Osho
Gautama, o Buda
Gautama, o Buda, é a maior ruptura que a humanidade conheceu até agora. O tempo não deveria ser dividido com o nome de Jesus Cristo; ele deveria ser dividido com o nome de Gautama, o Buda. Deveríamos dividir a história em antes de Buda e depois de Buda, não antes de Cristo e depois de Cristo, porque Cristo não é uma ruptura - é uma continuidade. Ele representa o passado em sua tremenda beleza e grandiosidade. Ele é a própria essência de toda a busca do homem antes dele. Ele é a fragrância de todo o empenho do homem para conhecer Deus, mas ele não é uma ruptura. No verdadeiro sentido da palavra, ele não é um rebelde. Buda é, mas Jesus parece mais rebelde do que Buda pela simples razão de que a rebelião de Jesus é visível e a rebelião de Buda é invisível.
Você precisará de um grande insight para compreender a contribuição de Buda para a consciência humana, para a evolução humana, para o crescimento humano. O homem não seria o mesmo se Buda não tivesse existido. O homem teria sido o mesmo se Cristo não tivesse existido, se Krishna não tivesse existido - não haveria muita diferença. Elimine Buda e algo de tremenda importância fica perdido; mas sua rebelião é muitíssimo invisível, muitíssimo sutil.
Antes de Buda, a busca - a busca religiosa - dizia respeito, basicamente, a Deus: um Deus que estava do lado de fora, um Deus que estava em algum lugar lá em cima, no céu. A busca religiosa também dizia respeito a um objeto de desejo, tanto quanto era a busca mundana. O homem mundano buscava dinheiro, poder, prestígio; e o homem não-mundano buscava Deus, o céu, a eternidade, a verdade. Mas uma coisa havia em comum: ambos estavam olhando para fora de si mesmos, ambos eram extrovertidos. Lembre-se dessa palavra, porque ela vai ser útil para você compreender Buda.
Antes de Buda, a busca religiosa não estava interessada no interior, mas no exterior. Ela era extrovertida e, quando a busca religiosa é extrovertida, ela não é religiosa. A religião começa somente com a introversão, quando você começa a cavar profundamente dentro de si mesmo.
As pessoas procuraram durante séculos por Deus: Quem é o construtor do universo? Quem é o criador do universo? E há muitos que ainda estão vivendo numa era pré-búdica, que ainda estão fazendo essas perguntas: "Quem é o criador do mundo? Quando ele criou o mundo?". Há algumas pessoas que até determinaram o dia, a data e o ano em que Deus criou o mundo. Há teólogos cristãos que dizem que exatamente há quatro mil e quatro anos antes de Jesus Cristo - obviamente numa segunda-feira, 1º de janeiro! - Deus criou o mundo ou começou a criar o mundo; e ele terminou o trabalho no sexto dia. Uma só coisa é verdadeira quanto a isso: ele deve ter terminado o trabalho em seis dias, porque você pode ver a confusão em que o mundo está - trata-se de um trabalho de seis dias! E desde então, ninguém mais ouviu falar dele. No sétimo dia, ele descansou e, desde então, tem continuado a descansar.
Talvez Friedrich Nietzsche esteja certo, ele não está descansando - está morto! Ele não tem demonstrado nenhum interesse. Então, o que aconteceu com sua criação? Parece estar completamente esquecida. Mas muitos cristãos dizem: "Não, ele não se esqueceu. Olhe! Ele enviou Jesus Cristo, seu primogênito, para salvar o mundo. Ele ainda está interessado". Esse foi o único interesse que ele demonstrou, enviando Jesus Cristo... - mas o mundo não está salvo. Se esse era o propósito ao enviar Jesus Cristo ao mundo, então Jesus fracassou e, por tabela, Deus fracassou - o mundo é o mesmo. E que espécie de interesse era esse - seu mensageiro foi crucificado e Deus não conseguiu fazer nada?
Ainda há muitos vivendo nessa visão de mundo pré-búdica.
Buda mudou toda a dimensão religiosa, ele deu a ela uma virada tão linda! - ele fez perguntas verdadeiras. Ele não era metafísico, nunca fez perguntas metafísicas; para ele, a metafísica era pura tolice. Ele foi o primeiro psicólogo que o mundo conheceu, porque baseou sua religião não na filosofia, mas na psicologia. Psicologia, em seu significado original, quer dizer ciência da alma, a ciência do mundo interior.
Buda não perguntou quem criou o mundo. Ele perguntou: "Por que eu estou aqui? Quem sou eu? Quem está me criando?". E não se trata de uma questão do passado - quem me criou. Nós estamos sendo criados constantemente. Nossa vida não é como uma coisa criada uma vez e para sempre: ela não é um objeto. Ela é um fenômeno crescente, é um rio fluindo. A cada momento, ela está passando através de um novo território. "Quem está criando a vida, esta energia, esta mente, este corpo, esta consciência que sou eu?" Seu questionamento é totalmente diferente. Ele está transformando a religião da extroversão para a introversão.
A religião extrovertida roga a Deus; a religião introvertida medita. Oração é extroversão; é dirigida a algum Deus invisível. Ele pode estar lá, pode não estar - você não está seguro, não tem certeza; a dúvida vai persistir, fatalmente. Desse modo, toda oração está enraizada, de um modo ou de outro, na dúvida, no medo, na incerteza, na ambição. A meditação está enraizada no destemor, na desambição. A meditação não está mendigando nada de ninguém, ela não é endereçada a ninguém. Meditação é um estado de silêncio interior. Oração ainda é barulho, você ainda está falando - falando a um Deus que pode não estar lá. Então, ela é insana, neurótica: você está se comportando como um louco. Pessoas loucas ficam falando; não se importam muito se há alguém para ouvi-las ou não. Esse é um sinal seguro de que elas são loucas - imaginam que alguém está ali; não apenas isso, elas quase podem ver o outro. A visualização delas é ótima, a imaginação é muito substancial. Elas são capazes de transformar sombras em substância, imaginação em realidades, ficção em fatos. Para você, elas parecem estar envolvidas num monólogo; para elas mesmas, elas estão envolvidas num diálogo. Você não pode ver quem está presente ali - elas estão sozinhas. Mas elas vêem que alguém está presente.
É devido a esse fato que a psicanálise é muito cautelosa quanto à religião, porque a pessoa religiosa se comporta exatamente como o neurótico. E há muitos psicanalistas que acham que religião nada mais é que uma neurose de massa - e eles são da seguinte opinião: a religião extrovertida é uma neurose de massa.
Mas os psicanalistas ainda não tomaram ciência de Buda. Buda lhes dará um novo insight dentro da religião, dentro da verdadeira religião. Não há nenhuma oração, nenhum Deus. A meditação não é um diálogo, nem mesmo um monólogo - meditação é puro silêncio. As pessoas me perguntam: "Qual deveria ser o objeto da meditação?". Elas estão fazendo a pergunta errada, mas eu posso compreender por que a fazem. Elas viveram nas religiões da oração, e a oração não pode existir sem alguém lá para quem rezar. A oração precisa de um objeto de veneração; a oração é uma dependência. Aquele que venera não é independente; é dependente do objeto de sua veneração e tem medo também. Mas o meditador não tem nenhum objeto. Meditação não quer dizer "meditar sobre algo". A palavra inglesa "meditation" dá uma conotação errada. Em inglês, não há nenhuma palavra para se traduzir a palavra budista dhyana. Na verdade, em nenhuma outra língua do mundo há uma palavra que seja absolutamente sinônima de dhyana. E por causa disso que, na época em que o budismo chegou à China, não foi possível traduzi-la para o chinês; desse modo, dhyana tornou-se chan - trata-se da mesma palavra. A palavra sânscrita é dhyana, mas Buda usou o páli, uma outra língua, a língua compreendida pelas pessoas entre as quais ele vivia. Em páli, dhyana tornou-se jhana; de jhana, ela tornou-se ch'an em chinês, e daí tornou-se zen em japonês. O chinês não tinha nenhum equivalente, o japonês não tinha nenhum equivalente. Na verdade, nenhuma outra língua tem equivalente, porque nenhuma outra língua deu à luz um homem como Buda. E, sem um Buda, fica impossível dar esse novo significado, essa nova visão, essa nova dimensão.
Em inglês, meditação quer dizer "meditar sobre algo"; mas, então, trata-se de pensamento; no máximo, de contemplação. Isso não é meditação. Meditação quer dizer estar meditativo, silencioso, pacífico, sem pensamentos na mente, uma consciência sem conteúdo. Esse é o verdadeiro significado de meditação: consciência pura, um espelho refletindo o nada. Quando um espelho não está refletindo nada, isso é meditação.
Buda transformou toda a questão religiosa da metafísica numa grande psicologia, porque ele perguntou: Quais são as causas da minha vida e da minha morte? Ele não está interessado no universo. Ele diz: Temos de começar pelo começo; e qualquer coisa, para ter um sentido de verdade na vida, tem de dizer respeito a mim mesmo: Quem sou eu e por que eu sou? Quais são as causas que continuam me criando?
O que é um Sutra?
O sutra é uma afirmação essencial sem nenhuma elaboração, sem nenhuma explicação, sem nenhum ornamento – apenas sua essência nua e crua. Isso era necessário nos tempos antigos, porque as pessoas tinham de se lembrar desses sutras. Assim, eles tinham de ser muito condensados, tinham de ser telegráficos, de modo que as pessoas pudessem se lembrar por séculos, porque eles passavam de geração em geração, fazendo parte da memória das pessoas. Os livros ainda não existiam, a imprensa não tinha aparecido. As pessoas tinham que se lembrar; daí o artifício do sutra.
Um sutra significa uma máxima, justamente o âmago essencial. Mas, se você se lembrar dele, sempre poderá decodifica-lo. E é isso o que estou fazendo aqui – decodificando esses sutras para vocês.
No Oriente, todas as grandes escrituras são escritas em sutras. Sutra significa a afirmação mais condensada, tão fina quanto um fio – a palavra “sutra” significa “fio”. Todas as coisas não-essenciais foram eliminadas; só sobrou o mais essencial. É o jeito mais telegráfico de se expressar coisas. Por isso, no Oriente, são feitos grandes comentários. No Ocidente não existem comentários, porque não se escreveu nenhum sutra. Um sutra precisa de um comentário.
No Ocidente, o próprio fenômeno dos comentários não aconteceu. Ninguém comenta sobre Kant, ninguém comenta sobre Hegel, ninguém comenta sobre Sócrates, ninguém comenta sobre a Bíblia. O fenômeno dos comentários é absolutamente oriental. Os sutras são a você o mínimo a ser lembrado, porque se lembrar do imenso conteúdo de um tratado filosófico não seria possível.
Sutras são pequenas sementes. Eles indicam o caminho, indicam uma certa direção. A menos que seu coração se torne um solo fértil para essas sementes, elas não brotarão em folhas, em ramos, em flores, em frutos. Essas sementes contêm tudo o que vai acontecer, elas têm todo o programa armazenado. Se você permitir que a semente invada o seu ser, à medida que ela for penetrando cada vez mais fundo, você perceberá tudo o que está contido nela. Ela se tornará uma realidade em você.
Quero deixar registrado uma ressalva no tocante a este texto, em que o Osho parece atribuir mais importância à Buda do que a Jesus. Isso não está realmente ocorrendo.
ResponderExcluirLeio o Osho há anos e reconheço sua nítida característica de exaltar o ensinamento (e o mestre) sobre o qual ele está discursando. Aqui ele está colocando Buda no topo de toda a espiritualidade porque naquele momento suas palestras versavam sobre o budismo. Em outros livros, cujas mensagens tratam da mensagem da Bíblia e de Jesus, ele eleva Jesus acima de todos os outros. E isso vale para todos os outros.
Não creio que seguir Jesus (e seus ensinamentos) tornem um indivíduo voltado para fora. Tudo depende da maneira de olhar para o que Jesus está falando. Jesus, que era plenamente consciente da Verdade, orava a Deus; e isso não significa que ele estava voltado para o exterior.
No que diz respeito a "entrar em contato com o Eu interior e estabelecer com Ele uma conexão", o ensinamento cristão não é inferior ao ensinamento budista. Tudo depende do olhar, da interpretação e da compreensão daquele que está em contato com o ensinamento. Os ensinamento do Caminho Infinito versam 100% sobre os ensinamentos de Jesus. Joel Goldsmith, através de sua explanação sobre os ensinamentos de Cristo, conduz poderosamente o ser humano ao despertar espiritual. Até hoje não encontrei um ensinamento cristão que expressa a Verdade, a Unidade, da forma como faz o Caminho Infinito.
Olhar para fora (tais como personagens, o cenário, o roteiro do mundo da representação) não significa necessariamente que a pessoa está voltada para fora. Utilizando a linguagem do Núcleo, cujos ensinamentos estão presentes em diversos textos deste blog, o indivíduo pode estar olhando para o mundo externo e, dependendo da visão com que olha, ele verá "muitos" ou "Um só". Se a pessoa estiver olhando para outros personagem, e reconhecer que "Sou Eu", ela estará em contato com o "interior", mesmo que os olhos físicos estejam olhando para fora.
Assim também é com os ensinamentos devocionais (Bhakti), que motivam o devoto a aprender a enxergar Deus em cada pessoa, objeto ou acontecimento do mundo da representação. O devoto (bhakta) é aquele que durante todo o tempo pensa, ama e interage com Deus. Se os ensinamentos de Jesus evocam o homem a olhar para "fora", o que dizer então daqueles que praticam o "Bhakti"? Nesse caso o caminho do Bhakti seria menos eficiente ou inferior ao caminho apresentado pelo Jnana (Conhecimento/Sabedoria) e Dhyana (Meditação). A verdadeira percepção espiritual (conciencial) não leva realmente em conta essas distinções.
Se Deus é tudo, quer a pessoa esteja olhando para "dentro" ou para "fora", EU estou ali. Basta o reconhecimento.
Assim, Jesus não é inferior (ou superior) a Buda. Mas, às vezes pode ser interessante ressaltar certas características (que são apenas aparentes, ou seja, existem só na superfície) em detrimento de outras, a fim de destacar as qualidades de um determinado ensinamento. É isso o que o Osho está fazendo nesse texto. Mas possamos não nos deixar levar pela literalidade das palavras.
Em última instância, todos os ensinamentos (e seus avatares, mestres/sábios iluminados) são belos, puros e verdadeiros.
Namastê!
Excelente Gu! Lindo lindo!
ResponderExcluir_/\_
ResponderExcluir