"MAIOR É O QUE ESTÁ EM VÓS DO QUE O QUE ESTÁ NO MUNDO." (I JOÃO 4:4)

terça-feira, junho 30, 2009

ENTREGUE-SE À VERDADE


Dárcio Dezolt


“Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito.”
- LUCAS 23: 46 -




Quantos estão dispostos a se entregar à Verdade? Quantos se dizem estudantes da Verdade, sempre conservando a ideia de que um “outro” é seu mestre, sem notar que esta crença lhes vêm da mente humana justamente para acobertar esta falta de entrega?

O mundo vive a sua mentira: uma suposta criação material. Contudo, temos a Verdade revelada: DEUS É ESPÍRITO! DEUS É TUDO! Desse modo, adiar a entrega da vida a essa totalidade, é o mesmo que renunciar à glória.

As pessoas desejam uma vida perfeita, sem problemas, mas veem a si mesmas, e às demais, como seres imperfeitos, dotados de um suposto “livre-arbítrio” que os capacita a serem bons e maus, conforme as circunstâncias. Livre-arbítrio não passa de outra fantasia do dualismo ilusório! Como haver “livre-arbítrio”, se a Mente, Deus, é TUDO? Mas o mundo continua vivendo suas crenças em pecados e pecadores, em bem e mal. A passagem bíblica da adúltera, em que a multidão procurava apedrejá-la por julgá-la pecadora, e que deixou de fazê-lo diante da colocação feita por Cristo: “Quem de vós estiver sem pecado, atire a primeira pedra”, continua se aplicando à vida atual do mundo das aparências. Quase ninguém analisa a si mesmo para se descobrir sendo o ser criado “à imagem e semelhança de Deus”. Quase ninguém se identifica por inteiro com o Deus que constitui sua própria Vida! Desse modo, como é mais fácil julgar pelas “aparências, e buscar defeitos“nos outros”, do que refletir sobre si mesma, a raça humana prossegue em seu “curso de ilusão”, como se nenhuma Verdade Absoluta lhe tivesse sido revelada!

“Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito”. Eis o modelo a ser seguido. Alguém disposto a fazê-lo? Que sentido tem esta frase? Um sofredor na cruz entregando a sua alma a um Deus superior, fora dele mesmo? Não. Esta frase retrata o fim da mente humana. O fim da “crença” em vida pessoal. Sem mente humana, inexiste instrumento capaz de registrar uma falsidade, um “quadro hipnótico”, em que um filho de Deus esteja existindo como um sofredor colocado numa cruz! Sem mente humana, surge a Verdade revelada de que a Mente infinita É ÚNICA e É TUDO! O mundo, em sequência à sua ILUSÃO, pode ter retirado da cruz ilusória um também inconsistente “corpo físico” de sua invenção. Contudo, o Cristo sempre esteve, e está, completamente ALHEIO a todo esse “teatro” da mente humana.

“Eu e o Pai somos um”, disse Jesus, antes mesmo que a mente humana criasse a falsa imagem de crucificação. Esta é a lição para todos nós! Não há sentido em estudarmos que DEUS, ESPÍRITO, É TUDO, e continuarmos acreditando em “existência humana”, onde “enviados de Deus” são torturados, crucificados, etc. Deus, sendo TUDO, enviaria enviados para onde? Existe “local” fora da Onipresença? Não! Existe “vida pessoal”? Não! Daí a gloriosa Revelação: “Eu e o Pai somos um”. DEUS É VIDA ÚNICA! DEUS É ONIPRESENÇA! Muitos aguardam a glória divina em “época futura”; há inclusive aqueles que chegam a duvidar que chegarão a vivenciá-la! Quem pensa desse modo? A suposta “mente humana”. E, enquanto perdurar a aceitação desta mente falsa, aparentará existir o “cenário” por ela visto, com sua seqüência de quadros de imperfeições e sua visão finita, limitada e ilusória do homem e do Universo, ou seja, de Deus.

Há uma Verdade infinita Se expressando. Ela já inclui VOCÊ e a todos de modo impessoal e completo. Não existe mundo material! Mas a inexistência do mundo material somente poderá ser constatada através do discernimento de que a mente humana não existe, e que unicamente a Mente divina é Mente real e onipresente.

Façamos como Jesus: “Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito”. Esta “entrega” é um reconhecimento da farsa do dualismo! É um “despertar” para a Verdade de que Deus é realmente Tudo; é um discernimento de nossa UNIDADE ESSENCIAL ETERNA! Esta Unidade existe; está consumada!

A “entrega” não é atitude pessoal, no sentido de que uma pessoa a faça, isolando em sua visão todas as demais. Não! A “entrega” é feita de modo que TUDO E TODOS estejam sendo entregues ao Pai como UNIDADE. A Visão espiritual contempla o Infinito e cada indivíduo que O forma. O “Pai”, citado por Jesus, é a divina Consciência infinita que agora nos faz discernir que “somos”, que “vivemos”, que somos “conscientes”. Sem a mente humana, esta Consciência única é discernida como TUDO E TODOS. E esta Consciência é a PERFEIÇÃO que abrange o Infinito! Este vislumbre da Realidade nos revela que DEUS, LUZ, É TUDO, e de que jamais houve imperfeição neste Universo de Deus.

“Entregar o espírito nas Mãos do Único” é deixar de ilusoriamente “dividir a Existência” em espírito e matéria, é evitar que a “ilusão de separatividade” atue hipnoticamente em nossas vidas. “Uma casa dividida não subsiste”, disse Jesus! E disse ainda: “Não podeis servir a dois senhores”.

O ensinamento é cristalino: DEUS É TUDO, TUDO É DEUS! Difícil segui-lo? Para a suposta mente humana, esta tarefa não apenas pode ser encarada como difícil, e sim como impossível! Mas a receita nos é dada: “PAI, NAS TUAS MÃOS ENTREGO O MEU ESPÍRITO!” Não há, aqui, NENHUMA incumbência dada à mente humana! Ela não existe! E Deus – Se revelando livremente na Consciência individual que se desfez da crença em imperfeições, em pecados ou pecadores – faz com que VOCÊ perceba que esta “Consciência individual” é o CRISTO, a Consciência infinita, que Se mostra presente como a SUA Consciência Iluminada e única. Contemple, agora, este Fato espiritual! Identifique-se com ele! ENTREGUE AO PAI O SEU ESPÍRITO!

sábado, junho 27, 2009

A Alma (Goldsmith)


Joel S. Goldsmith


A Alma é a parte do homem pouco conhecida e só raramente percebida. Muitas vezes, aqueles que estão imersos em profunda aflição rompem a névoa do sentido material até o recesso do seu ser interior, onde descobrem a Alma, ou a Realidade do ser. Tornam-se conscientes da Alma, encontram novos valores, novos recursos, uma força nova e diferente e uma maneira de ser de natureza totalmente diferente.

Exercer as faculdades da Alma resulta na quebra da ILUSÃO dos sentidos. Toda discórdia humana é o produto do sentido material e é vivenciada através dos cinco sentidos físicos — isto é, todas as desarmonias mortais são vistas, ouvidas, sentidas, saboreadas ou cheiradas. Por existirem apenas neste estado material de consciência, as discórdias e as doenças têm o seu ser em falsas idéias, em ilusões, embora naturalmente pareçam muito reais aos nossos sentidos.

Há muitos meios que nos proporcionam alívio temporário para as condições falazes de suprimento, de saúde ou outras desarmonias que se apresentam na vida diária. A destruição completa e definitiva do erro, porém, só é obtida ao se encontrar e exercitar as faculdades da Alma. A Alma é a parte do homem que jaz enterrada mais profundamente dentro dele, e por isso é raramente percebida. Nós usamos nossas faculdades matemáticas ou musicais porque jazem mais próximas à superfície do nosso ser, e, muito mais do que estas, nossas faculdades habituais de comércio, ou o nosso sentido de orientação, ou mesmo o nosso senso artístico; mas os artistas, os autores e os músicos de talento vão mais fundo dentro do seu ser, e de lá trazem à luz as grandes harmonias da boa música, a boa literatura, pintura, escultura ou arquitetura.

Escondida ainda mais profundamente, embora ao alcance de nossa consciência, jaz a Alma com suas faculdades. Quando tocamos tais poderes da Alma, estes emanam do nosso interior e atingem todos os caminhos da nossa vida cotidiana, trazendo inspiração, beleza, paz, alegria e harmonia para cada instante da nossa existência, e revestem todos os acontecimentos da vida com amor, compreensão e sucesso.

Aqueles, contudo, que estiverem demais envolvidos com as dores e os prazeres dos sentidos não chegarão, com certeza, até o reino da Alma. Ao longo da história, este convite para se dessedentar na fonte de águas vivas foi estendido a toda a humanidade, e todas as gerações têm produzido muitos homens e mulheres que encontraram a eterna paz e juventude dentro se si mesmos. E assim sempre surge aquele que bebeu mais profundamente na fonte da Alma, e todos estes videntes sempre deram notícias do reino interior e da vida que pode ser vivida pela Graça, uma vez atingida esta consciência. Por outro lado, muitos respondem que têm grandes encargos humanos que lhes ocupam todo o tempo; outros despendem tempo demais no prazer dos sentidos, passatempos e recreações; outros ainda estão ocupados em realizar e adquirir.

Cada vez mais, as pessoas começam a perceber que a libertação do medo, da insegurança, da necessidade, e da pouca saúde não se encontra no reino da matéria. As guerras não acabam com a guerra; as aplicações não garantem segurança contra a falta. A medicina alivia as dores, mas não traz uma saúde verdadeira. Devemos extrair um poder que seja maior do que aquele que é encontrado no corpo ou nos pensamentos humanos, um poder que nos dê a felicidade, a harmonia e a paz, que são direitos nossos de nascença. Tal poder está disponível para todos, pois ele JÁ faz parte do nosso ser — na verdade, é a parte maior do nosso ser. Como um iceberg, que mostra apenas uma parte de si fora da água, assim os poderes humanos do corpo e da mente não representam senão uma parcela de nossos poderes e faculdades.

As forças da Alma são mais reais e tangíveis do que qualquer poder material da natureza ou da capacidade inventiva. Elas trabalham num nível mais elevado de consciência, mas se tornam visíveis nas coisas chamadas de humanas.

As forças da Alma agem sobre o corpo humano para produzir e manter a saúde e a harmonia. Permeiam todos os caminhos da vida cotidiana com influências protetoras e são a fonte de suprimento infinito.

As pessoas deste mundo que são conscientes de sua Alma vivem uma vida interior de paz, de contentamento e domínio, e uma vida exterior em completa harmonia consigo mesmas e com o resto do mundo dos homens, dos animais e das coisas. Estão sintonizadas com seus poderes da Alma, e isto constitui sua UNIFICAÇÃO com toda a criação.

Todos podemos ter acesso à Alma. Ela jaz nas profundezas íntimas do nosso próprio ser. O desejo de realizações mais elevadas da vida é o primeiro requisito, e, a partir daí, deve-se manter uma constante orientação para o próprio interior até que a meta tenha sido alcançada.

Um bom começo pode ser a percepção da verdade que há muito mais na existência humana do que saúde física e suprimento material. Quando temos o vislumbre do fato de que mais dinheiro, mais casas ou automóveis não constituem o suprimento, que mais viagens não são recreação, que a ausência de doença não significa necessariamente saúde — em outras palavras, que "meu reino não é deste mundo" —, estamos na direção correta para descobrir o reino da Alma.

Todos sabemos como empregar a força física, como quando usamos o esforço muscular para erguer algum peso, ou fazemos força com os braços ou as pernas; e sabemos também como exercer pressão mental, como em profunda meditação ou pela vontade pessoal.

Sabemos que há um poder da Alma, mas saber que este poder pode fazer muito mais por nós do que os poderes materiais e mentais juntos, isto poucos sabem. Talvez uma 'razão pela falta de interesse por parte do mundo neste tema tão vasto' seja o fato de que este imenso reservatório de poder que está em nós NÃO possa ser utilizado para fins EGOÍSTAS. Pensemos na grandeza disso — um grande e maravilhoso poder à mão, mas que jamais pode ser usado para satisfazer a fins egoístas. Nisto está o segredo do porquê são tão poucos os que atingem a consciência da Alma. Só podemos perceber a presença da Alma após nos termos libertado dos desejos egoístas, e termos individualizado este poder infinito dentro de nós mesmos na medida do nosso desejo de SERVIR aos interesses da humanidade.

É justo, natural e normal que vivamos uma vida plena, próspera e feliz, mas nós podemos viver isto sem nos preocuparmos conosco, com nosso suprimento e mesmo com nossa saúde. Todo o bem necessário ao nosso bem-estar nos será fornecido em grande abundância quando pudermos aceitar que temos de abandonar nossos esforços e desejos de ter, de conseguir ou realizar, e nos aprofundarmos no desejo de cumprirmos apenas nosso destino sobre a terra. Estamos aqui como parte de um plano divino. Somos Consciência, que realiza (de si mesma) e expressa (de si mesma) a si mesma de forma individual; e se aprendermos a desprender o nosso pensamento de nós mesmos, ou da preocupação com nosso lugar, nosso suprimento ou saúde, e a deixar que Deus cumpra seus desígnios através de nós ou como cada um de nós, acharemos de fato que todas as coisas nos serão acrescentadas.

A Bíblia é literalmente verídica quando afirma: "Do Senhor é a terra, e tudo o que nela se contém" e "Filho... tudo que é meu é teu". Não há, pois, necessidade de ter qualquer ansiedade quanto ao nosso bem-estar. Esquecendo de nós mesmos e aprendendo a manter um estado de receptividade, perceberemos ESTAR plenificados pelo poder da Alma, da consciência e recursos da Alma, e nossa vida será aquinhoada com a companhia de outros homens e mulheres que partilharão conosco a alegria de sua descoberta.

A mente que estava em Jesus Cristo não é algo afastado, tampouco é ela a mente de uns poucos líderes religiosos: a mente que estava em Cristo Jesus é a sua, e está pronta para se manifestar em você na medida em que se esqueça do seu ego e se torne receptivo à divina sabedoria que está em seu íntimo. Os recursos da Alma estão à porta de nossa consciência, prontos a se derramar em nós, mais do que possamos receber, mas não para satisfazer algum desejo pessoal ou egoísta. Tais falsos desejos são as pedras de tropeço do nosso desenvolvimento espiritual, e não devemos pensar em usar nossos poderes espirituais para fins pessoais ou egoístas. A canção da Alma é liberdade, alegria e eterna felicidade; a canção da Alma é amor para toda a humanidade; a canção da Alma é você.

Por que demoramos tanto para obter a libertação da doença, da discórdia e de outras mazelas do mundo material? Inteiramente por causa de nossa incapacidade de apanhar a grande revelação: não há realidade no erro.

Pusemos tanta atenção na fé em Deus como nosso benfeitor, ou na fé em algum curador ou mestre, que passamos por cima da grande verdade: o erro não é realnão existe matéria, pois a substância da matéria é de fato mental.

Aprendemos com os cientistas físicos, e também com os metafísicos, que aquilo que tem sido chamado de matéria é uma interpretação equivocada da mente. A mente é um instrumento de Deus, e Deus é Espírito; assim, tudo o que existe é substância espiritual, apesar do nome ou da natureza que lhe tenha sido atribuído pelos sentidos finitos.

Deus é a consciência do indivíduo; assim tudo o que se nos depara como pessoa, coisa ou condição, nos vem como consciência, na consciência e através da consciência; e Deus, a Consciência, é a Alma de todo indivíduo; Deus, o Princípio, é a lei de toda ação; Deus, o Espírito, é a Substância de tudo de que temos consciência.

Pela educação equivocada, que estrutura nossos sentidos finitos, chegamos a temer certos indivíduos, coisas ou condições, sem perceber que estas coisas nos chegam pelo caminho da consciência, e que são todas Seres de Deus, Consciência que se nos revela, consubstanciadas de Espírito. A consciência material é o sentido finito e enganador que considera o homem e o Universo limitados, como bons e maus. A consciência espiritual é a percepção do indivíduo como um ser de Deus, que tem apenas a mente de Deus e o corpo do Espírito. Reconhece o Universo todo como manifestação da mente e governado pelo Princípio divino. A consciência espiritual é a capacidade de ver a realidade além das aparências, perceber e reconhecer que, como Deus é a nossa mente, tudo o que se nos apresenta está em e vem de Deus, nossa única consciência.

A consciência espiritual não supera nem destrói a matéria ou as condições materiais: apenas sabe que tais condições não existem, pelo menos da forma com que nos são mostradas pelos sentidos finitos. Ela traduz para nós as aparências, revelando-nos a verdadeira natureza das coisas que estão presentes.

O poder espiritual provém da Alma — da sua Alma, da minha Alma. É impessoal e imparcial. Todos podemos abrir as janelas da Alma e contemplar as glórias infinitas de um mundo bem acima do universo dos sentidos. O mundo da Alma é muito maior que tudo que possamos ter visto ou ouvido, é o mundo que é observado através do sentido espiritual. Sabemos que o pensamento não iluminado vê o Universo como algo material, enquanto a consciência iluminada, ou sentido da Alma, vê e compreende o Universo como algo espiritual.

No desenvolvimento de nosso sentido espiritual, ou poder da Alma, nada há de só teórico, não aplicável à prática. Esta consciência elevada capacitou Moisés para liderar seu povo em sua libertação da escravidão, através do Mar Vermelho, rumo à conscientização da abundância. Através de Jesus ela curou muitos dos males que afligiam aquela gente, alimentou multidões com alimento real e ressuscitou os mortos. Através de Paulo, ergueu uma parte da humanidade acima dos profundos pesares e persecuções, para a Cristo-consciência e a liberdade espiritual.

A consciência espiritual nos eleva para acima de toda forma humana de limitação e nos permite um sentido mais amplo da vida, da saúde e da liberdade. Onde houver esta consciência espiritual, não haverá escravidão a pessoas, lugares ou coisas, e não haverá limitações para nossas realizações.

Até onde se saiba, Jesus nunca deixou uma palavra escrita e, contudo, seus ensinamentos são os fundamentos morais e éticos de boa parte da humanidade. Muitos outros videntes deixaram apenas as palavras ditas a seus seguidores, embora, pelo seu poder intrínseco, tais mensagens tenham se tornado águas vivas durante épocas sem conta. A sabedoria dos tempos, propalada por homens e mulheres espiritualmente iluminados, que nunca sonharam que seus pensamentos corressem em volta da terra e influenciassem a vida e a conduta das pessoas, não está confinada no tempo e no espaço. O pensamento crístico, que preenche sua consciência, dela irradia como círculos na água atingida por uma pedra, criando círculos cada vez maiores, até atingir toda a humanidade. Sim, a consciência espiritual tem aplicação prática. Nosso desejo de abundância, contudo, deve ser o desejo de abundância para outros, antes que possamos ter a experiência da graça, que é o presente de Deus.

A meditação é a porta para o mundo da Alma, e a inspiração é o seu caminho. Quando aprendemos a ficar cinco ou dez minutos cada manhã, tarde e noite, sentados em silêncio com os ouvidos "de ouvir"; quando nos voltamos para dentro de nós mesmos e aprendemos a esperar pela "pequena voz silenciosa", adquirimos o hábito da meditação e desenvolvemos a habilidade nesta técnica, até que sejamos possuídos pela inspiração e que ela nos leve para o céu de nossa Alma. Este é o princípio de nosso novo nascimento, e aqui aprendemos a nova linguagem do Espírito. E a vida começa a ter um novo significado.


quinta-feira, junho 25, 2009

Você é Vida!





Segue uma reflexão a fim de auxiliar a entender o poema do vídeo:

Não somos corpo carnal, somos Vida! Há uma importante distinção que precisa ser feita. Muitas pessoas confudem "Vida" com "existência". A chamada "existência" é o período durante o qual a Vida está presente na Terra. Tente perceber a diferença e, assim, intuir diretamente o que vem a ser a Vida. A Vida é imaterial, é substância divina, é Espírito. Somos a Vida, não o corpo que nasce, vive e morre. O homem que consegue ver-se nitidamente como Vida, e não como corpo feito de matéria, é o homem que alcançou a imortalidade. Jesus disse de si mesmo: "Antes que Abraão fosse, Eu sou". Ele não estava referindo-se àquela manifestação material chamada "Jesus de Nazaré", pois este era somente o corpo carnal onde o Cristo havia se manifestado. O Cristo, em si, é a própria Vida de Deus, e é eterno - nunca nasceu, portanto nunca morreu. Em termos de expressão, tudo o que pode ser dito à respeito da existência de Cristo é: "Eu sou". Jesus, portanto, conhecia sua verdadeira imagem: a de Cristo, a de filho de Deus e, falando mais verdadeiramente, a do próprio Deus.

Mas Deus não significa corpo carnal, não significa matéria. Deus é Vida. O homem é Vida. "Eu sou" Vida. De hoje em diante não se julgue mais como sendo um ser que um dia nasceu e que um dia deixará de viver. Busquemos conhecer verdadeiramente quem somos! Assim como Jesus, precisamos alcançar a percepção de que "antes que Abraão fosse Eu Sou". Não existe morte para aquele que está desperto espiritualmente e conhece verdadeiramente a Si mesmo. Do ponto de vista do Ser que É "antes de Abraão existir", a matéria não existe. O "Ser que sempre É" nunca nasceu, e nunca vai desaparecer. Ele esteve sempre onde está agora, e é por isso que Ele nunca "entrou" na matéria. Não existe mundo material para Deus. Deus enxerga apenas o Seu Reino. "Entrar no Reino de Deus" significa fazer essa identificação com Ele, tornar-se um com Ele, e ver como é que as coisas realmente existem. É isso que significa a citação bíblica de deixar de ver por "espelho em enigma" e passar a vê-lo "face a face". A matéria não existe! Por mais que pareça existir, não existe realmente. Ela é um sonho. Quando se desperta para a Realidade vê-se o Reino de Deus espalhado em toda parte, em todas as pessoas.

A Vida é eterna e não está inserida da dualidade. A morte, esta sim, está inserida na dualidade e por isso possui um pólo contrário que lhe faça oposição. A oposição da morte é o nascimento. Mas a Vida não tem opositores. A Vida eternamente É. Para percebermos que somos Vida, e não corpo material, precisamos superar a dualidade e passar a enxergar tudo como um. O segredo de todas as espiritualidades está na palavra "Unidade". A religião ou filosofia que não prega a Unidade de tudo o que existe não passa de mera crendice e é pura perda de tempo. Busque conhecer a unidade existente entre todas as coisas! A Vida é Um e é infinita. Não existem duas Vidas. Não existe mais de um Deus. E Deus supre sua Vida por meio de sua própria Vida, Ele se basta a si mesmo. Ele não depende fatores exteriores a Ele para manter-se presente, vivo, alegre, próspero, bondoso, harmonioso. Tudo o que Deus é, tudo o que a Vida é, é retirado da própria Vida pela Vida. A Vida faz-se uma fonte de si mesma. É por isso que Deus pode doar tanto! É por isso que Deus pode amar tanto! Não depende de nada externo, mas vive a partir do centro de seu próprio ser. Entenda, leitor, AGORA, que você é Vida e não um corpo material. Tudo o que for necessário a você, a própria Vida irá lhe providenciar. Tudo já existe nela. Reconheça! Não ore a Deus pedindo, suplicando, ou implorando, como se houvesse a possibilidade de Ele atendê-lo ou não. A sua oração já foi atendida, antes mesmo de você fazê-la. Ao invés de orar suplicando como um pecador necesssitado, ore agradecendo como o filho de Deus que você já é, dizendo: "Deus, agradeço-lhe de coração porque sei que minha oração já foi atendida". Essa forma de oração é mais correta, e está dentro de uma compreensão mais próxima do que vem a ser a natureza de Deus. Foi Jesus quem disse que Deus já havia nos atendido antes mesmo de pedirmos ao Pai em oração. Quando se compreende isso, quando se entende que a Vida basta a si mesma ("Pai, só a Tua Graça me basta!"), e passa a se confiar nela, ela rompe seu estado de limitação e passa a manifestar sua liberdade. Mas se não acreditarmos que "a nossa Vida já é dotada de todas as coisas boas"... então soframos a consequência dessa crença. Porque Jesus disse: "Seja-te feito conforme a tua fé!". A Vida do homem é tão grandiosa que, apenas para continuar proporcionando o livre-arbítrio ao homem, ela é capaz de tolher, de aprisionar, limitar a si mesma. Mas, por ser infinita e grandiosa, também tem o poder de libertar-se de suas limitações na hora em que ela quiser. Procure compreender isso! Veja quem você relmente é. Você é Vida - nada mais, nada menos. Jesus, por conhecer quem ele era, disse: "Eu o Pai somos um". Você também pode dizer o mesmo. Porque só existe uma Vida. E essa Vida é a sua, é a minha, é onipresente.

Reconheça a Vida que você já é e viva à partir de si mesmo, do centro do seu próprio ser. Tudo o que lhe for necessário lhe será dado. Não perca de vista esta conscientização. Se perder, a sua Vida voltará a se expressar dentro dos padrões limitados pelas crenças de tua mente. Permita-a expressar-se livremente! Do referencial da realidade espiritual, não existem crenças a serem conhecidas pela mente, dispa-se de todas elas! Só há uma única coisa que realmente vale a pena ser conhecido: "a Vida". Quem sou eu? A partir desta conscientização, tudo se desdobrará. Por que? Porque a Vida é infinita, só há uma Vida, e esta Vida é a sua. E sua Vida basta-se a si mesma. Experimente manter essa conscientização no seu dia-a-dia, e veja os resultados. Você é filho de Deus! Você é mantido e sustentado por Deus! Você vive agora no Reino de Deus! Você vive pela Graça de Deus. Essa é a sua herança, como o filho de Deus que você é. Mas você precisa aceitar receber e ser digno de tal herança. Do contrário, terá de viver conforme a lei "seja-te feito conforme a tua fé", proferida por Jesus. É disto que se trata a mensagem trazida no vídeo. Você é Vida! Você é um ser absolutamente livre, que, de TÃO livre, possui a liberdade até mesmo para se limitar. Mas, na hora em que você quiser, possui a força para recuperar a sua própria liberdade (iluminação!), que lhe é inata, e permitir que a sua Vida se (auto)expresse livremente.


"Que é destino? Na hora exata, quando eu quiser, eu me liberto do mais triste destino." (Masaharu Taniguchi)



domingo, junho 21, 2009

Assumindo a Imortalidade


Joel S. Goldsmith

No princípio era o Verbo, e o Verbo era com Deus, e o Verbo era Deus... E o Verbo se fez carne... "O Verbo se fez carne" — mas ainda é o Verbo. Não mudou sua natureza, sua qualidade ou substância por ter-se feito carne. A Causa tornou-se visível como efeito, mas a essência ou substância continua sendo o Verbo, o Espírito ou Consciência.

Por este prisma, podemos compreender que não há um universo espiritual e um universo material, mas que o que se nos apresenta como o nosso mundo é o Verbo feito carne, o Espírito tornado visível, ou a Consciência que se expressa como idéia.

Todo o erro que se consumou durante os séculos baseia-se na teoria ou crença em dois mundos, um sendo o reino celeste ou vida espiritual e o outro um mundo material ou existência mortal, separados um do outro.

Apesar desta crença em dois mundos, o homem sempre tentou levar a harmonia às mazelas da existência humana, tentando, por meio da oração, fazer contato com o tal 'outro mundo', ou reino espiritual, para que o Espírito, ou Deus, atue na chamada existência material.

Comecemos por entender que o nosso mundo não é um mundo errôneo, mas trata-se do reino da realidade do qual mantemos um falso conceito. Para obtermos saúde e harmonia em nossa vida, não temos de nos desfazer nem mesmo mudar este universo material e efêmero, mas bastará corrigirmos a visão limitada que temos da nossa existência.

O pesquisador da verdade começa sua busca com um problema — talvez com vários deles. Os primeiros anos de sua busca são empregados na superação da desarmonia e na cura das doenças pela oração a um Poder mais alto ou pela aplicação das leis espirituais ou da verdade às condições humanas. Chega, porém, o dia em que percebe que a aplicação da verdade aos problemas humanos já não funciona mais, ou, pelo menos, não como funcionava no início, e que já não traz a mesma inspiração e satisfação aos seus estudos.

Por fim receberá, eventualmente, a grande revelação: os mortais podem assumir a imortalidade apenas na medida em que anulem a mortalidade — eles não podem acrescentar harmonia de espiritualidade imortal às condições humanas. Deus não criou nem rege as coisas humanas. "O homem natural não compreende as coisas do Espírito de Deus, pois que lhe parecem loucura: nem pode entendê-las, porque só se podem discernir espiritualmente."

Estaremos nós buscando as "coisas do Espírito de Deus" com algum propósito humano? Ou de fato estamos nos esforçando para nos livrar do que é mortal, para podermos contemplar a harmonia do reino espiritual?

Enquanto lutamos e combatemos os pretensos poderes deste mundo, combatendo a doença, o pecado e a carência, o sentido espiritual, por sua vez, revela-nos que "O meu reino não é deste mundo". Somente quando soubermos transcender o desejo de melhorar nossa vida humana é que nos colocaremos na posição de compreender o sentido desta mensagem vital; quando deixamos os limites do aperfeiçoamento humano, temos o primeiro vislumbre do significado das palavras: "eu venci o mundo".

Não teremos vencido o mundo enquanto mais buscarmos seus prazeres e menos desejarmos suas dores. E se não superarmos a postura de luta contra as coisas do mundo, não entraremos no reino das coisas do céu.

"Porque todo o que é nascido de Deus, vence o mundo." A consciência espiritual vence o mundo — tanto os prazeres como as dores do mundo. Não podemos conseguir a evangelização da humanidade pelo poder mental ou pela força física, mas apenas pela visão espiritual da vida, que pode ser cultivada por todos que devotam seus pensamentos às coisas do Espírito.

"Porque tudo o que está no mundo, os prazeres da carne, os prazeres dos olhos, o orgulho, não vem do Pai — vem do mundo." Observemos, por um pouco de tempo, nossos pensamentos, nossas ambições e interesses e vejamos se a nossa mente está voltada para a nossa saúde, para os prazeres dos sentidos ou para os ganhos mundanos. Se constatarmos tais pensamentos mundanos, aprendamos a afastá-los, pois já não estamos no caminho do aperfeiçoamento das coisas humanas, mas a caminho do reino espiritual.

"Não tenhas amor ao mundo nem ao que é do mundo. Pois no homem que ama o mundo não está o amor do Pai." Significaria isto que devemos nos tornar ascetas? Deveríamos desejar uma vida diferente do que é normal, desprovida de alegria e de sucesso? Não nos enganemos. Somente aqueles que aprenderam a manter sua atenção nas coisas do Espírito saborearam a completa alegria do lar, do companheirismo e dos empreendimentos de sucesso. Somente aqueles que em certo grau se centraram em Deus encontraram segurança, proteção e paz em um mundo combalido pela guerra. O pensamento espiritual não nos afasta do nosso meio normal, não nos priva do amor e do companheirismo tão necessários para uma vida plena. Ele apenas coloca tudo isto em um nível mais alto, onde não mais dependemos da sorte, das mudanças ou do azar, onde se manifesta o valor do que chamamos de cenário da vida.

"Não vos esforceis pelo alimento que perece, mas pelo alimento que dura pela vida eterna... Pois que o Reino de Deus não consiste em comer e beber, mas na justiça, na paz e no contentamento no Espírito Santo."

Quando nos defrontarmos com um problema humano, em vez de nos esforçarmos para melhorar as humanas condições, afastemos essa imagem e concentremo-nos na presença do Espírito divino em nós. Esse Espírito dissolve as aparências humanas e revela a harmonia espiritual, ainda que essa harmonia se nos apresente como uma melhora de saúde ou de riqueza. Quando Jesus alimentou as multidões, o que apareceu como pão e peixe foi a sua consciência espiritual de abundância. Quando curou os doentes, foi o seu sentimento da Presença Divina que se manifestou como saúde, força e harmonia.

Tudo isso pode ser resumido nas palavras de Paulo: "Voltai vosso olhar para as coisas do alto, não para as coisas da terra".

Vivemos em um universo espiritual, mas a finitude de nossos sentidos desenhou para nós uma imagem de limitações. Enquanto tivermos nossos pensamentos voltados para o cenário à nossa frente — "este mundo" —, estaremos nos esforçando para melhorá-lo ou mudá-lo. Mas, assim que elevarmos nosso olhar e não mais nos preocuparmos com o que comer, beber ou vestir, começaremos a perceber a realidade espiritual; e embora nos pareça apenas uma crença mais perfeita, é de fato a manifestação mais intensa da realidade. Esta manifestação traz consigo uma alegria inimaginável, aqui e agora, uma satisfação com a qual nem sonhamos e o amor de todos com quem fazemos contato, mesmo daqueles que desconhecem a fonte da nova vida que descobrimos.

"Deixo-vos a paz, a minha paz vos dou. Não como o mundo a dá." "Não recebemos o espírito do mundo, mas o Espírito que vem de Deus... Coisas que também falamos, não com as palavras ditadas pela sabedoria dos homens, mas como as ensina o Espírito Santo... O homem natural não compreende as coisas do Espírito, que lhe parecem loucura; nem pode compreendê-las porque elas se discernem espiritualmente."

Quantas vezes nos enganamos neste ponto! Com quanta freqüência tentamos compreender a verdade espiritual com nosso intelecto humano! E isso leva à indigestão mental, pois que tentamos digerir alimento espiritual com nossa mente erudita. Isso não funciona. A verdade não é um processo de raciocínio, e por isso só pode ser entendida espiritualmente. A verdade não está normalmente na esfera do nosso entendimento, e, quando parece estar, deve ser investigada mais profundamente para verificar sua autenticidade. Temos de desconfiar de uma verdade que nos pareça fácil de compreender.

Jesus caminhou sobre as águas, alimentou multidões com poucos pães e peixes, curou os doentes e ressuscitou os mortos — parece aceitável para o seu intelecto? Se o princípio subjacente a essas experiências pudesse ser entendido com a inteligência, todas as igrejas o ensinariam como um meio viável e recomendariam seu uso. Este princípio, porém, só é apanhado pelo sentido espiritual, e esta 'consciência espiritual elevada' pode fazer as coisas que o Cristo fez. Aquilo que foi possível à Cristo-consciência no tempo de Jesus, é possível à mesma Consciência agora.

Cultivando este sentido espiritual, nosso sucesso será tanto maior na proporção que abandonarmos o esforço mental e nos tornarmos receptivos às coisas que o Espírito de Deus nos ensina. Em vez de tentarmos fazer que o Espírito atue sobre nossos corpos e nossas coisas materiais, aprendamos a desviar nosso olhar desses quadros terrenos, dirigindo-o para as coisas do alto. Quando "descermos novamente à terra", perceberemos que as desarmonias e as limitações dos sentidos desapareceram, e apareceu mais claramente a Realidade.

O Reino de Deus não consiste em mais e melhor matéria, nem encerra um mais rico vocabulário sobre a verdade. Todavia, os frutos da compreensão espiritual são uma maior harmonia, paz, prosperidade, contentamento e amizades e relacionamentos mais próximos do ideal.

Assim compreendemos que "agradecemos por isso continuamente a Deus pois vós, que recebestes a palavra de Deus ouvida de nós, não a recebestes como palavra humana, mas como ela é de fato — a palavra de Deus, que atua sobre vós para que nela creiais".

Para recebermos a Palavra de Deus, ou sentido espiritual, precisamos mais sentir que raciocinar.

E é a isso que a Bíblia se refere com a expressão receber a palavra "no coração". Notemos que o desenvolvimento da consciência espiritual redunda em maior capacidade de intuir a harmonia do Ser. Compreendemos que nem a visão, nem o ouvido, o tato, o olfato ou o paladar podem nos revelar a verdade espiritual ou sua harmonia; por isso tal revelação só pode nos acontecer através de outra faculdade, a intuição, que atua pelo sentimento.

Até o momento, ao orar ou meditar, vinha-nos de imediato uma enxurrada de palavras e pensamentos. Talvez estivéssemos começando a reafirmar a verdade e a rejeitar o erro. É, porém, evidente que isso ocorria completamente no domínio da mente humana.

Ao cultivarmos o sentido espiritual, tornamo-nos receptivos aos pensamentos que emanam das profundezas do nosso ser. Mais do que falar a Palavra, tornamo-nos seus ouvintes. Nesse estado, a sintonia com o Espírito é tal que sentimos a harmonia do Ser; sentimos a presença real de Deus. Transcendidos os cinco sentidos materiais, nossa faculdade intuitiva fica desperta, receptiva e sensível às coisas do Espírito; e após este renascimento espiritual, começamos uma nova existência.

Estávamos, até aqui, ocupados com a palavra da Verdade; e daqui em diante nos ocuparemos apenas com o Espírito da Verdade. Já não nos interessa saber o que seja a Verdade, mas sim em sentir a Verdade. E isso conseguimos na medida em que dedicarmos menos empenho na letra do que à receptividade e ao sentir. A palavra "sentir", aliás, se refere também à revelação, à consciência e ao sentido da verdade. Agora já não estamos falando da verdade, e sim recebendo a verdade, e aquilo que recebemos no silêncio, podemos falar abertamente e com autoridade.

A cura espiritual é o resultado natural de uma consciência divinamente iluminada. Mas esta iluminação só nos é dada na medida em que estejamos receptivos e sensíveis a ela.

É um mal entendido associarmos a idéia de imortalidade à pessoa humana ou ao sentido individualista de eu. A morte não produz a imortalidade nem põe fim ao sentido do eu, e tampouco a continuação do humano viver leva à obtenção da imortalidade.

Obtemos a imortalidade na medida em que superamos o sentido pessoal do eu, nesta vida ou depois dela. E, ao nos despojarmos do nosso ego e alcançarmos a consciência do nosso Eu verdadeiro — nossa Realidade, ou Consciência divina —, chegamos à imortalidade. E isso pode acontecer aqui e agora.

Ao contrário, o desejo de perpetuarmos nosso falso conceito de corpo e seu bem-estar nos amarra à morte, nos enleia na mortalidade.

Mais que a idéia de "acréscimo" vindo de 'fora', o primeiro passo para obtermos a imortalidade é viver a partir do CENTRO do nosso ser, como uma IDÉIA de DESDOBRAMENTO DO NOSSO ÍNTIMO.

É mais no sentido de DAR do que de receber, de SER mais que obter. Nessa consciência não há julgamento ou crítica, ódio ou medo, e sim um sentimento contínuo de amor e de perdão.

Não é coisa fácil descrever a alegria e a paz da imortalidade, pois para aqueles que não querem abandonar seus atuais conceitos de ser, ela pode transparecer um processo de extinção. Mas não é bem isso: ela é a eterna preservação de tudo o que é real, belo, nobre, harmonioso, gracioso, altruísta e pacífico. É a realidade, trazida à luz, em substituição à ilusão dos sentidos. É o despertar da consciência da infinitude do ser individual, em substituição ao sentido finito de existência. O egoísmo e o amor-próprio se vão de nós quando temos a percepção da divindade do nosso ser.

Esta percepção nos ensina a ser pacientes e indulgentes com aqueles que ainda lutam com a consciência material, mortal. E isto é estar no mundo, mas sem pertencer ao mundo.


quinta-feira, junho 18, 2009

Ensinamentos espirituais (Ramana Maharshi) - Final


Ramana Maharshi


Questão: A mente deve cessar sua atividade. Mas pedir para a mente voltar-se para dentro e buscar sua Fonte não é empregá-la?

R.: É claro, estamos usando a mente. É de conhecimento comum que a mente só pode ser extinta com a ajuda da mente. Mas a diferença é que ao invés de começar dizendo que a mente existe e que eu quero destruí-la, você começa buscando sua fonte, e quando você encontra a Fonte você vê que a mente não existe. A mente voltada para fora resulta em pensamentos e objetos; voltada para o interior, ela se torna ela mesma o Eu Real.

R.: Eu não disse que você deve ficar rejeitando pensamentos. Se você agarrar a si mesmo – ou seja, se você agarrar o pensamento-eu (ou ego) – e mantiver-se interessado apenas nesse único pensamento, então os outros pensamentos serão rejeitados e desaparecerão automaticamente.

R.: A investigação “Quem sou eu?” significa tentar encontrar a fonte do ego ou pensamento-eu. Então você não deve ocupar a mente com outros pensamentos, tais como “eu não sou o corpo”, etc. Buscar a fonte do “eu” é um meio de se livrar de todos os pensamentos.

R.: A individualidade (o pensamento “eu”) é aquilo que está consciente da existência dos pensamentos e da sua seqüência. Essa individualidade é o ego ou, como as pessoas dizem, é o “eu”.

R.: Você não precisa eliminar nenhum falso “eu”. Como pode o “eu” eliminar a si mesmo? Tudo o que você precisa fazer é encontrar a Fonte do “eu”, e permanecer lá. O seu esforço só pode levá-lo até este ponto. A partir daí, o Transcendental vai tomar conta de si mesmo. Você não pode fazer mais nada então. Nenhum esforço pode chegar até Ele.

R.: As noções de prisão e libertação são meras modificações/devaneios mentais. Se, por exemplo, a pessoa investigar (em busca dessa) fonte: “para quem existe a prisão e libertação?”, será descoberto que é “para mim”, isto é, para a própria pessoa. Se, então, ela investigar “Quem sou eu?” sinceramente, descobrirá que não existe o “eu” e “meu”. Aquilo que “sobra”, uma vez que o “eu” desaparece – na verdade este "eu" não desaparece, pois nunca chegou a existir. É mais correto dizer "uma vez que o eu é visto como inexistente"–, é realizado de forma vívida e direta como o Eu que ilumina a si mesmo e que é como é. Essa Realização viva é a experiência direta e imediata da Verdade Suprema, e vem naturalmente, sem nada de especial sobre ela, a todos aqueles que, permanecendo assim como são, mergulham interiormente sem permitir que a mente se exteriorize nem por um momento, e nem desperdiçam seu tempo em conversas vãs.

Questão: Imagine que eu tenha o pensamento “cavalo”, e procure saber de onde ele veio. Fazendo isso eu vejo que ele vem da memória, e que esta surgiu da percepção passada de um “cavalo”, mas isso é tudo.

R.: Quem lhe pediu para pensar tudo isso? Esses também são pensamentos... Qual é o bem que você espera ganhar pensando assim sobre a memória e a percepção? O “eu” que tem essa percepção e memória - de onde ele vem? Descubra. A percepção, a memória e qualquer outra experiência surgem sempre para este “eu”. Você não tem essas experiências durante o sono e mesmo assim você existe enquanto dorme, assim como existe agora. Isso apenas mostra que o EU continua enquanto as outras coisas vão e vem. (...)

R.: Você veio da mesma Fonte em que estava durante o sono.

Questão: Os Upanishads dizem: Aquele que conhece Brahman torna-se Brahman.

R.: Sim, isso ocorre em virtude da Unidade existente entre tudo o que é. Mas na verdade não se trata de “tornar-se” mas sim de Ser. “Não existe o ‘realizar' do Eu Superior” – você pode apenas sê-lO e em verdade você já o é. O Bhagavan costumava assim lembrar, aos que perguntavam, que apenas o Eu Real é, agora e sempre, e que não é algo novo a ser descoberto. Esse paradoxo é a essência do não-dualismo.

R.: Tudo o que você precisa fazer é abandonar a sua identificação com esse corpo e abandonar todos os pensamentos de coisas externas, isto é, de coisas que não são o Eu Real. Por mais que a mente se exteriorize em direção aos objetos dos sentidos, detenha-a e fixe-a no Eu. Esse é todo esforço que você precisa fazer.

R.: Todos buscam apenas aquilo que lhes trará felicidade. A sua mente divaga em direção aos objetos exteriores pois você acredita que encontrará felicidade neles; mas descubra de onde a felicidade realmente vem, mesmo a felicidade que você acredita originar-se dos objetos dos sentidos. Então você perceberá que toda felicidade vem apenas do Eu e, com isso, será capaz de permanecer no Eu (devido à força do seu desejo natural por felicidade).

R.: Concentração não é pensar sobre algo. Pelo contrário, é excluir todos os pensamentos, já que todos os pensamentos obstruem a experiência do verdadeiro ser da pessoa.

Questão: Se o “eu” é uma ilusão, quem é que afasta este “eu”?

R.: O “Eu” afasta a ilusão do “eu” e mesmo assim continua sendo “Eu” – tal é o paradoxo da Auto-Realização. Mas os seres Realizados não vêem nenhum paradoxo nisto.

(...)

R.: Você pode abandonar esta ou aquela das “minhas” posses; mas, ao invés disso, se você abandonar o “eu” e “meu”, tudo é abandonado de uma vez só, e a própria semente da posse é destruída. Com isso corta-se o mal pela raiz. Mas a força do desapego deve ser grande para que isso seja possível. A ânsia de fazer isso deve ser igual à ânsia de alguém que está sendo afogado e tem que subir à superfície para respirar.

R.: O que é necessário é manter-se sempre fixo no Eu Real. Os obstáculos a isso são, por um lado, as distrações causadas pelas coisas do mundo (incluindo objetos dos sentidos, desejos e tendências) e, por outro, o sono. (...) Mas outro método é simplesmente não se preocupar com o sono. Quando ele vem, ele vem sem esperar, e você não pode evitá-lo. Então simplesmente mantenha-se fixo no Eu Real, ou na sua meditação, em cada momento da sua vida desperta, e retorne à meditação no momento em que você acordar. Isso será suficiente. Assim, mesmo durante o sono, a mesma corrente de consciência estará trabalhando.

R.: Você nunca deve ficar satisfeito com qualquer experiência que tenha. Quer você sinta prazer ou medo, pergunte-se quem sente isso e continue seus esforços até que prazer e medo sejam ambos transcendidos e que a dualidade cesse, permanecendo assim apenas a Realidade. Não há nada de errado em experimentar essas coisas, desde que você não pare por aí.

R.: Não se importe se há visões, sons, vazio, ou qualquer outra coisa. Você está presente nessas experiências ou não? Você deve ter estado lá para poder dizer que experimentou um vazio. Permanecer fixo neste “você” do início ao fim é a busca. (...) É a mente que vê objetos e tem experiências que se depara com o vazio quando pára de ver e experimentar, mas essa mente não é você. Você é a iluminação constante que dá vida tanto à experiência quanto ao vazio.

(...) Nos versos 212 e 213 do Vivekachudamani, depois de o discípulo dizer: agora que eliminei os cinco revestimentos como sendo não-Eu, percebo que nada permanece”, o Guru responde que o Eu Real, ou ISTO, pelo qual todas as modificações são percebidas – inclusive o ego e suas criações e a ausência delas (o vazio) –, está sempre lá.

R.: A mente é pura por natureza, mas se contamina quando se envolve com os objetos. O ideal é mantê-la ativa em sua busca sem abrir as portas para as impressões sensoriais e sem pensar em outras coisas.

R.: Para aqueles que seguem jnana marga (o caminho do Conhecimento) a auto inquirição é suficiente para desenvolver todas as qualidades divinas – eles não precisam se preocupar em fazer mais nada.

R.: A Consciência que percebe o vazio é o Eu Real.

R.: Permaneça sem pensar. Enquanto houver pensamento haverá medo.

(...)

R.: Todo mundo está consciente da existência de si mesmo. No entanto as pessoas se esquecem dessa consciência e vão buscar Deus. Qual é a utilidade de fixar a atenção entre as sobrancelhas? O objetivo de tal conselho é ajudar a mente a se concentrar. É um método poderoso de controlar a mente e evitar sua disperção.

R.: Você deve considerar-se o sujeito, o observador; assim, o ponto no qual você fixa a sua atenção se torna o objeto visto. Isto é apenas bhavana. Quando, ao contrário, você vê o próprio observador, você mergulha no Eu Real e torna-se um com ele – isso é o Coração.

Questão: Não é útil fazer um voto de silêncio?

R.: Um voto é apenas um voto. Ele pode ajudar a meditação até certo ponto. Mas qual é a utilidade de meramente manter a boca fechada se você permite à sua mente mover-se desenfreadamente? Por outro lado, se a mente está envolvida na meditação qual a necessidade da fala? Nada é tão bom quanto a própria meditação. Qual é a utilidade de um voto de silêncio se a pessoa está absorta na atividade (mental)?

Questão: O que ajuda a concentração e, também, o que ajuda a superação das distrações?

R.: Fisicamente, o sistema digestivo e demais órgãos devem estar livres de irritação. Para isso a alimentação deve ser regulada em qualidade e quantidade. (...) Mentalmente, tenha interesse em apenas uma coisa e fixe sua mente nisso. Deixe esse interesse absorvêlo completamente excluindo todo o resto. Isso é desapego (vairagya) e concentração.

R.: Tudo o que se fala sobre a entrega é como roubar açúcar de uma imagem de açúcar de Ganesha e depois oferecê-lo ao mesmo Ganesha. Você diz que oferece seu corpo e alma e todas as suas posses a Deus – mas eles são seus para você poder oferecer? No máximo você pode dizer: “Eu erroneamente imaginei até agora que essas coisas, que na verdade são Vossas, eram minhas. Agora percebo que elas pertencem a Vós, e não mais agirei como se minhas fossem”. E isso é a entrega. E esse é o conhecimento de que não existe nada além de Deus (Brahman) ou Eu Real (Atman), de que “eu” e “meu” são meras ficções, e que apenas o Eu Real existe, é Jnana.

Questão: Gostaria de saber quais são os passos por meio dos quais eu posso atingir a entrega?

R.: Há dois caminhos. Um é buscar a fonte do “eu” e mergulhar nessa Fonte; o outro é sentir “eu sou impotente sozinho; apenas Deus é todo-poderoso, e a única maneira de eu estar seguro é me atirando completamente Nele”, assim desenvolvendo gradualmente a convicção de que apenas Deus existe, e de que o ego é irrelevante. Ambos os métodos levam ao mesmo objetivo. A entrega completa é apenas outro nome para Jnana ou Libertação.

R.: “Semelhante ao sono”, está correto. É o estado natural. Como você agora se identifica com o ego, você olha para o estado natural como se fosse algo que interrompesse seu trabalho ou prática. Então você deve ter essa experiência repetida até que você perceba que esse estado é seu estado natural.

Questão: Swami, como pode o domínio do ego ser afrouxado?

R.: Não se acrescentando novas vasanas (tendências mentais) a ele.

R.: O exame da natureza transitória das coisas exteriores leva ao desapego (vairagya). Assim, a investigação ou inquirição é o primeiro e mais importante passo. Quando ela se torna automática resulta em indiferença à riqueza, fama, conforto, prazeres, etc. Então o pensamento “eu” é investigado até chegar-se à fonte do “eu”, o Coração, que é a meta final.

R.: “Não se preocupe com a Libertação. Primeiro descubra se há aprisionamento. Investigue a você mesmo primeiro”.

Questão: Uma vez alcançada, pode a Auto-Realização ser perdida?

R.: A Realização leva tempo para se estabilizar. O Eu Real certamente está dentro da experiência direta de todos, mas não da forma como eles imaginam. Só se pode dizer que ele é como é. (...) Devido à flutuação das vasanas, a Realização demora a se estabilizar. A Realização súbita não é suficiente para acabar com o ciclo de renascimentos, e ela não pode se tornar permanente enquanto houver vasanas. Na presença de um grande mestre as vasanas deixam de ser ativas e a mente se torna quieta, de forma que o samadhi (absorção no Real) resulta, assim como na presença de vários meios (mágicos) o fogo não queima. Assim, na presença do mestre o discípulo ganha conhecimento verdadeiro e uma experiência correta. Mas para isso ser estabilizado é necessário um esforço adicional. Então o discípulo saberá que isso é seu verdadeiro Ser, e assim será libertado mesmo enquanto no corpo.

Questão: Esse método parece ser mais rápido que o método comum de desenvolver as virtudes postas como necessárias à Realização.

R.: Sim. Todos os erros e defeitos estão centrados no ego. Quando o ego desaparece a Realização resulta naturalmente.

R.: A paz só pode reinar quando não há perturbação, e a perturbação existe por causa dos pensamentos que surgem na mente. Quando a mente está ausente, há paz perfeita. A menos que a pessoa tenha "aniquilado" a mente, ela não pode ter paz e ser feliz. E se a própria pessoa não for feliz ela não poderá dar felicidade aos “outros”. Então, “EU-SOU” é Deus.

Questão: O que é samadhi?

R.: No yoga o termo é usado para indicar um certo tipo de transe (ou absorção meditativa), e há vários tipos de samadhi. Mas o samadhi sobre o qual estou falando é diferente; é sahaja samadhi. Nesse estado você permanece calmo e sereno durante a atividade. Você percebe que é movido pelo Eu Real dentro de você, e permanece não afetado por qualquer coisa que você faça, diga, ou pense. Nada te toca.

R.: Tanto o homem Realizado quanto o não Realizado tem sensações. A diferença é que o não realizado se identifica com o corpo que tem sensações, enquanto que o Iluminado sabe que tudo isso é o Eu Real, que tudo é Brahman (O Absoluto). Se há dor, deixe-a ser; ela também faz parte do Eu, e o Eu é perfeito.

Questão: Podemos pensar sem a mente?

R.: Os pensamentos podem continuar, assim como as outras atividades. Eles não perturbam a Consciência Suprema.

R.: Se você agarrar-se ao Eu Real, o surgimento das imagens não irá enganá-lo. Também não vai mais importar se as imagens aparecem ou desaparecem.


Ramana Maharshi fresco

segunda-feira, junho 15, 2009

Ensinamentos espirituais (Ramana Maharshi) - 02


Ramana Maharshi


R.: Por que os seus deveres ou ocupações na vida deveriam atrapalhar o seu esforço espiritual? Por exemplo, há uma diferença entre suas atividades em casa e no trabalho. No trabalho você está desapegado: você apenas cumpre o seu dever e não se importa com o que vai acontecer, não está preocupado com o ganho ou perda do seu chefe ou empregador. Os seus deveres com a família, por outro lado, são desempenhados com apego: você está sempre preocupado se as suas ações vão trazer benefício a você e sua família. Mas é possível desempenhar todas as atividades da vida com desapego e ver apenas o Eu Superior como real. É errado pensar que se você permanecer fixado interiormente no Eu Real os seus deveres na vida não serão bem desempenhados. É como um ator no palco: ele se veste do personagem, age como ele e até sente que é parte da peça, mas na verdade sabe que na vida real não é o personagem, mas outra pessoa. Da mesma maneira, por que deveria a consciência do corpo ou o sentimento “eu-sou-o-corpo” lhe perturbar, uma vez que você saiba que na verdade você não é o corpo mas sim o Eu Real? Nada que o corpo faça deveria afastá-lo da permanência como Eu real. Permanecer fixado no Eu Real não irá interferir com o desempenho adequado e efetivo de quaisquer deveres que o corpo tenha, assim como o fato de o ator saber a sua verdadeira identidade não interfere no personagem que ele representa no palco.

R.: Não há nenhuma lei que diga que as ações só podem ser feitas com base no sentimento “eu-sou-o-agente”, então não há motivo para perguntar se elas podem ser feitas e os deveres serem cumpridos sem essa noção. Pegue como exemplo o caso de um contador que trabalha o dia inteiro no escritório e cumpre suas tarefas diligentemente. Pode parecer aos olhos dos outros que ele está carregando nas costas todas as responsabilidades financeiras da instituição; porém, se ele estiver consciente que não é pessoalmente afetado pelas entradas e saídas de capital ele conseguirá permanecer desapegado e livre da noção “eu-sou-o-agente”, embora desempenhe suas tarefas perfeitamente bem. Da mesma forma, é possível a um sábio pai de família que busque ardorosamente a Libertação cumprir seus deveres sem nenhum apego, considerando a si mesmo apenas como um mero instrumento para isso. Uma atividade assim não é um obstáculo ao Caminho do Conhecimento (jnana-marga), e nem é o Conhecimento um fator que impeça o cumprimento dos deveres da vida. A Compreensão e a atividade nunca são mutuamente excludentes – uma não atrapalha a outra.

R.: Se os objetos tivessem uma existência independente, ou seja, se existissem fora e separados de você, então seria possível você se afastar deles. Mas eles não existem assim – a sua existência depende de você, do seu pensamento. Então onde você pode ir para fugir deles?

R.: A ação feita abnegadamente purifica a mente e a ajuda a concentrar-se na meditação.

Questão: Mas e se eu fosse apenas meditar constantemente sem fazer mais nada?

R.: Tente e veja. As suas tendências mentais inerentes não lhe deixarão em paz. A meditação só acontece passo a passo, através do enfraquecimento dessas tendências por meio da graça do Guru.

Questão: Eu não sinto mais nenhum prazer em minha vida familiar. Não me resta mais nada para fazer lá; eu fiz tudo o que deveria ser feito e agora já tem netos e netas na casa. Eu deveria continuar lá ou deveria abandonar a casa e ir embora?

R.: Você deve ficar onde você está agora. Mas onde está você? Você está na casa ou a casa está em você? Existe alguma casa separada de você? Se você se estabilizar na sua própria morada você verá que todas as coisas desaparecerão em você e perguntas como essas se tornarão desnecessárias.

Questão: Então eu devo continuar em casa?

R.: Você deve continuar no seu verdadeiro estado.

R.: O mundo está apenas na mente. (...) Renúncia é a não-identificação do Eu com o não-Eu. Quando a ignorância desaparece, o não-Eu cessa de existir. Essa é a verdadeira renúncia.

R.: Os esforços sinceros nunca falham – com certeza eles resultarão em sucesso.

R.: No entanto, é mil vezes mais tolo querer carregar o seu próprio fardo uma vez que se tenha iniciado a busca espiritual, quer seja pelo caminho do conhecimento (jnana) quer pelo da devoção (bhakti).

R.: O Senhor do universo carrega todo o fardo – você apenas imagina fazê-lo. Você pode seguramente entregar todos os seus fardos e problemas a Ele. Então o que quer que você precise fazer acontecerá no momento certo, e você será apenas um instrumento para isso. Não imagine que você não possa agir a não ser que tenha o desejo de fazê-lo. Não é o desejo que lhe dá a força necessária [para agir] – a força é a de Deus.

R.: Por que se preocupar com o futuro? Você nem conhece o presente direito. Cuide do presente e o futuro cuidará de si próprio.

R.: Como você é, assim é o mundo. Qual é a utilidade de tentar entender o mundo sem entender a si mesmo? Os buscadores da Verdade não precisam se preocupar com isso. As pessoas desperdiçam sua energia com essas perguntas desnecessárias.

R.: Durante o seu trabalho a pessoa deve se render ao Poder Maior e nunca perder de vista que é este Poder que faz tudo. Então como ficar orgulhoso? A pessoa não deveria nem se preocupar com o resultado de suas ações. Só assim o karma será altruísta.

Questão: Se existissem cem pessoas que realizaram o Eu Real, isso não seria um benefício maior ao mundo?

R.: Quando você diz “Eu Real” você está se referindo ao ilimitado, mas quando você fala em “pessoas” você limita o significado. Há apenas um Eu Infinito.

(...)

Questão: Na Europa as pessoas não entendem que um homem pode ajudar a humanidade mesmo vivendo isolado. As pessoas imaginam que apenas aqueles que trabalham no mundo podem ser úteis. Quando essa confusão vai terminar? A mente dos europeus vai continuar patinando na lama ou vai compreender a Verdade?

R.: Esqueça-se de “Europa” ou “América”. Onde eles estão senão na sua própria mente? Compreenda o seu verdadeiro Eu e então tudo mais é compreendido. Se você vê inúmeras pessoas em um sonho e depois acorda e se lembra do sonho, você vai tentar descobrir se essas pessoas que você criou no sonho também estão acordadas?

Questão: Um Guru é realmente necessário?

R.: Isso depende do que você chama de Guru. Um Guru não precisa necessariamente ter uma forma física. Dattatreya disse que teve vinte e quatro Gurus – os cinco elementos, etc. Isso quer dizer que tudo no mundo era seu Guru. O Guru é absolutamente necessário. Os Upanishads dizem que ninguém além do Guru pode tirar o homem da selva das percepções sensoriais e formações mentais; logo, o Guru é indispensável.

R.: É verdade que o Ser do Guru é idêntico ao do discípulo. No entanto, apenas muito raramente uma pessoa pode compreender seu verdadeiro Ser sem a graça do Guru.

R.: O mestre está no interior. Se ele fosse um ser estranho pelo qual você espera, ele também estaria fadado a desaparecer. De que adianta um ser transitório como esse?

(...)

Questão: Então, o que o devoto deve fazer?

R.: Ele só precisa viver de acordo com as palavras do Mestre e trabalhar no seu interior. Com o tempo você perceberá que a Felicidade só surge quando você deixa de existir. A fim de alcançar esse estado você deve entregar-se. Então o mestre perceberá que você está em um estado propício para receber o ensinamento, e assim Ele irá guiá-lo.

R.: Se o eu individual for buscado ele não será encontrado em lugar algum. Isso é o Guru. Assim era Dakshinamurti.

Questão: Então Bhagavan tem discípulos?

R.: Como eu disse, do ponto de vista do discípulo a Graça do Guru é como um oceano: se ele vier com um copo ele sairá com um copo cheio. Não faz sentido dizer que o oceano é mesquinho; quanto maior for o recipiente mais água ele poderá carregar. Depende tudo do discípulo. Eles dizem que estou morrendo, mas eu não vou embora. Para onde eu poderia ir? Eu estou aqui.

Continua...

sábado, junho 13, 2009

Ensinamentos espirituais (Ramana Maharshi) - 01

Ramana Maharshi


Questão: Existem graus de ilusão?

Ramana: A ilusão é em si ilusória. Ela deve ser vista por alguém que encontra-se fora dela, mas como pode um observador assim estar sujeito a ela? Então, como ele pode falar de graus de ilusão?

R.: A ilusão é aquilo que faz os seres tomarem por real e existente por si aquilo que é inexistente e irreal, isto é, a trilogia mundo-ego-Deus.

R.: A essência da mente é apenas atenção ou consciência. Entretanto, quando o ego nubla a mente, esta adota as funções de raciocínio, pensamento e percepção. A mente universal, não sendo limitada pelo ego, não tem nada exterior a si, e portanto ela é apenas consciência. É isso o que a Bíblia quer dizer com “EU SOU O QUE EU SOU”.

Questão: Quando eu procuro o “eu” eu não vejo nada.

R.: Você diz isso porque você está acostumado a identificar o seu eu com o seu corpo e a sua visão com os seus olhos. O que existe para ser visto? E por quem? E como? (...) Na verdade não há nada para ver. Como você se reconhece agora? Você precisa pôr um espelho na sua frente para reconhecer a si mesmo? A consciência em si é o “eu”. Realize-a e isto é a verdade.

Questão: Quando eu investigo a origem dos pensamentos há a percepção do “eu”, mas isso não me satisfaz.

R.: Exatamente. Isso acontece porque essa percepção de “eu” está associada a uma forma, talvez a forma do corpo físico. Mas nada deveria ser associado ao Eu puro. Tudo o que nasce deve morrer; tudo o que é adquirido será perdido. Você nasceu? Não, você existe eternamente. O Eu Real nunca pode ser perdido.

R.: Se os méritos e deméritos de um homem são iguais ele renasce imediatamente na Terra; se os seus méritos superam seus deméritos ele primeiro vai ao céu em seu corpo sutil, já se seus deméritos superam seus méritos ele vai primeiro ao inferno. Mas em ambos os casos ele renasce posteriormente na Terra. Tudo isso é descrito nas escrituras, mas na verdade não existe nem nascimento nem morte; cada um simplesmente permanece como realmente é. Apenas isso é a Verdade.

Questão: Mas a partir de meu próprio nível de entendimento eu vejo a mim mesma e ao meu filho como reais.

R.: Você pensava sobre o seu filho antes dele nascer? O pensamento veio depois dele nascer, e continua após sua morte (a do filho). Ele só é o seu filho na medida em que você pensa nele. Para onde ele foi? Para a fonte de onde ele surgiu. Enquanto você continuar existindo ele continua também. Mas se você deixar de se identificar com o corpo e realizar o Eu Real, essa confusão desaparecerá. Você é eterna, e verá que os outros também o são. Enquanto isso não for realizado haverá sempre a tristeza e o desgosto, fruto dos falsos valores que são produzidos pelo conhecimento errôneo e pela identificação errônea.

R.: Que felicidade você pode obter das coisas exteriores a você mesmo? E quando você a obtém, quanto tempo ela dura?

R.: Se você negar o ego e ignorá-lo, você estará livre. Se você o aceitar, ele irá lhe impor limitações e levá-lo a lutar em vão para superá-las. Foi assim que o “ladrão” arruinou o Rei Janaka. Ser o "Eu" que você realmente é, é o único meio de realizar a Bem-Aventurança que é sempre sua.

R.: (Palavras ditas à devota que tinha perdido seu filho) - A tristeza só existe enquanto a pessoa pensa que possui uma forma definida, mas se a forma for transcendida, a pessoa conhecerá o Eu Único como eterno. Não existe nascimento nem morte. Apenas o corpo nasce, e o corpo é uma criação do ego. No entanto, o ego não é comumente percebido sem o corpo, e por isso você o identifica com o corpo. O que importa é o pensamento. (...) Se um homem pensa que ele nasceu ele inevitavelmente sentirá medo da morte. Deixe que ele descubra se ele alguma vez nasceu ou se existe nascimento para o Eu Real.

Questão: Se alguém que nós amamos morre isso nos faz sofrer. Nós deveríamos, então, para evitar este sofrimento, amar a todos igualmente ou não amar ninguém em absoluto?

R.: Se alguém que amamos morre isso causa sofrimento àquele que continua vivo. A maneira de se livrar do sofrimento é não continuar vivendo. Mate o sofredor – assim quem estará lá para sofrer? O ego deve morrer, é o único jeito. As duas alternativas que você sugere dão no mesmo. Quando percebemos que todos são apenas o Eu Único, quem está lá para amar ou odiar?

(...)

Questão: Estou com dor de dente – isso é apenas um pensamento?

R.: Sim.

Questão: Então por que eu não consigo simplesmente pensar que meu dente está normal e assim me curar?

R.: Não se sente a dor de dente quando se está absorto em outros pensamentos ou quando se está dormindo.

Questão: Mas ela ainda sim continua.

R.: A convicção humana de que o mundo é real é tão forte que é difícil se libertar dela. Mas o mundo não é mais real do que o sujeito que o vê.

Questão: Atualmene está acontecendo a guerra Sino-Japonesa. Se ela é apenas imaginação, pode o Bhagavan imaginar que ela não está acontecendo e assim acabar com ela?

R.: (Rindo) O Bhagavan que você vê (como um ser exterior) é tanto um pensamento seu quanto a própria guerra Sino-Japonesa.

R.: A Bem-Aventurança do Eu Real só pode se manifestar numa mente que se torna sutil e estável por meio da meditação. Aquele que experimenta essa Bem-Aventurança alcança a libertação ainda neste corpo. Isso é possível, mas insisto e dizer que você necessita buscar e manter uma pureza mental. Se você simplesmente não conseguir resistir às tendências inferiores, será preciso fazer um maior esforço de sua parte. E se mesmo assim você não puder conseguir, apenas confie em Deus.

R.: O livre arbítrio é o presente surgindo para uma faculdade limitada de visão e vontade. Este mesmo ego, quando olha para suas atividades passadas, percebe que elas se desenvolveram segundo certas “leis” ou regras – sendo o seu próprio livre arbítrio um dos elos dessa corrente causal. Então o ego percebe que a Onipotência e Onisciência Divinas agiram através do seu aparente livre arbítrio. Então a pessoa chega à conclusão de que o ego é guiado pelas aparências.

Questão: Os deuses, Ishvara e Vishnu, e seus céus, Kailas e Vaikuntha, são reais?

R.: Tão reais quanto você no seu corpo.

Questão: O que eu quero saber é se eles possuem uma existência fenomenal, tal como o meu corpo, ou se são meras ficções, tais como os chifres de uma lebre?

R.: Eles de fato existem.

Questão: Sendo assim, eles devem estar em algum lugar. Onde eles estão?

R.: Em você. Arunachala está dentro e não fora. O Eu Real é Arunachala. Por que se preocupar com Deus? Nós não sabemos se Deus existe, mas sabemos que existimos, então primeiro concentre-se em si mesmo. Descubra quem você é. Todo o Vedanta está contido nas duas declarações bíblicasEu sou o que Eu sou” e “Aquiete-se, permaneça imóvel e saiba que Eu sou Deus”.

Questão: Então o que me impede de conhecer a mim mesmo ou Deus?

R.: A sua mente que divaga e seus caminhos desvirtuados.

R.: Entregar-se completamente significa que você deve aceitar a vontade de Deus, e não reclamar do que não lhe agrada. As coisas podem se revelar diferentes do que pareciam. O sofrimento e a aflição muitas vezes levam a pessoa a ter fé em Deus.

R.: Eles rezam a Deus e no final da oração dizem: “Seja feita a Vossa vontade”. Se a vontade Dele vai ser feita, então por que eles oram? (...) Não é necessário dizer a Ele o que você precisa. Ele conhece muito bem suas verdadeiras necessidades, e cuidará de atendê-las.

Questão: As nossas preces são atendidas?

R.: Sim, elas são atendidas. Nenhum pensamento é emitido em vão. Cada pensamento produzirá o seu efeito em um ponto ou em outro. A força do pensamento nunca será em vão.

R.: O homem é pecado. Mas você não é o homem - nunca se esqueça disso. Você é o Eu Verdadeiro. Não existe o sentimento de ser um "ser humano" durante o sono profundo. O pensamento-corpo faz nascer a idéia do pecado. O nascimento do pensamento em si é o pecado.

Questão: Mas qual é o método?

R.: Volte para o lugar de onde você veio.

Questão: De onde eu vim?

R.: É exatamente isso que você precisa descobrir.

(...)

Questão: Qual é a prova que tenho?

R.: Alguém precisa de alguma prova de sua própria existência? Apenas esteja consciente de si mesmo e todo o resto será conhecido.

Questão: Então por que os dualistas e não-dualistas discutem tanto?

R.: Se cada um deles se ocupasse apenas da sua tarefa (de buscar a Realização) não haveria discussões.

R.: É verdade que não estamos aprisionados. Quer dizer, para o Eu Real não há prisão. E também é verdade que cedo ou tarde você retornará à sua Fonte. Mas enquanto isso, se você cometer más ações, como você as chama, você terá que enfrentar as suas conseqüências. Você não pode escapar disso. Se um homem lhe bate, você pode dizer “Eu sou livre. Eu não sou afetado pela surra e a dor não existe para mim.” e deixar ele continuar batendo? Se você realmente chegou a esse ponto então você pode fazer o que quiser; caso contrário, qual é a utilidade de apenas dizer em palavras que você é livre [enquanto ainda não é]? Todas as atividades que o corpo deve passar foram determinadas no momento em que ele veio à existência. Não cabe a você aceitá-las ou rejeitá-las. A única liberdade que você tem é voltar-se para dentro e aí renunciar às atividades.

R.: Por que este corpo surgiu? Ele foi feito para passar pelas várias experiências que foram determinadas para a pessoa nesta vida... Quanto à liberdade, o homem é sempre livre para não se identificar com o corpo e para não se deixar afetar pelos prazeres e dores resultantes das atividades do corpo.

Questão: O ser humano tem algum livre arbítrio ou tudo na sua vida é predeterminado?

R.: O livre arbítrio existe junto com a individualidade. Enquanto houver individualidade haverá livre arbítrio. As escrituras todas se baseiam nesse ponto e aconselham direcionar o livre arbítrio na direção certa. Predestinação na teoria, mas o livre arbítrio na prática.

R.: Assim, a consciência natural e não discriminativa só é alcançada depois do esforço da meditação. A forma da meditação vai depender do que lhe atrai mais. Veja o que lhe ajuda a afastar todos os outros pensamentos e adote isso para sua meditação.

R.: Se você consegue apenas permanecer quieto sem se envolver em nenhuma outra atividade, isso é ótimo. Mas se isso não for possível, qual é a utilidade de permanecer inativo apenas em relação à busca pela Realização (e ativo em relação ao resto)? Enquanto houver ego, o esforço é necessário. Quando o ego cessa as ações se tornam espontâneas. Ninguém tem sucesso sem esforço. O controle da mente não é seu direito de nascença – os poucos que dominam a mente alcançaram isso graças ao seu esforço perseverante. O esforço é necessário até o momento da Realização.

R.: Você pensar que deve fazer um esforço para se libertar desse sonho da vigília, mas os esforços que você faz para alcançar a Realização, são tudo partes do sonho.

R.: Entregue-se de uma vez por todas e acabe com o desejo. Enquanto houver a noção de que você é o agente, o desejo vai continuar, e, da mesma forma, o ego também.
Continua...

segunda-feira, junho 08, 2009

A inquirição silenciosa




Pergunta – Mestre, essa "não-mente" da qual o senhor fala, seria o fluir da intuição, ou algo diferente disso?

Mooji - Isto que não é esta mente, não é um outro tipo de mente. É como se fosse um espaço, mas eu não quero dar uma imagem a isso, porque a mente em si, ela rapidamente dá uma imagem a algo que não tem uma imagem. A única coisa que eu posso falar seria: tudo que você percebe é um pensamento, sensação, emoção, sentimentos, objetos, o que você chama de mente, memórias, qualquer coisa que é percebida, não pode existir sem você que a perceba.

Isto é um ponto muito simples, um senso comum. Você não deve pensar que é algo complexo, ou profundo. No momento em que você entende o que eu falei, você vê o quão simples é. Você está observando todas estas coisas. Então experimenta quem você é, experimenta quem percebe todas as coisas. Pode você, que está observando todo o resto, pode você ser observado? Tente ver. O que é você? Não pense sobre isso. Olhe, encontre!

É tão fácil simplesmente perder esta oportunidade. Eu me pergunto se você entende a profundidade desta oportunidade. Poucas pessoas percebem. Esta é a descoberta mais alta que você pode fazer. Porque põe um fim à separação. E talvez a gente esteja ainda investindo em separação. A sua mente ainda está investindo em separações. E enquanto a sua mente ainda está investindo em separações, você está na roda da existência. Enquanto sua mente está ainda investindo em separação, e você está investindo na mente, você não vai conhecer a liberdade completa. Talvez você nem queira! Porque se você estiver tão profundamente hipnotizado com a associação com a mente, o que estou falando não vai ter interesse pra você.

Pergunta - E esse sem-esforço, de onde vem? Como se percebe este sem-esforço?

Mooji - Parando de fazer esforço. Você pergunta de onde a falta de esforço vem, mas você deve entender que todo o esforço surge do não-esforço. A falta de esforço é estável, o esforço é instável. O esforço é variável. A falta de esforço é constante. E você é esta falta de esforço.

Mas se você usa sua mente para aceitar o que eu estou falando, a mente diz: mas como eu posso achar esta falta de esforço? Qual é o esforço certo para ser "sem esforço"? Quando você observa esta resposta que vem vindo da mente, não se identificando com ela, não comprando a sua sugestão, você mantém-se quieto. Observe, então, que isto é mais só um pensamento. Deixe o pensamento acontecer. Mas não entre em nenhuma relação com isso. Então, qual será sua experiência? Sua experiência é que nada te toca. Você não consegue se achar como um objeto fenomenológico. Você não é um fenômeno. Você é a testemunha do fenômeno.

Você entende isso, você vê isso? Isso é direto. Você não tem que ir a uma universidade pra aprender isso. Você não tem que ir morar numa caverna pra entender isso, você não tem que ser iniciado pra entender isso. Você não tem que recitar nenhum mantra pra saber disso. Essa é a verdade indissolúvel e transparente.

Quem é você? Você pode escrever algo sobre você que seja verdade, na luz do que estou compartilhando com você? Você pode ser descrito? Ou você é aquilo que percebe aquela descrição?

(...) Dizem que a coisa mais simples é a mais difícil de ser reconhecida. O que está longe é o mais fácil de ver. Aquilo que é o mais íntimo não pode ser visto. E a verdade está mais próxima do que a intimidade. Como e por quem pode ser vista? Algo diferente da verdade?

A maioria das pessoas quer um tipo de experiência porque quando você tem uma experiência, você pensa: algo especial aconteceu. Mas aquele que é verdadeiramente livre está além da experiência. Ele experimenta a experiência. Vocês entendem o que estou falando?

Aquele que testemunha a experiência, pode Aquele ser experimentado? Você está absorvendo a pergunta, ou você está só ouvindo mentalmente? Existe coragem para convidar esta pergunta pra dentro do coração? Você tem que ter a coragem do Buda. E o que é esta coragem do Buda? Esta pergunta é como uma granada. A coragem do Buda é aquele que vai para um lugar quieto com esta pergunta, que é uma granada, e tira o pino. Quem entende isso?

Se você se identificar com a mente, você vai deixar a mente escapar, porque você tem medo da possibilidade deste descobrimento. Mas por que você deveria ter medo de descobrir aquilo que você já é? É tão tolo assim. Não escute somente mentalmente. Aceite dentro de você. Eu fiz pergunta a vocês, mas eu não quero nenhuma resposta. Porque a maioria das respostas vem da mente. Fiz a pergunta. Coloquei esta pergunta como uma granada na sua mão. Você vai puxar o pino?

Pergunta - Pode repetir a pergunta?

Mooji - Você vê tudo. Tudo o que você vê e experimenta no mundo, tudo o que está preso na sua mente, tudo o que você percebe ser importante neste mundo, incluindo a idéia que você tem de você mesmo, tudo isso está sendo guardado na sua memória, existe somente em você.

Você pode acreditar que existe dentro de cada um, mas em cada pessoa isso existe de forma única como uma percepção subjetiva. Então, você é o centro do seu universo.

Você é experiência do seu universo. Então, quem é você? Quem é você que percebe todas essas coisas?

Se tem um sentimento dentro de você que o está perturbando, pode este sentimento estar dentro de você sem você, pode existir sem você, que o percebe? Mesmo a mudança mais sutil que acontece dentro de você, você é o que está consciente desta mudança.

Quem ou o que é você?
Você pode ser visto?
Você pode se apresentar?
Qual sua forma?
Você tem desejos?
Você tem data de nascimento?
Você tem um signo?
Aquilo que vê todo o resto...

Olhe e veja! Você pode passar os próximos 10 anos fazendo isso, mas você também pode achar em 10 segundos. Você escolhe.

O que acontece com você quando você olha através desta pergunta? Eu não quero sua resposta mental. Ela não é fresca. Ela é velha.

sexta-feira, junho 05, 2009

A natureza adora se ocultar (Osho)

“É melhor que as coisas não aconteçam às pessoas
Exatamente como elas querem.
A menos que você espere o inesperado,
Jamais encontrará a verdade,
Pois é árduo descobri-la,
É árduo atingi-la.
A natureza adora se ocultar.
O senhor cujo oráculo está em Delfos
Nem fala nem encobre – mas dá sinais.”

(Heráclito, 500 a.C)




A existência não tem linguagem e, se você depender da linguagem, não poderá haver comunicação com a existência. A existência é um mistério, você não pode interpretá-la. Se você interpretar, errará o alvo. A existência pode ser vivida, mas não pensada. Ela é mais como a poesia e menos como a filosofia. Ela é um sinal, uma porta. Ela mostra, mas nada diz.

É por isso que, por meio da mente, não há acesso à existência. Se você pensar sobre ela, pode continuar a pensar e a pensar, sobre isto e aquilo, mas nunca a alcançará – porque a barreira é precisamente o pensar.

Olhe, perceba, sinta, toque – e você estará mais próximo. Mas não pense. No momento em que entra o pensamento, você saiu da trilha e caiu num mundo particular. O pensar é um mundo particular, ele lhe pertence. Então você fica fechado, encapsulado, aprisionado dentro de si mesmo. Se não pensar, você deixa de estar, deixa de ficar fechado. Se não pensar, você se abre, fica poroso; a existência flui em você e você nela.

Mas a tendência da mente é interpretar. Antes de perceber algo, você já o interpretou. Você me ouve – mesmo antes de eu dizer algo, você já está pensando algo a respeito. É assim que o ouvir se torna impossível.

Você precisará aprender a ouvir. Ouvir significa estar aberto, vulnerável, receptivo, mas você não está de maneira nenhuma pensando. O pensar é uma ação positiva, o ouvir é passividade: você se torna como um vale, como um útero, e recebe. Se você puder ouvir, então a natureza fala – mas não é uma linguagem. A natureza não usa palavras. O que a natureza usa? Heráclito diz que ela usa sinais. Uma flor está presente – qual o sinal que ela transmite? Ela não está dizendo coisa nenhuma, mas você pode dizer realmente que ela não está dizendo coisa nenhuma? Ela está dizendo muito, mas não está usando nenhuma palavra – uma mensagem sem palavras.

Para ouvir a ausência de palavras, você precisará não ter palavras, porque somente semelhante pode ouvir semelhante. Ao sentar-se ao lado de uma flor, não seja um ser humano, seja uma flor; ao sentar-se ao lado de uma árvore, não seja um ser humano, seja uma árvore; ao tomar banho num rio, não seja um ser humano, seja um rio. E então, milhões de sinais serão transmitidos a você, e não se trata de uma comunicação, mas de uma comunhão. A natureza fala, fala em milhares de línguas, mas não em linguagem. Ela fala por meio de milhões de direções, mas você não pode consultar um dicionário a respeito, não pode perguntar a um filósofo o que ela quer dizer. No momento em que você começa a pensar o que ela quer dizer, já está se extraviando.

Um homem muito instruído, um crítico, foi visitar Picasso. Ele olhou para as pinturas de Picasso e disse: “São bonitas, mas o que você quer dizer com elas? Por exemplo, esta pintura, o que ela quer dizer?”

Picasso deu de ombros e disse: “Olhe para fora da janela – o que aquela árvore quer dizer? E aquele pássaro cantando? E qual é o sentido do alvorecer? E, se este todo existe sem significar coisa nenhuma, por que minhas pinturas precisam ter algum significado?”

Por que você pergunta pelo significado? Você quer interpretar, quer dar um padrão lingüístico, quer comunicar, e não comungar. Não, a natureza não quer dizer coisa nenhuma. Ela está presente em sua glória total. Ela é um significado, mas não quer dizer coisa nenhuma. O significado é existencial. Olhe, observe, sinta, penetre nela, deixe que ela penetre em você – mas não faça perguntas. Se você quer fazer perguntas, entre numa universidade; você não pode entrar no Universo. Se você quer entrar no Universo, não pergunte – não há ninguém para lhe responder. Você precisará ter uma qualidade de ser totalmente diferente e, somente então, estará em contato com ele.

Há um relato sobre um mestre zen – um fenômeno muito raro, inacreditável, porque a mente se assusta – que estava fazendo uma pintura no palácio do rei. E o rei repetidamente lhe perguntava se ela já estava pronta.

O mestre dizia: “Espere um pouco mais, espere um pouco mais”.

Passaram-se anos e o rei disse: “Está levando muito tempo. Você não deixa nem mesmo eu dar uma olhada” – porque ele trancava o quarto em que pintava – “e estou ficando velho. Estou cada vez mais curioso para saber o que você está pintando. A pintura ainda não está pronta?”

O mestre respondeu: “A pintura está pronta, mas estou esperando você – você não está pronto. A pintura ficou pronta há muito tempo, mas esse não é o ponto. A menos que você esteja pronto, para quem eu a mostrarei?

A existência está aí, pronta, sempre esperando. A cada momento, a cada curva da estrada, logo na esquina, ela está sempre esperando e esperando. Ela tem uma paciência infinita – mas você não está pronto.

Diz-se que finalmente o rei ficou pronto e o pintor disse: “Tudo bem, chegou a hora”. Eles entraram no quarto – ninguém mais teve permissão de entrar. A pintura era realmente maravilhosa. Era difícil dizer se era realmente uma pintura – ela parecia real. O mestre fez uma pintura de colinas e vales que pareciam tridimensionais, como se existissem de fato. Entre as colinas havia um pequeno caminho levando a algum lugar.

Agora vem a parte mais intricada da história. O rei perguntou: “Esse caminho vai dar aonde?”

O pintor disse: “Ainda não andei por ele, mas espere, vou ver”. Ele entrou no caminho e desapareceu além das colinas e nunca mais voltou.

É isto o que significa um mistério: ele diz muitas coisas sem nada dizer.

Se você for à natureza para descobrir aonde ela vai dar, não fique de fora para perguntar, porque assim nada pode ser feito. Você precisa penetrar nela. Se você penetrar, nunca voltará, porque o próprio movimento em direção à existência... e você perde o seu ego, você desaparece. Você atingirá o objetivo, mas nunca voltará para relatar a história. O pintor nunca voltou. Ninguém voltou, ninguém pode voltar, porque quanto mais existencial você se tornar, mais seu ego se perderá.

A existência abre milhões de portas para você, mas você fica de fora e quer saber algo à respeito de fora. Na natureza, não existe fora. Tudo está dentro... porque como algo pode existir fora da natureza? O todo é o interior. E a mente está tentando o impossível, está tentando ficar de fora, observar, perceber o que ela significa. Não, você precisa participar, precisa entrar nela, se integrar e se dispersar como uma nuvem – em algum lugar desconhecido.


Agora preste atenção nestas palavras de Heráclito:

“É melhor que as coisas não aconteçam às pessoas exatamente como elas querem...”

Por que? Por que não seria melhor? Porque tudo o que você deseja está errado, pois você está errado – como você pode desejar ou querer algo certo? Para desejar algo certo, em primeiro lugar, você precisa estar certo. A partir da ignorância, tudo o que for desejado o levará a um inferno cada vez mais profundo, porque um desejo é parte de você, ele vem de você. Como algo diferente pode vir? Tudo o que vier será você. É por isso que seus desejos criam cada vez mais problemas. Quanto mais você desejar, mais problemas criará. Quanto mais satisfizer seus desejos, mais estará em dificuldades. Mas não há retorno, você precisa seguir em frente. Daí a insistência de todos os que sabem: para encontrar a existência, o primeiro ponto é entrar num estado de ausência de desejos.

Nada está errado em desejar; desejar, em si, é belo... se um Buda desejar. Mas você desejar? Como você pode desejar algo que o conduzirá ao estado de graça? Não – porque o desejo vem de você, ele é parte de você. Ele é uma continuidade e, se você estiver errado, o desejo estará errado. Ele continuamente repetirá você – em diferentes situações, é claro, em diferentes mundos, em diferentes planetas, em diferentes vidas, mas seu desejo repetirá você. Seu desejo não pode transformá-lo. É por isso que digo às pessoas: “Se você tem intenção de ser iniciado, se tem a intenção de dar um salto no desconhecido, não pense a respeito – deixe isso comigo”. Por que a ênfase em deixar comigo? Somente para que você não o deseje. Deixe que seja algo que não venha de você, porque tudo o que vier de você será você – modificado, colorido de maneiras diferentes, mas será você.

Se você for um negociante e deseja moksha, a libertação, isso será um negócio, e não pode ser de outra maneira. Você estará procurando lucros – no outro mundo, é claro, mas tudo o que vier de sua mente será a partir do seu passado. E uma quebra é necessária, uma completa cisão é necessária, uma cisão intransponível.

Esse é o significado de ir até um mestre e se entregar. O que você entrega? Você entrega o seu desejar – o que mais você pode entregar? Você não tem mais nada. Você diz: “Agora não desejarei. Agora diga algo e o farei”. Você está permitindo que uma outra coisa entre em seu passado. Se você disser: “Sim, estou convencido, estou pronto a ser iniciado”, a iniciação será inútil. Se a iniciação acontecer a partir da sua convicção, ela não tem sentido. Mas este é o problema: primeiro você gostaria de ser convencido, primeiro gostaria de argumentar a respeito. Sua mente gosta de decidir.

Pessoas me procuram e dizem: “A menos que o desejo nasça em nós, como poderemos dar o salto?” Mas o problema é precisamente esse. Continuamente você tem desejado a partir de você mesmo, por muitas vidas, e isso não o levou a lugar nenhum – não pode levar. Você pode perceber o ponto? Você está errado, você deseja, e o desejo está errado. É isto. Você está errado, você acredita, e a crença está errada.

Você ouviu falar do rei Midas? Tudo o que ele tocava transformava-se em ouro. Tudo o que você toca, mesmo se for ouro, imediatamente se transforma em poeira. A questão não é um desejo correto ou incorreto. A questão não é um ato correto ou incorreto. Não existe tal coisa como um ato correto ou incorreto, e não existem desejos corretos ou incorretos. Existe somente um ser que deseja. Se ele for ignorante, tudo o que vier dele será incorreto. E, se o ser que deseja não for ignorante, algo totalmente diferente nasce a partir dele.

Lembre-se: o ser importa, e somente o ser importa – e nada mais.

“É melhor que as coisas não aconteçam às pessoas exatamente como elas querem...”

Pare de querer! Você tem vivido em infernos porque tem desejado. Pare de desejar! Pare de desejar e as portas se abrem. O desejo reforça a sua mente.

Tente entender a natureza do desejo. Desejar significa projetar o seu passado no futuro. E o futuro é desconhecido, e tudo o que você pedir será a partir do passado. Todo desejo repetirá continuamente o passado. Como você pode desejar o desconhecido? Como pode desejar o que está no futuro? Você não o conhece. O futuro é o desconhecido, o passado é o conhecido. Se você desejar será a partir do passado.

Mulla Nasruddin estava em seu leito de morte. Alguém lhe perguntou: “Se você nascer de novo, gostaria de viver de modo novo, ou gostaria de ter a mesma vida?”

Mulla ruminou bastante e, finalmente, abriu os olhos e disse: “Sempre quis partir o cabelo ao meio. Essa seria a única mudança. Eu sempre penteio o cabelo para a direita, e sempre quis parti-lo ao meio. Quanto ao resto, tudo seria igual ao que é”.

Parece estúpido, mas é assim que acontece. Se você pensar, se um outra chance for dada a você, o que você faria? Todas as mudanças que você gostaria de fazer não seriam mais do que o pedido de Mulla. Elas seriam apenas partir o cabelo ao meio. Você gostaria de ter uma outra mulher – mas que diferença faria? Você gostaria de ter outra profissão. Que diferença isso faria? Não seria mais do que partir o cabelo ao meio.

Você não pode pedir o passado, e o futuro é desconhecido. Por você ficar pedindo o passado, caminha num círculo vicioso. Esse círculo é o mundo, o sansar, o ir e vir, o nascer de novo e o morrer de novo. Repetidamente você faz a mesma coisa. Nenhuma mudança básica! Não pode haver, porque tudo o que você pensar, pensa a partir do conhecido. O conhecido é o seu passado. Então, o que fazer? Não deseje. Deixe que o futuro venha sem desejá-lo. O futuro virá – ele não precisa ser desejado. Ele já está vindo! Você não precisa forçar as suas projeções sobre ele. Seja passivo, não seja ativo a respeito. Deixe que ele venha. Não peça nada – esse é o significado da ausência de desejo. Não se trata de sair do mundo, de renunciar ao mundo e ir para o Himalaia – todas essas coisas são imaturas.

Partir, renunciar, significa não desejar – e esperar sem qualquer desejo, apenas esperar: “Tudo o que acontecer, serei uma testemunha”. Se você puder esperar sem desejar, tudo acontecerá a você – e acontecerá a partir da totalidade, do todo, do próprio Deus. Se você pedir, se desejar, acontecerá, mas acontecerá a partir de você mesmo. Você se fecha em si mesmo e nunca permite que a existência lhe aconteça.

“É melhor que as coisas não aconteçam às pessoas exatamente como elas querem...”

Heráclito diz: “É bom que as coisas não aconteçam como você quer.” Essa é a única possibilidade para o seu despertar. Por isso ele diz que é bom – porque, se todo desejo fosse satisfeito, você ficaria completamente em coma, pois em você não haveria mais perturbação. Você desejou riquezas e as riquezas estão aí; você desejou belas mulheres e belas mulheres estão aí; você desejou sucesso e o sucesso está aí; você desejou uma escada para alcançar o paraíso e a escada está aí. Você ficaria em coma, estaria num sonho. Se tudo fosse satisfeito, você jamais tentaria procurar a verdade. Não haveria intervalo para você... porque somente a miséria, dukkha, a infelicidade, o inferno que você cria à sua volta o ajudará a despertar. Isso o chacoalha para acordá-lo.

Na mitologia hindu está escrito que, num paraíso de deuses, todos os desejos são satisfeitos imediatamente, sem nenhum intervalo de tempo. Na concepção hindu do paraíso, existem árvores que satisfazem os desejos, kalptarus. Você se senta sob elas e deseja qualquer coisa, e sem nenhum intervalo de tempo... aqui você deseja e aqui recebe. Nem mesmo um único momento é perdido. Você pede uma bela mulher e ela aparece. Mas esses deuses devem estar vivendo em sonhos, devem estar vivendo drogados.

Os hindus dizem que do paraíso não há caminho que leve à verdade. Isso é muito belo. Eles dizem que, se um deus deseja se libertar completamente, terá de vir à terra. Por que? Porque no paraíso não existe infelicidade, não existe miséria para despertar alguém. Trata-se de um sono longo e tranqüilo, onde os sonhos são continuamente satisfeitos. Se todo sonho é satisfeito, porque o sonhador deveria abrir os olhos? Mesmo os deuses precisam vir à terra, e somente então podem ser libertados. Essa é uma concepção rara. Os cristãos não têm esse tipo de concepção; o paraíso deles é a última coisa. Mas os hindus dizem que ele não é a última coisa – ele é apenas um estado de sono bom e belo. Bom, belo, longo, muito longo, pode durar milhares de anos, mas é um estado de sonho. Para os deuses serem libertados, eles precisam descer de volta à terra. Por que à terra? Porque na terra existe miséria, dor, angústia... e somente a angústia é necessária. Somente isso pode sobressaltá-los e tirá-los de sua soneca.

“É melhor que as coisas não aconteçam às pessoas exatamente como elas querem...”

Uma coisa ou outra sempre sai errada, e isso é belo! Se nada sair errado, se tudo o que acontecer for o que você gostaria que acontecesse, quem desejaria a verdade, quem procuraria a existência, quem desejaria a liberdade, a liberdade total, moksha? Ninguém!

Por meio das drogas, as pessoas estão tentando ser como deuses do paraíso hindu. Você fuma maconha ou haxixe, ou toma LSD, e entra num estado de sonho, um belo estado de sonho, e fica sob uma árvore que satisfaz seus desejos. As drogas são contra a verdade, porque a verdade necessita de um despertar – despertar do passado, despertar dos sonhos, despertar de seus desejos para perceber toda a falsidade que você criou à sua volta e para abandoná-la. E abandoná-la sem nenhum esforço, apenas perceber que ela está errada e abandoná-la.

Lembre-se: se você fizer muito esforço para abandoná-la, o próprio esforço o torna feio. A compreensão não precisa realmente de muito esforço. Você compreende algo, percebe a realidade e o abandona. Você não pode perceber que está infeliz devido a seus desejos? Isso é algo para argumentar, algo a se convencer? Você não pode perceber isso? É muito claro que a partir dos desejos você criou um inferno. Então, por que se esforçar? Num puro e intenso momento de compreensão, por que não abandoná-los imediatamente? E, se você puder abandoná-los imediatamente, terá uma beleza e uma graça. Você não encontrará essa graça nos pretensos monges. Por todo o mundo, você não encontrará essa graça nos monges católicos, hindus e jainistas, porque eles estão tentando abandonar os desejos. O próprio esforço de abandonar mostra que eles ainda estão apegados; senão, por que se esforçar? Eles gostariam de parar de desejar, mas esse também é um desejo – e por isso há esforço. Eles se apegam e gostariam de abandonar os desejos. Eles não atingiram um momento de compreensão, um momento de verdade.

Todo o meu esforço para com você é levá-lo a um momento de compreensão no qual o esforço seja inútil. O entendimento é tão intenso, tão ardente, que tudo simplesmente se incendeia. Você percebe, e sua própria percepção se torna o abandonar.

Isso é possível, aconteceu comigo e pode acontecer com você. De maneira nenhuma sou excepcional; sou apenas uma pessoa comum. Se aconteceu comigo, uma pessoa comum, por que não com você? Simplesmente faça uma busca intensa em direção à compreensão. Compreensão é transformação, é mutação, é revelação. A compreensão liberta.

Preste atenção nestas palavras:

“É melhor que as coisas não aconteçam às pessoas
exatamente como elas querer.
A menos que você espere o inesperado,
jamais encontrará a verdade,
pois é árduo descobri-la
e é árduo atingi-la.”


Deixe que estas palavras entrem no seu coração:

“A menos que você espere o inesperado, jamais encontrará a verdade...”

Porque a verdade não pode ser sua expectativa. Tudo o que você esperar será uma mentira, uma projeção, uma parte de sua mente. Não, a verdade não pode ser prevista. Ela o toma de surpresa. Na realidade, ela vem quando você não espera por ela. Ela é uma iluminação repentina.

A expectativa significa que o seu conhecido se projeta no futuro, no desconhecido. Por isso, digo que, se você for cristão, hindu, budista ou jainista, errará o alvo – pois o que significa ser cristão? Significa uma expectativa cristã, significa um Deus visto por meio de olhos cristãos, significa uma concepção, uma filosofia. O que significa ser hindu? Significa um sistema de crença. Isso lhe dá uma expectativa, você espera um Deus, espera a verdade. A verdade será de uma certa maneira, o Deus será de uma certa maneira – a face, a figura, a forma, o nome que você esperou. Sua expectativa é a barreira, porque Deus é o inesperado, a verdade é o inesperado. Ela nunca foi teorizada, nunca foi trazida à linguagem e não pode ser forçada em palavras; ninguém jamais conseguiu e jamais conseguirá. Ela permanece o inesperado! Ela é uma estranha.

Sempre que Deus bater à sua porta, você não encontrará uma face familiar, não. Ele é o não-familiar, o estranho. Você nunca pensou sobre ele, nunca ouviu falar sobre ele, nunca leu sobre ele. Apenas o estranho... E, se você não pode aceitar o estranho, se pedir o familiar, a verdade não é para você. A verdade é uma estranha, ela vem sem dar aviso de que está vindo, ela vem quando você não está esperando, não está aguardando.

Lembre-se disto: as pessoas meditam continuamente, e isso é uma necessidade, mas a verdade nunca ocorre na meditação. Ela acontece fora. Mas a meditação ajuda-o, deixa-o alerta, faz com que você fique atento, faz com que você fique cada vez mais perceptivo e consciente. E subitamente, em algum lugar... ela acontece em momentos inesperados, você não pode entender o motivo de Deus escolher momentos tão inesperados.

Uma monja está carregando água, a alça de bambu quebra e o pote de barro cai e a água escorre... e, repentinamente, ela desperta. O que aconteceu? Por quarenta, cinqüenta anos ela meditou e ele nunca veio – porque meditação significa que você está esperando, está observando algo que irá acontecer. Sua mente está presente, funcionando muito sutilmente – muito, muito sutilmente, você pode até não detectar onde ela está. Você pode achar que agora tudo está em silêncio, nenhum pensamento, mas isso também é um pensamento. Você sente silêncio absoluto, mas mesmo essa impressão de que agora existe um silêncio absoluto e que logo a porta irá se abrir... isso é um pensamento. Quando você fica absolutamente silencioso, mesmo esse pensamento não está presente, que “Estou silencioso”. Mas isso significa que você não deve estar “meditando”. E este é o paradoxo: medite tanto quanto puder para trazer um momento de meditação não-meditativa.

Isso aconteceu com a monja. Ao carregar água, ela não estava preocupada com Deus; a alça de bambu era velha e ela estava preocupada com o bambu. Ela o segurava dessa e daquela maneira, com receio de que ele quebrasse a qualquer momento. E o pote era de barro e ele quebraria. Ela de maneira nenhuma estava à porta da verdade, e a porta estava aberta porque ela meditou por quarenta anos. Assim, a porta estava aberta, mas ela não estava lá... Subitamente, o bambu rompeu, o porte caiu e quebrou e a água fluiu. Foi um choque! Por um momento, mesmo essa preocupação de dissolveu. O que tinha de acontecer, aconteceu. Agora ela está em um momento não-meditativo e Deus está presente, e aconteceu.

Sempre acontece dessa maneira – e tais momentos a pessoa nunca espera. Quando você espera, você perde, porque você está presente em sua expectativa. Quando você não espera, acontece, porque o eu não está presente – ninguém está presente. Quando sua casa está totalmente vazia, tão vazia a ponto de você nem estar ciente de que “estou vazio”... porque esse tanto já será uma perturbação suficiente... Quando mesmo o vazio é jogado fora, ele vem.

“A menos que você espere o inesperado...”

Abandone todas as suas noções sobre Deus. Todas elas são falsas. Deixe que Deus mesmo diga quem Ele é a você. Você deve ter ouvido os hindus dizerem que as noções cristãs são falsas, os cristãos dizerem que as noções hindus são falsas, os jainistas dizerem que as noções cristãs e hindus são falsas, os budistas dizerem que as noções jainistas, cristãs e hindus são falsas – digo que todas as noções são falsas. Não que a minha noção esteja correta – não! Noção, como tal, é falsa, porque ela faz uma teoria a partir do desconhecido, o que não é possível. Todas as teorias são falsas, sem exceção. Todas as teorias são falsas – absolutamente, categoricamente, incluindo as minhas – porque o inesperado permanece o inesperado.

“A menos que você espere o inesperado,
jamais encontrará a verdade,
pois é árduo descobri-la
e é árduo atingi-la”


Na realidade, não é árduo atingi-la e não é árduo descobri-la. Por sua causa, é árduo atingi-la e descobri-la – pois como colocar essa mente de lado? A mente é sutil, ela permanece mesmo ao colocá-la de lado. Ela diz: “Tudo bem, não estarei aqui”. Mas isso também é mente. Ela diz: “Agora, deixe que Deus bata à porta. Eu não estou”. Mas isso também é a mente. A mente diz: “Meditarei, abandonarei todos os pensamentos”. Ela diz: “Olhe, abandonei todos os pensamentos. Olhe! Estou vazia”. Mas isso também é mente. Esse é o problema, tudo o que você faz, a mente está por lá.

Perceba o ponto – nenhum esforço ajudará. Apenas perceba o ponto – a mente existe por meio de pretensões... Perceba o ponto! Por que digo para perceber o ponto? Porque, se você perceber o ponto, não haverá pretensão. Se você não perceber o ponto, a mente poderá enaltecer-se: “Estou aqui sem pretensões”. Perceba o ponto! O vazio é necessário, não a pretensão de que estou vazio. A consciência é necessária, não a pretensão de que sou a consciência – porque sempre que surge o “eu”, você entrou na noite escura da mente. Quando o “eu” não está presente, há luz, tudo fica claro. Uma clareza, uma percepção infinita – você pode perceber amplamente, pode perceber o todo.

Dessa maneira, a única coisa que pode ser feita é observar as artimanhas da mente. E não tente fazer o oposto. Por exemplo, sua mente está repleta de pensamentos – não tente lutar contra os pensamentos, porque esse lutador é a mente. E, se você lutar, a mente alegará o oposto: “Olhe! Abandonei todos os pensamentos. Agora, onde está Deus? Onde está a iluminação?” Não faça o oposto, não crie uma luta, porque com a luta vem a pretensão.

Simplesmente observe e relaxe. Simplesmente observe e divirta-se com as artimanhas da mente. Divirta-se, elas são tão belas! Quão enganadoras, quão ilusórias! Como elas insistem em vir sem parar! Os hindus sempre dizem que elas são como a cauda de um cão. Mesmo se ela for mantida na reta por doze anos, no momento em que o esforço for interrompido, a cauda se curva novamente.



Um dia eu conversava com uma criança e ela disse: “Estamos nos esforçando para endireitar um amigo – porque ele não acredita em Santa Clara”. Num outro dia ele continuou: “Depois de sete dias de esforço, ele se rendeu e afirmou que agora acredita nela”. Mas, no dia seguinte, o menino disse: “Precisamos nos esforçar mais”.

Perguntei: “O que aconteceu? Ontem você disse que ele tinha se endireitado. Então, pra que se esforçar agora?”

O menino respondeu: “Ele deu pra trás de novo – nós o endireitamos, mas ele sempre dá para trás”.

Essa é a natureza da mente. Não há o que fazer. Essa é a natureza da mente – entenda-a, e isso é tudo. O entendimento é suficiente. Se não for assim, fica difícil... Você pode insistir, mas a mente o seguirá como uma sombra, e tudo o que você alegar será uma alegação da mente. É por isso que todos os sábios dizem: “Os que alegam que sabem, não sabem. Os que dizem que atingiram, não atingiram”. Por que? Porque a própria alegação é perigosa.

“A menos que você espere o inesperado
jamais encontrará a verdade,
pois é árduo descobri-la
e é árduo atingi-la.
A natureza adora se ocultar.”


Esse é um jogo de esconde-esconde. Ele é belo assim como é! A natureza não está na superfície, ela está oculta no centro. A natureza é como as raízes das árvores, ela fica na profundidade do solo – o mais essencial está oculto. Nunca considere que a árvore é o mais essencial. Ela é apenas a periferia de onde vêm as flores, as folhas, os frutos; ela é a periferia. A árvore verdadeira existe no subsolo, no escuro; ela está oculta no útero escuro da terra. Pode-se cortar a árvore e uma nova árvore brotará, mas corte as raízes e tudo desaparece.

Você não está na superfície de sua pele; essa é a periferia. Você é o subsolo profundo e oculto. E Deus não está na superfície. A ciência aprende cada vez mais sobre a superfície, aprende cada vez mais sobre a pele. Não importa o quão fundo a ciência vá, ela nunca vai realmente fundo, porque ela aprende de fora. De fora pode-se aprender somente sobre a pele. O real está oculto no interior, no santuário mais íntimo. Também em você ele está oculto no santuário mais íntimo. Você vive na periferia e assim o perde. E a existência tem um centro – o centro está oculto.

“A natureza adora se ocultar(...)”

Por que? Por que a natureza adora se ocultar? Porque esse é um jogo. Em sua infância você deve ter brincado de esconde-esconde. Para Heráclito, a existência é um jogo, é uma leela, uma brincadeira. Ela se oculta, e isso é belo! – e você precisa descobrir. E no próprio esforço de descobrir, você cresce.

Existem dois tipos de pessoa. Um chamo de não-descobridoras: elas permanecem na periferia. E as descobridoras: elas caminham e direção ao centro. As pessoas que vivem na periferia são mundanas. O mundo dos negócios é periferia, a política é periferia, sucessos e conquistas são periferia. Elas não são descobridoras, não são aventureiras. Mesmo se forem para a lua, isso não é uma aventura, porque elas permanecem na periferia. A aventura verdadeira é religiosa, é caminhas para o próprio centro do ser.

Primeiro você precisa entrar em você mesmo, porque você é um mundo em miniatura. Você caminha para o seu centro e, a partir desse centro, tem o primeiro vislumbre de como as coisas são. O real está oculto. Na periferia estão as ondas, os sonhos; na periferia há apenas uma representação. Na profundidade, no âmago mais profundo da existência, está o oculto. Heráclito o chama de harmonia oculta.

Caminhe em direção ao ser, ao centro, à própria base. Procure sempre as raízes, e não se deixe enganar pelas folhagens. Mas você é enganado pelas folhagens – se uma pessoa é bonita na superfície, você se apaixona; você se apaixonou pela folhagem. Mas a pessoa pode não ser bonita por dentro, ela pode ser absolutamente feia – e você caiu na armadilha. Há uma graça interior quando a luz brilha por dentro e chega também na periferia; não se pode ver de onde ela está vindo. Você pode ver uma pessoa bonita e, ainda assim, feia, e pode ver justamente o oposto também acontecendo: uma pessoa feia e, ainda assim, bonita.

Quando uma pessoa feia é bela, não se pode encontrar a fonte, onde ela está, porque a pele as superfície, a estrutura e a fisiologia não são atraentes – mas algo interior o atrai. Quando acontece da pessoa ser bela na superfície e também no ser interior, trata-se de algo muito misterioso. Então, o que acontece é carisma. Algumas vezes você sente um carisma à volta de uma pessoa – carisma significa que existe alguma harmonia oculta entre a superfície e o centro; a personalidade tem um magnetismo, algo do divino. Esse encontro da periferia com o centro é uma harmonia oculta.

“A natureza adora se ocultar(...)”

Por que? Porque somente por meio do ocultar-se o jogo pode continuar; do contrário, o jogo cessará. O jogo continua, ele é eterno.

E lembre-se também disto: mesmo se você encontrar, o jogo continua, mas então ele também tem uma qualidade diferente. Nunca ache que o jogo terminará quando você encontrar o âmago mais profundo. Não, o jogo continua. Agora com consciência, muitas vezes você se afasta do centro oculto; com consciência, você dá uma chance para a natureza se ocultar novamente – mas agora é proposital. É como duas crianças brincando, e uma sabe onde a outra está escondida. Para dar certa qualidade ao jogo, ela procura em todos os lugares e corre por toda parte, exceto naquele lugar. Ela sabe onde a outra está escondida, ela poderia pegá-la de cara, mas fica dando voltas.

Os budas continuam a jogar, mas o jogo muda. Agora eles sabem, agora não há ansiedade, não há desejos, nada a ser atingido. Agora, trata-se de um simples jogo. Não há objetivo nele – ele continua.

Assim, há duas possibilidades. Um jogo ignorante... é isso o que está acontecendo com você. Por você ser ignorante, você leva o jogo muito a sério – a seriedade se torna uma doença – e fica triste a respeito. Pessoas me procuram... se elas meditam e não alcançam, ficam muito sérias e frustradas. Eu digo para não ficarem sérias e frustradas, porque este é todo o ponto a ser entendido: trata-se de um jogo! Não há pressa para terminá-lo; ele não é um negócio. Deixe que ele se estenda tanto quanto possível. Por que tanta pressa? Por que ficar tão tenso? A infinidade está à frente, um tempo eterno está à frente, não há pressa. Você sempre estará presente e o jogo sempre estará presente – ele sempre existiu e sempre existirá. Tome-o com leveza... leve-o numa boa! Ele está sempre na esquina, a qualquer momento pode ser descoberto.

Mas por que tanta pressa? Relaxe – se você puder relaxar, chegará mais cedo ao centro. E, se estiver com pressa, permanecerá na superfície, pois uma mente apressada e tensa não pode se dirigir aos reinos mais profundos do ser. Somente a paciência o ajuda a se estabelecer na essência, na verdadeira essência.

“A natureza adora se ocultar(...)”

É belo a natureza adorar se ocultar. A natureza não é exibicionista. Ela não é exibicionista. A impressão de que ela consiste na folhagem é apenas uma maneira de se ocultar. De uma maneira sutil, Deus está se ocultando na flor. Se você simplesmente perceber a flor, errará o alvo.

Um poeta inglês, Tennyson, disse corretamente: “Se eu puder entender uma flor em sua totalidade, compreenderei Deus”. Ele está certo! Se você puder entender uma pedrinha na praia em sua totalidade, compreenderá Deus, pois esses são todos os esconderijos. Uma flor é um esconderijo, uma pedrinha também é um esconderijo. Ele está oculto em todos os lugares – milhões de formas. Onde você estiver, ele estará presente em todas as formas à sua volta. Qualquer forma pode passar a ser uma porta. Ao ter prontidão para entrar, ao não ter expectativa, ao não desejar, ao não pedir ou projetar algo, repentinamente a porta se abre.

“(...) O senhor cujo oráculo está em Delfos nem fala nem encobre – mas dá sinais.”

Em Delfos há um velho santuário grego, e as pessoas costumavam ir ao oráculo de Delfos par fazer perguntas. Mas o oráculo de Delfos nunca disse nada, ele simplesmente dava sinais. Heráclito o usa como uma parábola. Ele diz que Deus, o total, o todo, nunca fala em termos de sim ou não – ele simplesmente dá sinais. Ele é poético, ele lhe dá símbolos. Não tente interpretá-los. Se você interpretar, perderá. Apenas observe e deixe o sinal penetrar mais fundo em você e ser impresso em seu coração. Não tente encontrar o significado imediatamente, pois quem descobrirá o significado? Se você encontrar o significado, ele será o seu significado. Apenas deixe o sinal, o símbolo, ser impresso em seu coração e, algum dia, a vida revelará o significado. Você simplesmente vive com ele, simplesmente deixa que ele esteja presente.

Por exemplo, você vem a mim e pergunta: “como a minha meditação está indo?” Você me pergunta e eu sorrio. Eu lhe dei um sinal. O que você fará com isso? Você pode interpretar. Essa é a primeira tendência da mente. Você pensará: “Tudo bem, ele sorriu, e isso significa que estou chegando lá. Ele disse sim e tudo está indo bem. Estou no caminho certo”. Seu ego fica satisfeito. Se você estiver numa disposição de ânimo positiva, essa será a interpretação. Mas, se você estiver numa disposição de ânimo negativa, pensará: “Ele sorriu – ele não disse sim e apenas foi gentil, mas não estou indo a lugar nenhum”.

Das duas maneiras você errou o alvo, pois, se houvesse um sim a ser dito, eu o teria dito. Eu não o teria colocado numa tal dificuldade para encontrar a interpretação. Se houvesse um sim a ser dito, eu o teria dito; se houvesse um não a ser dito, eu também o teria dito. Mas eu simplesmente lhe sorri, não disse nem sim nem não. Na realidade, eu nada lhe disse – eu lhe dei um sinal. Não o interprete! Deixe que esse sorriso penetre fundo em seu coração, deixe que esse sorriso esteja presente. Algumas vezes lembre-se dele, coloque-o de volta no coração, deixe que ele se dissolva em você e não tente encontrar o significado – e isso ajudará na sua meditação. Um dia, subitamente, num profundo estado meditativo, você começará a sorrir da mesma maneira que eu sorri, porque esse momento será o momento da compreensão. Então, você poderá sorrir, pois saberá qual era o significado.

A vida é sutil. O “sim” e o “não” não podem ser usados. A vida é tão sutil que, se você disser sim, você o falsifica, e, se disser não, você o falsifica também. A linguagem é muito pobre, ela conhece somente duas coisas, sim e não. E a vida é muito rica, ela conhece infinitas posturas e posições entre o sim e o não – infinitas gradações. Trata-se de um espectro de milhões e milhões de cores. Sim e não são muito pobres – você nada diz com eles. Sim e não significam que você dividiu a vida em preto e branco. Mas a vida tem milhões de cores, ela é um arco-íris.

Na realidade, o preto e o branco não são cores. Tirando o preto e o branco, todas as cores existem. Você precisa entender isso. O preto é a ausência de todas as cores, ele não é uma cor. Quando nenhuma cor está presente, o vazio é escuro; em si mesmo, ele não é uma cor. É por isso que o preto não é muito encontrado na natureza. Ele é uma ausência. E o branco também não é uma cor, mas uma mistura de todas as cores, elas viram branco; ele não é uma cor. Branco é um pólo, preto é outro. A presença de todas as cores é o branco, a ausência de todas as cores é o preto. Entre essas duas polaridades, existem cores reais – verde, vermelho, amarelo e todas as suas variações, milhões de variações.

Quando lhe sorrio, não estou dizendo preto ou branco, sim ou não – estou lhe dando uma cor no espectro, uma cor real. Não tente interpretar, pois se o fizer, dirá que é preto ou branco, e não se trata de nenhum dos dois. A cor está em algum lugar no meio, e ela é tão sutil que palavras não podem expressá-la. Se palavras pudessem expressá-la, eu lhe daria uma palavra e não o teria colocado desnecessariamente em dificuldade.

Você me procura, diz algo e eu não respondo. Algumas vezes acontece de você vir me ver e eu nem mesmo lhe faço uma pergunta e simplesmente o esqueço. Eu interpelo outros e deixo você de lado. Você interpretará isso: “Por que?” Não interprete, simplesmente deixe esse ato entrar fundo em você. Algum dia, numa disposição de ânimo muito meditativa, o significado florescerá. Estou pondo sementes em você, e não lhe dando palavras e teorias.

Quando eu me for, por favor, lembre-se de mim como um poeta, e não como um filósofo. A poesia precisa ser entendida de maneira diferente – você precisa amar a poesia, e não interpretá-la. Você precisa repeti-la muitas vezes, de tal modo que ela se misture com o seu sangue, com os seus ossos, com a sua própria medula. Você precisa recitar poesia muitas vezes, de tal modo que possa sentir todas as nuanças, as suas formas sutis. Você precisa sentar-se simplesmente e deixar a poesia entrar em você, para que ela passe a ser uma força viva. Você a digere e depois se esquece dela; ela entra cada vez mais fundo e o transforma.

Deixe que eu seja lembrado como um poeta. É claro, não estou escrevendo poesias em palavras. Estou escrevendo num veículo mais vivo – em você. E é isso o que toda a existência está fazendo.

Heráclito diz: “O senhor cujo oráculo está em Delfos nem fala nem encobre – mas dá sinais.”

Um sinal não deve ser interpretado, um sinal deve ser vivido. Sua mente terá a tentação de interpretá-lo. Não seja tentado pela mente; apenas diga a ela: “Isso não lhe diz respeito, não é para você. Vá brincar com outras coisas. Deixe que isso penetre mais fundo em meu ser”. E é isso o que faço quando me comunico com você.

Não estou me comunicando com sua mente, mas com você como ser, como ser luminoso, como deus encarnado, como uma possibilidade, como uma potencialidade infinita. Estou me comunicando com o seu futuro, e não com o seu passado. Seu passado é lixo – jogue-o fora! Não o carregue. Estou me comunicando com o seu futuro, o inesperado, o desconhecido. Aos poucos você será capaz de ouvir esta música, a música do desconhecido, a música em que todos os opostos desaparecem e surge uma harmonia oculta.

Sim, a natureza adora se ocultar, porque ela é um mistério. Ela não é uma questão, não é um quebra-cabeça a ser resolvido. Ela é um mistério a ser vivido, desfrutado, celebrado.



Osho