Masaharu Taniguchi
Se alguém pensa que a Meditação Shinsokan se trata apenas de uma concentração espiritual para conseguir experiências espirituais profundamente misteriosas, poderá enganar-se. Sendo a Meditação Shinsokan a contemplação da Imagem Verdadeira, onde Deus está em nós e nós em Deus, se limitarmo-nos apenas à meditação e não praticarmos atos de gratidão acabaremos destruindo a nós mesmos, pois cairemos no convencimento de já ter conseguido compreender a Verdade, tornando-nos arrogantes, ingratos e impudicos. Torna-se necessário, então, o exercício da gratidão como prática complementar da Meditação Shinsokan.
O exercício da gratidão é uma prática espiritual que consiste em procurar não esquecer o sentimento de gratidão, em todos os momentos da vida cotidiana. Os sentimentos opostos à gratidão são o descontentamento, a insatisfação, o ressentimento, a inveja, a raiva, etc. Eles desarmonizam o pensamento do homem, e serão também desarmoniosos os acontecimentos que advirão desse pensamento. A desarmonia dos acontecimentos, por sua vez, gera mais sentimentos maléficos como o descontentamento, a insatisfação, a raiva, etc., os quais constituem o carma desencadeador de outros acontecimentos infelizes, e estes aceleram a velocidade de transmigração do carma.
Dessa maneira, mesmo que pratiquemos dedicadamente a Meditação Shinsokan, que é uma forma de transcender a transmigração do carma e fundir-se na Imagem Verdadeira, se não houver a prática dos atos de gratidão em nosso cotidiano e mantivermos os sentimentos de descontentamento, insatisfação, raiva, inveja, etc., estaremos apagando o sentimento de fusão com o mundo harmonioso da Imagem Verdadeira conseguido através da Meditação Shinsokan.
Em contraposião à Meditação Shinsokan, que é a prática espiritual para contemplar a Imagem Verdadeira e transcender a imagem falsa, a insatisfação é a ação do carma que, encobrindo a Imagem Verdadeira, faz com que fiquemos presos à imagem falsa. Sendo ambos totalmente opostos, possuem o poder de anular o efeito um do outro. Por isso, para conseguir de modo perfeito a eficácia da Meditação Shinsokan, é importante não esquecer de praticar o oposto da insatisfação e da reclamação: o exercício da gratidão no cotidiano. O sentimento de insatisfação desencadeia infelicidades que geram mais insatisfações, e faz com que o carma transmigre sem parar. Ao contrário, a prática da gratidão cria sentimento de gratidão, ou seja, de "harmonia", mesmo diante do mais infeliz dos acontecimentos. Como consequência desse "sentimento de harmonia", manifesta-se o "mundo de harmonia" no mundo exterior, impedindo que seja mantido o "mundo infeliz" de até então, gerado pela "insatisfação". Desse modo, a gratidão torna-se uma prática complementar para interromper a "transmigração do carma".
É por isso que a maioria das religiões recorre a artifícios para retirar a insatisfação dos homens e suscitar-lhes o sentimento de gratidão. Na seita Shin ou na Ittoen o sentimento de gratidão é despertado fazendo-se o adepto considerar o homem como um mortal cheio de pecado, o pior ser do mundo. Se perguntamos aos seus seguidores por que se sentem gratos sendo os piores seres do mundo, respondem: "Somos tão pecaminosos, e no entanto recebemos graças até demais de Deus; por isso sentimo-nos gratos". No caso da seita Shin, dizem-se tão pecaminosos que não há meio de se salvarem com sua própria força; mas acreditam que podem ser salvos e acolhidos num lugar tão maravilhoso como a "Terra Pura" (Paraíso) graças a força de Amitabha, e por isso sentem-se gratos. Essa gratidão assemelha-se mais a um expediente e encerra elemento desonesto. Eles se julgam pecadores, maus, e avaliando a si mesmos honestamente obteriam nota zero, dois ou três, mas recebem nota cem de um outro ser e por isso sentem-se gratos. Não se sentem gratos pelo próprio valor, mas pela nota ou pelo prêmio que outros lhe dão, o que significa que, se não lhes derem nota ou prêmio superior ao que realmente merecem, não se sentirão gratos. Essa é uma gratidão que depende dos outros, pois não se é grato pelo próprio valor. É portanto uma gratidão vazia e falsa. Mas, como é melhor sentir gratidão do que sentir-se insatisfeito, os religiosos criaram artifícios de interpretação como meios para fazer nascer nas pessoas o sentimento da gratidão.
A missão da religião é fazer os homens conscientizarem sua Natureza Divina. Para isso, ela faz com que sintam gratidão porque esse sentimento conduz à paz infinita, e através desse sentimento pacífico é facilitada a conscientização da sua própria Imagem Verdadeira, fazendo surgir o mundo iluminado no mundo exterior e trazendo à tona a força infinita do interior.
Existem duas maneiras de fazer com que as pessoas despertem o sentimento de gratidão: a da religião hinayana, que faz com que as pessoas sintam gratidão por qualquer tipo de tratamento que receberem, partindo da conscientização de que possuem a maldade infinita; e a da religião mahayana, que as faz sentir uma gratidão incomparável, pela conscientização de ser Deus a sua verdadeira natureza e por reconhecerem que possuem virtude infinita.
No budismo há a escola Jodo (Terra Pura), que diz: "Nós somos maus, cheios de pecado, mas podemos ser acolhidos na Terra pura como graça de uma força alheia. Que felicidade!"; e há a escola Shoodo (Caminho Sagrado), que diz: "Sendo todos originariamente filhos de Buda, se reconhecerem o seu verdadeiro valor serão salvos. Ser ou não ser salvo, depende de si próprio. Se o Buda Daitsutishô (Buda que pregou os ensinamentos contidos na Sutra do Lótus, num passado infinitamente remoto) não despertou para a Verdade durante um tempo infinitamente longo é porque ele próprio não despertou". Assim se atribui valor absoluto a si próprio.
Também o cristianismo fala de "gratidão relativa" que Paulo sentiu pelo fato de ter sido salvo apesar de ser pecador; entretanto quando fala de Cristo não se refere à gratidão relativa, mas sim à gratidão absoluta. Ou seja, a consciência de que ele próprio é filho de Deus. Quando Jesus disse: "A qualquer que te ferir na face direita, volta-lhe também a outra", não quis dizer que o homem não teria o direito de reclamar quando espancado, porque é um pecador, comparando relativamente o ser humano com o pecado. Ele disse com tanta espontaneidade "A qualquer que te ferir na face direita, volta-lhe também a outra" baseando-ne na consciência de que, por mais que se modifique a forma, a verdadeira natureza do homem é Deus onipotente, é uma existência de "valor absoluto"; portanto, mesmo sendo surrado, não o está, mesmo sendo roubado, não o está.
Como vimos, há várias categorias de gratidão e, mesmo que se diga "sinto-me grato", a avaliação desse sentimento dependerá do grau de desenvolvimento espiritual de cada um. Há a gratidão da pessoa que, ao encontrar dinheiro na rua, sente-se grata a Deus por Ele satisfazer seus desejos e protegida por tal Deus. Há também a gratidão pela cura, obtida através da fé, de uma doença que o médico não conseguiu curar. Há ainda pessoas que acreditavam que por serem pecadoras não escapariam do inferno, mas quando souberam que existe um buda chamado Amitabha que as leva ao paraíso sentiram-se tão gratas como um preso que recebe anistia. Há ainda a gratidão daquelas que varriam a calçada humildemente, conforme recomenda a Ittoen, quando alguém lhes ofereceu a refeição matinal; esse gesto as deixa agradecidas, bem como o fato de descobrirem que há um Deus que não as abandona se forem humildes.
Mas em minha opinião tais sentimentos de gratidão não podem ser considerados autênticos, no sentido religioso. Não há dúvida de que 'encontrar dinheiro na rua', 'curar-se da doença', 'poder ir para o Paraíso' ou 'conseguir a sobrevivência ao se tornar humilde' são fatos dignos de gratidão, mas não significam a verdadeira gratidão religiosa, e sim gratidão calculista. Em outras palavras, é a gratidão que se sente por ter recebido algo de fora. Com esse tipo de gratidão a pessoa ainda não poderá transcender realmente o carma, pois se não continuar recebendo coisas de fora não sentirá mais gratidão.
A gratidão religiosa não é apenas agradecer ao fato de receber algo de fora. O estímulo a essa gratidão é apenas um meio para conduzir as pessoas à verdadeira gratidão religiosa, mas você não deve ficar estacionado nesse estágio. A gratidão que nos vem espontaneamente de dentro quando temos a consciência de que nós próprios somos Deus, nós próprios somos Buda, essa é a gratidão no sentido religioso. Mesmo a gratidão pelo fato de ter cohecido a Seicho-No-Ie não será verdadeira se não evoluir até esse nível. Aliás, isso não se refere somente a Seicho-No-Ie. O sentimento de gratidão proveniente da verdadeira fé precisa fundamentar-se na consciência de que nós próprios somos Deus, de que nós próprios somos Buda. Sentir-se grato 'por estar sendo perdoado e salvo, apesar de ser tão mau', não passa de fé covarde e desonesta, pois significa desejar obter nota cem quando na verdade só vale dez. Não podemos dizer que tal desonestidade seja fé verdadeira.
No caso da seita Ittoen, enquanto a pessoa mantiver o pensamento simplista de que conseguiu a alimentação para o dia porque foi humilde fazendo a faxina do banheiro, não conhecerá o verdadeiro valor da Imagem Verdadeira. O viver religioso verdadeiro consiste em conscientizar-se: "Eu sou Deus". Mesmo o modo de viver da seita Ittoen, no caso do sr. Tenko Nishida, está baseado na conscientização: "Eu venci o mundo", confome consta em sua obra Zange no Seikatsu (Vida de Penitência). Portanto, seria errôneo pensar que já alcançou a vida cheia de gratidão só pelo fato de dormir sobre a serragem ou lascas de madeira, ou por fazer limpeza de banheiros, imitando apenas superficialmente o sr. Tenko, sem se conscientizar: "Eu venci o mundo", ou "Eu sou o maior do mundo".
Há pessoas que, ao ouvirem falar na "vida de penitência" da Ittoen, acham que se trata de vida de autodepreciação, que consiste em considerar-se culpado; mas de modo algum é assim. Conscientizar "eu sou um com Deus (na Ittoen diz-se 'luz'), não há ninguém tão grandioso quanto eu" - isto é a vida segundo a Ittoen. Como essa conscientização de "grandiosidade" baseia-se na convicção da "grandiosidade" de que a sua substância é Deus, a pessoa sente que existe (independentemente da grandiosidade exterior constituída de status, comendas, mansão magnífica, roupas luxuosas) algo originariamente puro, por mais que as forças externas tentem maculá-la, não se macula; por mais que tentem aniquilá-la, não podem ser aniquilada, tal é a sua superioridade. É alicerçado nessa grandiosa conscientização que o sr. Tenko ora apregoa a humildade, dizendo que não há ninguém tão mau quanto ele, ora afirma arrogantemente que, se lhe for atribuído o cargo de primeiro-ministro, não terá dficuldade de administrar o país porque possui grande versatilidade. Também por isso afirma que, se não for através do modo de viver da Ittoen, não se pode salvar a humanidade; que não existe ninguém tão grandioso como ele, e que, por esse motivo, toda a humanidade deve segui-lo. Por isso, para os olhos de pessoas pouco perspicazes, pode parecer que a vida da Ittoen seja a vida em que, dizendo-se "eu sou mau", limpando o banheitro e procurando comida no lixo, não haverá dificuldade econômica. São muitas as pessoas que frequentam a seita Ittoen assimilando apenas a parte que trata da ausência de dificuldade econômica visível. Mas a verdadeira vida sem dificuldade econômica da Ittoen é baseada na conscientização da frase "Como sou um com a Vida perene, sou na realidade imortal e livre de dificuldades econômicas". Por isso, o sr. Tenko diz: "Sem o espírito preparado para morrer a qualquer momento, não há a vida da Ittoen". Essa convicção de estar preparado para morrer a qualquer momento nasce da conscientização de ser, na essência, imortal. No que se refere a essa conscientização, a Ittoen e a Seicho-No-Ie pensam de modo idêntico.
Entre as pessoas que se dizem gratas por ter conhecido a Seicho-No-Ie e por passar a frequentá-la, há as que agradecem somente o fato de ter melhorado economicamente ou ter-se curado de doença de difícil cura através da literatura Seicho-No-Ie. Mas tais pessoas ainda não conheceram a verdadeira gratidão religiosa: estão agradecendo apenas o benefício de ordem utilitária, externa, o que significa que sua gratidão é ainda uma gratidão utilitarista, e não atingiram a gratidão religiosa. A gratidão religiosa deve ser aquele sentimento de júbilo que brota de dentro e vai enchendo a alma, decorrente da conscientização suprema de que a sua essência é Deus, é Buda, independemente da aparência exterior. Se não houver essa conscientização, quando alguém se torna humilde imitando a Ittoen, apega-se à humildade; quando está em situação superior, apega-se à posição superior. Assim, sente-se culpado ao viajar no vagão de segunda classe, como aconteceu com certo milionário, ou tem sentimento de culpa se não dormir ao relento no meio das lascas de madeira, como um mendigo, conforme aconteceu com outra pessoa. Em suma, se a gratidão não for aquela que emerge do coração pela conscientização de que a sua substância é Deus, pode-se perder o sossego espiritual tanto no estado positivo (abundância em demasia) como no estado negativo (carência em demasia) do ambiente material. Se a paz de espírito é influenciada pelo estado positivo ou negativo do ambiente material, isso significa que o espírito da pessoa está sendo conduzido pela "coisa de fora" que é a aparência. Se isso acontece, não se pode dizer que a pessoa apreendeu o valor da Imagem Verdadeira, seja na seita Ittoen ou em outra religião. O verdadeiro "valor da Imagem Verdadeira" está no fato de a sua própria Imagem Verdadeira ser Deus. Portanto mesmo que a pessoa seja rica demais ou pobre demais, seu sentimento de gratidão não se altera por causa disso.
O sr. Masao Takahashi, da seita Konko, que vive como se tivesse somado e dividido por dois os ensinamentos desta seita e o modo de viver da seita Ittoen, diz o seguinte: "No momento em que percebi que eu era um indivíduo mau, sem nenhuma qualidade, sem direito de reclamar por pior que fosse o tratamento que me dessem, deixei de ter motivos para me queixar; abriu-se um mundo imenso onde antes parecia um beco sem saída; o meu coração se encheu de luz e começou a nascer abundantemente a força vital". Ouvindo essa confissão, temos a impressão de que o fato de pensar "eu sou mau, eu não tenho nenhuma qualidade" constitui uma ótima fonte de paz e origem da força vital, mas não é bem assim. Na realidade, quase todos os indivíduos que se vêem em condições semelhantes à de mendigos, tornam-se pessoas, que, considerando-se realmente sem valor e sem qualidade, perdem a coragem de se reerguer. Se, por trás do pensamento "eu sou mau", não houver a conscientização de que existe em seu interior a Vida de Deus, realmente venerável, presente em todo o Universo, e não nascer a sensação real de estar sendo vivificado pelo Universo, de nada adiantará.
O sr. Masao Takahashi, porém, lembrando-se da época em que não havia atingido o modo de viver e o estado de espírito atual, confessava que era uma pessoa realmente má. Todavia, segundo as palavras de um adepto da seita Konko que o conhecia naquela época, o sr. Takahashi, embora dissesse de si que não era mau, nã era absolutamente uma pessoa má quando visto pelos outros. O que o sr. Masao tinha era um senso de autocrítica mais severo do que os outros, que o fazia refletir profundamente, à luz do ensinamento, sobre os defeitos que passam despercebidos às demais pessoas, e admitir que era "irremediavelmente mau". Desse modo, mesmo naquela época, as pessoas reverenciavam ocultamente o sr. Masao Takahashi como possuidor de elevadas virtudes, quase um deus vivo.
Todavia, se o sr. Takahashi se tornou paradoxalmente mais respeitável ao reconhecer "eu é que sou mau", isso não se deve simplesmente à conscientização de sua maldade. Ele percebeu que, à luz da Verdade, ou seja, comparado ao "eu identificado com a Verdade", isto é o "eu verdadeiro", ele "era mau". Aquele que pensa "eu sou mau" sem conscientizar que aloja em seu interior o caminho (a Vida) que traspassa todo o Universo, atrofia-se e degenera-se. Mas aquele que pensa "o eu atual é mau" consciente de que há e seu interior a Vida que preenche todo o Universo progride cada vez mais. Esse "eu" da frase "o eu atual é mau" não é "eu verdadeiro" e sim o "eu falso". E o julgamento que se faz desse "eu falso", desmascarando-o diante do "eu verdadeiro", é que constitui a autocrítica "eu sou mau". Nisto está a prova de que a luz do "eu verdadeiro" está resplandecendo. Pensar irrefletidamente "eu sou bom" é convencimento e significa o fim do progresso. Mas ficar somente se condenando - "eu sou mau, eu sou mau" - sem descobrir dentro de si a luz do "eu verdadeiro" que resplandece também fará com que a pessoa se atrofie, e impedirá o seu progresso.
Quando dizemos "eu sou bom", referimo-nos à nossa natureza real, ou seja, ao "eu" que é um com o Universo, que é filho de Deus; e quando dizemos "eu sou mau", referimo-nos ao "eu falso", isto é, ao eu fenomênico. Assim, se nos referimos a nossa natureza real, somos possuidores de virtude infinita, à qual nenhum elogio será exagerado; e se nos referimos ao eu fenomênico, somos seres insuficientes que, por mais insultados e censurados como "irremediavelmente maus", nunca estaremos sendo criticados demais.
Os iniciadores de religião costumam pregar os seus ensinamentos colocando o "eu verdadeiro infinitamente bom" em contraposição ao "eu falso infinitamente mau"; por isso, se não compreendermos bem, poderemos incorrer ou na autonegação depreciativa, considerando-nos "maus até em nossa natureza real", ou no convencimento de que o próprio "eu falso" é o ser mais grandioso do mundo. É nesse momento que surge a Seicho-No-Ie para diferenciar claramente o "eu verdadeiro" do "eu falso".
Como todas as religiões, a seita Konko valoriza muito o sentimento de gratidão; porém, não considera verdadeira a gratidão que não é fundamentada na conscientização do "eu verdadeiro", que é um com o Universo. A gratidão que provém da fé interesseira, ou seja, que existe pelo fato de ter recebido graça material, não é a gratidão pregada pelo fundador da seita Konko. Em sua doutrina, ele diz: "Deixe a desconfiança e descortine o largo caminho Verdade. O seu corpo vive dentro da virtude divina". O que significa: se observar a sua Imagem Verdadeira, perceberá que a virtude divina preenche tanto o Universo como o eu são um só corpo. A seita Konko, habitualmente pregada em suas igrejas, é uma fé que valoriza a graça recebida mas, chegando nesse ponto, é exatamente igual à Seicho-No-Ie.
Segundo consta, o fundador da seita Konko ensina: "Quando for arrancar um nabo, agradeça ao nabo; quando for sentar-se num toco de árvore, agradeça ao toco de árvore". À primeira vista, parece que ele recomenda agradecer pela utilidade material do nabo ou do toco de árvore, dizendo-lhes "obrigado". Mas não é isso. A pessoa que tem clara consciência de que o eu é um com a Vida do Universo, seja ao arrancar o nabo seja ao sentar-se no toco de árvore, reconhece no interior deles a Vida que, tendo a mesma origem na Vida do Universo, é também a sua, e não pode deixar de sentir gratidão.
Sakyamuni dosse na Sutra Mahapari-nirvana que "todos os seres, sem nenhuma exceção, possuem natureza búdica". Pois bem, o sentimento de gratidão que nasce em nós ao reconhecermos em todos os seres a referida natureza búdica, impelindo-nos a reverenciá-los, é que é o sentimento de gratidão no sentido religioso. Se não sentirmos gratidão diante da nossa Imagem Verdadeira, diante da Imagem Verdadeira do Universo e todas as coisas, nossa fé não poderá ser considerada verdadeira e inabalável. Se nos sentimos gratos pelos resultados utilitários no nível fenomênico, essa gratidão está repousada no nível instável, inconsistente como bolha, e não podemos dizer que é a verdadeira gratidão religiosa inabalável.
Mesmo o sr. Masao Takahashi, que após repetir "eu sou mau, eu sou mau" teve ampliado o seu mundo e o seu coração tornou-se mais generoso, diz, elogiando o fundador da seita Konko: "Ele sentiu gratidão a si próprio, passou a reverenciar a si próprio, e denominou a si mesmo 'Grande Deus Vido Konko'. Como ele sente gratidão a si próprio, sente-a também em relação a todo o Universo. Ao ver a montanha, sente gratidão à montanha; ao ver as pessoas, sente gratidão às pessoas; ao ver a esposa, sente gratidão à esposa; ao ver os pais, sente gratidão aos pais. Por isso, o mestre deu à sua esposa o título divino de 'Isshi Taijin', e a cada um dos filhos também deu nomes divinos, fazendo o mesmo com as pessoas que vêm ao templo".
Em resumo, a gratidão verdadeiramente religiosa é alcançada quando a pessoa adquire consciência de que a sua Imagem Verdadeira é "filha de Deus", e, estando ela manifestada, reconhece a Imagem Verdadeira (a natureza búdica) de todas as coisas do Universo, não podendo deixar de juntar as mãos em reverência a si próprio e a todas as coisas do Universo. Somente quando a pessoa atinge este ponto é que se torna possível experimentar a gratidão absoluta que está acima de considerações relativistas, tais como a de se sentir agradecido por estar agraciado de tantas bençãos não obstante ser uma pessoa sem valor.
Na Seicho-No-Ie não se oferecem títulos divinos aos adeptos, mas proporciona-se a cada um deles a valiosa conscientização de que são "filhos de Deus", de que a sua natureza real é Deus. A partir disso desenvolve-se a gratidão em nível mais elevado e também o mundo fenomênico enche-se de gratidão, a doença se cura e a sorte melhora espontaneamente. "Como ele sente gratidão a si mesmo, sente-a também em relação a todo Universo" - ao preencher o cotidiano com esse espírito de gratidão, estará vivificando no dia-a-dia a Imagem Verdadeira livre da influência do mundo exterior. Por isso, o exercício da gratidão é a mais importante prática complementar da Meditação Shinsokan.
"O exercício da gratidão é também a prática da bondade. O pensamento de que dedicando-se aos outros a força vital diminui não passa de supertição. Há um adepto da Seicho-No-Ie que sofre de deslocamento da retina, que na oftalmologia é considerado de cura muito difícil, e quando lê as letras do livro sagrado A Verdade da Vida para si mesmo não consegue ir além de uma página e meia, tamanha é a dor que sente no fundo dos olhos e na região occipital. Porém, o espantoso é que, quando lê para os outros com a intenção de curar-lhes a doença, fica momentaneamente curado de seu mal ocular e não sente dor nos olhos nem cansaço algum após a leitura, mesmo tendo lido seguidamente quarenta a cinquenta páginas.
É muito bom ler A Verdade da Vida para seu próprio despertar,mas melhor ainda será ler para o despertar de outrem. Quando se pratica em benefício dos outros, manifesta-se a força vital infinita que transcende o 'eu' e os 'outros'; atinge-se a compreensão infinita de que 'eu' e os 'outros' somos um só corpo. Se ainda há manifestação de doença é porque sentimentos egoístas se misturam à ação. Se a pessoa ficar pensando em salvar o outro só depois de curar a sua própria doença, não haverá oportunidade para isso. Enquanto ela estiver salvando os outros a sua doença está curada. Se dedicar-me eternamente a salvar os outros, não haverá doença eternamente.
(Do livro A Verdade da Vida, vol. 08; pgs. 185 a 199)