domingo, setembro 02, 2012

Ensinamentos Essenciais da Seicho-No-Ie - 1/2

Masaharu Taniguchi


1 –  O MUNDO ABSOLUTO

Uezawa – Mestre, gostaria de alcançar o estado mental em que não se teme absolutamente nada. Desejo ouvir seus conselhos para consegui-lo.

Taniguchi – Para isso, é preciso contemplar com os olhos mentais unicamente a perfeição do mundo absoluto de Deus, sem considerar como existência verdadeira o inconstante mundo fenomênico, pois este é falsa existência. Assim procedendo, sua mente não se prenderá às transformações deste mundo. Somente o mundo absoluto é existência verdadeira, e portanto não é preciso inquietar a mente, temendo as transformações fenomênicas.

Uezawa – O que é o mundo absoluto? Refere-se ao mundo espiritual?

Taniguchi – Não, ele não se refere ao mundo espiritual. O mundo absoluto pode ser chamado também de “mundo do Jisso”. Dizemos “absoluto” para caracterizar sua natureza eterna, transcendental e indestrutível em contraposição com o mundo fenomênico, que é relativo, inconstante e destrutível. Há quem confunda o mundo absoluto com o mundo espiritual, mas este faz parte do mundo fenomênico e é habitado por espíritos, inclusive por aqueles inferiores e sofredores. O mundo absoluto é aquele onde a perfeição criada por Deus perdura para sempre e se faz presente, digamos, no âmago, no interior ou por trás do relativo mundo fenomênico. No mundo absoluto, tudo é absolutamente belo, bom e perfeito, pois foi criado por Deus; nele, tudo é dotado de infinita sabedoria, infinito amor, infinita Vida e infinita força de Deus.

Uezawa – Gostaria que o senhor explicasse em que se fundamenta para afirmar isso, pois não consigo ver tal mundo absoluto.

Taniguchi – O mundo absoluto não é perceptível aos cinco sentidos, nem ao sexto sentido. Assim sendo, não posso me basear em coisas relativas e palpáveis para convencê-lo de que tudo que existe no mundo absoluto é belo e perfeito. A existência desse mundo só pode ser compreendida através da “iluminação”, que é uma espécie de percepção espiritual. Essa iluminação vem como um raio de luz e revela a existência do mundo absoluto. O mundo fenomênico pode ser comparado à escuridão, onde só se pode ter ideia aproximada dos objetos, tateando-os. Algumas pessoas, “tateando” o mundo fenomênico, conseguem ter uma ideia aproximada do mundo absoluto.  Por exemplo, existem sábios que, observando o cumprimento rigoroso de todas as leis da Natureza, a precisão com que os astros se movimentam no espaço, a germinação da Vida alojada em uma semente, etc., chegam à conclusão de que existe uma fonte absoluta. Entretanto, essa conclusão se baseia em fenômenos do mundo relativo, e portanto não chega a ser iluminação. O modo mais fácil de abrir a porta do mundo do absoluto e conhecê-lo consiste em contemplar a Realidade, praticando a Meditação Shinsokan (Shin = Deus/Espírito Absoluto; So = ver; Kan = Mente; portanto o significado dessa palavra é “Contemplar Deus com os Olhos da Mente”) e contemplando a Essência da existência e a Essência de sua própria Vida.

Uezawa – Para conhecer o mundo absoluto basta praticar a Meditação Shinsokan?

Taniguchi – Como já disse, a conclusão a que se chega tateando o mundo fenomênico na escuridão é resultado da inteligência cerebral, e não o conhecimento absoluto. Para conhecê-lo, precisamos contemplar corretamente, através da Meditação Shinsokan, a Essência da existência e a Essência de nossa própria Vida.

Uezawa – O que quer dizer “contemplar corretamente a Essência da existência e a Essência de nossa própria Vida”?

Taniguchi – Uma existência possui essência e aparência. A aparência é o fenômeno relativo,  o qual parece existir, mas não é existência absoluta, tanto assim que se transforma a todo instante. E como a preocupação com o que se transforma incessantemente não leva a nada, devemos deixar de olhar para o fenômeno inconstante e, da mesma forma como observamos os astros com a visão concentrada em um telescópio, devemos contemplar a Essência de nossa existência, concentrando a visão mental. Nisto consiste a Meditação Shinsokan. E quando assim visualizamos nossa Essência, que é perfeita, compreendemos que ela existe no interior de toda e qualquer existência.

Uezawa – Quando o senhor diz “toda e qualquer existência”, está se referindo a todas as pessoas, coisas e fatos?

Taniguchi – Isso mesmo. Em todas as pessoas, coisas e fatos há a Essência e aparência. Devemos, pois, deixar de ver a aparência imperfeita e passar a ver sempre a Essência perfeita de todas as pessoas, coisas e fatos.

Uezawa – “Essência perfeita” significa “natureza divina”?

Taniguchi – Exatamente. Tanto faz chamá-la de “natureza divina”, “natureza búdica” ou “natureza verdadeira”. Sakyamuni disse que todos os seres vivos, como também todas as coisas inanimadas e todos os fatos contêm em seu âmago a Essência, a perfeição. Esta não pode ser conhecida pelos cinco sentidos nem pelo sexto sentido; não há outro meio senão intuí-la com a nossa própria Essência.

Uezawa – O senhor disse “Intuir com a nossa própria Essência”. Gostaria que me explicasse isso de modo mais compreensível. 

TaniguchiSomente uma Essência pode reconhecer outra Essência. Os cinco sentidos podem reconhecer apenas coisas e fatos fenomênicos, pois somente as vibrações de mesma frequência podem se sintonizar. Se procurarmos a Essência entre as coisas perceptíveis aos sentidos, confundiremos a Essência com o que é perceptível, e não conseguiremos conhecer a Essência, da mesma forma que um rádio mal sintonizado capta duas transmissões ao mesmo tempo e não consegue transmitir nitidamente nenhuma delas. Por isso, precisamos “desligar” os cinco sentidos por algum tempo e sintonizar o nosso ser exclusiva e totalmente com o mundo da Essência. Assim, a “nossa Essência” entrará em contato direto com a “Essência da existência”, com a “Essência da Vida”, e então perceberemos que, na verdade, sempre estivemos preenchidos e ao mesmo tempo envoltos por ela. Isto é o verdadeiro despertar, a verdadeira iluminação.

Uezawa - Quando o senhor diz “Essência da existência” e “Essência da Vida”, está dizendo o mesmo com palavras diferente ou cada um dessas expressões encerram significados distintos?

Taniguchi – “Essência da existência” pode ser expressa também como “Essência de todos os seres animados e inanimados”. Significa a “natureza verdadeira da coisa em si”. O mundo que se apresenta aos nossos sentidos não é, como já expliquei, o mundo verdadeiro em si. Por exemplo, os fatos imperfeitos que sucedem no mundo fenomênico não são verdadeiros, isto é, eles não estão ocorrendo no mundo do absoluto de Deus; a nossa mente é que deforma os fatos perfeitos e os apresenta como imperfeitos. O mesmo se pode dizer em relação às dificuldades de sobrevivência: para o homem verdadeiro não existem dificuldades de sobrevivência, mas elas se manifestam pelo poder da mente. Entretanto, isso se refere ao mundo fenomênico, porque no mundo absoluto não há semelhante problema. Portanto, se fitarmos a “Essência da existência”, isto é, a “original perfeição interior”, e agirmos conforme a solicitação que brotar espontaneamente do interior, as dificuldades de sobrevivência desaparecerão. Assim, estaremos manifestando no mundo fenomênico a perfeição da Essência da existência, bem como a imagem fiel da nossa própria Essência, que é divina. 

Vejamos agora se as expressões “Essência da existência” e “Essência da Vida” têm o mesmo significado. Se considerarmos que “tudo que existe é Vida”, as duas expressões terão o mesmo sentido. Entretanto, a expressão “Essência da existência” é empregada na maioria das vezes para se referir à essência das coisas, dos fatos ou dos acontecimentos externos, enquanto que a expressão “Essência da Vida” é usada para falar da Essência do ser humano, e ainda significa “Vida de Deus que rege o Universo” quando temos a convicção de que “nossa Vida é Vida de Deus”.

Quando procuramos contemplar constantemente a perfeição interior de tudo que nos cerca, nossa mente ilumina tudo ao nosso redor; consequentemente, as imagens ou situações imperfeitas acabam desaparecendo. Como já foi dito, no mundo absoluto criado por Deus não há imperfeições nem infelicidades; se, no entanto, elas surgem no ambiente de uma pessoa, é porque sua mente faz com que a “perfeição da existência verdadeira” se projete distorcidamente no plano fenomênico. Portanto, quando purificamos nossa mente e contemplamos unicamente a perfeição do mundo do absoluto, melhoram o ambiente, a situação e inclusive o corpo carnal, pois nossa mente, infiltrada em todas as células do nosso corpo, torna-se sadia e acaba restaurando todas as células e todos os tecidos.

Uezawa – O senhor falou em “perfeição da existência verdadeira”. Posso interpretá-la como “perfeição de Deus” ou seria mais correto dizer “perfeição de nossa Vida no mundo da existência verdadeira”?

Taniguchi – Se partirmos da premissa de que “somente Deus é existência verdadeira”, podemos dizer que “perfeição da existência verdadeira” significa também “perfeição de Deus”. Mas quando se refere ao homem, ela significa “perfeição do homem verdadeiro”. E esse homem verdadeiro jamais deixou de ser saudável; mesmo que o corpo carnal esteja doente, o homem verdadeiro não está doente.

Uezawa – Esse “homem verdadeiro” – que não adoece, mesmo quando o corpo está enfermo – pode ser entendido como “homem-espírito” ou “homem-Vida”?

Taniguchi – A expressão “homem-espírito” pode suscitar ambiguidade, pois a palavra “espírito” pode significar tanto “espírito universal” como “espírito individual”, e este é classificado em “absoluto” e “fenomênico”. O "espírito individual absoluto” é o próprio filho de Deus, enquanto que a expressão “espírito individual fenomênico” pode abranger “espírito em ilusão” ou “espírito não evoluído”. Portanto, dizendo simplesmente “homem-espírito”, não fica claro se se trata de “espírito individual em ilusão” ou de “espírito individual absoluto”. O “homem verdadeiro” é o “espírito individual absoluto”, é a Vida individual exatamente como foi criada por Deus. Quando a mente do homem se tornar correta, limpa e sem distorção, sua Essência criada por Deus projetar-se-á do mundo absoluto para o mundo fenomênico, com fidelidade e perfeição; então o homem manifestará plenamente a perfeição de que é dotado originariamente.

O mundo fenomênico é, segundo a filosofia da Seicho-No-Ie, projeção do mundo absoluto através da mente, e pode ser denominado também “mundo da projeção”. Este mundo da projeção deve refletir cada vez mais fielmente o mundo absoluto até tornar-se tão perfeito quanto o original. A lente utilizada para “fotografar” o original e produzir a cópia chamada mundo fenomênico, é a nossa mente. Quando conscientizamos a “Essência da existência” e vivemos visualizando a “Essência de nossa própria Vida”, que é Deus, nossa lente mental se torna límpida e perfeita, e então o homem fenomênico torna-se a projeção perfeita do homem verdadeiro, que é divino. Assim, temos o homem carnal saudável num ambiente feliz.


2 – SOBRE O EU VERDADEIRO E O FALSO EU

Uezawa – Penso que a expressão “sou Vida de Deus” significa que o eu é a força vital. Se é assim, não poderia haver distinção entre o que se chama de “Eu verdadeiro” e o “falso eu”, pois este também seria uma das manifestações da força vital do “Eu verdadeiro”. Quando a força vital do Eu verdadeiro atua em relação à matéria, assume a forma de “eu fenomênico”. Portanto, não é possível existir um “falso eu” do “Eu verdadeiro”, mas sou da opinião de que ambos são diferentes formas de manifestação da mesma força vital, portanto uma coisa só e não seres distintos. Gostaria que o senhor me desse esclarecimento a esse respeito.

Taniguchi – A ideia de que o eu é a força vital surgiu, na Antiguidade, com a filosofia dos Vedas. Na era moderna, o grande filósofo Schopenhauer abraçou essa ideia. E Rolland e Henri Bergson. Sakyamuni contestou a teoria védica, pregando na Sutra do Lótus que tal “eu” não existe. Se considerarmos o “eu fenomênico (dos cinco sentidos)” como “Eu verdadeiro”, deveremos admitir a satisfação dos desejos carnais ou egoísticos como manifestação natural e correta do Eu verdadeiro; deverá ser considerado bom e correto o conflito entre os seres vivos, isto é, a exploração dos fracos pelos fortes. Schopenhauer considerou a “Vontade de viver” como princípio fundamental da manifestação da Natureza, mas sua visão não lhe permitiu transcender o conflito existencial, e ele acabou criando a filosofia mais pessimista de todos os tempos: “Viver é sofrer”. Isso mostra que, enquanto considerarmos uma força fenomênica como Essência do nosso Eu verdadeiro, não conseguiremos alcançar a verdadeira salvação. Esta é conseguida quando compreendemos que o “eu fenomênico” é o “falso eu”, portanto inexistente, e volvemos a mente para o Eu verdadeiro, que é puro, perfeito e repleto de luz. Esta é a iluminação ou o despertar que a Seicho-No-Ie proporciona. 

Se alguém pensa que o “eu fenomênico” não é falso nem inexistente, e o considera como uma das manifestações do Eu verdadeiro, ele está em ilusão. Segundo a Seicho-No-Ie, o “falso eu” e o “ego” que procura defender tão somente seus interesses, mesmo prejudicando o próximo. Se o ego não fosse o “falso eu”, e sim manifestação do Eu verdadeiro, deveríamos louvar a manifestação desenfreada do egoísmo como manifestação do Eu verdadeiro e deveríamos também incentivar atitudes egoísticas, a corrupção, os assaltos, as guerras, etc. A Seicho-No-Ie não adota essa concepção. O Eu verdadeiro, o Eu que existe verdadeiramente, não contém egoísmo. Os conflitos egoísticos, as guerras, os assaltos, a corrupção, etc., não são existências verdadeiras, mas a “humanidade acredita ilusoriamente que tais males sejam existências verdadeiras”, como diz a Sutra do Lótus. Esta é a visão da Verdade da Seicho-No-Ie. Peço, portanto, que não se equivoque.


3 – A INTERFERÊNCIA DE PENSAMENTOS BANAIS NA PRÁTICA DA MEDITAÇÃO SHINSOKAN NÃO AFETA A ESSÊNCIA

Kakizaki – Durante a prática da Meditação Shinsokan para penetrar no mundo da Essência (no mundo perfeito e absoluto de Deus), surgem-me pensamento banais que atrapalham minha concentração. Que devo fazer?

Taniguchi – os pensamentos banais não prejudicam absolutamente a Meditação Shinsokan. O pensamento do Eu Verdadeiro dirigido à Essência (Deus) é um pensamento consistente, mas os pensamentos banais não têm consistência; são ilusórios. Portanto, por mais que eles surjam, não podem anular o pensamento dirigido à Essência divina. O senhor pode prosseguir a mentalização, sem ligar para os pensamentos banais que surgirem; não precisa eliminá-los primeiro para depois mentalizar a Essência divina. Mentalizando a Essência, os pensamentos banais irão desaparecendo naturalmente. O principal não é eliminar os pensamentos banais, mas mentalizar a Essência divina.

Kawahara – Mestre, o senhor diz que o principal é mentalizar a Essência, mas acho que a meditação não terá efeito se não for eliminada a interferência dos pensamentos banais.

Taniguchi – O senhor pensa assim porque tem a ilusão de que os pensamentos banais possuem força concreta. Se mentalizar a Essência sem se importar com os pensamentos banais que surgirem, estes desaparecerão automaticamente, assim como a treva desaparece automaticamente quando se acende a luz, sem que façamos esforço algum para eliminá-la, e haverá somente o efeito da mentalização da Essência, da perfeição interior.

Alguém indagou ao grande mestre budista Hônen: “procuro concentrar-me nas orações, mas minha mente se distrai, pensando em coisas mundanais. Será que minhas orações não me conduzirão ao paraíso?”. O mestre respondeu: “Pensar em coisas mundanais durante a oração não te prejudicará, se orares sinceramente. Mesmo que um filho contrarie um pouco a vontade do pai, receberá sua herança, a não ser que ele próprio renuncie a esse direito”.

Mentalizar Deus não é firmar com Ele um contrato que poderá ser desfeito a qualquer momento. Deus é nosso Pai. Logo, se contemplarmos Deus, a herança dEle (o paraíso) se manifestará natural e automaticamente, por mais que surjam pensamentos banais.


4 – A MEDITAÇÃO SHINSOKAN E A ALIMENTAÇÃO

Takimoto – Pratico a Meditação Shinsokan todas as manhãs durante uma hora ao me levantar. Desde que passei a praticá-la, meu apetite aumentou tanto que o desjejum, que antes se restringia a duas tigelinhas de sopa que eu tomava a muito custo, hoje chega a cinco ou seis tigelinhas de arroz, que esvazio com muito gosto. Isso me deixa satisfeito e passo o dia todo de bom humor. Há quem diga que a prática da Meditação Shinsokan espiritualiza o corpo carnal e vai reduzindo a necessidade de alimentação material, até que esta se torne dispensável. Entretanto, comigo ocorre o contrário. Afinal, a Meditação Shinsokan aumenta ou diminui a capacidade de se alimentar?

Taniguchi – Como a prática da Meditação Shinsokan consiste na contemplação da perfeição interior, ela determina ao organismo o que é necessário para que a pessoa exteriorize essa perfeição. Quanto à alimentação, tal dúvida corresponde à pergunta: “É mais certo a água subir em forma de vapor ou cair em forma de chuva?”. É correto a água evaporar e subir ao céu, assim como é correto ela precipitar em forma de chuva. Por isso, tanto é correto aumentar o apetite como diminuir. E quanto à quantidade de alimentos, a dúvida do senhor corresponde à pergunta: “É melhor que chova bastante, ou que chova pouco?”. Na época de plantio é bom que chova abundantemente, enquanto que muita chuva no período de colheita pode prejudicar a safra. Prender-se a uma forma não condiz com o modo de viver da Seicho-no-Ie. A abundância é benéfica, a escassez também. Tudo é bom quando ocorre de modo adequado às circunstância, à hora e à pessoa. Todo ato é bom quando se procede desprendida e adequadamente como as nuvens que flutuam no céu ou as águas que fluem. Nada de mal acontece, desde que se contemple a perfeição da Essência. Portanto, sr. Takimoto, não se prenda inutilmente ao aumento ou à diminuição de apetite; este aumenta quando é preciso alimentar mais o organismo e diminui quando é preciso reduzir a alimentação.


5 – OS DESEJOS MUNDANOS E A ILUMINAÇÃO

Toyoda – Certa pessoa disse: “As pessoas consideradas mestres não diferem das pessoas comuns, pois eles também têm os mesmos defeitos e desejos mundanos. Se os mestres conseguem proezas admiráveis, é porque não se prendem a seus defeitos e desejos. Os que conseguem seriamente sem se prender a seus defeitos são verdadeiros mestres”. Mas, no meu entender, no momento em que o homem se tornar um mestre de verdade, não terá defeitos nem desejos mundanos; se alcançar a iluminação, emitirá luz de seu interior, que o iluminará e a todos os lugares aonde se dirigir, e consequentemente desaparecerão todos os defeitos. Estou certo pensando assim?

Taniguchi – Certa vez, o grande mestre Dharma dirigiu-se a três de seus discípulos e perguntou-lhes qual era a relação entre os desejos mundanos e a iluminação. Um dos discípulos respondeu: “Eliminando-se os desejos, alcança-se a iluminação”. Eliminar os desejos corresponde a “transcender os desejos e defeitos” a que o senhor se referiu. Conta-se que o mestre Dharma elogiou esse discípulo, dizendo: “Você conquistou meus músculos!”. O outro discípulo respondeu: “Os desejos conduzem à iluminação”. Esse discípulo quis dizer que não há iluminação separada dos desejos mundanos, que não existe paraíso separado do mundo terreno, que a dor é o processo pelo qual a Vida sobrepuja e faz desaparecer a doença. O mestre Dharma então elogiou o segundo discípulo, dizendo: “Você conquistou meus ossos!”. O terceiro discípulo respondeu: “Os desejos mundanos não existem verdadeiramente! Há unicamente a iluminação!”. O mestre Dharma louvou-o, dizendo: “Você conquistou a minha medula!”. 

Também segundo a Seicho-No-Ie, os desejos mundanais não existem verdadeiramente, existindo unicamente a iluminação; o fenômeno não existe verdadeiramente, existindo unicamente a Essência; o corpo carnal não existe verdadeiramente, existindo unicamente a Vida. Entretanto, se aparecem desejos mundanos, é porque por trás existe a Essência, da mesma forma como as sombras aparecem porque por detrás existe luz. Não se apreende a Essência fugindo dos desejos mundanos; vive-se a Essência, estando no mundano. Se a luz da Essência for projetada sem distorção, o mundano, que é sombra projetada por essa luz, tornar-se-á puro e perfeito, e os desejos serão purificados. Portanto, quando se alcança esse estado, pode-se manifestar a perfeição da Essência sem eliminar os desejos, pois estes se tornam sadios, possibilitando realizar quaisquer empreendimentos com grande entusiasmo.

(Do livro: A Verdade da Vida, vol. 18, pp. 111-122)


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