu." Se o homem é capaz de perambular entre dois universos, então ele não é a imagem que aparece na Representação quando mergulha no universo da divindade; tampouco é a imagem que surge quando imerge no universo da separatividade. Enquanto estiver na Representação, ele é aquela identidade vazia, misteriosa, indefinível, capaz de assumir ambos os conteúdos. Por isso, ao mesmo tempo que é vazio, é completamente cheio. Mas essa Verdade só é válida do ponto de vista da Representação. Na Matemática 2+2 é igual a 4, e é impossível que 2+2 seja igual a 5. Mas no quadro-negro é possível a equação 2+2 ser igual a 5. Da mesma forma, na Realidade Celestial é impossível sermos algo separado ou diferente do que Deus é. Mas na Representação podemos existir ou experienciar nosso ser como sendo algo separado ou diferente Dele. Consequentemente, também podemos experimentar o nosso Ser como unido e idêntico a Deus.

Por isso, na Representação, somos aquele ser misterioso, vazio, híbrido, indefinível, capaz de assumir conteúdos condizentes com a Realidade, e conteúdos condizentes com a irrealidade.

Uma vez que assimilemos isso, podemos compreender que o nosso Ser pode se alinhar tanto com a Verdade, como também pode se alinhar com a inverdade. Se estivermos alinhados com a irrealidade, devemos fazer um trabalho de esvaziamento, a fim de que nos tornemos disponíveis para receber em nós a Verdade, somente então é que passaremos a expressá-La aqui na Representação. Não é incomum vermos tantos ensinamentos discorrendo sobre a importância do "Vazio" e incentivando os buscadores a aprenderem a se esvaziar. Somente quando nos tornamos vazios (do conteúdo correspondente à inverdade) é que nos colocamos em condição de receber/acessar a Verdade e manifestá-la no universo da Representação.

O ego tem o papel de utilizar todas as estratégias possíveis para nos manter alinhados com a inverdade como, por exemplo, proteger a linha ou fronteira que demarca a existência do "eu" e do "outro". Ao proteger essa fronteira e mantê-la intacta, é impossível surgir a noção ou percepção do Eu. Pois, como já vimos, Eu = "eu" + "outros".

O ego tem uma determinada visão do universo, ao passo que o Eu tem uma outra visão do mesmo universo. O universo em si não é nada, não tem significado algum. A percepção é tudo(!). Nós é que conferimos significado ao universo mediante a visão com que olhamos para ele. Se conseguirmos alterar a lente de percepção com que enxergamos o universo (trocando as lentes da separatividade por uma lente iluminada), o universo inteiro se tornará iluminado, e assim perceberemos Eu aparecendo como tudo e todos neste próprio universo em que vivemos.

E muitas ferramentas nos são oferecidas. Há várias chaves de percepção que, se colocadas em prática, alinham a nossa visão com a percepção que o Eu tem do universo. Algumas delas:

* Pensar, falar e agir com Amor (ser Amor).
* Perdoar verdadeiramente (Purificar a  mente de conteúdos pesados e negativos, como raiva, ciúme, ódio, inveja, mágoas, ressentimentos, etc.)
* Não julgar (Pois, como já dito, o universo não é nada por si mesmo. Tudo depende da percepção com que se olha para ele. Sempre que julgarmos algo, estaremos vendo apenas um subproduto de nossa própria visão).
* Manter em mente somente pensamentos da Verdade (Tudo aquilo que sabemos ser verdadeiro na Realidade Celestial) e buscar manifestar nossas vidas em conformidade com essa Verdade.
* Sempre levar em consideração o outro (Ou seja, saber que todos estão incluídos na Verdade, pois ela é impessoal. O Todo somente se revela quando se reúnem todas as suas "partes").
* Gratidão (assim como o amor, a gratidão é uma chave poderosa para nos alinhar com a Verdade divina)
* Estar sempre atento ao momento presente, e aceitá-lo tal como ele é (A Verdade existe sempre aqui e agora).
* Ação dhármica (agir sem visar recompensas pessoais, com renúncia aos frutos da ação, ou seja com desapego. Pois o "eu" não existe. Só existe o Todo).
* Receber a Deeksha (a energia da Deeksha acelera o processo do despertar da consciência).
* E, claro, um desejo/amor ardente e inquebrantável por querer conhecer a Verdade, Deus.

Essas são algumas das principais chaves de acesso ao Eu, que são recomendadas pelos mais variados ensinamentos. A cada vez que exercitamos uma dessas chaves, nosso ser se alinha/sintoniza um pouco mais com a Verdade. São essas as coisas que precisamos treinar.

Também é muito importante lembrar o que o Silvano disse: "A chamada 'mente comum nem mesmo interfere quando estamos percebendo a partir da Consciência". Isso significa que não precisamos aniquilar a visão mental para desfrutarmos da percepção consciencial. Podemos perceber consciencialmente independente da interferência da mente comum [mente do personagem], pois a interferência causada pela mente do personagem é apenas aparente. Isso é algo que pouquíssimos ensinamentos revelam aos buscadores. Mas é a verdade. Podemos nos perceber sendo o Ator, e mesmo assim continuar representando o papel de nossos personagens aqui na Representação. Foi em razão disso que Joel Goldsmith disse:

"O nosso próximo [o outro personagem] pode não saber, nós podemos não saber [ou seja, podemos estar representando o papel de um personagem que ainda não despertou para a Verdade, e mesmo assim estarmos conscientes de Quem somos. Pois quem está consciente de Si mesmo é o Ser, e não o personagem], mas a verdade é: Eu Sou o Espírito, Eu Sou a Alma, Eu Sou a Consciência, Eu Sou Deus Expresso - assim como o nosso próximo."

Todas essas coisas são algo que vale a pena ponderar, contemplar, e meditar.

Namastê!


quarta-feira, novembro 04, 2015

"Não dar falso testemunho" (Goldsmith)


  - Joel S. Goldsmith - 


Nunca pensemos em um ser humano como se ele precisasse de cura, de emprego ou de riquezas, porque se assim fizermos, seremos seu inimigo em vez de amigo. Se houver qualquer homem, mulher ou criança que acreditamos estar doente, ser pecador, ou estiver morrendo, não oremos até que tenhamos nos reconciliado com esse irmão, pedindo perdão por temos cometido o erro de julgar, porque todos são DEUS em expressão. Tudo é Deus manifestado. Só Deus constitui este universo, bem como a vida, a mente e a Alma de cada individuo.

"Não darás falso testemunho contra teu próximo" tem uma conotação muito mais ampla do que, meramente, não espalhar boatos ou fofocas sobre ele. Não devemos manter o  nosso próximo em humanidade. Se dissermos: "Meu próximo é bom", estaremos dando falso testemunho contra ele, tanto quanto se disséssemos: "Meu próximo é mau", porque isso demonstra que reconhecemos sua condição humana às vezes bom e às vezes mau - e não a espiritual. 

Dar falso testemunho contra o próximo é declarar que ele é humano, que é finito, que tem falhas, que é menos do que o próprio Filho de Deus. Toda vez que reconhecemos o nosso próximo como pecador, pobre, doente ou morto, como outro que não o filho de Deus, daremos falso testemunho contra ele. 

Violando a Lei cósmica atraímos nossa própria punição. Deus não nos pune, nós é que nos punimos porque, ao dizermos "você é pobre", praticamente estamos dizendo que "eu sou pobre", uma vez que há somente um Eu e Um Ser. Assim, a Verdade que diz respeito a você diz respeito a mim. 

Se eu aceitar a crença de pobreza no mundo, ela reage sobre mim. Se eu disser que você está no mundo, ela reage sobre mim. Se eu disser que você está doente ou que você não é gentil, estarei aceitando uma característica separada de Deus, uma atividade à parte de Deus e, dessa forma, estarei condenando a mim mesmo, porque só existe UM SER.

Finalmente, quando dou falso testemunho contra alguém, me condeno e sou o Único a sofrer as consequências. 

A única maneira de evitar falso testemunho contra o próximo  é perceber que o Cristo é nosso próximo, que nosso próximo é um ser espiritual - o filho de Deus, exatamente como nós. Ele pode não saber, nós podemos não saber, mas a verdade é: Eu Sou o Espírito, Eu Sou a Alma,  Eu Sou a Consciência, Eu Sou Deus Expresso - assim como o nosso próximo.


terça-feira, novembro 03, 2015

Abandonando o apego, vive-se a Vida verdadeira - 2/2

- Masaharu Taniguchi - 


"Sou um ser dotado de corpo" – pensar assim é adotar uma postura mental dualista. Com essa postura mental, não se pode alcançar a verdadeira liberdade. Num confronto entre a mente e o corpo, a mente pode sair-se vitoriosa, mas em tal situação, ela seria como um mero condutor do corpo. Nesse caso, o ser humano consegue recuperar até certo ponto a liberdade inata do seu "Eu verdadeiro", mas não se pode dizer que obtém plena liberdade. A liberdade que se alcança com a vitória da mente sobre o corpo é apenas relativa, comparável à de um motorista que dirige um veículo: enquanto o veículo estiver funcionando perfeitamente, o motorista desfrutará plena liberdade, mas uma vez que ocorrer uma pane ou algum outro problema mecânico, ele ficará tolhido e terá de tomar providências concretas para consertá-lo; da mesma forma, quando o corpo apresentar algum problema, a mente ficará tolhida enquanto não for tomada uma medida concreta para sanar esse problema. Como podemos notar, enquanto admitirmos a dualidade "corpo e mente" e, consequentemente, o confronto entre eles, não poderemos alcançar a verdadeira liberdade.

Precisamos, pois, despertar para a Verdade de que não somos seres dotados de corpo, não somos condutores do corpo. Precisamos despertar para a Verdade de que o corpo não é algo que tenha existência própria, é sim, mera sombra da mente, ou, em outras palavras, uma imagem produzida por nossas vibrações mentais, e, portanto, não existe de verdade. Enquanto não ocorrer esse despertar, não poderemos controlar livremente o mundo em que vivemos, do mesmo modo que o ilusionista faz surgir diversas coisas segundo sua vontade.

Nossos sentidos não são capazes de apreender a essência, a natureza verdadeira dos seres e das coisas. Por isso, pensamos que o ser humano é "matéria", é corpo carnal. E devido a isso, fomos expulsos do jardim do Éden. Este fato é citado de forma simbólica no Antigo Testamento, em Gênesis. Eva, que vivia no jardim do Éden, certo dia, enganada pela astúcia da serpente (que simboliza os cinco sentidos) e, deixando de ver a perfeição de seu corpo nu (que simboliza a Imagem Verdadeira), considerou feia a sua própria nudez e sentiu vergonha. Isso ocorreu pela ilusão dos sentidos; ela deixou de ver a perfeição da sua "nudez", ou seja, da sua natureza verdadeira; e resolveu cobrir a natureza verdadeira com um elemento material. Ela se "cobriu com folhas de figueira", ou seja, encobriu sua Imagem Verdadeira e passou a julgar-se "corpo carnal". Por isso Adão e Eva foram expulsos do jardim do Éden.

O homem não é um ser carnal (físico), e sim um ser espiritual. A causa do sofrimento do ser humano está no fato de "se cobrir com as folhas de figueira", ou seja, de encobrir o espírito. Devemos emergir logo desse estado de ilusão. É impossível que o homem tenha sido realmente banido do paraíso. A expulsão do paraíso não passa de produto da ilusão. Irmãos, eliminem a "venda de seus olhos" (a ilusão), e o paraíso ressurgirá imediatamente.

Para fazermos ressurgir o paraíso, não basta reconhecermos a nós próprios como sendo um "ser espiritual", um ser divino dotado de Vida eterna e, portanto, digno de habitar o jardim do Éden. É preciso contemplar todas as pessoas como sendo filhos de Deus, dignos de viver no paraíso. Não devemos ter pensamentos desdenhosos em relação aos outros, como: "Eu sou filho de Deus, mas o Fulano é um pobre coitado, pois ainda está mergulhado em ilusão". Mesmo que saibamos que nós próprios somos filhos de Deus, se não considerarmos os outros como filhos de Deus, este mundo não se tornará um lugar paradisíaco. Somente o mundo onde todos somos filhos de Deus, é o verdadeiro paraíso.

Não nos limitemos a reconhecer unicamente a nossa natureza sublime; reverenciemos todas as pessoas como seres sublimes. Somos "receptores" que captam a Verdade, e "trombetas" que anunciam ao mundo a natureza sublime de todas as pessoas. A sutra sagrada Palavras do Anjo, assim canta:

"Sou apenas uma trombeta.
Homens, não adoreis a mim.
Não louveis a Deus manifestado na forma.
Todas as minhas virtudes provêm de Deus onipresente.
Venerai a Deus que eu aponto, e não a mim, pois sou apenas mensageiro.
Tendo eu próprio compreendido que minha essência é Deus, 
faço-vos compreender que também a vossa essência é Deus".

Nestes versos, o Anjo, fazendo-se de trombeta, propaga a Verdade. A designação "Deus manifestado na forma" que consta na terceira linha, corresponde a "mim", que aparece na segunda linha, e e refere ao próprio Anjo. Assim como o Anjo, cada ser humano é vivificado pela Vida de Deus que nele flui. Portanto, a Vida de todo ser humano é essencialmente divina. Para distinguirmos o ser humano do Deus-Pai, usamos a designação filho de Deus. Seria possível fluir no filho de Deus uma outra Vida que não seja a de Deus? É evidente que não. Se fluísse no ser humano um outra Vida que não fosse a Vida de Deus, ele não seria filho de Deus. Jesus Cristo disse: "Quem não reverencia o filho de Deus, não reverencia o Deus-Pai". Aquele que não é capaz de reverenciar o ser humano como filho de Deus, também não é capaz de reverenciar verdadeiramente o Deus-Pai que rege o universo. Enquanto não formos capazes de reverenciar todas as pessoas, não poderemos fazer com que este mundo se transforme em paraíso.

Algumas pessoas, tendo lido o livro A Verdade da Vida, curam-se da doença e adquirem a convicção de serem filhos de Deus. Mas, lamentavelmente, logo se deixam levar pela soberba e passam a ter pensamentos tais como: "Eu sou filho de Deus, mas os outros são pobres criaturas em estado de ilusão". Tais pessoas precisam lembrar-se da advertência de Jesus Cristo – "Quem não reverencia o filho de Deus, não reverencia o Deus-Pai" – e refletir bastante acerca de sua conduta. Há pessoas que, passando a se dedicar à militância religiosa, tornam-se intolerantes para com os outros, rebelam-se contra aqueles que as acolheram, e provocam constantes atritos internos na seita. Tal conduta se deve ao fato de que elas reverenciam apenas a si mesmas, ao invés de reverenciar todas as pessoas como filhos de Deus. Adeptos de todas as religiões, não criem atritos dentro da própria seita! E também não antagonizem outras seitas. A base de toda religião é a harmonia. Lembremo-nos de que "quem com ferro fere, com ferro será ferido", "segundo o juízo com que julgardes, sereis julgados". Chama-se inferno o mundo repleto de pessoas intolerantes; e chama-se paraíso o mundo repleto de pessoas generosas. O inferno é habitado exclusivamente pelos Enma-o, o senhor das trevas, e os diabos. E o paraíso é habitado exclusivamente pelos seres celestiais, tais como Amida Nyorai (Amithaba, o Iluminado), Kanzeon Bosatsu, etc.

Despertar para a Verdade de que "o homem é filho de Deus" não é conscientizar-se apenas da natureza divina de si mesmo, mas sim compreender que "todas as pessoas são filhos de Deus" e viver em harmonia com todos, amando-os e reverenciando-os. A verdadeira paz mundial nasce da união, harmonia e compreensão mútua entre as pessoas. Onde não há união, harmonia e compreensão mútua, não é possível o ressurgimento do paraíso. 

Ultimamente, nota-se no Japão uma tendência geral de exaltar o idioma japonês, e de rejeitar todas as coisas que não sejam genuinamente nipônicas (*Nota: o autor refere-se à década de 1930, época em que escreveu este livro). Porém, nada é mais antinipônico do que tal atitude. A atitude nipônica deveria ser a de "grande harmonia". Harmonizar-se com todas as coisas, acolhe generosamente todas as coisas – isso é que é ser verdadeiramente nipônico. Devemos abandonar o apego egoístico, responsável pelo velho espírito insular dos japoneses. Budismo, cristianismo, islamismo, todos são boas religiões. Chegando-se à essência de suas respectivas doutrinas, constata-se que a Verdade que elas pregam é uma só. Assim como as religiões se identificam em sua essência, as pessoas se identificam em sua natureza verdadeira: todas as pessoas são filhos de Deus.


Do livro "A Verdade da Vida, vol. 33", pp. 49-54

segunda-feira, novembro 02, 2015

Abandonando o apego, vive-se a Vida verdadeira - 1/2

- Masaharu Taniguchi - 


O ser humano é filho de Deus. Portanto, é óbvio que tenha a natureza espiritual sumamente harmoniosa e livre, à semelhança do Pai. É impossível que seja o contrário.

A Verdade da Vida cura doenças, melhora as situações adversas, enfim, faz ocorrer muitos acontecimentos milagrosos. As pessoas ficam assombradas diante de tais acontecimentos que elas consideram místicos, e pensam que esses fatos ocorrem pelo poder de Deus que age de fora para dentro. Mas isso é um equívoco. Quando pensamos que Deus está fora de nós e realiza milagres atendendo a nossos apelos, e que devemos agradar a esse Deus "exterior", corremos o risco de misturar superstições à fé verdadeira. Deus não responde à bajulações e servilismo, e sim ao coração sincero. Coração sincero é a natureza divina que existe em nós. Deus responde ao coração sincero, porque o Seu Sagrado Espírito que rege o Grande Universo e a natureza divina (coração sincero) que existe em nós são originariamente um, e portanto, sintonizam perfeitamente.

Deus é nosso Pai e, assim sendo, é lógico que não devemos nos limitar a interpretá-lo "materialisticamente", como ondas mentais. Ele nos protege "personificadamente" com Seu infinito amor e Sua infinita misericórdia. A graça de Deus nos é concedida incessantemente, não apenas quando ela se manifesta na matéria. As religiões vulgares acreditam num deus discriminador, que concede graças aos que pedem e não as concede aos que não pedem, Devido a isso, naqueles meios proliferam males como: ameaça de castigo divino, intimidação por meio de vaticínios (predições), trapaças, extorsão de contribuições, etc., etc.

Aqueles que pensam que Deus age com parcialidade como os seres humanos comuns e Se deixa levar pelas bajulações, estão cometendo uma grave ofensa contra Deus, ainda que pareçam ser devotos. Deus não responde à adulações nem a tentativas de "suborná-lo" com oferendas. Devotar-se a Deus com intuito de receber graças é uma ofensa contra Ele. Lamentavelmente, há muitas pessoas que, embora pareçam devotar-se a Deus, na verdade O estão ofendendo.

Quando digo que não se deve buscar a Deus com o intuito de receber graças, alguns contestam: "Mas isso ocorre também na Seicho-No-Ie. Têm sido constatado muitos casos de pessoas que se curaram ao ouvir palestras ou ao ler os livros da Seicho-No-Ie". De fato, os que frequentam a Seicho-No-Ie têm recebido graças. Mas não dizemos que Deus lhes concedeu graças somente porque eles pediram ou porque frequentam assiduamente a Seicho-No-Ie. O mestre-fundador da seita Konko disse: "As dádivas de Deus existem dentro de nós mesmos", e a Seicho-No-Ie prega que "Desde o princípio temos todas as dádivas recebidas de Deus, e cabe a nossa própria mente manifestá-las concretamente". Conforme afirmou Jesus Cristo, Deus é infinitamente misericordioso e "faz nascer seu sol sobre bons e maus, e manda a chuva sobre justos e injustos". 

Deus não é como pregam certas religiões, ou seja, um ser que age segundo seus caprichos, ora provocando desgraças para nos punir, ora nos concedendo saúde e felicidade para nos premiar. Ele é a "Grande Vida" que zela por nós constantemente, envolvendo-nos com Seu amor infinito. Se somos desafortunados, não é porque Deus nos desamparou, mas sim porque nós próprios não abrimos nossa mente para aceitar a Imagem Verdadeira. A Imagem Verdadeira é dotada de todas as dádivas de Deus. Imagem Verdadeira não é mero objeto de especulações filosóficas. É a Imagem Verdadeira daquilo que Deus nos concedeu; é a Imagem Verdadeira daquilo que Deus criou. Imagem Verdadeira é a existência verdadeira, ou seja, aquilo que existe de verdade. Devemos apreender diretamente aquilo que existe de verdade e não pela cognição relativa. Para isso, basta abrirmos os olhos da mente.

As pessoas confundem "o que existe de verdade" com "manifestação", a Imagem Verdadeira com o fenômeno, e crêem na existência de infortúnios e doenças. Isso é ilusão. Também ao lhes ocorrerem acontecimentos milagrosos tais como a cura de uma doença considerada incurável pela medicina, confundem a Imagem Verdadeira com o fenômeno e dizem que "alcançaram a graça". Isto também é ilusão. Esses milagres são "manifestações fenomênicas" da graça divina, e não a graça divina em si. A graça divina em si é a "perfeição da Imagem Verdadeira", que existe independente de a reconhecermos ou não. 

Denominamos "projeção da mente" aquilo que se manifesta quando é reconhecido pela mente. Dizemos que "o corpo carnal é projeção da mente" e "o ambiente também é projeção da mente"; isso significa que tanto o corpo carnal como o ambiente são manifestações resultantes do conhecimento. O que "passa a existir" somente por meio da cognição relativa chamada "reconhecimento" não é algo que exista por si mesmo. A isto chamamos "projeção da mente" ou "insubstancialidade". Dizemos que o mundo material é insubstancial, e que o corpo carnal também é insubstancial. Isto significa que tanto o mundo material como o corpo carnal são inconstantes e transitórios, não permanecem inalteráveis nem por um segundo. Observando-os atentamente, percebemos que o aspecto que eles apresentam num momento, já não existe no momento seguinte. Tudo aquilo cujo aspecto está em constante mutação não existe de verdade. E justamente por não existirem de verdade, não conseguem manter-se imutáveis, transformam-se e mudam constantemente. Assim é o mundo fenomênico. Parece concreto, mas é insubstancial. O que insubstancial está em constante mutação; o que está em constante mutação é vibração.

Essa vibração é o que, no budismo, recebe o nome de carma. Em última análise, carma é o "efeito inercial" das vibrações de pensamentos. Portanto, embora se manifeste concretamente no plano fenomênico, na verdade não existe. A salvação é possível porque o carma não existe de verdade. Alcançar a salvação consiste em deixar de se prender a "algo que não existe de verdade" e, transcendendo o aspecto aparente, apreender a Imagem Verdadeira, ou seja, "o que existe de verdade".

O corpo carnal não é existência verdadeira; o carma também não é existência verdadeira. Tanto o corpo carnal como o carma são soma de vibrações. Assim sendo, compreendendo que o corpo carnal não é existência verdadeira, compreendemos que o carma também não é existência verdadeira. Aparentemente, o corpo que temos hoje é o mesmo de ontem; porém, se o examinarmos meticulosamente, constataremos nele um incessante processo de transformação. Se assim não fosse, não haveria a renovação das estruturas celulares e o corpo, perdendo a vida, se mumificaria. Viver no mundo fenomênico é transformar-se incessantemente; é não ser hoje o mesmo de ontem; é soltar a vida de hoje para receber a de amanhã. Pode-se dizer que viver é "morrer a cada instante". A "morte" é que torna possível a renovação. Abandonando o apego à vida é que se encontra a vida. Aquele que se apega à vida, perde-a; e aquele que "solta" a vida, encontra-a. 

Para nos alimentarmos regularmente e absorvermos elementos nutritivos, precisamos "soltar" (exteriorizar) a energia acumulada. Soltando a energia acumulada, podemos absorver novos nutrientes, que são transportados pelo sangue, suprindo o organismo de oxigênio e eliminando as matérias envelhecidas e inúteis. No organismo, é incessante a renovação dos elementos componentes. No momento em que cessa esse processo de renovação, o corpo deixa de viver. O corpo vivo e todas as coisas que estão em constante mutação "não são existência verdadeira". Não se assombrem ao ouvirem a afirmação de que "o corpo não é existência verdadeira". O corpo não é existência verdadeira, mas nele se abriga "aquilo que existe de verdade", ou seja, a Vida que anima o corpo. A Vida não se extingue com a morte das células, pois ela própria é o "princípio" gerador de novas células. Por mais que o corpo sofra processo de transformação, o "princípio" da Vida mantém-se inalterável. Ela é imutável, é a Verdade Suprema, é a Imagem Verdadeira de nosso ser.

A constatação da transitoriedade da matéria leva-nos à compreensão de que a matéria não é existência verdadeira e, por conseguinte, o corpo também não é existência verdadeira. E essa compreensão nos conduz à descoberta daquilo que existe de verdade. Devemos mudar radicalmente a noção acerca da "existência", passando a admitir a "inexistência daquilo que julgávamos existente", e reconhecer a "existência" daquilo que julgávamos "inexistente". Precisamos despertar para o fato de que, na verdade, o corpo não existe. Ele não passa de materialização das vibrações mentais em constante mutação. A transformação constante é próprio do corpo carnal. O corpo carnal é uma imagem em constante transformação. Este nosso corpo, que se transforma incessantemente e não tem substância, não é nosso "Eu Verdadeiro", o qual é eterno. Então, o nosso "Eu Verdadeiro" seria a nossa mente? Não – a mente também não é o nosso "Eu Verdadeiro", pois também muda constantemente, é transitório. Ser transitório é não manter o mesmo aspecto nem por um instante; e "não manter o mesmo aspecto nem por um instante" é não ser existência verdadeira.

Ao compreendermos que "o corpo não é existência verdadeira", damos o primeiro passo para a verdadeira liberdade. Enquanto continuarmos acreditando que "o corpo existe, a matéria existe", não podemos alcançar a verdadeira liberdade. O corpo é um elemento material que ocupa lugar no espaço, e, portanto, é sujeito a limitações impostas pela matéria e pelo espaço. Assim sendo, o corpo chega a ser até um obstáculo concreto para a livre manifestação do "Eu verdadeiro". No caso de surgir uma doença no corpo, se a pessoa mantiver a crença de que "o corpo existe de verdade", não poderá deixar de considerar a doença como uma realidade concreta contra a qual não se pode lutar, e sentir-se-á impotente. Admitir a existência verdadeira do corpo é renunciar à plena liberdade do "Eu verdadeiro". E isso constitui a causa fundamental da doença.

Se queremos manifestar plenamente a liberdade inata do nosso "Eu verdadeiro", não devemos admitir a existência de matéria (corpo) capaz de impedir essa manifestação. A matéria (corpo) não é algo que existe independentemente do "Eu verdadeiro", e sim o elemento que o "Eu verdadeiro" pode modificar e moldar livremente, segundo sua vontade, tal como argila. Somente quando compreendemos que a matéria (corpo carnal) é algo que pode ser controlado livremente, tal como o ar que um grande cantor controla, tornamo-nos capazes de assegurar a liberdade do nosso "Eu Verdadeiro".

Admitir que a matéria (o corpo carnal) seja algo que não depende da mente, é renunciar à liberdade mental, e, por conseguinte, do nosso "Eu Verdadeiro". Quando a mente renuncia ao direito de comandar o corpo, ela perde a capacidade de controlá-lo, e nessa circunstância, é natural que ocorra a doença e que ela seja de difícil cura.

Compreender que "o corpo não existe" é o primeiro passo para que se manifeste a liberdade do "Eu verdadeiro", para o despertar, para a verdadeira libertação. Porém, isso não é suficiente para a salvação. Compreender que "o corpo não existe" é saber que não existe um "invólucro" encobrindo a Vida e tolhendo-lhe a liberdade; mas de nada adianta sabermos isto se a nossa própria Vida estiver adormecida. É preciso que ela desperte para a liberdade que lhe é inerente. Devemos despertar para o fato de que a nossa própria Vida integra a grandiosa Vida onipresente no Universo. Compreendendo isso, estaremos dando o segundo passo para a plena liberdade. Conhecer a verdade de que "a matéria não existe", "o corpo não existe" e "todas as coisas deste mundo são transitórias" constitui os passos preliminares para manifestar a original liberdade da Vida. Porém, mesmo que conheçamos essa Verdade, se não compreendermos que nossa Vida é parte integrante da Grande Vida, este mundo nos parecerá vazio e sem sentido, e tenderemos a adotar filosofias pessimistas, como o budismo pessimista, o chamado "pequeno veículo", que prega que o corpo e a mente revertem ao nada. Não adianta compreendermos que "a matéria não existe", "o corpo não existe", "todas as coisas deste mundo são transitórias, são como visões efêmeras produzidas por um ilusionista", se isso nos leva a adotar uma visão de vida pessimista. Devemos manifestar, na prática, a liberdade inata do nosso "Eu verdadeiro", controlando livremente todas as coisas, da mesma forma que o ilusionista faz com que as coisas surjam ou desapareçam, segundo a vontade dele.

Continua...

Do livro "A Verdade da Vida, vol. 33", pp. 41-48

quinta-feira, outubro 29, 2015

Reverenciar a Vida - 3/3

- Masaharu Taniguchi - 


Conforme relatei, conheci a Verdade ouvindo uma voz proveniente do céu, que soou como o ruído de um vagalhão e assim afirmou: "O homem é filho de Deus; a matéria não existe". Durante algum tempo, sentia-me renascido e tão feliz, que tudo ao meu redor parecia resplandecer. Porém, ainda estava longe de viver a Verdade na vida prática. O meu despertar ainda não se manifestava em atos concretos.

Nessa época, eu trabalhava como tradutor na firma americana Vacuum Oil Company. Como havia estudado inglês quando cursava a faculdade de Letras da Universidade de Waseda, eu tinha bom conhecimento de inglês literário, mas nessa empresa tinha de traduzir livros técnicos referentes a máquinas e peças, e isso era um serviço bastante complicado e difícil para mim. Nessa firma, havia diversos departamentos de publicidade, e fazia traduções de documentos referentes a máquinas estrangeiras. O serviço de tradução era sujeito à rigorosa supervisão por parte de outros setores da empresa, principalmente o departamento técnico e o departamento de vendas. Com base nos documentos referentes às máquinas, traduzidos por mim e meus colegas, elaboravam-se manuais com explicações tais como: "Levando-se em conta a estrutura desta máquina, nestes pontos é imprescindível o uso de um óleo que forme uma película extremamente resistente à pressão". Os engenheiros mecânicos do departamento técnico da empresa apresentavam esses manuais aos engenheiros de várias fábricas que eles visitavam. Também com base naqueles documentos, elaboravam-se guias práticos, que eram oferecidos aos engenheiros de fábricas clientes. Portanto, se fosse feita uma tradução errônea de algum termo e os especialistas descobrissem isso, haveria um grande problema. Um tradutor que trabalhava nessa empresa antes de mim fora demitido por causa de uma palavra que apareceu com erro num documento traduzido. E o erro não foi de tradução, e sim de tipografia. Além disso, nessa empresa havia rivalidade e inveja entre os vários departamentos, e o relacionamento entre os funcionários era bastante difícil.

Como vocês sabem, ao traduzirmos textos escritos em inglês, frequentemente nos deparamos com preposições ou expressões idiomática peculiares, que, traduzidas para a língua japonesa, não fazem sentido, e sendo assim, melhor seria deixarmos de traduzi-los, do que tentarmos uma tradução forçada, apegando-nos demais ao texto original. Porém, naquela empresa, se fizéssemos uma tradução livre, que consiste em transmitir o significado do texto sem nos prendermos a cada palavra e cada frase, alguém poderia indicar determinada palavra em inglês, e perguntar: "Onde está a tradução desta palavra, no texto em japonês?". E, se constatasse que essa palavra não fora traduzida, poderia apontar esse fato ao gerente geral americano, e então haveria um grande problema. Por isso, nós, tradutores, tínhamos de ter o máximo cuidado com cada palavra e cada frase do texto original, procurando traduzi-las o mais fielmente possível e, além disso, fazer com que a redação em japonês fosse perfeita. Tanto nos esforçávamos nesse sentido, que nos textos por nós traduzidos não havia omissão de nenhuma frase do original em inglês. Aqueles textos poderiam até ser usados nos livros de inglês para os exames de admissão nos colégios, que trazem numa página as frases em inglês, e na página oposta a tradução em japonês, palavra por palavra. A impressão dos manuais também era feita de tal modo que, comparando o original em inglês com o livro em japonês, podia se constatar que uma frase contida numa determinada página e linha do original aparecia no livro traduzido, exatamente na mesma página e mesma linha,

Por esses fatos, vocês podem imaginar como era desgastante o meu trabalho naquela empresa. Todos os dias, ao voltar para casa mais ou menos às 7 horas da noite, estava física e mentalmente exausto e mal conseguia me manter de pé. Embora desejasse empreender a obra de iluminar o mundo, publicando uma revista para divulgar o caminho da Verdade que eu havia encontrado, faltava-me ânimo para isso, devido à limitação da energia física. Hoje sei que essa limitação era proveniente do fato de que, apesar de ter conhecido a Verdade, ainda não a estava vivendo concretamente na vida cotidiana. Eu havia, de fato, conhecido a Verdade, pela Voz divina que soara em minha mente e atingira minha alma como um relâmpago, porém ainda não estava vivendo a Verdade na vida prática. Intelectualmente, havia conquistado a liberdade ilimitada, mas na vida prática via-me tolhido pela limitação da energia física. Ainda não tinha assimilado totalmente a Verdade.

Sem conseguir superar as limitações do plano material, deixava-me levar por ideias comodistas, tais como: "Quando minha situação econômica melhorar, quanto tiver mais tempo e melhor disposição física, vou lançar uma revista de cultura moral para divulgar o caminho da Verdade que encontrei. Até lá, vou continuar trabalhando como assalariado e economizar ao máximo o meu ordenado. Quando tiver economizado o suficiente, vou me demitir da firma e iniciar o trabalho de publicação da revista para divulgar a Verdade. Revistas desse tipo não se difundem rapidamente. Portanto, terei de estar em condição econômica razoável para poder manter a revista com meus próprios recursos na fase inicial, talvez por meio ou um ano". Essa era a minha atitude mental, da qual hoje me envergonho, pois percebo que pensava assim por falta de coragem e determinação.

Conforme relatei antes, arranjei emprego nessa firma americana logo depois que voltei a Kobe, minha terra natal, após ter perdido praticamente tudo no grande terremoto de Tóquio, ocorrido em setembro de 1923. Como não tinha roupa para ir trabalhar, tive que mandar reformar um conjunto de "melton" preto que meu pai adotivo usara havia vinte anos. Minha esposa e minha filha – ainda bebê – também precisavam de roupas. Leva-se considerável tempo para conseguir juntar móveis, utensílios domésticos, roupas, etc., a partir da "estaca zero". À custa de muito trabalho, fui reconstruindo minha vida, pouco a pouco. Justamente quando a situação havia melhorado bastante e eu já visualizava a possibilidade de iniciar em breve o trabalho de publicação da revista, entrou um ladrão na minha casa. Foi num domingo de agosto. Eu e minha esposa tínhamos saído para um passeio, levando nossa filhinha. Quando voltamos para casa no fim da tarde, constatamos que um ladrão havia esvaziado a cômoda, levando todas as nossas roupas e todo o dinheiro que eu havia economizado com tanto sacrifício. Mais uma vez, tive de recomeçar praticamente da estaca zero. Durante dois anos e meio, trabalhei com afinco, economizando dinheiro para concretizar o plano de publicar a revista. Quando tinha economizado uma quantia considerável, novamente entrou ladrão em minha casa e levou tudo. Isso aconteceu no dia 13 de dezembro de 1929.

E justamente ao sofrer o segundo roubo, despertei de verdade. Aquele incidente fez com que o "despertar temporário" que eu havia conseguido se tornasse definitivo. Até então, embora eu pensasse ter despertado, na realidade não havia alcançado o verdadeiro despertar. Assim fora o meu despertar inicial. Uma voz misteriosa, que parecia ter vindo do espaço cósmico e ressoado em minha mente me fizera compreender que "o homem é filho de Deus" e que "a doença, os sofrimentos, as desgraças, a miséria, enfim, todos os males não passam de ilusão, não existem de verdade!". Havia aceito docilmente essa Verdade, mas não a estava vivendo na vida prática e me apoiava em outras coisas. Isto é, havia compreendido que o ser humano é Filho de Deus, mas na vida prática necessitava de apoio material. Em vez de confiar na força interior proveniente da Imagem Verdadeira da minha própria Vida, buscava apoio em elementos do mundo exterior, tais como dinheiro e outros bens materiais. Pensava que não seria possível colocar em prática o plano de publicar uma revista para a difusão da Verdade enquanto não tivesse economizado o suficiente para mantê-la com meus próprios recursos, pelo menos durante seis meses. Em outras palavras, pensava em trilhar o caminho da vida, apoiando-me no salário, economias, etc. Quem mantém tal postura mental ainda não alcançou o verdadeiro despertar. Era o meu caso.

Alcançar o verdadeiro despertar é conscientizar a perfeição e a força infinita do nosso interior, e deixar de buscar apoio em elementos exteriores. É confiar plenamente na grande força vital que existe dentro de nós próprios. Até então, eu buscava apoio em coisas materiais. Percebi o erro e tomei a decisão de passar a confiar plenamente na Vida do meu interior. Lembrei-me da seguinte afirmação de Confúcio: "Se eu conhecer de manhã o Caminho da Verdade, não importa morrer ao entardecer". Minha ilusão consistia em pensar que, em primeiro lugar, precisava garantir minha subsistência e somente depois, quando tivesse dinheiro suficiente e mais saúde, iniciar o trabalho de divulgação da Verdade. Eu julgava que minha capacidade física fosse limitada e, como resultado da concretização dessa ideia, tinha a saúde tão precária, que as companhias de seguro recusavam-se a segurar minha vida. Apesar da saúde frágil, tinha de trabalhar o dia todo, traduzindo desinteressantes livros técnicos. Por que me cansava tanto, se naquela época já havia conhecido a Verdade e compreendido que o ser humano, sendo filho de Deus, não adoece nem se cansa? É que o meu despertar era apenas superficial. Isto é, embora tivesse conhecido a Verdade, não a havia assimilado completamente.

Ainda que despertemos para a Verdade, enquanto não a assimilarmos com todo o nosso ser, o seu efeito não se manifesta concretamente. Era isso que ocorria comigo: ainda estava arraigada em minha mente a ideia de que "quanto mais se trabalha, mais o corpo se cansa" e "o cansaço pode provocar adoecimento". Em outras palavras, eu ainda confundia a vida fenomênica com a Vida da Imagem Verdadeira. Por isso, pensava que não seria possível conciliar meu emprego com o trabalho de publicação da revista para a divulgação da Verdade, e resignava-me à condição em que me encontrava, acreditando que não havia outra alternativa para garantir minha sobrevivência. Aquele que se sujeita à condições ainda não conhece realmente a sua própria Vida, que não depende de condição alguma para se sustentar. "Se eu conhecer de manhã o Caminho da Verdade, não importa morrer ao entardecer" – esta afirmação de Confúcio expressa o estado espiritual de quem tem consciência da Vida, que não depende de nenhuma condição ou circunstância para existir. Quem pensa que o ser vivo depende do corpo físico para se manter vivo, jamais poderá proferir tal afirmação. Somente aqueles que têm consciência de que a Vida existe independentemente da sobrevivência ou não do corpo físico, podem afirmar com serenidade que a morte não tem nenhuma importância. A Verdade é eterna. Portanto, quem vive o Caminho da Verdade, "viverá ainda que morra". Jesus disse: "Aquele que crê em mim, ainda que esteja morto, viverá".

A Vida da Imagem Verdadeira é absoluta: não depende de nada, sustenta-se por si mesma, sem precisar de nenhum apoio exterior. Ela se sustenta por si só, ainda que nada exista no aspecto fenomênico, tal como o "dedo que se levanta, mesmo não existindo na forma fenomênica", citado num episódio conhecido como "o mestre Gutei e seu aprendiz". Mesmo que no aspecto fenomênico nada pareça existir, a Vida tem tudo dentro de si próprio. Algumas pessoas pensam que a Seicho-No-Ie é uma seita vulgar, que se ocupa somente em curar doenças. Mas a Vida que a Seicho-No-Ie reverencia não é a vida do corpo físico. Se têm ocorrido inúmeros casos de cura dos adeptos, é porque a Seicho-No-Ie os conduz ao despertar, ou seja, torna-os conscientes da Vida indestrutível que transcende o corpo físico. Ocorre então uma intensa vibração da Vida e, como "efeito colateral", ocorre a cura. Embora sejam citado muitos casos de cura, a Seicho-No-Ie não é uma seita que tenha como finalidade curar doenças.

O primeiro item das Sete Declarações Iluminadoras diz: "Declaramos transcender todo sectarismo religioso e, reverenciando a Vida, viver em fiel obediência à Lei da Vida". A Vida a que se refere essa declaração não é a limitada vida fenomênica que sucumbe à doença, à miséria e à morte; mas sim a Vida simbolizada no "dedo que se levanta, mesmo tendo sido cortado no plano fenomênico", conforme o episódio "o mestre Gutei e seu aprendiz". É a Vida que transcende o corpo e se mantém intacta, mesmo que se destrua o corpo físico.

De certo modo, eu "destruo" o corpo das pessoas que vêm à Seicho-No-Ie em busca de cura. Naturalmente não lhes destruo o corpo com uma arma, mas com o poder da palavra. Às pessoas que buscam a cura da enfermidade do corpo, afirmo energeticamente: "O corpo não existe!". Comumente, acredita-se que o corpo existe. Por isso as pessoas se apegam a ele, e, quando adoecem, buscam a salvação do corpo. Estando apegadas ao corpo, impedem que a Vida se manifesta livremente. E a Vida não se manifestando livremente, não ocorre a cura. Porém, diante da minha energética afirmação de que "o corpo não existe", as pessoas compreendem que o corpo, embora pareça ter existência própria, na verdade não existe. Ao compreenderem isso, deixam de se apegar ao corpo; e então a Vida passa a se manifestar livremente e ocorre a cura da doença.

Até ser roubado pela segunda vez, eu planejava iniciar a publicação da revista para a difusão da Verdade quando minha condição financeira melhorasse, o que significava que ainda não havia me conscientizado de que a Vida não depende de nenhuma condição. Porém, despertei de verdade quando, pela segunda vez, entrou ladrão em minha casa e levou toda a minha economia. Pode-se dizer que esse ladrão me cortou o apoio chamado "boa condição econômica", do mesmo modo que o mestre zen Gutei cortou o dedo fenomênico de seu aprendiz, no episódio acima mencionado. Fiquei sem apoio material. E, assim como aquele aprendiz, tinha de "levantar o dedo, sem o possuir no plano fenomênico", isto é, reerguer-me sem qualquer apoio material. Devido à dura jornada de trabalho na firma, estava exausto, mas precisava encontrar forças para me erguer. Não havia outra saída. E justamente aquele momento crucial fez com que eu alcançasse o verdadeiro despertar e tomasse a firme decisão de começar a trabalhar para a divulgação da Verdade, mesmo não tendo vigor físico nem dinheiro. Tomei essa decisão no dia 13 de dezembro de 1929. Quando deixei de tentar me apoiar em coisas materiais, a minha força interior passou a se manifestar, e a partir desse ponto o caminho abriu-se diante de mim. Sinto que, no desenrolar de todos os bons e maus acontecimentos por que passei, houve a ajuda dos espíritos de meus antepassados. Foram eles que me conduziram a uma situação crucial, a fim de que eu pudesse alcançar o verdadeiro despertar. Se vocês querem alcançar o despertar, bem como obter êxito nesta vida, devem reverenciar os espíritos de seus ancestrais, para que possam receber naturalmente a orientação e proteção deles. 

No budismo zen, existem os Koans, que são "questões para meditação". Quase sempre, a questão apresentada é extremamente difícil, impossível de ser solucionada com a sabedoria e discernimento comuns, porque se refere a uma situação aparentemente "sem saída", em que a pessoa envolvida se vê premida por duas ou mais forças antagônicas. Um dos koans frequentemente apresentados no zen budismo é aquele intitulado "Produzir o som do bater das palmas, usando apenas uma das mãos". Como se pode notar, trata-se de uma questão aparentemente sem solução. Para bater palmas é preciso usar ambas as mãos. Mas a exigência é não usá-las. E isso é impossível. Se quisermos atender à exigência de "usar apenas uma das mãos", não será possível produzir o som do bater de palmas. E se quisermos atender à exigência de "produzir o som", teremos de usar ambas as mãos. O que fazer? É uma situação em que nos vemos pressionados por duas exigências contraditórias. Para solucionar uma situação "sem saída", não adiante recorrer à inteligência limitada da mente presa ao aspecto fenomênico. É preciso transcender o aspecto fenomênico.

No zen budismo, isso é feito no nível da ideia, por meio da solução do Koan apresentado. Mas, na Seicho-No-Ie, transcende-se o aspecto fenomênico, na vida prática. Por exemplo: se um paraplégico me procura para receber orientação espiritual, pergunto: "O que deve fazer um paraplégico para andar sem as muletas?". Essa pergunta é um Koan aplicado à vida prática. Enquanto acreditar que é incapaz de andas sem se apoiar em muletas, a pessoa estará presa ao aspecto fenomênico. Se a pessoa não sabe a resposta, ordeno energeticamente: "Jogue as muletas!". Geralmente a pessoa replica: "Mas se jogar as muletas, eu caio!". Então digo: "Não importa que o corpo caia. Dentro de você existe algo que jamais cairá nem sucumbirá". A pessoa poderá cair e ficar estendida. Porém, ao compreender que seu "Eu verdadeiro" não é o corpo carnal sujeito à queda, mas sim "um ser que se mantém firme mesmo que o corpo caia", a pessoa muda completamente a sua visão. Ela deixa de se apegar ao corpo, deixa de buscar desesperadamente a cura da doença. Compreende que seu "Eu verdadeiro" não é o corpo carnal, mas sim a própria Vida, que é capaz de se manter sem se apoiar em coisa alguma. Assim, a cura ocorre quando a pessoa, mesmo vendo-se encurralada numa situação de dilema, transcende o fenômeno e apreende a Imagem Verdadeira da Vida.

Constatando a ocorrência de muitos casos de cura na Seicho-No-Ie, algumas pessoas pensam que nos empenhamos exclusivamente em curar doenças e comentam que a Seicho-No-Ie não é uma doutrina religiosa elevada. Devo esclarecer que a cura de doenças é um "efeito colateral" do despertar. O despertar consiste em transcender o aspecto fenomênico justamente numa situação de extrema dificuldade, quando parece não haver nenhuma saída. Portanto, uma vez que a pessoa tenha conseguido o despertar, por meio da religião, é natural ocorrer a cura. Este é o princípio fundamental da cura de doenças pela leitura do livro A Verdade da Vida.

Lendo esse livro, as pessoas transcendem o aspecto fenomênico e superam as situações aparentemente sem saída que às vezes ocorrem na vida prática. Nele consta o relato de minha vida, no qual narro como alcancei a salvação, transcendendo o aspecto fenomênico no momento mais difícil de minha vida, quando me encontrava numa situação aparentemente sem saída. Naquela época, não conseguia "caminhar com minha própria força". Meu corpo não estava tolhido, mas minha vida sim, e eu pensava que só poderia caminhar se contasse com o auxílio de uma "bengala", ou seja" de condições tais como: disponibilidade de tempo, melhor salário, bastante economia, etc. Eu ia trilhando a muito custo o caminho da vida, apoiando-me no modesto salário e na pequena economia, os quais constituíam a minha "bengala". Porém, quando um ladrão entrou em minha casa e me arrebatou essa "bengala", despertei da ilusão e me tornei capaz de sustentar-me com minha própria força". No momento crucial é que se abre o caminho da salvação – eis o ensinamento da Seicho-No-Ie.

A Seicho-No-Ie ensina que os atos norteados pela inteligência do eu fenomênico frequentemente levam a situações dilemáticas em que, ao beneficiar um lado da vida, é inevitável prejudicar o outro lado dela. Tais situações provocam angústias e aflições que podem se manifestar também sob forma de doenças. Para resolver situações dilemáticas, é preciso transcender o aspecto fenomênico e compreender, pela experiência, o que é o "dedo que se levanta, mesmo sem existir", o "entrevado que anda sem as muletas", o "som do bater de palmas, produzido por apenas uma das mãos", etc. Mesmo que se fique sem os dedos, as muletas, a mão, enfim, todo e qualquer apoio material, ainda é possível levantar os dedos, caminhar, ou bater as palmas – quando desperta para esta Verdade, o ser humano conhece a verdadeira liberdade da Vida.


Do livro: "A Verdade da Vida, vol. 33, pp. 25-39

terça-feira, outubro 27, 2015

Reverenciar a Vida - 2/3

- Masaharu Taniguchi - 


Até despertar para a Verdade, passei por muitas angústias e sofrimentos. Eu tinha uma ideia errônea a respeito da Vida. Influenciado pelas ideias de Schopenhauer e Darwin, eu pensava: "Para sobrevivermos, é inevitável sacrificar os outros. Somos seres perversos e cruéis que, para garantir nossa vida, destruímos a dos outros". Angustiado com essa visão de vida sombria, passei a buscar o caminho que conduzisse para uma vida harmoniosa. 

Por essa época, conheci a seita Ittoen, fundada pelo mestre Tenko Nishida. Fiquei impressionado com os seus ensinamentos e frequentei-a durante algum tempo. Soube que, no passado, o mestre Tenko Nishida trabalhou como capataz numa mina de carvão situada na província de Hokkaido. Sua posição era de intermediário entre o capitalista e os operários. Com o decorrer do tempo, ele passou a refletir acerca dessa situação: "Os capitalistas, sem fazer nenhum esforço e vivendo confortavelmente, ganham muito dinheiro, ao passo que os operários, desgastando-se num trabalho árduo e arriscando a própria vida nos locais perigosos da mina, só recebem modestos salários. Não posso continuar ganhando o meu sustento, servindo como representante dos que lucram muito sem fazer nada e pressionando ainda mais os operários que levam uma vida tão sofrida. Se, para ganhar o pão de cada dia, é inevitável submeter-me à lei da selva e oprimir os fracos, ajudando os poderosos, prefiro renunciar à vida". Assim pensando, demitiu-se e voltou para sua casa, na província de Shiga. 

E, tomando a decisão de nunca mais obter seu sustento por meio de atividades que impliquem em oprimir e prejudicar os outros, permaneceu durante três dias no caramanchão (construção utilizada em diversos espaços públicos, tais como parques, jardins, etc.), praticando o jejum. No terceiro dia, ouviu o choro de um bebê nas proximidades, e, como ele próprio estava faminto, pensou: "Com certeza, o pobrezinho está com fome e quer mamar". Daí a pouco, o bebê parou de chorar, e o sr. Nishida, percebendo que o pequenino fora atendido pela mãe, refletiu: "No ato de amamentação da mãe, a mãe e o bebê estão em perfeita harmonia, apesar de ser uma relação em que uma das partes é 'aquele que suga' e a outra é 'aquela que é sugada'. Não se trata, em absoluto, de uma relação em que um prejudica o outro. Se o bebê não sugar o leite da mãe, ela ficará com os seios intumescidos e sentirá dores; e se a mãe não conceder o leite ao bebê, ele definhará e poderá até morrer. No ato da amamentação, beneficiam-se mutuamente a mãe, que dá o leite, e o o bebê, que suga o leite. Essa é a verdadeira harmonia. Aquele bebê chorou porque estava com fome, e logo apareceu outra pessoa pronta a acudí-la, ou seja, a mãe. Eu também vou chorar para ser acudido". Assim pensando, o sr. Nishida deixou o caramanchão. 

Naturalmente, ele não saiu por aí, chorando de verdade; mas foi caminhando pelas ruas, buscando em sua alma a ajuda dos céus, como uma criancinha que busca o colo da mãe. À certa altura, viu muitos grãos de arroz espalhados no chão e catou-os. Nesse momento, passou uma senhora da vizinhança, carregando um balde 'água. "Que sorte!", pensou o sr. Nishida, e pediu-lhe que cedesse um pouco de água para lavar o arroz. Então, essa senhora não só concordou em ceder-lhe a água, como também convidou-o à sua casa e preparou-lhe uma canja com aquele punhado de arroz. Após servir-se dessa refeição, o sr. Nishida ofereceu-se para executar alguma tarefa em sinal de agradecimento. Constatando a eficiência do sr. Nishida, essa senhora perguntou-lhe se ele não poderia trabalhar durante algum tempo na loja que ela possuía. Ele concordou. Decorrido um mês, ela pediu-lhe que permanecesse mais algum tempo, e confidenciou: "Antes de o senhor vir trabalhar para mim, esta loja estava à beira da falência. Isto porque, após a morte do meu marido, os empregados da loja passaram a me tratar com pouco caso e tornaram-se muito negligentes. Mas depois que o senhor veio e deu um exemplo de dedicação e eficiência, eles passaram a trabalhar com afinco, e a loja se salvou da falência. Nem sei como lhe agradecer". Foi assim que o sr. Nishida iniciou uma vida dedicada ao "trabalho em benefício dos outros" que deu origem à Ittoen. 

Tomado de grande admiração pela Ittoen, frequentei-a assiduamente durante uma fase de minha vida, chegando a praticar a mendicância religiosa. Nessa fase, fui trabalhar numa casa de massas onde, juntamente com o sr. Tanino, membro da Ittoen, executava serviços humildes, inclusive o de lavar os mictórios. Tendo decidido fazer o possível para viver sem prejudicar os outros, eu levava uma vida de extrema simplicidade: possuía apenas uma pequena maleta contendo uma toalha e uma escova de dentes, e trajava um modesto quimono, amarrado na cintura com um pedaço de corda; e julgava estar vivendo como São Francisco de Assis. Mesmo assim, continuava sentindo peso na consciência. Não consegui deixar de pensar que, apesar de levar uma vida extremamente modesta, ainda causava dano a outros seres vivos, principalmente aos mais fracos, pois, no simples ato de respirar, ou no ato de beber água, estava matando os seres microscópicos contidos nesses elementos.

Contudo, nós, seres humanos, não podemos viver sem respirar ou sem beber água. Somos, portanto, predadores que sacrificam outros seres vivos para garantir a própria subsistência. Atormentado por essa ideia, cheguei a pensar que, não sendo possível sobreviver sem sacrificar outros seres vivos, seria preferível renunciar à minha própria vida. Porém, refleti que renunciar à vida seria matar a mim mesmo, e isso também seria a destruição de uma vida. "Não devo matar-me, nem matar outros seres vivos" – assim pensei, e ansiei por encontrar um meio de manter minha vida sem destruir a de outros seres.

Houve uma época em que a seita Ittoen criou seu próprio departamento de confecções e passou a vender, na cidade de Kyoto, roupas com preços muito mais baixos que os do mercado. Por causa disso, muitos alfaiates e lojas de confecções de Kyoto perderam seus fregueses e ficaram em dificuldade. O fato de a seita Ittoen ter criado um departamento de confecções e passado a vender roupas a preços muito baixos pode dar a impressão de que ela prestou um grande benefício à sociedade. Porém, isso acabou prejudicando muito alfaiates e lojas de confecções. Ao considerar esse fato, concluí que também o modo de viver da Ittoen não consegue evitar disputas e, portanto, não concretiza a verdadeira harmonia. Assim ponderando, não me converti totalmente à Ittoen. 

Foi nessa época que escrevi um livro de ensaios, sob o título Shodo-e (Buscando o caminho sagrado), o qual foi publicado por volta de agosto de 1923, pela editora Shinko-sha. Esse livro tinha como tema principal a teoria budista de "Criação do mundo pela ilusão". Eu apresentava, nesse livro, o seguinte ponto de vista: "Não é possível que Deus onipotente, onisciente e infinitamente misericordioso tenha criado este mundo imperfeito e cruel, onde é inevitável a destruição dos fracos pelos mais fortes. Este mundo surgiu a partir da ilusão, e é movido pela força cármica". Minha vida, nessa época, era triste e sombria. Mente sombria atrai destino sombrio. Assim, perdi praticamente tudo no grande terremoto de Tóquio, ocorrido em 1º de setembro de 1923, e voltei para Kobe, minha terra natal. Ali, passei a praticar a concentração mental todos os dias. 

Certo dia, durante a concentração mental, ouvi uma voz que veio do alto e soou como o ruído de um vagalhão: "O homem é filho de Deus" – proclamou a voz solene, como se fosse a voz do próprio Universo; e prosseguiu, soando como um vagalhão ou uma catarata: "O homem é filho de Deus. E este mundo é originalmente perfeito. A matéria não existe; a infelicidade e a pobreza também não existem. Tudo isso parece existir, mas não passa de projeção da mente em estado de ilusão. Eliminando-se as ilusões, extinguem-se todos os males manifestados no plano fenomênico como projeção da mente". Ouvindo isso, compreendi que a vida que vivemos neste mundo, ou seja, a vida fenomênica sujeita à cruel "lei da selva" – a lei do mais forte – não é a Vida verdadeira, e sim projeção de nossa própria mente. Compreendi que a Vida Verdadeira, a Vida da Imagem Verdadeira, é a que existe de verdade – não é mera projeção da mente e não está sujeita à lei da selva. É a Vida plena de harmonia, que não precisa empreender lutas cruéis para se manter. Esta, sim, é a nossa Vida verdadeira, que jamais se extingue. É esta a Vida que a Seicho-No-Ie reverencia.

Ouvindo a Voz misteriosa e solene que soou do alto e ecoou em minha mente como o ruído de um vagalhão, emergi da ilusão e compreendi que este mundo, em sua essência, é a Terra Pura – ou seja, o Paraíso – e todos nós, seres humanos, somos filhos de Deus (ou "seres búdicos", na linguagem do budismo). Compreendi que tanto eu próprio como todas as pessoas e todas as criaturas, estamos vivos graças a Vida de Deus que flui em nós, e que na linguagem do budismo, somos todos manifestações da Vida de Buda. Conta-se que Rinzai, um grande mestre Zen budista que viveu na China, no século IX, no instante em que alcançou o despertar espiritual, afirmou o seguinte: "Mesmo que se busque por todo o país, não se encontrará sequer uma pessoa que não esteja salva, pois, na essência todos são seres búdicos". Creio que Rinzai alcançou naquele momento o mesmo estado espiritual que eu alcancei quando aquela voz solene soou-me "como o ruído de um vagalhão".

A partir daquele instante, minha visão do mundo mudou completamente. Este mundo, que antes eu só conseguia ver com os olhos físicos e me parecia feio e cruel, revelou ser um mundo puro e luminoso, onde todos os seres convivem em perfeita harmonia e a própria Natureza é imagem de equilíbrio e harmonia. Tenho conhecido a Verdade, surgiu em mim o desejo de transmiti-la de algum modo a outras pessoas. Contudo, eu próprio ainda não era capaz de viver, na prática, a Verdade.

Continua...

Do livro: "A Verdade da Vida, vol. 33, pp. 19-25

domingo, outubro 25, 2015

Reverenciar a Vida - 1/3

- Masaharu Taniguchi -


Na Seicho-No-Ie, alcançam-se graças milagrosas pela leitura do livro A Verdade da Vida. Porém, isso é uma espécie de "efeito colateral". O objetivo principal da Seicho-No-Ie não é a obtenção de graças milagrosas, mas sim o despertar espiritual. Em outras palavras, a Seicho-No-Ie visa despertar a humanidade para a Imagem Verdadeira (aspecto e natureza originais) da Vida. Por essa razão, falamos constantemente acerca da Imagem Verdadeira. Uma vez explicado "o que é Imagem Verdadeira", torna-se fácil compreender os ensinamentos da Seicho-No-Ie.

O termo "Imagem Verdadeira" parece simples; mas segundo o Zen budismo, "Imagem Verdadeira não é algo que se transmite por meio da palavra escrita ou falada, e sim pela comunicação direta de mente para mente". Por isso, considerava-se muito difícil explicar "o que é Imagem Verdadeira". Nesta palestra, tentarei explicar, em curto espaço de tempo o que é "Imagem Verdadeira". Portanto, talvez alguns consigam entender, e outros não. Aqueles que assimilam os ensinamentos da Seicho-No-Ie alcançam muitas graças milagrosas, e isto se deve ao fato de que a Seicho-No-Ie prega a Verdade de tal modo, que as pessoas conseguem compreender facilmente "o que é Imagem Verdadeira". 

Devido à maneira simples e compreensível com que a Seicho-No-Ie explica a Imagem Verdadeira, até as pessoas que levam uma vida agitada no mundo atual conseguem alcançar facilmente o despertar espiritual. Então, como reflexo de nos tornarmos conscientes da plena liberdade da Vida, resultante desse despertar espiritual, passam a ocorrer na vida dessa pessoas fatos que, considerados com base no senso comum, parecem fenômenos estranhos ou milagrosos. Esses fenômenos são, por assim dizer, "efeitos colaterais" do despertar espiritual. Isto é, embora o objetivo da Seicho-No-Ie seja "despertar as pessoas para a Imagem Verdadeira" e não a realização de milagres, estes acontecem naturalmente como consequência do despertar.

Como é do conhecimento da maioria, não iniciei a Seicho-No-Ie com  a intenção de fundar uma seita religiosa. Nos princípios de 1930, publiquei pela primeira vez uma revista de cultura moral denominada Seicho-No-Ie, movido pelo ideal de divulgar à humanidade a Verdade que eu alcançara pelo despertar espiritual. Ao redigir artigos para essa revista, não tinha em mente promover cura de doenças, melhora da situação, lucro financeiro, obtenção de bom emprego, etc. Porém, à medida que a revista ia sendo difundida, aumentava o número de leitores que afirmavam ter recebido graças milagrosas. Assim, em dezembro de 1934 foi fundada uma sociedade anônima denominada Sociedade para a Difusão do Pensamento Iluminador com a finalidade de organizar os artigos publicados na revista Seicho-No-Ie e formar a coleção  A Verdade da Vida. Como foi possível iniciar tal empreendimento? No início, não passava de uma pequena empresa, com um capital de 250.000 ienes. Sua fundação foi possível graças à união de muitas pessoas que investiram dinheiro com o intuito de publicar exclusivamente obras de minha autoria. Essas pessoas tinham a certeza de que poderiam manter a empresa, mesmo sem publicar obras de nenhum outro autor. Creio que somente esse fato é suficiente para comprovar que as palavras da Verdade contidas da revista Seicho-No-Ie tinham o grande poder de movimentar pessoas.

Mas, afinal, o que é a Seicho-No-Ie e por que ela movimenta as pessoas de tal maneira? A Seicho-No-Ie não tem forma concreta. Na parte inicial do volume 1 de A Verdade da Vida constam "As Sete Declarações Iluminadoras". A primeira delas é a seguinte: "Declaramos transcender todo sectarismo religioso e, reverenciando a Vida, viver em fiel obediência à Lei da Vida".

Esta é a primeira declaração da Seicho-No-Ie, feita logo no início, antes mesmo de se tornar uma sociedade religiosa, como se apresenta agora. Talvez vocês pensem que a Seicho-No-Ie seja uma seita religiosa. Mas a declaração de que transcendemos todo sectarismo religioso já constava na contracapa do primeiro número da revista Seicho-No-Ie, de aspecto modesto, publicado em 1930. Desde o princípio manifestei publicamente o meu propósito de "transcender todo sectarismo religioso e, reverenciando a Vida, viver em fiel obediência à Lei da Vida", e até hoje venho mantendo essa mesma postura. 

Eu próprio considerava a revista Seicho-No-Ie como sendo de cultura moral e esperava que o público a acolhesse como tal. Porém, para minha surpresa, muitas pessoas alcançaram graças milagrosas por meio de sua leitura, razão pela qual ela não podia ser classificada como mera revista de cultura moral, de filosofia ou de literatura; assim, o público passou a considerá-la revista de cunho religioso., E, como se tratava de algo inédito, consideraram a Seicho-No-Ie como uma nova religião, e muitas pessoas tornaram-se devotas. Diante desse desenrolar dos acontecimentos, sinto-me, ao mesmo tempo, agradecido e um tanto constrangido.

A Seicho-No-Ie, coerente com a declaração de "transcender todo o sectarismo religioso", reverencia a essência de todas as crenças religiosas, ou seja, a Verdade comum a todas as religiões. Em última análise, todas as religiões que se mantêm até hoje, apesar das vicissitudes pelas quais passaram ao longo dos anos, pregam, em "linguagem religiosa" peculiar, a mesma Verdade preconizada pela Seicho-No-Ie. Excetuam-se, é lógico, certas seitas que pregam inverdades e, quando desmascaradas, acabaram se arruinando. Todas as religiões conduzem à mesma Verdade que a Seicho-No-Ie prega, quando se busca a sua essÊncia, sem se ater a expressões e atitudes sectárias que elas ostentem.

Mas, afinal, em que consiste a Verdade pregada pela Seicho-No-Ie? Para compreendê-la é fundamental entender o que significa "reverenciar a Vida", que consta no item 1 das Sete Declarações Iluminadoras. No budismo existe o termo Muryo-ju, que significa Vida infinita (muryo = infinita; ju = Vida). Jesus Cristo também ensinou que a Vida é eterna e exortou os homens a reverenciá-la, dizendo: "Aquele que crê em mim, tem a vida eterna. Eu sou o pão da vida." (João, 6:47-48).

O que é Vida? Certamente, vocês todos têm consciência de estarem vivos. Sim, vocês estão vivos. Estão vivos porque têm Vida. Mas a Vida não está no corpo carnal em si. Suponhamos que se decepe um membro de um ser vivo e que nele se busque a Vida. Naturalmente, não a encontrará. Decepando-se sucessivamente outros membros e o tronco e analisando-os, também não se constatará em nenhuma dessas partes a presença da Vida. Pode ser que se constate a presença da "vida celular", mas ela não é Vida organizada que mantém vivo o ser. A primeira declaração da Seicho-No-Ie é no sentido de reverenciar a Vida, essa Força invisível e misteriosa que nos mantém vivos, e isso corresponde a "reverenciar muryo-ju" na linguagem do budismo, e a reverenciar o "pão da Vida", na linguagem do cristianismo. 

A palavra Vida, devido à sua ambiguidade, tem sido usada com diversos significados segundo o ponto de vista de vários filósofos e religiosos, e isso tem causado interpretações errôneas. Afinal, o que é essa energia misteriosa chamada Vida, que nos mantém vivos? Segundo Schopenhauer, e a "vontade irracional". Essa vontade seria a vida, que se empenha numa feroz luta pela existência. De acordo com essa teoria, pela "vontade irracional" incoerente e contraditória, uma vida luta contra a outra, a vida da espécie se confronta com a vida individual, a vida mais forte persegue, domina e acaba tragando a vida mais fraca – e por sim ela própria se extingue. A maioria das pessoas pensa da mesma forma. Também na Teoria da Evolução, de Darwin, a vida é tratada como algo sujeito à lei da selva, na qual os mais fortes devoram os mais fracos. Se nos propusermos a reverenciar a Vida partindo de tal ideia, teríamos que nos sujeitar à lei da selva.

Porém, a Vida que reverenciamos não é a vida manifestada no plano fenomênico, à qual se referem Schopenhauer, Darwin e muitos outros. Na Seicho-No-Ie, chamamos de "vida fenomênica" à Vida manifestada no plano fenomênico. Afirmamos que a vida fenomênica é apenas "manifestação da Vida" e não a Vida em si, que existe verdadeiramente. À Vida que existe verdadeiramente, chamamos de Imagem Verdadeira da Vida. Mesmo aqueles que são considerados grandes pensadores confundem a vida fenomênica com a Vida da Imagem Verdadeira. A vida verdadeira (A Imagem Verdadeira da Vida) existe por trás da vida fenomênica, mantendo-se intacta mesmo quando a vida fenomênica se extingue, e plena de harmonia mesmo quando a vida fenomênica se empenha na luta pela existência. Essa Vida é aquilo que, na linguagem do budismo, se chama "natureza búdica do ser"; na linguagem do cristianismo, poderia se chamar "natureza divina" ou "Cristo eterno" e, na linguagem do xintoísmo, é chamado de Kakurimi (Ser oculto, ou Ser invisível), como se pode constatar do Kojiki (Livro de Mitologia Japonesa). É o "Deus invisível" de que fala a doutrina cristã. A Seicho-No-Ie ensina a reverenciar esse Deus absoluto, invisível, e prega que, essencialmente, todas as religiões veneram o Deus único e verdadeiro.

Continua...


Do livro: "A Verdade da Vida, vol. 33", pp. 13-19

quinta-feira, outubro 22, 2015

O poder da palavra

Sathya Sai Baba


Cada pensamento e sentimento que emana de você é um reflexo de sua verdade interior. Infelizmente, ele se converte em falsidade pelo uso inadequado da fala. A língua é um dos cinco sentidos. Os sentidos são a causa das mudanças em nós. Eles são responsáveis pelo pecado ou o mérito que obtemos. A violência (Himsa) não se limita a ferir ou magoar os outros; na verdade, agir de forma contrária a suas próprias palavras também é violência. Lembre-se disto sempre: na verdade, não pode haver maior ahimsa (não-violência) do que usar nossa fala de uma maneira sagrada.

As palavras têm tremendo poder. Elas podem incitar emoções e podem acalmá-las. Elas comandam, enfurecem, revelam ou confundem. São forças poderosas que trazem à tona grandes reservas de energia e sabedoria. Tenha, portanto, fé no nome do Senhor e repita-o sempre que puder.

O som dos mantras (hinos védicos) tem o poder de transformar os maus impulsos e as más tendências. A palavra “mantra” significa aquilo que salva quando voltado para a mente. Mantenha sempre o mantra na mente: isto afastará o falar desenfreado, a conversa inútil, a intriga e o escândalo. Fale somente quando for totalmente necessário. Fale o menos possível.

Tudo o que você fala é um reflexo dos pensamentos internos. Tudo o que você faz é um reflexo da ação interior. Assim, agir de acordo com seu impulso interior é Dharma (Retidão). Falar o que você sente dentro de si é Sathya (Verdade). Refletir sobre o que você experimenta em seu coração é Shanti (Paz). Compreender adequadamente as sugestões do coração é Ahimsa (Não-violência). Consideração por tudo que emana do coração é Prema (Amor). Os cinco valores são, portanto, reflexos dos sentimentos que emanam do coração. Ser verdadeiramente humano significa ter completa harmonia entre pensamento, palavra e ação. Se houver divergência entre pensamento, palavra e ação, qual é o resultado? Ação infrutífera.


terça-feira, outubro 20, 2015

"Aquele que fala contigo..."

- Núcleo -


"Disse Jesus ao que era cego: Crês tu no Filho de Deus?
Ele respondeu, e disse: Quem é ele, Senhor, para que nele creia?
E Jesus lhe disse: Tu já o tens visto, e é aquele que fala contigo." (João 9:35-37)


A questão essencial é: Quem é o Filho de Deus para que Nele possamos crer?

O Filho de Deus respondeu presencialmente ao que era cego: É aquele que fala contigo!

Embora esta resposta tenha sido dada pelo Filho de Deus há aproximadamente dois mil anos, trata-se em verdade de uma revelação divina de validade atemporal.

Para aqueles que deixaram de ser cegos, a resposta à questão "Quem é o Filho de Deus para que Nele possamos crer" ainda continua sendo a mesma: É aquele que fala contigo!

Assim como de nada adianta “ter olhos e não ver”, também não adianta “ter ouvidos e não ouvir” que o Filho de Deus É aquele que fala contigo! E não ouvir nada do que Ele diz!

Assim, a questão agora não é com quem o Filho de Deus fala, mas sim, quem ouve o que está sendo dito! Pois, o próprio Cristo já revelou que Ele É aquele que fala contigo!

Perceba algo que está sendo enfatizado nesta revelação divina ao que era cego: Ele fala!

Deixar a condição dos que “têm olhos e não vêem” [ou seja, deixar a condição daquele que era  cego] é perceber que o Cristo já realizou o milagre em você e perceber que Ele fala contigo!

Enquanto a sua mente disser que Ele não fala com você, ou seja, enquanto continuar dando foco à percepção [mental] de que você não ouve a voz do Filho de Deus em você, não estará dando foco à percepção [consciencial] de que: Ele fala! Pois, Ele É aquele que fala contigo!

Atente ao fato de que esta é uma “percepção consciencial” que está sendo compartilhada com você! Ou seja, algo de validade atemporal e impessoal está sendo percebido e compartilhado. Note que o ensinamento do Núcleo é centrado nas próprias percepções e não em personagens que tem as percepções. 

A percepção consciencial é como uma interface entre o personagem e o Ser Real, ela está ao alcance do personagem mas pertence ao Ser Real e é o que possibilita a percepção da nossa real identidade. Por isso quando Simão Pedro respondeu que Jesus era em realidade o Cristo, o Filho do Deus Vivo, Jesus enfatizou que aquela percepção de Sua real identidade não veio da “carne e sangue”, ou seja, não veio da mente de Simão Pedro, porque a mente e os personagens estão na representação, mas aquela percepção veio da Realidade na qual está o Pai, enfim, veio dAquele que está no céu, a Realidade subjacente à representação! [Mateus 16: 15-16]

Essa passagem bíblica evidencia que os personagens podem ter “percepções conscienciais”, ou seja, os personagens podem perceber a Realidade; e evidencia também que esta percepção não vem de suas mentes, mas do próprio Ator, o Ser Real que subjaz a todos os personagens. E essa passagem revela também o quanto Jesus enfatizou esta percepção compartilhada por Simão Pedro, a ponto de declarar que sobre esta “pedra” [sobre esta percepção sólida como Pedra, ou seja, fundada na Realidade que é o Pai, o Ser Real] iria edificar sua Eclésia [comunidade dos que percebem o Real]. É para que todos percebam a realidade de Deus que as comunidades espirituais são criadas. Elas normalmente emergem em torno de personagens despertos que são aqueles que percebem, desfrutam e compartilham o que percebem da Realidade de Deus e possibilitam que outros personagens também percebam o Real, e que percebendo desfrutem essa percepção, e que a desfrutando a compartilhem com todos.

Sobre Céu e Terra há toda uma simbologia bíblica. Alguns personagens despertos compartilharam suas percepções a esse respeito. Vamos a elas!

Em Gênesis 1: 1 está escrito: “No Princípio, criou Deus os céus e a terra”.

Deus é próprio Princípio Divino no qual tudo expressa o que Ele É.

A palavra Princípio não deve ser entendida em termos temporais como “início dos tempos”, mas como Origem de tudo o que É, da mesma forma como está escrito em: “No Princípio era o Verbo”, significando que o Verbo, a Palavra, a Substância divina, expressa a Si mesmo, manifesta a própria origem ou Princípio divino e existe atemporalmente no Ser, em sua própria Realidade e Consciência.

Assim, criou Deus “no Princípio”, ou seja, criou em Si mesmo, em Sua própria Consciência, céu e terra; Realidade e Representação.

As duas criações divinas são, portanto, o céu, a “Realidade divina” e a terra, a “representação divina”.

A natureza de tudo que é criado na “Realidade divina” é eternidade; e, daquilo que é criado na “Representação divina” é a efemeridade.

Assim, observa-se que o homem criado à “Imagem e Semelhança” de Deus é descrito no capítulo 1 do Gênesis. Este é o homem real, eterno, é o chamado “Eu Verdadeiro”, a real identidade humana.

Em contraposição a esta real identidade humana, o homem criado na representação divina, terra, como descrito em Gênesis 2:7, foi formado do “barro”, ou seja, foi formado da própria substância da “representação divina”. Assim, sendo o homem formado da própria “representação divina” ele é também uma “representação divina” e,  portanto, efêmero como tudo na terra ou “representação divina”.

Importa ainda observar que o próprio “Deus” descrito no capítulo 2, que formou o homem do barro, não é o mesmo Deus que criou o homem a Sua Imagem e semelhança, mas sim, o “Senhor Deus”, que é o Senhor que atua como a Lei da representação divina, a Lei de causa e efeito.

Vale lembrar que dois personagens despertos, Masaharu Taniguchi e Joel Goldsmith compartilharam a mesma percepção consciencial de que Deus, Aquele Ser que é Amor e Vida Eterna, está descrito no capítulo 1 do Gênesis. Na Representação divina Ele aparece como “Senhor Deus” e atua como Lei, a Lei que rege a representação, a Lei de causa e efeito, como está descrito no capítulo 2 do Gênesis.

Na Representação divina Aquele que aparece como “Senhor Deus” fez a “árvore da Vida” e fez também a “árvore do conhecimento do bem e do mal”.

Sendo Deus Aquele que na representação divina aparece como “Lei de causa e efeito”, pelo fruto da “árvore da Vida” se faz perceptível a Realidade divina, e pelo fruto da “árvore do conhecimento do bem e do mal”, se faz perceptível a Representação divina. Desta forma, causa e efeito assim se relacionam: o fruto da “árvore da Vida” é a percepção da Consciência do Ser, que é unitária e a tudo vê como uma expressão do próprio Ser. Ao passo que o fruto da “árvore do conhecimento do bem e do mal” é a percepção da mente do personagem, que é dual, e a tudo vê como separado de si.

O que se deve notar é que embora tenha Deus criado céu e terra, Realidade e representação divinas, como descrito em Gênesis 1:1, as duas árvores e seus consequentes frutos, que representam as duas percepções, aparecem apenas na “representação divina”; ou seja, no céu [na Realidade divina] não há “árvore do conhecimento do bem e do mal”, não há “percepção mental”. É preciso adentrar à “representação divina” para se acessar á “árvore do conhecimento do bem e do mal”.

Nesse sentido alguns ensinamentos absolutistas afirmam que a realidade desconhece a ilusão. De fato, é impossível ao homem criado à “Imagem e Semelhança” do Criador, conforme descrito em Gênesis 1:27 [o Eu Verdadeiro], ser iludido pelo fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal. Assim, é evidente que a dualidade é uma ficção, é algo aparente e ocorre apenas quando o ator divino atua na “representação divina” – terra – assumindo uma identidade aparente, a identidade de um personagem, como se tivesse sido formado do “barro da terra”, como está descrito em Gênesis 2:7; ou seja, como se tivesse sido formado da substância [barro] da própria terra [representação divina], ou seja, o ator divino assume a identidade de um personagem na representação divina e passa a ver tudo como separado de si, o que faz da representação algo bastante realístico para a mente do seu próprio personagem.

Vale notar que Joel Goldsmith observou que através de Moisés a humanidade teve acesso ao “Senhor Deus”, isto é, ao Deus da representação divina, e assim a humanidade aprendeu como viver sob a Lei de Causa e Efeito, como se beneficiar da Lei que rege a terra. E observou que através de Jesus a humanidade teve acesso ao Deus Verdadeiro, ao Deus que é Vida Eterna e Amor.

Por sua vez, na representação Jesus declara ser o Filho de Deus e nos ensina como podemos ascender da Lei para a Graça! Ele afirma que não veio para revogar a Lei, mas sim para cumpri-la! E o cumprimento da Lei, Jesus revela que está condensado em dois mandamentos que são: Amar a Deus sobre todas as coisas e amar ao próximo como a si mesmo!

O que Jesus está nos revelando é por si só algo divino e raramente enfatizado nos ensinamentos espirituais de quaisquer tradições do mundo! Ele está nos fazendo ver que mesmo estando imersos na representação é possível transcendermos a Lei de Causa e Efeito não a rejeitando ou a negando mas sim a cumprindo integralmente acessando a percepção da Consciência do Ser, a árvore da Vida, que é unitária e a tudo vê como uma expressão do próprio Ser.

Então, como os ramos são membros do próprio Ser que é a Videira, Jesus nos ensina a vê-lo de forma unitária, como partes do mesmo Ser único, revelando que ele é a Videira e nós somos os ramos!  E para ativarmos essa visão unitária, a visão da “árvore da vida” que está em nós ele ensina que: “O reino de Deus está dentro de vós.” Jesus também revela que: “Ninguém vai ao Pai senão por mim.” Todo seu ensinamento espiritual é no sentido de acessarmos essa “árvore da Vida” em nós, a fim de que possamos colher os seus frutos, que é percepção da Realidade Divina na qual semeador e ceifeiro são Um.

Amar é perceber de forma unitária. Por isso a ênfase na percepção de unidade se condensa naqueles dois mandamentos que são: Amar e amar!

Amar a Deus… sobre todas as coisas;
Amar ao próximo… como a ti mesmo.

A percepção que se deve ter destes dois mandamentos é essa:

Amar a Deus sobre [é perceber Sua onipresença subjacente a todas as aparências e interagir com Aquele que subjaz a] todas as coisas;

Amar ao próximo como [é perceber que Deus é Aquele que subjaz ao próximo como subjaz] a ti mesmo.

Deus é Amor. Sendo amor, Deus ama. Deus percebe. Por perceber que é amor, Deus ama. Amar é a forma como Deus percebe e age. No Núcleo é reiteradamente enfatizado o principio divino de que: “Não há percepção sem ação”. Se o Deus Verdadeiro é Amor e se Seu reino está EM nós, não há como acessar este reino EM nós sem amar, sem perceber de forma unitária, que é a forma de percebê-lO.

Por isso Jesus enfatizou os dois mandamentos e veio cumprir a Lei revelando como acessarmos a “arvore da Vida”, a visão de unidade representada pela parábola da Videira e os ramos.

É importante ainda observar que Jesus ora a Deus não para que nos tire deste mundo, desta representação, mas que nos livre do mal, da visão dual que é produzida pela árvore do conhecimento de bem e mal, pela qual Deus é visto apenas como o “Senhor Deus”, a Lei de causa e efeito, que castiga os maus e recompensa os bons. Por isso, a “figueira que não dá bons frutos”, Jesus mesmo a seca!

Por fim, se acessarmos a árvore do conhecimento de bem e do mal estaremos agindo sob os efeitos dos frutos dessa árvore, a saber, estaremos vendo apenas a representação e agindo “em pecado”, ou como enfatizou Masaharu Taniguchi, estaremos agindo com a visão encoberta (tsumi).

Nesse sentido, sabendo que os personagens que queriam testá-lo estavam agindo “em pecado”, ou seja, “com a visão encoberta”, Jesus disse: “Aquele que não estiver em pecado atire a primeira pedra”. Narra a Bíblia que nenhum deles foi capaz de atirar a pedra, pois, a palavra de Jesus foi dirigida aos próprios atores por traz daqueles divinos personagens. A Consciência divina de cada um deles lhes tornava conscientes de que seus personagens “agiam em pecado”, e que apenas o próprio personagem Jesus naquele contexto agia com a visão descoberta. Jesus deu ali uma lição prática de como acessar a “árvore da Vida”, a percepção unitária que está em nós, a percepção que fez com que cada um daqueles presentes naquela cena visse sobre si o que viam no “outro”.

Em síntese, mesmo estando na representação temos acesso direto à “arvore da Vida”, a essa percepção unitária que nos dá acesso ao reino de Deus, à certeza de que: “nele vivemos, e nos movemos, e existimos; como também alguns dos vossos poetas disseram: Pois somos também sua geração.”

Enfim, Céu é a Realidade, aquilo manifestado pela atividade da Consciência do Ser – É fruto da “árvore da vida”, fruto da percepção consciencial.

Terra é a Representação, aquilo gerado pelo pensamento da mente do personagem – É fruto da “árvore do conhecimento de bem e mal”, fruto da percepção mental.

Dando foco à “árvore da vida”, a interface que está na representação mas que pertence ao Ser Real, você acessa em você mesmo, no Reino de Deus em você, a percepção do Filho de Deus, a percepção unitária, consciencial, dAquele que fala contigo!

Um último detalhe contido nesta passagem, não menos importante, é este: Disse Jesus ao que era cego: Crês tu no Filho de Deus?Note bem, o milagre já havia sido realizado, aquele divino personagem que era cego já havia sido curado por Jesus. Da mesma forma o mesmo já aconteceu com você, o milagre já se realizou em você, pois você tem acesso a esta percepção que agora está sendo compartilhada, assim como o cego já podia ver, você também já pode perceber! Você já pode perceber que O Filho de Deus É aquele que fala contigo.

Que todos os que eram cegos mas que agora podem ver, [ou seja, que todos os que não percebiam mas agora podem perceber] e que perguntam: “Quem é ele, Senhor, para que nele creia?” desfrutem a percepção da presença de Quem em si mesmos, no Reino de Deus, diz: Tu já o tens visto [já o tens percebido], Ele É aquele que fala contigo.

Namastê.