Masaharu Taniguchi
"Visto pelos olhos da Verdade, todo homem é filho de Deus e está nos braços de Deus desde o princípio; ele é filho de Buda. Todos o são, independemente de se conscientizarem ou não disso" - estas são as palavras do sr. Ryocen Tsunajima, citadas em sua obra Jikaku shôki, inserida em Kaikô-loku. Esta conscientização é praticamente igual à proporcionada pela Seicho-No-Ie, de que "o homem é originariamente filho de Deus, filho de Buda, e já está salvo, independentemente de despertar para a Verdade". Então porque a conscientização de que "o homem é filho de Deus" alcançada pelo sr. Ryocen não o curou da enfermidade? E por que na Seicho-No-Ie a mesma conscientizãção - "o homem é filho de Deus" - proporciona a inúmeros adeptos a força para curar a doença? Por que a mesma conscientização beneficia a vida prática de uns e não beneficia a de outros? Creio que não será inútil pesquisar e descobrir a "sutil diferença de conscientização" que provoca tão diferente resultado.
Frequentemente ouço pessoas se queixarem: "Conscientizo que o homem é filho de Deus, mas minha doença não sara". São pessoas que têm a fé semelhante à do senhor Ryocen. Ele escreve em seu livro, Anshin litsumei no nihoomon:
"Para os adeptos da filosofia da resignação, a vida humana é um vazio; a humanidade e o mundo são como sonho ou sombra; apegar-se à sua própria existência é também ilusão. Segundo eles, alcança-se o nirvana somente quando se transcendem todos os fatos e todas as coisas do Universo, compreendendo que eles são vãos. A tranquilidade deles está na morte, no nada, no silencio absoluto, como bem exprime o ditado: 'grande é a morte: os sábios nela repousam e os medíocres nela jazem'. A paz deles não está além do túmulo, mas dentro do próprio túmulo. O objetivo deles não é 'morrer para viver', mas 'morrer para morrer'. O que eles desejam não é a 'vida na morte' mas a 'morte na morte'; é a grande morte, de onde não regressam. Pegam no grande e eterno sono, penetrando no mudo e solitário 'absoluto', que consideram seu túmulo. Nisso está a tranquilidade deles. (...)
Essa 'filosofia da resignação' prega também que devemos romper com a causalidade que rege o nascimento-morte-reencarnação e dormir no nirvana, desfrutando sua deliciosa quietude. Pertencem a essa filosofia uma parte do hinduísmo, a parte principal do pensamento de Sakyamuni e até a filosofia de Schopenhauer.
Agora, vamos analisar os adeptos da 'filosofia otimista'. Para eles, nada é sonho, nada é vão; tudo é manifestação dos atributos de Deus. Na visão deles, todos os seres, fatos e coisas têm, cada qual, seu lugar glorioso e seu valor. A grandeza dos heróis da 'filosofia otimista' está em possuir a verdadeira consciência de que são filhos de Deus. Obviamente, eles também derramam lágrimas e sofrem, pois os sofrimentos e as dores são realidades da vida humana. Eles não os consideram sonhos. Honesta e corajosamente encaram a realidade como tal, sem fugir dela. As lágrimas que eles derramam no espinhoso caminho desta vida são altamente confortantes. As lágrimas dos que possuem fé não são solitárias; pelo contrário, tornam profunda a alegria. Conta-se que, quando um sábio da antiguidade foi morto com um golpe de pedra desferido por um inimigo, seu rosto resplandeceu como o de um anjo. Nesse momento, estou sob uma chuva de projéteis. Será isto um sonho, uma miragem? Não, isto é realidade."
A crença do sr. Ryocen tendia mais para o cristianismo do que para o budismo. Conforme mostra o trecho citado, ele considerava o budismo uma doutrina pessimista que leva o homem a ver tudo como mero sonho e renunciar a tudo, e enaltecia a vida de sofrimento como a dos mártires cristãos: "Eles também derramam lágrimas e sofrem, pois os sofrimentos e as dores são realidades da vida humana. (...) As lágrimas (...) aprofundam a alegria. (...) Quando um sábio da Antiguidade foi morto com uma pedrada desferida por um inimigo, sua face resplandeceu como a de um anjo".
Se ele dizia que tanto as dores como as tristezas são realidade e as lágrimas aprofundam a alegria, e que até simpatizava com a tragédia daquele cuja face resplandeceu como a de um anjo quando foi morto com uma pedrada, é porque ainda possuía a idéia de que supotar tragédias e dores é uma atitude louvável que agrada a Deus. Isso é prova de que ele, mesmo após ter conhecido Deus ainda possuía o sentimento de culto ao sofrimento. E isso constituía a principal causa de não ter se curado de sua doença, mesmo após ter conscintizado que era "filho de Deus, filho de Buda, desde o princípio".
Não obstante, a "consciência de ser filho de Deus" do sr. Ryocen era muito profunda. Ele a adquiriu através de sua própria experiência na qual se manifestou a consciência absoluta (consciência de Deus), experiência essa bem semelhante à que eu tive. Ele disse:
"Eu, que até então estava escrevendo como um ser do mundo concreto, de repente senti-me transformado em Realidade universal; é como se eu tivesse desaparecido e Deus estivesse escrevendo em meu lugar. Estas são as palavras mais exatas para exprimir esta experiência extraordinária e surpreendente. Não conheço outra forma de expressar o que estou sentindo neste momento. Eu vi realmente Deus; encontrei-me realmente com Deus. Não, os termos 'ver' e 'encontrar-se' são muito superficiais para exprimir esta sensação. Na verdade, o que ocorreu foi a fusão entre mim e Deus, fusão esta em que praticamente me dissolvi dentro de Deus. Em outras palavras, identifiquei-me com Deus".
Ele diz também:
"Na experiência em que vi Deus, tive a comprovação de que a relação entre Deus e o homem é a de pai e filho. A consciência de que Deus é o pai do homem - que Jesus Cristo teve e utilizou magistralmente como um gênio extraordinário - essa consciência é a mais verdadeira e a mais solene Realidade objetiva e não pode jamais ser vista como uma forma de expressão poética. Tive a comprovação disso através de minha própria experiência. Na verdade, essa consciência possui um conteúdo tão rico e tão profundo que não pode ser exprimido com palavras humanas e metafóricas. Pelo menos assim senti no momento da experiência. Como não encontro palavras adequadas para exprimir esta consciência incomparável, uso emprestada a expressão 'Pai e filho', que julgo a mais próxima da ideal. Jesus Cristo escolheu muito bem essa expressão, que será usada eternamente. Eu simplesmente repito as palavras de Jesus para expressar a relação entre Deus e o homem, relação exata que existe na mente de quem viu Deus. Oh! como é profunda a sensação de ter visto Deus! Neste momento, sinto-me como que dissolvido dentro de Deus: não sou mais eu quem escreve movendo a caneta, mas o próprio Deus, que Se manifesta dinâmica e majestosamente do âmago do Universo. Um grande e dinâmico Ser espiritual invade toda a minha mente, e eu praticamente deixo de existir. Dissolvo-me neste grandioso Ser espiritual. Em outras palavras, identifico-me com Deus. Alguém poderá indagar se minha individualidade desapareceu no mar de Deus como uma gota. Digo que não, mesmo porque isso não expressa fielmente o meu estado de espírito. De um lado, tenho a sensação de que me dissolvi totalmente no grande mar de Deus, mas, por outro lado, estranhamente, tenho num canto de minha mente a sensação de que estou presenciando Deus diante dos meus olhos. Deus está realisticamente presente e eu estou mergulhado nEle, mas sem perder minha individualidade. Que coisa surpreendente! Esse estado de fusão e identificação é profundo demais, forte demais e verdadeiro demais para ser exprimido com palavras como Pai e Filho".
Em certa noite de novembro de 1904, através dessa experiência em que viu Deus, o sr. Ryocen Tsunajima alcançou a profunda consciência de que está ligado aqui e agora, ao Infinito e à Vida eterna. Desde então, tornou-se capaz de declarar: "Visto pelos olhos da Verdade, todo homem é filho de Deus e está nos braços de Deus desde o princípio; ele é filho de Buda. Todos o são, independentemente de se conscientizarem disso". Já que alcançou a consciência de que "está ligado, aqui e agora, à Vida eterna", ele transcendeu os três mundos (passado, presente e futuro), o que lhe permitiu afirmar:
"Quem toma consciência de estar ligado à Vida eterna transcende as limitações do tempo e vive sempre no eterno presente. Para um desperto, não existe nem o nascer nem o morrer. Ele transcende a relação de causa e efeito dos três mundos. Assim, ele vive hoje, amanhã e milhões de anos. Por que? Porque ele vive em Deus. E quem vive em Deus vive eternamente, vive verdadeiramente. Ele é aquele que se deleita na 'eternidade absoluta' de que falou Chuang-Tzu (sábio chinês do século IV). Ele não está sujeito à correnteza do tempo pertinente a nascer-morrer-reencarnar, nem possui o apego ilusório de ansiar pela encarnação futura. Mesmo que eu continuasse vivendo por milhões de anos através de sucessivas reencarnações, se não tivesse a consciência de viver em Deus, continuaria sem Deus e sem Vida eterna, permaneceria sem despertar e continuaria reencarnando na ilusão, isto é, na treva do nascer-e-morrer. E, mesmo que eu vivesse sentindo anseio pelas encarnações futuras, tal vida nada teria a ver com a minha vida verdadeira. É infeliz aquele que vive no tempo, sem viver em Deus. Isso não é a Vida eterna do Eu verdadeiro".
O sr. Ryocen prega a "vida do Grande Eu, que está ligada à Vida eterna e infinita aqui e agora". Que é o Eu verdadeiro ou o ser verdadeiro de que ele fala? É aquele que está ligado à Vida infinita no ponto chamado "aqui e agora". Esse ponto é a Grande Vida Universal que, sem ter volume algum, está presente em todos os lugares, é a Grande Vida Universal que, sem ter duração, abrange todos os tempo. Nesse ponto absoluto, Deus é Eu, e Eu sou Deus; Deus é tudo, e Eu sou tudo. Se "Deus é tudo, e Eu sou tudo", nada pode existir além de Deus, além do Bem, além daquilo que seja sumamente belo e sublime. Se o sr. Ryocen tivesse realmente conscientizado que nada existe além de Deus e do Bem, teria compreendido que a doença não existe, e, consequentemente, teria se curado. Faltou um passo para transpor a barreira que o separava da grande Verdade pregada pela Seicho-No-Ie. E qual seria esse passo? Naquela noite de novembro de 1904, ele conscientizou que estava ligado à Vida eterna, mas, quando saiu do êxtase e olhou para o mundo fenomênico-material, viu-o como existência verdadeira. Foi aí que sua conscientização sofreu uma queda. Por ter visto o mundo material como existente, a matéria se tornou para ele uma barreira, o que o impediu de dar um passo para alcançar a conscientização proporcionada pela Seicho-No-Ie.
O sr. Ryocen, após conscientizar que estava ligado a Deus, conscientizou também que "tudo que existe é bom", exatamente como prega a Seicho-No-Ie. Entretanto, ele usava a expressão Tudo que existe em sentido muito diferente daquele em que tal expressão é usada na Seicho-No-Ie. Nela, negamos totalmente o fenômeno dizendo "o fenômeno não existe", e, somente então, dizemos que "tudo o que existe é bom", vendo apenas a existência verdadeira. O sr. Ryocen, no entanto, não conseguia negar o fenômeno, a matéria; ele tachava de "filosofia da resignação" aquela que nega a matéria; afirmava que "tudo que existe é bom", vendo a matéria, o fenômeno, a doença, o sofrimento e as tragédias como realidade, e considerava herói quem aceitava tudo isso como realidade.
Por exemplo, ele sofria dos pulmões. E qual foi sua atitude em relação à sua doença? Apesar de compreender que "tudo o que existe é bom" no mundo criado por Deus, não foi capaz de afirmar que não existe algo indesejável, desagradável, mau como a doença. Apesar de conscientizar que "existe somente Deus", não compreendeu a inexistência do fenômeno, da matéria; por isso, ele considerou o fenômeno e a matéria como integrantes de Deus que, para ele, engloba tudo. Em outras palavras, quando disse que "tudo o que existe é bom", estava incluindo a doença entre "tudo o que existe". Para ele a doença em si não era inexistente nem era um bem, mas, considerando-a dentro de um contexto todo, admitiu que "também a doença existe como um bem". Comparemos a doença a uma mancha feia de tinta marrom. Essa mancha em si não é bela, mas, quando ela serve para ressaltar a beleza de um quadro, ela passa a ser bela. É dessa forma que o sr. Ryocen via sua doença. Quanto mais sua doença fosse dolorosa, mais servia para resaltar o bem e a beleza do quadro geral de sua vida. Essa era sua visão de vida. É por isso que "as lágrimas tornam profunda a alegria" e "seu rosto resplandece quando é morto por uma pedrada inimiga". Ele próprio, explicando sua afirmação de que "tudo que existe é bom", diz o seguinte em sua obra Nyose Gashô:
"Dizem que tudo que existe é bom. Mas não me deixem tropeçar nessa frase. Como costume dizer, essa expressão deve ser usada quando um fato é considerado dentro de um conjunto, isto é, dentro do panorama único do mundo de Deus, onde todos os fatos e todas as coisas formam um todo harmônico. Quando se sobe o pico do absoluto e de lá do alto se olha para as ondas de diferentes tamanhos, vê-se que tudo é belo e bom. (...) Todas as coisas são realmente boas no estado em que se encontram".
Explicando melhor, o sr. Ryocen quis dizer que a "o ponto marrom" (correspondente ao sofrimento), na sua relação com as demais "tintas" colocadas na tela da Imagem Verdadeira (Jisso ou Realidade divina), quando visto do plano de Deus que transcende o tempo e o espaço, constitui um belo absoluto, um bem absoluto. Ele não nega a existência da doença, da infelicidade; apenas as sublima e diz que são belas somente quando vistas do céu do bem e do belo absolutos. Isso quer dizer que, para quem vive a vida prática com os pés no chão, o pico do absoluto é infinitamente alto, e o caminho para atingí-lo é extremamente difícil. Ele mesmo lamenta em Nyose Gashô, dizendo: "Diante dessa realidade, ninguém pode negá-la. Refletindo bem, vejo que sou fraco e não sou perfeito; preciso ser forte, preciso ser perfeito". Ele diz "diante da realidade", mas que é essa "realidade"? Ela não passa de fenômeno, não passa de algo que não existe verdadeiramente. Enquanto a pessoa vir como existente o fenômeno, que não é existência verdadeira, terá de lamuriar, dizendo "sou fraco, não sou perfeito", mesmo tendo passado pela experiência de se fundir com o mundo absoluto de Deus. É um erro considerar o fenômeno como realidade. Saibam que realidade é apenas a Imagem Verdadeira, a perfeição proveniente de Deus. Portanto, quando ressaltamos a existência exclusiva da Imagem Verdadeira e negamos a existência do mal, dizendo "Seres fracos não existem! A imperfeição não existe!" - isto é, quando afirmamos apenas a realidade da Imagem Verdadeira, na qual tudo é bem - dominamos até a realidade fenomênica e então não precisamos lamentar dizendo "sou fraco, não sou perfeito", como fazem os dominados pela realidade fenomênica.
Como vemos, a Seicho-No-Ie afirma unicamente o bem da Imagem Verdadeira e nega totalmente as infelicidades, que pertencem ao mundo fenomênico, dizendo "O fenômeno não existe". Esta é a razão por que consegue um grande poder para dominar o mundo concreto. Se pensarmos que "o fenômeno existe", estaremos reconhecendo que o fenômeno possui força, e consequentemente não poderemos dominá-lo. Certos religiosos e filósofos fazem a seguinte crítica à Seicho-No-Ie: "o fenômeno existe como fenômeno; admitir apenas o mundo substancial (o mundo da existência verdadeira, o mundo da Imagem Verdadeira) e querer aplicar no mundo fenomênico a idéia de perfeição do mundo substancial é confundir os dois mundos". Mas a Seicho-No-Ie não confunde o mundo substancial com o mundo fenomênico, pois não reconhece a existência deste último. Faz confusão só quem reconhece a existência do mundo fenomênico. Como nós conscientizamos que "o mundo fenomênico não existe" e como não é possível confundir algo inexistente com algo existente, afirmamos apenas e sempre a perfeição do mundo substancial. Consequentemente, essa perfeição se projeta no mundo fenomênico, tornando possível a eliminação das infelicidades. Certas religiões contrapõem o mundo fenomênico ao mundo substancial, dizendo que dizendo que "o fenômeno existe como fenômeno", e outras pensam que "o mundo fenomênico é projeção do próprio mundo da Imagem Verdadeira e portanto eles são um mundo só, sendo que o segundo faz parte do primeiro". As religiões que não conseguem se libertar dessas idéias tradicionais não conseguem jamais dominar a vida prática. Se a Seicho-No-Ie manifesta uma força extraordinária para dominar a vida prática, é porque rompe com o mundo fenomênico, afirmando alta e claramente que o fenômeno não existe e que existe unicamente a Imagem Verdadeira.
Frequentemente ouço pessoas se queixarem: "Conscientizo que o homem é filho de Deus, mas minha doença não sara". São pessoas que têm a fé semelhante à do senhor Ryocen. Ele escreve em seu livro, Anshin litsumei no nihoomon:
"Para os adeptos da filosofia da resignação, a vida humana é um vazio; a humanidade e o mundo são como sonho ou sombra; apegar-se à sua própria existência é também ilusão. Segundo eles, alcança-se o nirvana somente quando se transcendem todos os fatos e todas as coisas do Universo, compreendendo que eles são vãos. A tranquilidade deles está na morte, no nada, no silencio absoluto, como bem exprime o ditado: 'grande é a morte: os sábios nela repousam e os medíocres nela jazem'. A paz deles não está além do túmulo, mas dentro do próprio túmulo. O objetivo deles não é 'morrer para viver', mas 'morrer para morrer'. O que eles desejam não é a 'vida na morte' mas a 'morte na morte'; é a grande morte, de onde não regressam. Pegam no grande e eterno sono, penetrando no mudo e solitário 'absoluto', que consideram seu túmulo. Nisso está a tranquilidade deles. (...)
Essa 'filosofia da resignação' prega também que devemos romper com a causalidade que rege o nascimento-morte-reencarnação e dormir no nirvana, desfrutando sua deliciosa quietude. Pertencem a essa filosofia uma parte do hinduísmo, a parte principal do pensamento de Sakyamuni e até a filosofia de Schopenhauer.
Agora, vamos analisar os adeptos da 'filosofia otimista'. Para eles, nada é sonho, nada é vão; tudo é manifestação dos atributos de Deus. Na visão deles, todos os seres, fatos e coisas têm, cada qual, seu lugar glorioso e seu valor. A grandeza dos heróis da 'filosofia otimista' está em possuir a verdadeira consciência de que são filhos de Deus. Obviamente, eles também derramam lágrimas e sofrem, pois os sofrimentos e as dores são realidades da vida humana. Eles não os consideram sonhos. Honesta e corajosamente encaram a realidade como tal, sem fugir dela. As lágrimas que eles derramam no espinhoso caminho desta vida são altamente confortantes. As lágrimas dos que possuem fé não são solitárias; pelo contrário, tornam profunda a alegria. Conta-se que, quando um sábio da antiguidade foi morto com um golpe de pedra desferido por um inimigo, seu rosto resplandeceu como o de um anjo. Nesse momento, estou sob uma chuva de projéteis. Será isto um sonho, uma miragem? Não, isto é realidade."
A crença do sr. Ryocen tendia mais para o cristianismo do que para o budismo. Conforme mostra o trecho citado, ele considerava o budismo uma doutrina pessimista que leva o homem a ver tudo como mero sonho e renunciar a tudo, e enaltecia a vida de sofrimento como a dos mártires cristãos: "Eles também derramam lágrimas e sofrem, pois os sofrimentos e as dores são realidades da vida humana. (...) As lágrimas (...) aprofundam a alegria. (...) Quando um sábio da Antiguidade foi morto com uma pedrada desferida por um inimigo, sua face resplandeceu como a de um anjo".
Se ele dizia que tanto as dores como as tristezas são realidade e as lágrimas aprofundam a alegria, e que até simpatizava com a tragédia daquele cuja face resplandeceu como a de um anjo quando foi morto com uma pedrada, é porque ainda possuía a idéia de que supotar tragédias e dores é uma atitude louvável que agrada a Deus. Isso é prova de que ele, mesmo após ter conhecido Deus ainda possuía o sentimento de culto ao sofrimento. E isso constituía a principal causa de não ter se curado de sua doença, mesmo após ter conscintizado que era "filho de Deus, filho de Buda, desde o princípio".
Não obstante, a "consciência de ser filho de Deus" do sr. Ryocen era muito profunda. Ele a adquiriu através de sua própria experiência na qual se manifestou a consciência absoluta (consciência de Deus), experiência essa bem semelhante à que eu tive. Ele disse:
"Eu, que até então estava escrevendo como um ser do mundo concreto, de repente senti-me transformado em Realidade universal; é como se eu tivesse desaparecido e Deus estivesse escrevendo em meu lugar. Estas são as palavras mais exatas para exprimir esta experiência extraordinária e surpreendente. Não conheço outra forma de expressar o que estou sentindo neste momento. Eu vi realmente Deus; encontrei-me realmente com Deus. Não, os termos 'ver' e 'encontrar-se' são muito superficiais para exprimir esta sensação. Na verdade, o que ocorreu foi a fusão entre mim e Deus, fusão esta em que praticamente me dissolvi dentro de Deus. Em outras palavras, identifiquei-me com Deus".
Ele diz também:
"Na experiência em que vi Deus, tive a comprovação de que a relação entre Deus e o homem é a de pai e filho. A consciência de que Deus é o pai do homem - que Jesus Cristo teve e utilizou magistralmente como um gênio extraordinário - essa consciência é a mais verdadeira e a mais solene Realidade objetiva e não pode jamais ser vista como uma forma de expressão poética. Tive a comprovação disso através de minha própria experiência. Na verdade, essa consciência possui um conteúdo tão rico e tão profundo que não pode ser exprimido com palavras humanas e metafóricas. Pelo menos assim senti no momento da experiência. Como não encontro palavras adequadas para exprimir esta consciência incomparável, uso emprestada a expressão 'Pai e filho', que julgo a mais próxima da ideal. Jesus Cristo escolheu muito bem essa expressão, que será usada eternamente. Eu simplesmente repito as palavras de Jesus para expressar a relação entre Deus e o homem, relação exata que existe na mente de quem viu Deus. Oh! como é profunda a sensação de ter visto Deus! Neste momento, sinto-me como que dissolvido dentro de Deus: não sou mais eu quem escreve movendo a caneta, mas o próprio Deus, que Se manifesta dinâmica e majestosamente do âmago do Universo. Um grande e dinâmico Ser espiritual invade toda a minha mente, e eu praticamente deixo de existir. Dissolvo-me neste grandioso Ser espiritual. Em outras palavras, identifico-me com Deus. Alguém poderá indagar se minha individualidade desapareceu no mar de Deus como uma gota. Digo que não, mesmo porque isso não expressa fielmente o meu estado de espírito. De um lado, tenho a sensação de que me dissolvi totalmente no grande mar de Deus, mas, por outro lado, estranhamente, tenho num canto de minha mente a sensação de que estou presenciando Deus diante dos meus olhos. Deus está realisticamente presente e eu estou mergulhado nEle, mas sem perder minha individualidade. Que coisa surpreendente! Esse estado de fusão e identificação é profundo demais, forte demais e verdadeiro demais para ser exprimido com palavras como Pai e Filho".
Em certa noite de novembro de 1904, através dessa experiência em que viu Deus, o sr. Ryocen Tsunajima alcançou a profunda consciência de que está ligado aqui e agora, ao Infinito e à Vida eterna. Desde então, tornou-se capaz de declarar: "Visto pelos olhos da Verdade, todo homem é filho de Deus e está nos braços de Deus desde o princípio; ele é filho de Buda. Todos o são, independentemente de se conscientizarem disso". Já que alcançou a consciência de que "está ligado, aqui e agora, à Vida eterna", ele transcendeu os três mundos (passado, presente e futuro), o que lhe permitiu afirmar:
"Quem toma consciência de estar ligado à Vida eterna transcende as limitações do tempo e vive sempre no eterno presente. Para um desperto, não existe nem o nascer nem o morrer. Ele transcende a relação de causa e efeito dos três mundos. Assim, ele vive hoje, amanhã e milhões de anos. Por que? Porque ele vive em Deus. E quem vive em Deus vive eternamente, vive verdadeiramente. Ele é aquele que se deleita na 'eternidade absoluta' de que falou Chuang-Tzu (sábio chinês do século IV). Ele não está sujeito à correnteza do tempo pertinente a nascer-morrer-reencarnar, nem possui o apego ilusório de ansiar pela encarnação futura. Mesmo que eu continuasse vivendo por milhões de anos através de sucessivas reencarnações, se não tivesse a consciência de viver em Deus, continuaria sem Deus e sem Vida eterna, permaneceria sem despertar e continuaria reencarnando na ilusão, isto é, na treva do nascer-e-morrer. E, mesmo que eu vivesse sentindo anseio pelas encarnações futuras, tal vida nada teria a ver com a minha vida verdadeira. É infeliz aquele que vive no tempo, sem viver em Deus. Isso não é a Vida eterna do Eu verdadeiro".
O sr. Ryocen prega a "vida do Grande Eu, que está ligada à Vida eterna e infinita aqui e agora". Que é o Eu verdadeiro ou o ser verdadeiro de que ele fala? É aquele que está ligado à Vida infinita no ponto chamado "aqui e agora". Esse ponto é a Grande Vida Universal que, sem ter volume algum, está presente em todos os lugares, é a Grande Vida Universal que, sem ter duração, abrange todos os tempo. Nesse ponto absoluto, Deus é Eu, e Eu sou Deus; Deus é tudo, e Eu sou tudo. Se "Deus é tudo, e Eu sou tudo", nada pode existir além de Deus, além do Bem, além daquilo que seja sumamente belo e sublime. Se o sr. Ryocen tivesse realmente conscientizado que nada existe além de Deus e do Bem, teria compreendido que a doença não existe, e, consequentemente, teria se curado. Faltou um passo para transpor a barreira que o separava da grande Verdade pregada pela Seicho-No-Ie. E qual seria esse passo? Naquela noite de novembro de 1904, ele conscientizou que estava ligado à Vida eterna, mas, quando saiu do êxtase e olhou para o mundo fenomênico-material, viu-o como existência verdadeira. Foi aí que sua conscientização sofreu uma queda. Por ter visto o mundo material como existente, a matéria se tornou para ele uma barreira, o que o impediu de dar um passo para alcançar a conscientização proporcionada pela Seicho-No-Ie.
O sr. Ryocen, após conscientizar que estava ligado a Deus, conscientizou também que "tudo que existe é bom", exatamente como prega a Seicho-No-Ie. Entretanto, ele usava a expressão Tudo que existe em sentido muito diferente daquele em que tal expressão é usada na Seicho-No-Ie. Nela, negamos totalmente o fenômeno dizendo "o fenômeno não existe", e, somente então, dizemos que "tudo o que existe é bom", vendo apenas a existência verdadeira. O sr. Ryocen, no entanto, não conseguia negar o fenômeno, a matéria; ele tachava de "filosofia da resignação" aquela que nega a matéria; afirmava que "tudo que existe é bom", vendo a matéria, o fenômeno, a doença, o sofrimento e as tragédias como realidade, e considerava herói quem aceitava tudo isso como realidade.
Por exemplo, ele sofria dos pulmões. E qual foi sua atitude em relação à sua doença? Apesar de compreender que "tudo o que existe é bom" no mundo criado por Deus, não foi capaz de afirmar que não existe algo indesejável, desagradável, mau como a doença. Apesar de conscientizar que "existe somente Deus", não compreendeu a inexistência do fenômeno, da matéria; por isso, ele considerou o fenômeno e a matéria como integrantes de Deus que, para ele, engloba tudo. Em outras palavras, quando disse que "tudo o que existe é bom", estava incluindo a doença entre "tudo o que existe". Para ele a doença em si não era inexistente nem era um bem, mas, considerando-a dentro de um contexto todo, admitiu que "também a doença existe como um bem". Comparemos a doença a uma mancha feia de tinta marrom. Essa mancha em si não é bela, mas, quando ela serve para ressaltar a beleza de um quadro, ela passa a ser bela. É dessa forma que o sr. Ryocen via sua doença. Quanto mais sua doença fosse dolorosa, mais servia para resaltar o bem e a beleza do quadro geral de sua vida. Essa era sua visão de vida. É por isso que "as lágrimas tornam profunda a alegria" e "seu rosto resplandece quando é morto por uma pedrada inimiga". Ele próprio, explicando sua afirmação de que "tudo que existe é bom", diz o seguinte em sua obra Nyose Gashô:
"Dizem que tudo que existe é bom. Mas não me deixem tropeçar nessa frase. Como costume dizer, essa expressão deve ser usada quando um fato é considerado dentro de um conjunto, isto é, dentro do panorama único do mundo de Deus, onde todos os fatos e todas as coisas formam um todo harmônico. Quando se sobe o pico do absoluto e de lá do alto se olha para as ondas de diferentes tamanhos, vê-se que tudo é belo e bom. (...) Todas as coisas são realmente boas no estado em que se encontram".
Explicando melhor, o sr. Ryocen quis dizer que a "o ponto marrom" (correspondente ao sofrimento), na sua relação com as demais "tintas" colocadas na tela da Imagem Verdadeira (Jisso ou Realidade divina), quando visto do plano de Deus que transcende o tempo e o espaço, constitui um belo absoluto, um bem absoluto. Ele não nega a existência da doença, da infelicidade; apenas as sublima e diz que são belas somente quando vistas do céu do bem e do belo absolutos. Isso quer dizer que, para quem vive a vida prática com os pés no chão, o pico do absoluto é infinitamente alto, e o caminho para atingí-lo é extremamente difícil. Ele mesmo lamenta em Nyose Gashô, dizendo: "Diante dessa realidade, ninguém pode negá-la. Refletindo bem, vejo que sou fraco e não sou perfeito; preciso ser forte, preciso ser perfeito". Ele diz "diante da realidade", mas que é essa "realidade"? Ela não passa de fenômeno, não passa de algo que não existe verdadeiramente. Enquanto a pessoa vir como existente o fenômeno, que não é existência verdadeira, terá de lamuriar, dizendo "sou fraco, não sou perfeito", mesmo tendo passado pela experiência de se fundir com o mundo absoluto de Deus. É um erro considerar o fenômeno como realidade. Saibam que realidade é apenas a Imagem Verdadeira, a perfeição proveniente de Deus. Portanto, quando ressaltamos a existência exclusiva da Imagem Verdadeira e negamos a existência do mal, dizendo "Seres fracos não existem! A imperfeição não existe!" - isto é, quando afirmamos apenas a realidade da Imagem Verdadeira, na qual tudo é bem - dominamos até a realidade fenomênica e então não precisamos lamentar dizendo "sou fraco, não sou perfeito", como fazem os dominados pela realidade fenomênica.
Como vemos, a Seicho-No-Ie afirma unicamente o bem da Imagem Verdadeira e nega totalmente as infelicidades, que pertencem ao mundo fenomênico, dizendo "O fenômeno não existe". Esta é a razão por que consegue um grande poder para dominar o mundo concreto. Se pensarmos que "o fenômeno existe", estaremos reconhecendo que o fenômeno possui força, e consequentemente não poderemos dominá-lo. Certos religiosos e filósofos fazem a seguinte crítica à Seicho-No-Ie: "o fenômeno existe como fenômeno; admitir apenas o mundo substancial (o mundo da existência verdadeira, o mundo da Imagem Verdadeira) e querer aplicar no mundo fenomênico a idéia de perfeição do mundo substancial é confundir os dois mundos". Mas a Seicho-No-Ie não confunde o mundo substancial com o mundo fenomênico, pois não reconhece a existência deste último. Faz confusão só quem reconhece a existência do mundo fenomênico. Como nós conscientizamos que "o mundo fenomênico não existe" e como não é possível confundir algo inexistente com algo existente, afirmamos apenas e sempre a perfeição do mundo substancial. Consequentemente, essa perfeição se projeta no mundo fenomênico, tornando possível a eliminação das infelicidades. Certas religiões contrapõem o mundo fenomênico ao mundo substancial, dizendo que dizendo que "o fenômeno existe como fenômeno", e outras pensam que "o mundo fenomênico é projeção do próprio mundo da Imagem Verdadeira e portanto eles são um mundo só, sendo que o segundo faz parte do primeiro". As religiões que não conseguem se libertar dessas idéias tradicionais não conseguem jamais dominar a vida prática. Se a Seicho-No-Ie manifesta uma força extraordinária para dominar a vida prática, é porque rompe com o mundo fenomênico, afirmando alta e claramente que o fenômeno não existe e que existe unicamente a Imagem Verdadeira.
(Do livro "A Verdade da Vida, vol. 27", pgs. 109 à 119)
por favor alguém comente esta parte
ResponderExcluirda Sutra Chuva de Néctar da Verdade,comparando com texto da matéria postada.
"As corporificações das idéias emitidas pela Vida e projetadas no espaço dá-se o nome de matéria. A matéria é originaramente nada e não possui autonomia nem força. O que faz parecer que a matéria possui força para dominar a vida, é a distorção ocorrida na ocasião da passagem da Vida por aquela forma de reconhecer. Vede corretamente a Imagem Verdadeira da Vida sem vos prender a essa distorção." Mais adiante a sutra ainda afirma tudo é projeção da mente, que mente é esta.
Sua pergunta será respondida...
ResponderExcluirAguarde um pouco, ok?
Abraço.