"MAIOR É O QUE ESTÁ EM VÓS DO QUE O QUE ESTÁ NO MUNDO." (I JOÃO 4:4)

quarta-feira, julho 24, 2019

Aprofundando nos ensinamentos do texto anterior


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Este texto de Masaharu Taniguchi, intitulado "O Arrependimento e o Despertar", apresenta três pontos importantes que merecem ser comentados e aprofundados.

O primeiro consiste no fato de dizer que, ao despertar espiritualmente, o ser humano passa a vivenciar o reino de Deus aqui mesmo neste mundo fenomênico. Ao abrir os olhos da mente, podemos enxergar além do que os sentidos físicos permitem captar, e percebemos a nossa condição espiritual de unicidade com Deus, que somos filhos de Deus. O ser humano enquanto corpo carnal não é o filho de Deus, e sim o filho do pecado, da separatividade. Enquanto estivermos identificando o nosso ser com o corpo fenomênico, estaremos "pecando" (ou seja, nos vendo na separação e errando o alvo) e seremos filhos do pecado. O filho de Deus existe como um ser espiritual que está em eterna unidade com Deus, e ele é a essência que habita o âmago de cada um de nós. Quando despertamos para esse fato, ocorre uma mudança total em nossa perspectiva de perceber a vida, porque quando a unicidade se realiza, ela o faz englobando tudo. Essa mudança total em nosso modo de perceber é o que o texto denomina "arrependimento" ou "conversão". Quando ocorre esse "despertar", esse "arrependimento", essa "conversão", o mundo fenomênico reflete esse despertar e se converte em um paraíso terrestre. Então o reino de Deus passa a se expressar no plano fenomênico. Por isso, Masaharu Taniguchi escreve que: "quem se arrepender verdadeiramente, há de encontrar o paraíso aqui e agora, nesta vida terrena", e também: "contanto que nos arrependamos verdadeiramente, podemos passar a desfrutar imediatamente da graça dos céus".

Um outro objetivo do presente texto é desmistificar alguns ensinamentos que dizem que o mundo fenomênico (a Representação) existe como um opositor-inimigo do reino de Deus, que o reino de Deus somente poderá ser experienciado ao se rejeitar por completo a existência fenomênica, e que às vezes incentivam os estudantes a repudiarem o mundo fenomênico. É verdade que o reino de Deus é a Realidade que existe desde "antes que a Representação existisse", mas a Representação em si não é nem "boa" nem "ruim", não é sagrada nem profana. Ela é como um espelho (vazio) a refletir a imagem (conteúdo) colocada diante dela. Por isso, devido a sua natureza vazia desprovida de qualquer imagem, a representação tem a capacidade de refletir a Realidade divina (o reino de Deus) existente subjacente à ela. Sendo assim, o reino de Deus pode se evidenciar aqui mesmo neste mundo fenomênico, e isso ocorre quando o ser humano desperta para a sua filiação divina. Por isso Masaharu Taniguchi diz: "Quando descobrimos nossa natureza verdadeira, compreendemos que estamos no Paraíso, na Terra Pura, aqui mesmo neste mundo."

E, a fim de que possamos despertar para a nossa natureza verdadeira, Masaharu Taniguchi explica que primeiro deve ocorrer em nós o arrependimento e a conversão. E, sobre isso, ele faz uma notória observação - que é o segundo ponto importante de ser comentado. Ele diz: "O arrependimento completo consiste na transformação total da postura mental e, como consequência disso, o nosso mundo se transforma totalmente. O mundo que me refiro aqui não é o mundo físico, e sim o mundo interior."

Para compreendermos o arrependimento e a conversão referidos no texto, é muito importante ter em mente o fato já mencionado de que a Representação não existe como "boa" ou "ruim", como "sagrada" ou "profana", mas que sua natureza é o vazio. Por ser vazia como um espelho, em si ela nada é, e por isso nada tem para nos apresentar. Ela não nos apresenta um universo profano, ela não nos apresenta um universo divino. Ela apenas reflete. O universo que aparentemente nos é apresentado pela representação é apenas um reflexo da própria visão ou percepção que temos dele. Quem olhar para o universo com a visão que o filho de Deus tem do universo, se verá diante um universo divino. E quem olhar para o universo com a visão/percepção que um ser pecador (ego) tem do universo, se verá diante de um universo de separação (pecado)... que é um universo totalmente sem sentido. O universo em si é nada. A percepção é tudo! O mesmo universo pode ser visto/experienciado de formas diferentes, a depender da lente com que se olha para ele. Se alguém olhar uma paisagem (universo) com óculos de lente de cor vermelha, a paisagem será vista toda em vermelho (universo aparente). E se ao lado dessa pessoa houver mais alguém olhando a mesma paisagem (universo) com lentes de cor amarela, a paisagem será vista toda amarelada (universo aparente). É importante saber fazer distinção entre "universo" e "universo aparente" e não confundi-los. O universo em si é nada, e não possui significado algum. Por sua vez, o universo aparente surge em decorrência da visão/significado que atribuímos ao universo. 

Por isso, caso estejamos vendo ou experienciando o mundo fenomênico como um lugar "ruim", "defeituoso" ou "imperfeito", isso significa que estamos percebendo-o com visão/lentes defeituosas. O defeito não está no mundo em si, mas na visão com que olhamos para ele. Compreendendo isso, não é necessário querer modificar, repudiar, condenar ou desprezar o mundo em que vivemos na representação. O defeito deve ser corrigido na própria base ou raiz onde ele se origina. No exemplo acima citado, se o indivíduo que usava lentes vermelhas quiser enxergar toda a paisagem na cor azul, basta descolorir as lentes que naquele momento estavam vermelhas e colori-las novamente com a cor azul. Então, ao colocar novamente os óculos, aquela paisagem aparecerá azulada. Da mesma forma, se pudermos modificar o teor/a essência da visão com que olhamos para o mundo, ele se nos apresentará de acordo com a natureza do nosso olhar. Assim é a Representação. Ela é como um "projetor" que projeta na tela qualquer que seja o conteúdo gravado no filme. Aqueles que possuem um olhar iluminado, experienciam um mundo iluminado. Ao passo que aqueles que possuem um olhar imperfeito, experienciam um mundo imperfeito.

Sabendo disso, Masaharu Taniguchi disse: "O arrependimento completo consiste na transformação total da postura mental." A "postura mental" a que ele se refere é o olhar, a visão, a percepção. A "transformação total" deve ocorrer bem na raiz de todas as coisas, que é a nossa percepção, "e entãocomo consequência disso, o nosso mundo se transforma totalmente." E a chave mais essencial para fazer com que a transformação ocorra na "raiz", é aplicarmos em nossa vida a sabedoria do não-julgamento. Ao compreendermos verdadeiramente que o universo nada é de si mesmo - que ele não possui significado algum, e que somos nós quem conferimos significado a ele mediante nossa própria visão (julgamento) - automaticamente perdemos o interesse em nomeá-lo, em dizer o que ele "é" ou "não é". Então a energia que estava fluindo para o exterior começa a ser redirecionada para o interior (percepção), e conseguimos alcançar o ponto-raiz onde é possível realizar verdadeiramente a transformação, o arrependimento, a conversão.

Tendo compreendido tudo o que foi dito até aqui, vamos prosseguir para o terceiro ponto importante do texto.

Masaharu Taniguchi diz: "Conversão significa o arrependimento completo, em que a pessoa muda por inteiro a sua postura mental e, como consequência disso, o seu mundo se transforma totalmente. O 'mundo' a que me refiro aqui não é o mundo físico, e sim o mundo interior."

Para compreendermos bem este terceiro ponto, precisamos nos defrontar com algumas questões metafísicas. Sabemos que a Realidade (a qual os diversos ensinamentos chamam de Reino de Deus, Céu, Jissô, Terra Pura, Nirvana, Moksha, etc.) existe desde "antes que a Representação existisse." Porém, uma vez que surge a Representação, algumas questões devem ser entendidas.

Primeiramente: uma das finalidades da Representação é a de permitir (simular) a experiência de nosso Ser como algo separado ou diferente de Deus. Todavia, devido à sua natureza vazia, a Representação também tem o propósito de expressar a glória e o amor incomensuráveis de Deus. Ao mesmo tempo que a Representação foi feita para possibilitar a experiência de separatividade, também foi feita para que a Divindade pudesse Se expressar plenamente através de cada ser, coisa e fato. Dependendo do olhar (percepção) que lançarmos para o universo da Representação, experienciaremos e desfrutaremos de uma coisa ou outra.

Em segundo lugar: uma vez que lançamos um "olhar" para a Representação, ela imediatamente reflete a natureza daquele olhar, e de súbito já nos vemos dentro de um universo inteiramente construído. Ao lançarmos um "olhar de separação", repentinamente nos vemos inteiramente dentro de um universo de separatividade, totalmente pronto, acabado, construído para funcionar naquele sentido. E assim constatamos que o universo da separação detém uma espécie de "inteligência" trabalhando a favor da separação a fim de preservar sua arquitetura, valendo-se de vários mecanismos, planos, estratégias para se automanter, e também para assegurar a nossa permanência dentro dele. Essa inteligência é chamada de "ego". O ego é o guardião do universo da separação. Por sua vez, o inverso também ocorre: quando lançamos um olhar iluminado para a Representação, ela o reflete e de imediato já nos vemos em um universo de pura luz, onde a Divindade se evidencia como tudo e todos. Esse universo divino também já aparece inteiramente pronto, com uma arquitetura toda construída e funcionando no sentido de se autopreservar e de assegurar a nossa permanência dentro dele. E à Inteligência guardiã desse universo divino chamamos de "Eu".

Em terceiro lugar: tudo o que foi contado até aqui ocorre no âmbito de uma magnitude imensamente maior/acima daquela em que se manifesta o universo visível. Está ocorrendo em um mundo invisível, de âmbito metafísico, algo de natureza grande demais para se apreender com a capacidade da mente/inteligência/percepção que se manifesta na visibilidade. Tal mundo invisível também faz parte da Representação (não é a Realidade). E em contraposição ao mundo invisível, temos o mundo físico-visível, que todos nós conhecemos muito bem. O mundo físico é um "reflexo visível" do mundo invisível, existindo apenas como "efeito", "aparência" ou "sombra". Por ser mero "reflexo" ou "sombra" do mundo invisível, é dotado de insubstancialidade, daí porque a Metafísica o classifica como sendo "nada" ou mera "aparência". Por trás do mundo visível (físico, insubstancial) existe o mundo invisível (metafísico, substancial), onde tudo está acontecendo.

Em quarto lugar: no universo da separação, um dos mecanismos utilizados pelo ego para perpetuar seu senso de "eu sou" é trabalhar para fazer com que fiquemos identificados exclusivamente com a realidade visível, de modo que sequer desconfiemos que nosso Ser vive e existe em uma realidade invisível. Dessa forma, a realidade visível atua como "cortina de fumaça" para esconder a realidade invisível, que é onde tudo acontece, e isso torna impossível ocorrer uma real mudança ou transformação em nossas vidas. Não há nada acontecendo no universo das aparências, por isso o Todo não reconhece nossas ações aqui na realidade visível. Por exemplo: se um personagem arrepender-se apenas no mundo das aparências (convencendo-se mentalmente de que sua identidade não é a de um "eu" pecador, mas sim o Filho de Deus), esse arrependimento não será reconhecido pelo Todo, porque ocorreu numa realidade insubstancial, em "nada", em "lugar nenhum". A pessoa não sentirá o seu universo visível se transformar no paraíso terrestre que o texto menciona, e que pode ser vivido aqui e agora. Talvez ela consiga reformar a sua personalidade, o seu caráter, a sua moral, as suas atitudes, e se tornar um ser humano melhor. Mas ela não adentrará o paraíso iluminado que existe aqui e agora. Para que a conversão/o arrependimento seja verdadeiro e surta efeito perante o Universo, ele deve ocorrer na realidade substancial. Aí sim o Universo reconhece e responde à transformação. O Universo sempre responde no âmbito da realidade invisível; e quando a realidade invisível se modifica, a realidade visível reflete a transformação.

Por isso, Masaharu Taniguchi fez a importantíssima observação, dizendo: "O mundo a que me refiro aqui não é o mundo físico, e sim o mundo interiorEm outras palavras, o verdadeiro arrependimento consiste em abandonarmos completamente a ideia de que somos seres constituídos de corpo carnal, sujeito a pecados, e nos conscientizarmos de que somos filhos de Deus, isentos de pecado. Esta é a verdadeira conversão." Tal conscientização não deve ocorrer somente a nível físico, aparente, superficial. Ela deve ocorrer nas profundezas invisíveis da realidade, que é onde verdadeiramente vivemos e existimos na Representação. É por isso que as práticas espirituais metafísicas não levam em conta a existência/presença da realidade visível. O metafísico trabalha unicamente no plano invisível, porque no universo da Representação tudo está acontecendo ali.

Todos os caminhos espirituais recomendam que os estudantes adquiram o hábito de realizarem diariamente alguma prática espiritual (sadhana), que pode ser: leitura de livros sagrados, meditação, oração, repetição de mantras ou de nomes divinos, realização de serviço desinteressado, etc.. Qualquer que seja a prática recomendada, é importante haver a repetição diária e constante, até que ela penetre nas profundezas e impregne completamente o nosso ser. Isso é assim porque, sempre que um treinamento espiritual está em seu início, ele é praticado apenas no âmbito do mundo visível (e enquanto a prática ocorrer apenas aqui, não haverá real transformação); mas, com o passar do tempo, a prática constante alcança as profundezas de nosso ser e passa a ocorrer também no mundo invisível. Então o nosso ser interior vai absorvendo e assimilando o conteúdo praticado, até ocorrer em nós uma espécie de "alteração" ou "reprogramação" no mundo invisível. E quando o mundo invisível se transforma, nossa vida verdadeiramente se transforma.

Vejamos o que Mooji disse para seus ouvintes, em um de seus satsangs:

"Eu não falo para você como você sendo uma pessoa. Eu falo para você como você sendo Consciência e presença [que existe no mundo invisível]Se eu falar para você como você sendo uma pessoa, eu sei que o iria sobrecarregar, porque 'você' não pode mudar [a "pessoa" pertence ao mundo visível, insubstancial, que é "nada"]Quando eu falo para você como sendo Consciência, você simplesmente entende [o indivíduo entende enquanto "ser" ou "presença" invisível que ele é] e a Graça é libertada lá."

"Se você quiser obter o máximo proveito de mim, esteja sentado na posição da consciência e ouça como a própria consciência. Se você ouvir como uma pessoa, você nunca irá 'compreender' onde eu estou ou aquilo para o qual eu estou apontando. Ouça como consciência. Encontre uma sintonia, uma sincronicidade com a sensação de presença. Seja um com ela. Esta sincronicidade é um nível muito mais elevado de comunicação no reino do ser. É muito mais elevada do que conversar mentalmente ou verbalmente. Ressonância do Coração é a vibração da santidade. Através dela, você vem a reconhecer espontaneamente o Ser."

A partir de agora, tenhamos a consciência de que, sempre que estivermos diante de um ser desperto, ele não olha para nós como se fôssemos uma "pessoa". Ele não fala para nós como se fôssemos uma "pessoa". Ele fala com a presença/a consciência que existe (invisivelmente) por detrás da pessoa. A lembrança de que somos o Ser não ocorre a nível de nossa memória ou capacidade cerebral. Se insistirmos em compreender os ensinamentos com a nossa "pessoa", estaremos perdendo totalmente o nosso tempo. O mestre sabe que as coisas que ele diz devem ser compreendidas pelo ser invisível/silencioso que existe por detrás da pessoa. Geralmente os iniciantes na busca espiritual, sempre que vão participar de um satsang, ouvem as palavras do mestre como se fossem pessoas. Mas, com o passar do tempo, aprendem a ouvir o mestre com o ser silencioso que existe por trás de suas pessoas. E quando o ser silencioso compreende afinal os ensinamentos do mestre, o indivíduo recebe um vislumbre da verdade ou até mesmo o próprio despertar espiritual.

Concluindo: após tudo o que foi dito, ficou muito claro que a "conversão" ou "arrependimento" que o texto menciona deve ocorrer não no mundo físico (visível, insubstancial, efeito), mas no mundo interior (invisível, substancial, causa). Ao ocorrer uma total transformação em nossa forma de olhar (percepção) para a vida, a vida automaticamente se transforma, e assim podemos viver e desfrutar de um reino iluminado aqui mesmo neste mundo terreno. Finalizo, pois, este texto, com as seguintes palavras de Masaharu Taniguchi:

"O mundo radioso existe desde o princípio. Basta abrirmos os olhos da mente para compreendermos que o reino de Deus está aqui e agora. Como já expliquei, 'devemos nos arrepender, pois o reino de Deus existe aqui e agora, já está ao nosso alcance'; isto é, o reino de Deus não está para chegar daqui a algum tempo, ele já existe aqui e agora. Basta 'arrependermo-nos' para que ele se manifeste diante de nós. Os aflitos, os enfermos, os que estão com o coração cheio de tristeza, enfim, todos aqueles que sofrem, descobrirão o reino de Deus tão logo abrirem os olhos da mente. Quando eles abrirem os olhos da mente e despertarem da ilusão, o mundo terreno, que até então parecia impuro, feio e perverso, revelar-se-á como um mundo puro, repleto de paz e felicidade, iluminado pela Luz de Deus."

Namastê!


sábado, julho 20, 2019

O Arrependimento e o Despertar - 2/2

- Masaharu Taniguchi -


A Imagem Verdadeira do ser humano

A Seicho-No-Ie ensina que "o pecado não existe". Diante dessa afirmação, alguns contestam com veemência: "O pecado existe, sim! Por isso a religião é necessária". No que se refere ao aspecto fenomênico, tal contestação é válida. Existe a religião porque existe o pecado. Porém, não estamos falando de existir ou não existir no plano fenomênico. Estamos tratando de uma questão de suma importância, do ponto de vista religioso e filosófico. "Existir ou não existir" não significa ser visível ou não, estar manifestado ou não. Vendo somente o aspecto fenomênico, muitos afirmam que a humanidade é pecadora. Essas pessoas são como Nicodemos, o qual, ao ouvir de Jesus Cristo a afirmação de que "para ver o reino de Deus, é preciso nascer de novo", disse: "Como pode um homem nascer sendo velho? Por ventura pode tornar a entrar no ventre de sua mãe e renascer?". Ao dizermos que "o pecado não existe", estamos afirmando que "o pecado não é existência verdadeira", isto é, "o pecado não existe de verdade". Estamos tratando da questão da existência real

Se o pecado existisse de verdade, ninguém conseguiria extingui-lo, por mais que tentasse. Porém, o pecado não existe de verdade, embora pareça existir. Não passa de falso aspecto, originado da ilusão. Assim sendo, podemos extinguir o pecado retirando a sua "máscara" de realidade e revelando que não passa de falso aspecto. O pecado é como a treva. Na verdade, a treva não existe. Talvez vocês digam: "À noite, tudo fica escuro. Portanto, a treva existe". Mas ela existe apenas no nível fenomênico, isto é, embora pareça existir, não existe de verdade. Ao anoitecer, tudo fica na escuridão, e por isso parece que a treva existe; mas se iluminarmos a treva, no intuito de examiná-la e ver seu aspecto, ela desaparece. Ela parece existir, mas não existe de verdade. Se existisse de verdade, a treva ofereceria resistência à presença da luz, coisa que não ocorre. Quando a luz vem, a treva simplesmente desaparece, revelando a sua ausência. Assim é a treva. Por não existir de verdade, extingue-se diante da luz. Pode-se dizer que a luz consegue iluminar a treva porque a treva é originariamente inexistente.

Assim também é o pecado: Embora pareça existir, não existe de verdade. O mesmo se pode dizer dos efeitos do carma e da causalidade, os quais, em última análise, são diferentes denominações do pecado. Se o pecado ou os efeitos do carma e da causalidade não se manifestassem no aspecto fenomênico, não haveria necessidade de religião. Porém, como eles se manifestam e parecem existir, surgiu a religião para extingui-los, do mesmo modo com que se apaga a treva – que parece existir – com o poder da luz  que existe de verdade. 

A mestra fundadora da seita Tenri disse que "o ser humano é como uma esfera de cristal ligeiramente coberta de poeira". Ela ensinou que a natureza verdadeira do ser humano é bela e límpida como uma esfera de cristal puríssimo. O pecado não existe. Essencialmente, o ser humano é perfeito, não há nele nenhuma mácula. Suas imperfeições aparentes são como poeira que encobre a beleza e a limpidez de uma esfera de cristal. Mesmo que a poeira cubra a superfície de uma esfera de cristal, poeira é poeira, e cristal é cristal. Vendo uma esfera de cristal coberta de poeira, as pessoas dizem: "Essa esfera de cristal está suja". Estão equivocadas. Suja é a poeira; a esfera de cristal permanece límpida e bela. O mesmo se pode dizer do ser humano. A natureza verdadeira do ser humano é um ser divino (filho de Deus), um ser espiritual puro, belo e eterno, invisível aos olhos físicos. 

O ser humano não é o corpo material cheio de imperfeições. Na Bíblia, encontramos diversas passagens com alusões à efemeridade da carne. Considerando o ser humano do ponto de vista físico, temos de admitir que é um ser que precisa comer para viver, que mata outros seres vivos para se alimentar da carne deles, destrói microorganismos e até elimina um semelhante seu caso isso seja necessário para garantir sua sobrevivência. Porém, esse ser imperfeito não é o verdadeiro ser humanoO verdadeiro ser humano é "a imagem de Deus". Aqui, mais uma vez, deparamos com a questão da existência real. A distinção entre "existir de verdade" e "estar manifestado"" é uma questão de suma importância, do ponto de vista filosófico. Sem ter a compreensão do que sejam "existir de verdade" e "estar manifestado", não será possível entender realmente a essência da religião, ou seja, a Verdade que a Seicho-No-Ie prega. Quem pensa que a Seicho-No-Ie é uma religião vulgar, está cometendo um grande equívoco. O ensinamento da Seicho-No-Ie é muito elevado e, para entendê-lo bem, é preciso conhecê-lo em profundidade, considerando-o do ponto de vista filosófico.

Até agora, julgava-se verdadeiro ser humano o "homem fenomênico", o homem feito de corpo material, o homem imperfeito e transitório. Porém, verdadeiro é espírito proveniente de Deus e não "corpo carnal". Na verdade, todos estamos vivos porque "Deus está em nós". Dependendo da crença religiosa de cada um, isso pode ser expresso com outras palavras, tais como: "Vivemos porque Cristo está em nós", "vivemos porque Buda está em nós", "vivemos porque Brahma está em nós", etc. O importante é compreender que somos vivificados por Deus que está em nós. Compreender isso é despertar espiritualmente, é alcançar a iluminação.

A Imagem Verdadeira de todo ser humano é espírito proveniente de Deus. Portanto, o verdadeiro ser humano é perfeito, belo e límpido como um esfera de cristal da mais alta pureza, conforme as palavras da mestre-fundadora da seita Tenri. Ela afirmou que não existem nem o pecado, nem as impurezas, nem carma, nem doença, nem "encostos", enfim, coisa alguma que fira a natureza original perfeita do ser humano. Se o pecado e o carma existissem de verdade, não poderíamos extingui-los, por mais que tentássemos, procurando "polir" a nós mesmos com nossa força humana. Pecado, fatalidade, carma, são originalmente inexistentes, pois Deus não cria coisas más. Parecem existir, mas na verdade não existem, da mesma forma que a treva, embora pareça existir, não existe de verdade. Para se eliminar a treva, basta acender a luz. Do mesmo modo, para extinguirmos o pecado, a fatalidade, o carma, basta volvermos nossa mente para a Luz da Existência Verdadeira, isto é, Luz de Deus. Quando volvemos nossa mente para a Luz e contemplamos a perfeição de Deus nosso Pai, a nossa luz se funde com a Luz do Pai, a nossa vida se funde com a Vida do Pai, e então apagam-se todos os pecados manifestados no aspecto fenomênico.

Portanto, embora seja também necessário refletirmos sobre cada um de nossos atos na vida cotidiana e procurarmos melhorar sempre, o essencial é despertarmos para a Verdade de que somos filhos de Deus, ou seja, conscientizarmos o nosso "Eu verdadeiro", no qual flui a Vida de Deus, isento de pecado e sofrimento. Nisso consiste a verdadeira salvação.

Quando a pessoa recupera a liberdade inata da Vida, ocorre a cura da doença, qualquer que seja a sua religião. Eis a Verdade. Tanto na Seicho-No-Ie, como no cristianismo e outras religiões, ocorrem casos de cura de doenças. Se há pessoas que não conseguem a cura, é porque não acreditam na cura. Elas próprias impedem a manifestação da força curadora latente por estarem convencidas de que a cura é impossível, e devido a isso não ocorre a cura. Portanto, também nesse caso é verdadeira a afirmação da passagem bíblica: "Seja-te feito conforme a tua fé" (Mateus 8:13). É natural que o cristianismo também cure doenças, pois o próprio Jesus Cristo curava enfermos. Não seria lógico se, nos dias atuais, o cristianismo tivesse deixado de curar doenças. Isso estaria em desacordo com o seu ensinamento original. Se não ocorre a cura, é porque a própria pessoa, devido à sua crença errônea, está impedindo que a força de Deus atue sobre ela. 

Eu disse "impedir", mas na verdade isso é impossível, pois a crença errônea, ou seja, a ilusão, não tem força ativa para isso. Estar em ilusão e não conseguir ver da Luz de Deus é como estar de olhos fechados e não enxergar a luz do sol. Despertando da ilusão, compreendemos que vivemos num mundo radioso, repleto de bênçãos de Deus, do mesmo modo que, abrindo os olhos, vemos a resplandecente luz do sol. O mundo radioso existe desde o princípio. Basta abrirmos os olhos da mente para compreendermos que "o reino de Deus está aqui e agora". 

Como já expliquei, "devemos nos arrepender, pois o reino de Deus existe aqui e agora, já está ao nosso alcance"; isto é, o reino de Deus não está para chegar daqui a algum tempo, ele já existe aqui e agora. Basta "arrependermo-nos" para que ele se manifeste diante de nós. Os aflitos, os enfermos, os que estão com o coração cheio de tristeza, enfim, todos aqueles que sofrem, descobrirão o reino de Deus tão logo abrirem os olhos da mente. Quando eles abrirem os olhos da mente e despertarem da ilusão, o mundo terreno, que até então parecia impuro, feio e perverso, revelar-se-á como um mundo puro, repleto de paz e felicidade, iluminado pela Luz de Deus.


Do livro "A Verdade da Vida, vol. 33", pp. 85-90

segunda-feira, julho 15, 2019

O Arrependimento e o Despertar - 1/2

- Masaharu Taniguchi -


Algumas pessoas pensam que a finalidade da religião é pregar a salvação do homem após a morte. Porém, a verdadeira religião prega a salvação do homem nesta vida, ensinando a Verdade da Vida. Tanto o cristianismo como o budismo tem como essência a Verdade da Vida – portanto são religiões verdadeiras. Se a religião não pudesse salvar o ser humano nesta existência, como poderia ela garantir-nos a salvação após a morte? Mesmo que a salvação após a morte nos seja garantida, não há razão para não buscarmos a salvação nesta vida. Penso que é justamente a salvação nesta vida que nos conduz à certeza da salvação após a morte. 

Em que consiste, então, a salvação nesta vida? Alguns pensam que ser salvo é ser liberto dos sofrimentos e das dificuldades e passar a desfrutar uma vida de fartura e conforto, tal como um peixe liberto da rede e solto no oceano. Porém, a verdadeira salvação não consiste simplesmente em alcançar melhor situação econômica ou obter a cura da doença.

Penso que, em última análise, alcançar a salvação é recuperar a verdadeira liberdade que nos é inerente – a liberdade da Vida. Referindo-se a isso, Sakyamuni usou o termo gedatsu, que significa "ser salvo", isto é, libertar-se de todos os apegos, aflições e sofrimentos e alcançar o satori – a iluminação. O "satori" do budismo corresponde ao "arrependimento" de que fala a doutrina cristã. Arrependimento não consiste somente em reconhecer o erro cometido e tomar a decisão de não tornar a errar. Isto é apenas "arrependimento parcial". O arrependimento completo consiste na transformação total da postura mental. Algumas pessoas traduzem a palavra inglesa "conversion" simplesmente como o ato de aderir a um doutrina; mas o verdadeiro significa dessa palavra é "arrependimento completo, em que a pessoa muda por inteiro a sua postura mental e, como consequência disso, o seu mundo se transforma totalmente". O "mundo" a que me refiro aqui não é o mundo físico, e sim o mundo interior. Mudar completamente a postura mental, abandonando, de uma vez por todas, a ideia de que somos criaturas cheias de pecado, e descobrir o nosso "Eu Verdadeiro" isento de pecado e sofrimento – este é o verdadeiro arrependimento. Em outras palavras, o verdadeiro arrependimento consiste em abandonarmos completamente a ideia de que somos seres constituídos de corpo carnal, sujeito a pecados, e nos conscientizarmos de que somos filhos de Deus, isentos de pecado. Esta é a verdadeira conversão.

Em última análise, o verdadeiro arrependimento consiste em deixarmos de pensar que somos mera existência material e alcançarmos a sublime conscientização de que somos filhos de Deus e, portanto, existência espiritual. Jesus Cristo pregou: "Arrependei-vos, porque está próximo o reino dos céus" (Mateus 3:2). Lendo a Bíblia em inglês, constatei que o referido versículo diz: "The Kingdom of Heaven is at hand". Na tradução do inglês para o japonês, o termo "at hand" é usado com a conotação de "estar se aproximando"; devido a isso, muitos pensam que o reino dos céus "está para chegar". Porém, o referido termo em inglês significa também "ao alcance", e no mencionado versículo foi usado com esse significado. Portanto, a advertência de Jesus Cristo não foi no sentido de que "devemos nos preparar, arrependendo-nos dos pecados, porque o reino dos céus vai chegar daqui a algum tempo". A referida afirmação "at hand" significa "estar à mão" ou "estar ao alcance, para ser desfrutado desde já". Sendo assim, contanto que nos arrependamos verdadeiramente, podemos passar a desfrutar imediatamente as graças do reino dos céus. Este é o verdadeiro significado da referida passagem bíblica.

O verdadeiro arrependimento não consiste em tentarmos nos redimir cada vez que cometemos um erro, de modo a melhorarmos gradativamente, mas sim em abandonarmos, de uma vez por todas, a ideia de que somos criaturas pecadoras, e compreendermos que somos filhos de Deus, criados à imagem do Pai, que é Existência espiritual e eterna. Quem se arrepender verdadeiramente há de encontrar o paraíso aqui e agora, nesta vida terrena.


"Ninguém subiu ao céu, senão aquele que desceu do céu"

No Evangelho de São João (3: 2-13), consta a passagem em que Jesus diz o seguinte a Nicodemos, um dos principais entre os judeus: "Em verdade, em verdade te digo que não pode ver o reino de Deus senão aquele que nascer de novo". Nicodemos, que já era bastante idoso, perguntou-lhe então: "Como pode um homem nascer, sendo velho? Porventura pode tornar a entrar no ventre de sua mãe e renascer?". Jesus explicou, em linhas gerais, o seguinte: "Não estou falando em renascimento físico. O que nasce da carne, será sempre carne. Ainda que o ser humano pudesse renascer do útero de uma mulher, e passasse por tal renascimento quantas vezes desejasse, ele nascerá sempre como um ser carnal (material)". Isso não é o verdadeiro renascimento. O verdadeiro renascimento consiste em compreendermos a sublime Verdade de que não somos meros corpos carnais, e sim "existência real" de natureza espiritual. O vento sopra, e você ouve o ruído, mas não sabe de onde o vento vem, nem para onde ele vai. Se nem das coisas terrenas você entende, como pode entender das coisas celestes? "Somente aquele que desceu do céu, pode subir ao céu". Dessas palavras de Jesus Cristo, podemos depreender que somente aqueles que desceram do céu podem tornar ao reino do céu, ou, em outras palavras, somente aqueles que se originaram de Deus podem voltar para junto de Deus. O que nasce da carne será sempre carne. O ser humano enquanto "corpo carnal" sujeito aos pecados não pode entrar no reino do céu, ou seja, reino de Deus, por mais que se arrependa e procure melhorar sua conduta. 

Como será o reino de Deus? Conforme consta numa passagem do Evangelho de São Lucas (17:20-21), Jesus Cristo disse: "O reino de Deus não virá com aparato; nem se dirá: 'Ei-lo aqui, ou ei-lo acolá'. Porque eis que o reino de Deus está no meio de vós". O significado dessas palavras é o seguinte: O reino de Deus não pode ser visto "aqui" ou "acolá", no mundo material, pois ele existe dentro de nós mesmos, e o encontramos quando compreendemos que nossa Vida provém do Espírito de Deus que se alojou em nós. Assim sendo, não é possível descrever o aspecto do reino de Deus como se descreve o aspecto do mundo material. O reino de Deus existe dentro de nós mesmos, e o encontramos quando mudamos completamente o conceito acerca de nossa própria natureza.

Até agora, julgávamos o ser humano uma criatura cheia de pecados e prisioneira de seu próprio carma, e com esse pensamento vínhamos tolhendo a nós mesmos. Devemos nos libertar desse tolhimento, transcendendo o "eu fenomênico" cheio de pecados, e conscientizando verdadeiramente que o Espírito de Deus proveniente dos céus vive dentro de nós. Portanto, o nosso "Eu verdadeiro" não é o "corpo carnal" sujeito ao tolhimento e cheio de imperfeições, mas sim a Vida infinita presente em nós, proveniente de Deus. Só então podemos dizer que nos arrependemos verdadeiramente; só então podemos afirmar a nossa natureza divina, tal como o apóstolo Paulo expressou: "E vivo, não mais eu, mas é Cristo quem vive em mim". Cristo não é apenas uma pessoa de carne e osso que nasceu na Judeia há cerca de dois mil anos, mas sim uma expressão sublime da Verdade eterna, que surgiu na Judeia naquele tempo. O próprio Jesus Cristo disse: "Eu sou o caminho, a verdade e a vida" (João 14:6). Assim como Jesus Cristo, todo ser humano traz dentro de si a natureza divina eterna. No Evangelho de São João, lemos as seguintes palavras de Jesus Cristo: "Já não vos chamarei de servos, porque o servo não sabe o que faz o seu senhor. Mas chamei-vos amigos, porque vos dei a conhecer tudo aquilo que ouvi de meu Pai" (João 15:15). Todos nós temos, latente, a mesma natureza divina de Jesus Cristo. E quando compreendemos isso, deixamos de ser servos e tornamo-nos irmãos e amigos do Cristo-Filho de Deus.


Parábola do mendigo e a riqueza oculta, contida na Sutra do Lótus

Todos nós temos, latente, a natureza divina eterna, mas não percebemos isso. Enquanto não nos damos conta de nossa natureza divina, somos meros servos de Jesus Cristo, mas quando despertamos para essa nossa natureza verdadeira, tornamo-nos amigos dele. 

Também no budismo (sutra do Lótus) há uma passagem que se refere à natureza divina latente do ser humano. Trata-se da parábola do mendigo e a riqueza oculta: Certa vez, um homem rico, que saiu para tratar de negócios, encontrou no caminho um velho amigo a quem não via há muitos anos. O amigo estava num estado deplorável: sujo, maltrapilho e macilento, parecendo não ter se alimentado há muitos dias. "Que foi que aconteceu com você? – perguntou-lhe o homem rico. "Estou desempregado e passando necessidade, como pode ver" – respondeu o amigo. Compadecido, o homem rico lhe disse: "Eu estava indo para tratar de negócios, mas não posso deixá-lo nesse estado. Vou levá-lo à minha casa, e oferecer-lhe almoço". Assim, o homem rico levou o amigo pobre para sua casa e mandou servir uma lauta refeição acompanhada de saquê. O amigo pobre, após comer e beber até saciar-se, acabou adormecendo. O homem rico, vendo que já estava na hora de sair para atender a um compromisso de negócio, sacudiu o amigo para acordá-lo, mas este continuou profundamente adormecido. O homem rico, que queria tirar o amigo da miséria, teve uma ideia e imediatamente colocou-a em prática: Descosturou um pouco a gola do casaco do amigo, colocou dentro dela uma pedra preciosa de grande valor, e refez a costura. "Pronto! Agora o meu amigo é dono desta pedra preciosa de grande valor. Basta ele apalpar a gola para descobri-la. Vendendo esta pedra, poderá conseguir muito dinheiro e refazer sua vida". 

Em seguida, o homem rico saiu para tratar de negócios, e quando ele voltou ao anoitecer, o amigo pobre já havia partido. Passaram-se alguns meses, e um dia o homem rico tornou a deparar com aquele velho amigo, o qual continuava sujo e maltrapilho como da vez anterior. Surpreso, o homem rico perguntou: "Que é que você tem feito de sua vida?", e o outro respondeu: "Como vê, continuo na miséria". "Não é possível" – disse o homem rico – "eu lhe dei uma pedra preciosa de enorme valor". "Não sei do que você está falando". "Examine a gola do seu casaco. Isso! Notou que há algo dentro dela, não é? Abra-a e verá que se trata de uma pedra preciosa de grande valor". E assim o amigo pobre, que se julgava sem um tostão, finalmente descobriu a pedra preciosa de valor incalculável que estava oculta dentro gola de seu casaco. 

Nesta parábola, a pedra preciosa de valor incalculável corresponde à natureza divina de que todos nós somos dotados. Embora tenhamos natureza divina, ela será inútil enquanto não conscientizarmos isso. Porém, a partir do momento em que despertarmos para nossa natureza divina, ela passará a manifestar infinitas virtudes.

Dentre todos os sutras budistas, o sutra do Lótus é o que contém a verdade mais profunda, que Sakyamuni guardou consigo durante quarenta anos e revelou por último. Nele consta a Verdade de que todos nós temos natureza búdica (ou seja, natureza divina), perfeita e eterna. O verdadeiro arrependimento consiste em compreendermos que não somos criaturas imperfeitas e pecadoras, mas sim seres dotados de natureza divina eterna. Parafraseando Jesus Cristo, podemos dizer: "Arrepende-te, pois o reino de Deus está aí mesmo, junto a ti", "Abre os olhos e vê, o paraíso está 'dentro da gola' de tua própria roupa". Quando descobrimos nossa natureza verdadeira, compreendemos que estamos no Paraíso, na Terra Pura, aqui mesmo neste mundo. 

Nosso "Eu Verdadeiro" não é o corpo físico, de duração limitada, que com o passar dos anos se desgasta e envelhece, e sim o ser espiritual dotado de natureza divina. O apóstolo Paulo disse: "E vivo, não mais eu, mas Cristo vive em mim". Quem não é cristão, não precisa mencionar "Cristo". Os budistas podem dizer "Buda vive em mim", e os seguidores do hinduísmo podem dizer "Brahma vive em mim". Qualquer que seja a religião, é fundamental que a pessoa desperte para a Verdade e compreenda que traz dentro de si a Vida de Deus. Esse despertar é a conversão, é o verdadeiro arrependimento; no budismo, é a iluminação, a libertação, a "obtenção da serenidade espiritual". 

Quando despertamos para nossa natureza divina, manifesta-se a força infinita, latente em nós desde o princípio. O que acontece quando se manifesta a força infinita? Naturalmente, passam a ocorrer efeitos correspondentes, beneficiando-nos em tudo: se estamos doentes, recuperamos a saúde; se temos problemas, encontramos a solução; se estamos com dificuldades financeiras, a situação melhora rapidamente, e assim por diante. Alguns riem, quando afirmo isto; dizem que acreditar nisso é crer numa magia. Porém, não se trata disso. Como podemos constatar em diversas passagens bíblicas, o próprio Jesus Cristo, pelo poder de sua força divina, curava os doentes e socorria os pobres. Quanto a resolver o problema de carência material, não consta alusão clara na Bíblia, mas isso fica subtendido em algumas passagens, como – por exemplo – aquela em que Jesus Cristo, após pregar para a multidão à margem do lago Genesaré, falou com Simão Pedro (que nessa época ainda era pescador), e aconselhou-o a "fazer-se ao largo e lançar a rede"; por terem seguido o conselho, Simão Pedro e seus colegas conseguiram apanhar "tão grande quantidade de peixes, que a sua rede rompia-se" (Lucas 5: 4-7). Eles obtiveram a fartura porque, ouvindo as palavras da Verdade que Jesus Cristo pregara, compreenderam que o ser humano traz dentro de si  Vida infinita e a capacidade ilimitada que o possibilitam conseguir todas as coisas necessárias para seu sustento.

Em Mateus 14: 17-21, Marcos 6:38-44 e Lucas 9:13-17, consta que Jesus Cristo, tomando cinco pães, multiplicou-os e distribuiu-os a cinco mil pessoas. Segundo as referidas passagens bíblicas, todos se saciaram e ainda sobraram doze cestos cheios de pães. Talvez haja quem duvide que possa acontecer tal milagre. Mas aconteceu. Assim é a religião. Ela transcende a matemática. A salvação que oferece transcende as leis matemáticas e as leis físicas, e por isso podemos dizer que é a verdadeira salvação, proporcionada por Deus. Enquanto estivermos presos ao mundo regido pelas leis físicas, onde prevalece a relação de causa e efeito, não podemos nos considerar verdadeiramente salvos. Alcançar a verdadeira salvação, proporcionada por Deus através da religião, consiste em transcender o mundo regido pela lei da causalidade e atingir o estado de liberdade total, pelo conhecimento da Verdade. Jesus Cristo disse: "A Verdade vos tornará livres" (João 8:32). Sendo ele próprio a personificação da Verdade, Jesus Cristo tem o poder de nos livrar do tolhimento da lei da causalidade e tornar-nos verdadeiramente livres. 

Se o único meio de nos livrarmos dos efeitos cármicos que acumulamos ao longo de nossas existências anteriores consistisse em irmos pagando um por um todos os erros e pecados do passado, não precisaríamos de religião. Bastaria nos esforçarmos incessantemente para acumularmos boas ações e irmos redimindo, pouco a pouco, os erros e pecados cometidos ao longo de nossas existências. Porém, como os efeitos cármicos também continuarão se acumulando, jamais conseguiríamos redimir todos os erros e pecados. Desse modo, jamais poderíamos alcançar a verdadeira salvação. Para alcançarmos a verdadeira salvação, precisamos nos libertar da "corrente cármica", e para isso é necessário arrependermo-nos verdadeiramente, ou seja, volver nossa mente para Deus e despertar para nossa natureza divina.

Do livro "A Verdade da Vida, vol. 33", pp. 75-84

quarta-feira, julho 10, 2019

"Quem somos" na Realidade e na Representação

- Gustavo -


Sobre o conteúdo do post anterior, seguem algumas importantes considerações:

Este texto de Goldsmith é realmente profundo! Não me surpreende que um texto dessa magnitude tenha chamado sua atenção para nos proporcionar uma reflexão do que ele contém.

Eu escolhi esse texto de Goldsmith porque ele complementa e enfatiza (com palavras diferentes) o que foi dito por Masaharu Taniguchi.

Uma verdade essencial a ser assimilada, por nós que buscamos a Verdade, é que a visão do Todo (aquilo que chamamos de Eu) somente emerge em nossa percepção quando conseguimos levar em consideração todos os nossos irmãos (ou seja, o "outro"). A Verdade que buscamos para nós deve incluir em si todos os seres, sem exceção. Somente assim é que surge a percepção do Eu. A mente egoica, visando manter a separação entre "eu" e o "outro", tende a querer associar a Verdade com aquele "eu" e não levar em consideração o "outro". Dessa forma, a percepção do Eu não pode emergir. O sentido de "Eu" somente surge quando nossa percepção da verdade inclui  tanto o "eu" quanto o "outro". Numa equação simples, Eu = "eu" + "outros". Desaparecendo a linha ou fronteira que separa o "eu" e o "outro", surge o Eu que "aparece como" todos.

Manter o "outro" separado do "eu" é uma das estratégias do ego para nos manter presos na mente. 

Por isso, Masaharu Taniguchi disse:

"Para fazermos ressurgir o paraíso, não basta reconhecermos a nós próprios como sendo um 'ser espiritual', um ser divino dotado de Vida eterna e, portanto, digno de habitar o jardim do Éden. É preciso contemplar todas as pessoas como sendo filhos de Deus, dignos de viver no paraíso. Jesus Cristo disse: 'Quem não reverencia o filho de Deus, não reverencia o Deus-Pai'. Aquele que não é capaz de reverenciar o ser humano como filho de Deus, também não é capaz de reverenciar verdadeiramente o Deus-Pai que rege o universo. Enquanto não formos capazes de reverenciar todas as pessoas, não poderemos fazer com que este mundo se transforme em paraíso. Despertar para a Verdade de que 'o homem é filho de Deus' não é conscientizar-se apenas da natureza divina de si mesmo, mas sim compreender que 'todas as pessoas são filhos de Deus' e viver em harmonia com todos, amando-os e reverenciando-os."

Por sua vez, Goldsmith diz que: 

"... dar falso testemunho contra o próximo é declarar que ele é humano, finito, que tem falhas, e que é menos do que o filho de Deus. Violando essa lei cósmica, atraímos nossa própria punição, porque a verdade que diz respeito ao 'outro', diz respeito também a 'mim', uma vez que há somente um Eu e um Ser. A única maneira de evitar falso testemunho contra o próximo é perceber que o Cristo (filho de Deus) é nosso próximo, que nosso próximo é um ser espiritual, exatamente como nós. Ele pode não saber, nós podemos não saber, mas a verdade é: Eu Sou o Espírito, Eu Sou a Alma, Eu Sou a Consciência, Eu Sou Deus Expresso - assim como o nosso próximo."

Essa é a visão que devemos treinar, exercitar, buscar manter sempre conosco.

O interessante a se notar é que: para os que são "acordados" (iluminados), não existe pessoa ou ser que não seja iluminado. Um ser desperto vê/percebe todos os outros seres como estando despertos. Em outras palavras, percebe somente a Si mesmo. Ele pode até conversar frente-a-frente com um indivíduo não-desperto, pode tentar auxiliar esse indivíduo a tornar-se desperto, mas não levará isso a sério. Ele estará apenas "jogando", ou seja, apenas interagindo na representação.

A percepção iluminada é absoluta. Quando ela se realiza em você, simultaneamente se realiza em todos os seres, iluminando tudo. Ao se tornar consciente, você também perceberá todos os seres estando conscientes. Isso ocorre porque você é um universo inteiro e infinito. Por exemplo: suponhamos que eu não esteja iluminado, e me encontre com você que está iluminado. Nesse caso, haverá a presença de dois universos infinitos - o meu universo e o seu universo. Se você estiver iluminado, eu (que estou aparecendo no seu universo) estarei iluminado. Se o seu universo estiver iluminado, eu estarei iluminado para você. Você me perceberá assim porque estará vendo do referencial do seu universo, que inclui a mim. E eu, permanecendo no referencial do meu universo, não poderei perceber a mim nem a você como iluminados, enquanto o meu universo não se iluminar. 

O modo como o meu universo se torna iluminado não se dá de modo objetivo (com mudanças exteriores ocorrendo nele), e sim de modo subjetivo (quando eu obtenho uma certa percepção dele). Se você olhar pela janela e quiser ver a paisagem da cor vermelha, não precisa empreender o duro trabalho de pintar todo o cenário de vermelho, basta colocar um óculos com lentes vermelhas e a paisagem toda se torna vermelha instantaneamente. De modo análogo, é assim que o universo se torna iluminado para nós: quando iluminamos a nossa percepção.

Joel Goldsmith diz que "Deus aparece como o Ser individual", e que o Ser individual compreende o infinito, a totalidade do universo inteiro. É por isso que cada um de nós somos esse Ser Individual, esse Universo infinito. Tudo o que precisamos fazer é iluminar a percepção que temos do universo que somos.

E o que fazer para iluminar a percepção que temos de nosso universo?

Primeiro precisamos compreender uma verdade essencial acerca de Quem realmente somos (quando não levamos em conta a existência da Representação), e também de Quem somos (quando levamos em conta a presença da Representação).

O Ser que verdadeiramente somos existe desde "antes que a Representação existisse", e existe como um Ser absolutamente puro, iluminado, imaculado, sagrado e perfeito. É a nossa Identidade Celestial, em que Deus-Pai (Ser Universal) aparece como o Filho (Ser Individual). Nessa Realidade (que existe antes da Representação), Deus-Pai e o Filho são exatamente a mesma coisa, o mesmo Ser. Tudo o que Deus é, nós, enquanto Filhos de Deus, também o somos. Deus compartilha conosco tudo quanto Ele é e tem. Nossa Realidade e Identidade celestiais é uma existência gloriosa. Essa é a Verdade exata e imutável sobre de cada um de nós enquanto Seres "anteriores à Representação". É a Verdade exata sobre nós, assim como na matemática o 4 é o único resultado correto e possível para a equação 2+2.

Mas, então, eis que surge a Representação. Uma vez que a Representação entra em cena, muitas coisas se tornam possíveis, até mesmo o que não existe de verdade. A Representação tem a característica de ser como um "quadro-negro" ou "folha de papel em branco", e nela é possível escrever aquilo que se quiser. Se você escrever num quadro negro que 2+2 = 4 (ou seja, a verdade), ele irá registrar isso. Por outro lado, se você escrever 2+2 = 5 (ou seja, o erro), ele também irá registrar isso. O propósito da Representação é proporcionar a existência/experiência de tudo o que não é verdadeiro. Mesmo que a matemática tenha o 4 como o único resultado possível/correto para a conta 2+2, o quadro-negro aceitará a presença da equação 2+2 = 5, caso alguém assim queira assinalar. 

Por isso, quando levamos em conta a Representação (o quadro-negro), o Ser que somos não é necessariamente aquela Identidade Celestial perfeita. Ao adentrarmos a Representação, assumimos o nosso Ser como algo absolutamente indefinível, capaz de se revestir tanto de uma identidade correspondente à Verdade, como também de uma identidade correspondente à inverdade. No âmbito da Representação, o Ser que somos é como um vácuo, um espaço vazio e sem forma, capaz de assumir em Si os mais diversos conteúdos. Isso é o que torna possível estarmos no universo da Representação, caso contrário ficaríamos somente na Realidade que existe desde "antes" da Representação.

É por isso que determinados ensinamentos (que não levam em conta a Representação) mencionam de forma taxativa que a nossa real identidade é a de Deus (ou Filhos de Deus), e enfatizam a nossa realidade divina como Verdade definitiva e imutável. Se esses ensinamentos fossem indagados sobre a pergunta "Quem sou eu?", eles diriam: "Você é Deus, o Filho de Deus perfeito, vivendo aqui e agora no reino de Deus".

Por sua vez, se outros ensinamentos (os quais levam em conta a Representação) fossem indagados sobre a pergunta "Quem sou eu?", responderiam: "Não tente descobrir Quem é você, não tente obter uma resposta para essa pergunta. Nem mesmo assuma que você é 'Brahma', ou o 'Atma', ou o 'Divino'. Apenas fique com a pergunta, até que ela finalmente desapareça, e quando a pergunta desaparecer somente então você saberá quem é". E a pergunta somente desaparece quando nós também desaparecemos, ou seja, quando nos percebemos sendo esse imenso Vazio sem conteúdo algum (e, por isso, capaz de todos os conteúdos). 

Em um dos livros de "A Verdade da Vida", Masaharu Taniguchi explica que "o homem é um ser enigmático, misterioso, híbrido, capaz de perambular entre dois universos" (unidade e separatividade). Ao experienciar sua real identidade na Representação, ele desejou expressar ao mundo o seu despertar e assim registrou em forma de poema, dizendo: "Abandono-me ao sabor das ondas, e, completamente entregue a elas, fito o céu azul. Nada vejo, mas tudo existe. Sendo vazio e, ao mesmo tempo, pleno; sendo pleno e, ao mesmo tempo, vazio - um ser que está vivo e flutua, um ser misterioso e extraordinário: isto sou Eu." Se o homem é capaz de perambular entre dois universos, então ele não é a imagem que aparece na Representação quando mergulha no universo da divindade; tampouco é a imagem que surge quando imerge no universo da separatividade. Enquanto estiver na Representação, ele é aquela identidade vazia, misteriosa, indefinível, capaz de assumir ambos os conteúdos. Por isso, ao mesmo tempo que é vazio, é completamente cheio. Mas essa Verdade só é válida do ponto de vista da Representação. Na Matemática 2+2 é igual a 4, e é impossível que 2+2 seja igual a 5. Mas no quadro-negro é possível a equação 2+2 ser igual a 5. Da mesma forma, na Realidade Celestial é impossível sermos algo separado ou diferente do que Deus é. Mas na Representação podemos existir ou experienciar nosso ser como sendo algo separado ou diferente Dele. Consequentemente, também podemos experimentar o nosso Ser como unido e idêntico a Deus. A Representação foi feita para possibilitar a existência da separatividade (Ego) e também para que a Divindade (Eu) pudesse Se expressar plenamente através de cada ser, coisa e fato.

Por isso, na Representação, somos aquele ser (o Observador) misterioso, vazio, híbrido, indefinível, capaz de assumir conteúdos condizentes com a Realidade, e conteúdos condizentes com a irrealidade.

Uma vez que assimilemos isso, podemos compreender que o nosso Ser pode se alinhar tanto com a Verdade, como também pode se alinhar com a inverdade. Se estivermos alinhados com a irrealidade, devemos fazer um trabalho de esvaziamento, a fim de que nos tornemos disponíveis para receber em nós a Verdade, somente então é que passaremos a expressá-La aqui na Representação. Não é incomum vermos tantos ensinamentos discorrendo sobre a importância do "Vazio" e incentivando os buscadores a aprenderem a se esvaziar. Somente quando nos tornamos vazios (do conteúdo correspondente à inverdade) é que nos colocamos em condição de receber/acessar a Verdade e manifestá-la no universo da Representação.

O ego tem o papel de utilizar todas as estratégias possíveis para nos manter alinhados com a inverdade como, por exemplo, proteger a linha ou fronteira que demarca a existência do "eu" e do "outro". Ao proteger essa fronteira e mantê-la intacta, é impossível surgir a noção ou percepção do Eu. Pois, como já vimos, Eu = "eu" + "outros".

O ego tem uma determinada visão do universo, ao passo que o Eu tem uma outra visão do mesmo universo. O universo em si não é nada, não tem significado algum. A percepção é tudo(!). Nós é que conferimos significado ao universo mediante a visão com que olhamos para ele. Se conseguirmos alterar a lente de percepção com que enxergamos o universo (trocando as lentes da separatividade por uma lente iluminada), o universo inteiro se tornará iluminado, e assim perceberemos Eu aparecendo como tudo e todos neste próprio universo em que vivemos.

E muitas ferramentas nos são oferecidas. Há várias chaves de percepção que, se colocadas em prática, alinham a nossa visão com a percepção que o Eu tem do universo. Algumas delas:

* Pensar, falar e agir com Amor (ser Amor).
* Perdoar verdadeiramente (Purificar a  mente de conteúdos pesados e negativos, como raiva, ciúme, ódio, inveja, mágoas, ressentimentos, etc.)
* Não julgar (Pois, como já dito, o universo não é nada por si mesmo. Tudo depende da percepção com que se olha para ele. Sempre que julgarmos algo, estaremos vendo apenas um subproduto de nossa própria visão).
* Manter em mente somente pensamentos da Verdade (Tudo aquilo que sabemos ser verdadeiro na Realidade Celestial) e buscar manifestar nossas vidas em conformidade com essa Verdade.
* Sempre levar em consideração o outro (Ou seja, saber que todos estão incluídos na Verdade, pois ela é impessoal. O Todo somente se revela quando se reúnem todas as suas "partes").
* Gratidão (assim como o amor, a gratidão é uma chave poderosa para nos alinhar com a Verdade divina)
* Estar sempre atento ao momento presente, e aceitá-lo tal como ele é (A Verdade existe sempre aqui e agora).
* Ação dhármica (agir sem visar recompensas pessoais, com renúncia aos frutos da ação, ou seja com desapego. Pois o "eu" não existe. Só existe o Todo).
* Receber a Deeksha (a energia da Deeksha acelera o processo do despertar da consciência).
* E, claro, um desejo/amor ardente e inquebrantável por querer conhecer a Verdade, Deus.

Essas são algumas das principais chaves de acesso ao Eu, que são recomendadas pelos mais variados ensinamentos. A cada vez que exercitamos uma dessas chaves, nosso ser se alinha/sintoniza um pouco mais com a Verdade. São essas as coisas que precisamos treinar.

Também é muito importante lembrar que: "A chamada 'mente comum nem mesmo interfere quando estamos percebendo a partir da Consciência". Isso significa que não precisamos aniquilar a visão mental para desfrutarmos da percepção consciencial. Podemos perceber consciencialmente independente da interferência da mente comum [mente do personagem], pois a interferência causada pela mente do personagem é apenas aparente. Isso é algo que pouquíssimos ensinamentos revelam aos buscadores. Mas é a verdade. Podemos nos perceber sendo o Ator, e mesmo assim continuar representando o papel de nossos personagens aqui na Representação. Foi em razão disso que Joel Goldsmith disse:

"O nosso próximo [o outro personagem] pode não saber, nós podemos não saber [ou seja, podemos estar representando o papel de um personagem que ainda não despertou para a Verdade, e mesmo assim estarmos conscientes de Quem somos. Pois quem está consciente de Si mesmo é o Ser, e não o personagem], mas a verdade é: Eu Sou o Espírito, Eu Sou a Alma, Eu Sou a Consciência, Eu Sou Deus Expresso - assim como o nosso próximo."

Todas essas coisas são algo que vale a pena ponderar, contemplar, e meditar.

Namastê!


domingo, julho 07, 2019

"Não dar falso testemunho"


- Joel S. Goldsmith - 


Nunca pensemos em um ser humano como se ele precisasse de cura, de emprego ou de riquezas, porque se assim fizermos, seremos seu inimigo em vez de amigo. Se houver qualquer homem, mulher ou criança que acreditamos estar doente, ser pecador, ou estiver morrendo, não oremos até que tenhamos nos reconciliado com esse irmão, pedindo perdão por temos cometido o erro de julgar, porque todos são DEUS em expressão. Tudo é Deus manifestado. Só Deus constitui este universo, bem como a vida, a mente e a Alma de cada individuo.

"Não darás falso testemunho contra teu próximo" tem uma conotação muito mais ampla do que, meramente, não espalhar boatos ou fofocas sobre ele. Não devemos manter o  nosso próximo em humanidade. Se dissermos: "Meu próximo é bom", estaremos dando falso testemunho contra ele, tanto quanto se disséssemos: "Meu próximo é mau", porque isso demonstra que reconhecemos sua condição humana às vezes bom e às vezes mau - e não a espiritual. 

Dar falso testemunho contra o próximo é declarar que ele é humano, que é finito, que tem falhas, que é menos do que o próprio Filho de Deus. Toda vez que reconhecemos o nosso próximo como pecador, pobre, doente ou morto, como outro que não o filho de Deus, daremos falso testemunho contra ele. 

Violando a Lei cósmica atraímos nossa própria punição. Deus não nos pune, nós é que nos punimos porque, ao dizermos "você é pobre", praticamente estamos dizendo que "eu sou pobre", uma vez que há somente um Eu e Um Ser. Assim, a Verdade que diz respeito a você diz respeito a mim. 

Se eu aceitar a crença de pobreza no mundo, ela reage sobre mim. Se eu disser que você está no mundo, ela reage sobre mim. Se eu disser que você está doente ou que você não é gentil, estarei aceitando uma característica separada de Deus, uma atividade à parte de Deus e, dessa forma, estarei condenando a mim mesmo, porque só existe UM SER.

Finalmente, quando dou falso testemunho contra alguém, me condeno e sou o Único a sofrer as consequências. 

A única maneira de evitar falso testemunho contra o próximo  é perceber que o Cristo é nosso próximo, que nosso próximo é um ser espiritual - o filho de Deus, exatamente como nós. Ele pode não saber, nós podemos não saber, mas a verdade é: Eu Sou o Espírito, Eu Sou a Alma,  Eu Sou a Consciência, Eu Sou Deus Expresso - assim como o nosso próximo.


quarta-feira, julho 03, 2019

Sintonizando o Ator no personagem



Divinos Amigos,

Permitam-me compartilhar uma Percepção. Ela será útil em qualquer estudo sobre Deus, em toda prática de meditação e no próprio ato de viver a vida cotidiana, ou seja, será útil em como viver.

O mundo fenomênico, o mundo percebido pelos cinco sentidos, é uma Representação Divina! Por ser uma Representação Divina é bastante/extremamente realística para quem estamos sendo... ou seja, é bastante realística para o personagem que estamos representando.

Contudo, não somos o personagem, somos o Ator Divino subjacente ao nosso personagem...

Cabe enfatizar que não somos “quem estamos sendo”, não somos o personagem que estamos representando, somos Quem realmente Somos; somo o Ser Real subjacente ao “personagem”.

A Percepção aqui compartilhada é que não é possível perceber a nossa real identidade a partir dos cinco sentidos. Isto é assim porque os cinco sentidos estão no domínio da Representação. É por este motivo que a prática da Meditação Shinsokan começa com: “Neste momento deixo o mundo dos cinco sentidos e entro no mundo da Imagem Verdadeira.” É também por este motivo que Jesus iniciou seu Ministério com a Percepção compartilhada pelo profeta Isaías, lendo na Sinagoga a passagem das Escrituras Sagradas onde está escrito: “O Espírito do Senhor está sobre mim e me ungiu para evangelizar os pobres, regatar a visão aos cegos, dar liberdade aos contritos, libertar os cativos e anunciar o Ano do Senhor.” Tudo isso parte da Percepção dAquele que realmente faz, a saber, o Espírito do Senhor, que é Quem está acima [está sobre mim], que é Quem dá sustentação e fundamento a toda ação, que é Quem unge. A unção vem do Alto, vem dAquele que está acima, que está no Céu, na Realidade, não vem da Representação.

Notem que o Ator subjacente ao personagem é Aquele a Quem o personagem busca! Aquele a Quem o personagem busca não está fora do próprio personagem, não está além, mas não está no mundo! 

Este Ator subjacente a quem estamos sendo é chamado na linguagem cristã de Espírito Santo.    

Assim, a Percepção aqui compartilhada parte deste Ator Divino subjacente ao personagem e tem como objetivo sintonizá-Lo no personagem! Alguns poderiam questionar: Isto é possível? Pode o irreal (o personagem) sintonizar o real (o Ator)? A resposta está na elucidação dada por Jesus a Simão, a quem Jesus disse: “Isto Quem te revelou não foi carne e sangue, mas meu Pai, que está no Céu.”

Notem! Simão era um personagem comum que teve uma Percepção vinda do Ator subjacente! Mas Simão não percebeu que isto estava acontecendo. Por isso Jesus enfatizou esse fato, de que esta Percepção não era da “mente” do “personagem” Simão”, mas sim, do próprio Ator! E Jesus enfatizou que este Ator Divino, ou seja, que o Ser Real, está no Céu, está na Realidade e não na “Representação”.

Eis o ponto central, o objetivo da religião, o objetivo do “religare”! Por isso, diante desse fato, diante da Percepção de Pedro, Jesus enfatizou este detalhe a ser notado! Essa é a ponte que une as “margens do rio”, na linguagem budista, na qual de um lado do rio estão os que buscam a iluminação e do outro estão os iluminados! Esta separação aparente entre margens do rio, entre iluminados e não iluminados existe apenas na Representação; Não é real!

Essa possibilidade de o personagem ter a própria Percepção do Ator é que deve ser focalizada!

Quando a mente do personagem pensa imediatamente entra na dimensão da Representação. Por isso o ato de pensar é, em quase cem por cento das vezes, um obstáculo à Percepção. E é assim porque o simples ato de pensar aciona o personagem; por assim dizer, o ato de pensar faz o “download” do personagem.

O “cogito ergo sum” não deveria ser um penso, logo existo, mas sim um penso, logo, desisto...

A menos que o personagem esteja sintonizado nos “pensamentos de Deus” seus pensamentos o levarão a entrar na Representação, cujo cartaz é sempre o mesmo “filme”: A expulsão de Adão do Paraíso...

Há duas versões para a criação do homem: Aquele feito à Imagem e Semelhança de Deus e aquele feito do barro da Terra... Terra é Representação! O homem feito do “barro da Terra”, ou seja, feito da “essência da Representação”, é pó! E, como pó, ao pó retorna...

O Homem feito à Imagem e Semelhança de Deus é feito da essência da Realidade, ou seja, é Realidade; É, na linguagem bíblica, “obra permanente de Deus”, e jamais deixa a Realidade! Jamais deixa o Céu, que é a Realidade! Ainda que esteja aparecendo como um personagem na Representação este Homem feito à Imagem e Semelhança de Deus sabe que aquilo que subjaz à Representação é a própria Realidade. Ele sabe que a Representação não tem existência real. É uma Representação. Na Representação existe (aparentemente e realisticamente) evolução. Na Representação existe matéria. Na Representação existe tempo e espaço. Na Representação existe mundo físico e mundo espiritual; ou seja, na Representação existe mundo dos espíritos encarnados (mundo dos vivos) e mundo dos espíritos desencarnados (mundo dos mortos). Na Representação existe ainda uma multifacetada gama de seres, seres deste planeta e seres de outros planetas; seres desta dimensão e seres de outras dimensões; seres celestiais e muitos outros seres...

Mas, subjacente à Representação há a Realidade! E a Percepção da Realidade permeia a tudo!

A Percepção da Realidade é chamada de Consciência Divina ou Mente de Cristo, na linguagem cristã, e aparece na Representação como sendo a presença e revelação de seres iluminados... Notem bem! O único Real iluminado é o Ator subjacente a qualquer personagem e ao cenário! Apenas a partir do Real o que é Real pode ser percebido! E o Real, subjacente ao personagem, é o Ator! Por isso não é possível partir da “mente do personagem” [da mente em ilusão] para perceber o Ator!

Assim, divinos Amigos, sempre que estiverem diante de um ensinamento espiritual, sempre que estiverem diante do ensinamento de um Mestre, sintonizem a Percepção deste Mestre em vocês! Sintonizar a Percepção do Mestre em nós não significa concordar com o Mestre... Isto é assim porque nesta Percepção não há um eu separado (eu do personagem) para concordar com o Eu do Mestre! É o próprio Eu do Mestre, a própria Percepção do Mestre, que Se Percebe! Isto acontece quando as certezas mentais, quando os “pensamentos da mente do personagem”, não estão em foco, mas sim os “pensamentos do Ator”! Isto é estar sintonizado no Mestre. 

Masaharu Taniguchi expressa esta sintonia afirmando que Deus Se "aloja em nós". Esta afirmação é uma Revelação!

Na linguagem cristã sintonizar o Mestre em nós significa sintonizar o Espírito Santo em nós e viver por Ele, ou seja, viver segundo Seus pensamentos, que são os "pensamentos elevados", que são as “Percepções”!

Gratidão Àquele que aparece como cada UM de nós e nos dá a possibilidade de compartilharmos a Sua Percepção.

Namastê!


segunda-feira, julho 01, 2019

"Iluminação" e a "Natureza de Maya"


- Núcleo - 


Escute ArjunaEntre Mim e este Universo move-se mayadenominada ilusão. Deveras, é difícil, uma árdua tarefa o homem alcançar ver além de maya, porque maya também é Minha. É da mesma substância. Você não a pode supor separada de Mim. É criação Minha e está sob o Meu controle. Numa fração de segundo revira o mais poderoso dos homens de pernas para o ar! Somente aqueles que são plenamente ligados a Mim podem vencer maya.

Arjuna, não veja em maya, o mínimo que seja, algo repulsivo que tenha descido de qualquer parte. Ela é um atributo da mentefazendo esta ignorar a Verdade e o Eterno ParamatmaMaya conduz ao erro de acreditar que o corpo é o Ser. Não é algo que era e depois desaparecerá; nem é alguma coisa que não era, vem a ser, e ainda é. Maya nunca foi; não é; e nunca será. É um nome para um fenômeno inexistente. Mas esta coisa não existente vem de dentro da própria visão!  É igual à miragem no deserto, um lençol d’água que nunca houve nem há. Quem conhece a Verdade não vê miragem. Somente os desavisados quanto ao deserto são por ela atraídos. Correm para ela e sofrem aflição, exaustão e desespero. Como a sombra crescendo dentro do quarto, a esconder o próprio quarto; como a catarata a crescer no olho suprime a visão, maya apega-se àquele que a ajuda a crescer. 

Arjuna, você pode perguntar se maya, que penetra e prejudica o próprio lugar que lhe dá origem, não Me tem maculado, pois em Mim tomou nascimento. Tal dúvida é natural. Mas é sem base. Maya é a causa de todo esse universo, mas não é a causa de DeusSou Eu a autoridade que a dirige. Este universoque é produto de maya, move-se e se comporta de acordo com a Minha Vontade. Assim, a pessoa que estiver ligada a Mim e se conduza de acordo com a Minha Vontade não pode ser prejudicada por maya; maya reconhece autoridade nela também. O único método para vencer maya é adquirir jnana (sabedoria) do Universale redescobrir sua própria natureza Universal. Você atribui limite à existência daquilo que é eternopois isto é o que produz maya. Fome e sede são características da existênciaAlegria e tristeza, impulso e imaginação, nascimento e morte são tidos características do corpoNão são características do Universal, do Atma.

Acreditar que o Universalque é você mesmo, está limitado e sujeito a todas essas características não-átmicas – isto é maya. Mas lembre-semaya não ousa aproximar-se de quem tenha Me tomado por refúgio. Para aqueles que fixam a atenção em mayaela opera como um obstáculo de vastidão oceânica. Mas aos que fixam sua atenção em Deusela se apresentará como Krishna! A barreira de maya pode ser superada, seja por desenvolver a atitude de unidade com Deus Infinitoseja pela atitude de completa submissão ao Senhor. 
(Sathya Sai Baba - Gita Vahini)


Divinos personagens,

“Iluminação” é estar consciente de que Deus é o único Ser Real e, da real identidade!

Assim, o “iluminado” está consciente de Quem Deus É, e de Quem (tudo e todos os seres) Somos…

Aquele que está consciente de que não há outro Ser Real senão o próprio Ser, quem pode e sabe ser senão o próprio Ser?

Um ator não deixa de ser “ator” quando está representando. É “atuando” que ele se expressa e que se realiza!

Deus é o ator divino, e por ser divino atua tanto representando o papel de “personagens” quanto o papel de “cenário” e dos “objetos do cenário”!

Assim, o “Ator divino” quando está atuando está presente em toda a Sua “encenação divina”.

Está consciente tanto quando a “vê” como “encenação” quanto quando a “vê” como real…

Quando a “vê” como “encenação” está atuando como um personagem desperto, iluminado;

Quando a “vê” como real… está atuando como um personagem indesperto, não iluminado.

Em ambos os casos trata-se do próprio Ser Real consciente de que é “o ator” representando!

Portanto o Ser Real é a real identidade de todos os personagens e também de todo o cenário!

Na linguagem védica essa “representação divina” é chamada de “Maya”.

Maya surge do Ser e é o próprio Ser Quem está presente em toda ela, tanto como personagens quanto cenário!

O que se segue é uma passagem do livro Gita Vahini (A Interpretação do Bhagavad Gita por Sathya Sai Baba), comentado conforme a linguagem exposta pelo Núcleo.

Os comentários estão entre colchetes, assim: […]

Escreve Sai Baba:

Escute Arjuna [personagem]Entre Mim [o Ser Real; o Ator] e este Universo move-se maya [a representação divina]denominada ilusão. Deveras, é difícil, uma árdua tarefa o homem [o personagem] alcançar ver além de maya, porque maya também é Minha. É da mesma substância. Você não a pode supor separada de Mim. É criação Minha e está sob o Meu controle. [Notem que Krishna é Quem está falando com Arjuna e que ele é consciente de que é tanto o aspecto criador do Universo Real, Brahma, quanto é consciente de que Ele é Quem cria a “representação”, “maya”. Um adendo: em termos da simbologia védica há um Deus universal chamado de Brahman. Brahman revela ter três aspectos: O aspecto criador de Brahman é chamado de Brahma; o aspecto preservador de Brahman é chamado de Vishnu; e o aspecto transformador é Shiva. Krishna manifesta ora um ora outro desses aspectos, sendo por esse motivo considerado por uns como um “avatar” de Shiva e por outros um “avatar” de Vishnu. Literalmente a palavra “avatar” significa “descida”; a “descida de Deus”, do céu, para Se manifestar no Universo! Portanto, Krishna é a própria divindade manifesta! Ele é o Ser Real, consciente de Quem É! Por ser Quem É, Krishna conhece sua real identidade e a real identidade de todos os seres, e conhece também a natureza tanto do Universo Real quanto da representação divina, maya. É o que Krishna está revelando a Arjuna neste diálogo divino. Daí a importância do texto!]

Krishna diz:

“Numa fração de segundo revira o mais poderoso dos homens [personagens] de pernas pro ar! Somente aqueles que são plenamente ligados a Mim [o Ser Real] podem vencer maya [vencer maya não significa se debater contra maya com a finalidade de vencê-la, mas sim, significa vê-la com uma visão que a transcende, que percebe sua natureza de representação divina, ou seja, aquilo que parece ser real, mas que em realidade não é!]. Arjuna, não veja em maya, o mínimo que seja, algo repulsivo que tenha descido de qualquer parte. Ela é um atributo da mente [Que revelação divina! Notem que é a visão da “mente do personagem” que vê maya como sendo algo real]fazendo esta ignorar a Verdade e o Eterno Paramatma [A Verdade é que só Deus é Real. Há um Universo, criado por Deus, que é Real. Mas maya é apenas uma representação divina]. Maya conduz ao erro de acreditar [acreditar é perceber com a “mente do personagem”, é “ver” mentalmente a representação e tomá-la como real…] que o corpo é o Ser. Não é algo que era e depois desaparecerá; nem é alguma coisa que não era, vem a ser, e ainda é. Maya nunca foi; não é; e nunca será [Maya é uma representação].

É um nome para um fenômeno inexistente. Mas esta coisa não existente vem de dentro da própria visão! [Outra revelação divina digna de nota! Krishna está revelando que é a visão da mente do personagem que vê o que não é real e a projeta como se fosse real, tornando-a real para a própria visão da mente do personagem…] [Em seguida Krishna elucida que…] É igual à miragem no deserto, um lençol d’água que nunca houve nem há. Quem conhece a Verdade não vê miragem. Somente os desavisados quanto ao deserto são por ela atraídos. Correm para ela e sofrem aflição, exaustão e desespero. Como a sombra crescendo dentro do quarto, a esconder o próprio quarto; como a catarata a crescer no olho suprime a visão, maya apega-se àquele que a ajuda a crescer.”

Prossegue Krishna:

“Arjuna, você pode perguntar se maya, que penetra e prejudica o próprio lugar que lhe dá origem, não Me tem maculado, pois em Mim tomou nascimento. Tal dúvida é natural. Mas é sem base. Maya é a causa de todo esse universo [universo do personagem; representação]mas não é a causa de Deus [e nem é a causa do Universo Real, que é gerado por Brahman].

Sou Eu a autoridade que a dirige [Krishna é a base que “sustenta” a representação. Isto significa que não seria possível haver representação sem o Ator, sem os personagens e sem o próprio cenário]. [Por isso, acrescenta Krishna que] Este universo [irreal, este universo dos personagens]que é produto de maya, move-se e se comporta de acordo com a Minha Vontade. Assim, a pessoa que estiver ligada a Mim e se conduza de acordo com a Minha Vontade não pode ser prejudicada por maya [“estar ligada em” Krishna é ser unida à visão que Krishna proporciona; é estar percebendo a onipresença da divindade na representação, e ao mesmo tempo estar consciente de que se trata de uma representação e não da Realidade]; maya [por ser da mesma substância de Krishna e não poder se supor separada de Krishna] reconhece autoridade nela também. O único método para vencer maya é adquirir jnana (sabedoria) do Universal [o conhecimento do Ser Real], e redescobrir sua própria natureza Universal. Você [com a visão de um personagem do Ser] atribui limite à existência daquilo que é eterno [o Ser Real]pois isto [a visão mental] é o que produz [o que faz surgir] maya. Fome e sede são características da existência [dos personagens]. Alegria e tristeza, impulso e imaginação, nascimento e morte são tidos características do corpo [do personagem que se percebe num universo dual…]. Não são características do Universal, do Atma [do Ser Real].

Acreditar [perceber com a mente do personagem] que o Universal [que o Ser Real], que é você mesmo, está limitado e sujeito a todas essas características não-átmicas – isto é maya. Mas lembre-se [bela ênfase de Krishna a Arjuna e a todos os divinos personagens]: maya não ousa aproximar-se de quem tenha Me tomado por refúgio. Para aqueles que fixam a atenção em maya [para os que se fixam na percepção da mente que “vê” maya]ela opera como um obstáculo de vastidão oceânica. Mas aos que fixam sua atenção em Deus [para os que se fixam na percepção da Consciência que “vê” a Realidade]ela se apresentará como Krishna! [E completa Krishna dizendo que…] A barreira de maya pode ser superada, seja por desenvolver a atitude de unidade com Deus Infinito [seja por se ver em unidade com Deus]seja pela atitude de completa submissão ao Senhor [seja por seguir as orientações divinas, como contidas nesta esplêndida e muito elucidativa revelação divina de Krishna a Arjuna!].

E para completar, usando a linguagem bíblica…

Disse Jesus:

"Vós já estais puros pela palavra que vos tenho anunciado. Permanecei em mim [Ser Real] e Eu permanecerei em vós. O ramo [o personagem] não pode dar fruto por si mesmo, se não permanecer na videira [no Ser Real]Assim também vós não podeis tampouco dar fruto, se não permanecerdes em Mim. Eu sou a videira [o Ser Real]vós, os ramos [personagens]Quem permanecer em mim e eu nele, esse dá muito fruto; porque sem Mim nada podeis fazer.

E quanto a tudo o que disse, Jesus revelou:

Já não vos chamo servos [personagens inconscientes]porque o servo não sabe o que faz seu senhor. Mas chamei-vos amigos [personagens conscientes]pois [sendo Eu o Ser real que aparece na representação como um personagem consciente] vos dei a conhecer tudo quanto ouvi de meu Pai [o Eu Verdadeiro, a Consciência do Ser, a nossa real identidade!]. (João 15:15)

Namastê!