- Masaharu Taniguchi -
A PRÁTICA DO ASCETISMO, MEDITAÇÃO E DA ILUMINAÇÃO
A prática do jejum
Apresentador - Gostaria que o senhor nos ensinasse mais detalhadamente sobre a relação entre a prática do jejum, o desenvolvimento da espiritualidade e a iluminação espiritual.
Taniguchi - O jejum e as demais práticas que mortificam o corpo contribuem para o desenvolvimento da parte espiritual da pessoa, porque a negação do corpo carnal, a negação da matéria, atua concretamente na vida prática e, assim, facilita o despertar espiritual. Pode-se afirmar isso ao observar o modo como viveu Sakyamuni. É impossível desenvolver a potencialidade espiritual satisfazendo à exaustão os desejos carnais. Ainda hoje há pessoas que se retiram numa montanha e praticam jejum, abluções, banhos na cachoeira, para assim alcançarem algum despertar. Eu também já fiquei em jejum, mas não foi por isso que despertei. Não há dúvida de que essas práticas facilitam certo tipo de despertar.
Não estou, porém, recomendando o jejum aos senhores. A Seicho-No-Ie diz que as práticas ascéticas não levam ao despertar, ou seja, que mortificar desnecessariamente o corpo não contribui para o aprimoramento espiritual. No entanto, quando se satisfaz demasiadamente o corpo carnal, a balança mental pende mais para o lado dos desejos carnais e o peso espiritual fica mais leve, dificultando o despertar.
Há, contudo, um dano causado pela prática do jejum. Em contraposição ao enfraquecimento da psique física por meio do jejum, torna-se acurada a sensibilidade espiritual. Em consequência, a pessoa poderá ser incorporada por inúmeros espíritos baixos e, no caso de não contar com um bom espírito-guia ou um anjo protetor poderoso, poderá ser ludibriada por essas almas iludidas. Constatamos isso no fato do demônio Papiyas ter se manifestado em Sakyamuni momentos antes de este alcançar a iluminação e no fato de Satanás ter tentado Jesus pouco antes de ele conscientizar que era filho de Deus. Sakyamuni e Jesus Cristo não se renderam a esses espíritos maléficos e, certos de que não eram manifestações de Deus, afastaram-nos dizendo "Vai-te, Satanás".
Se alguém se retirar numa montanha e praticar o jejum, poderá receber a influência de espíritos de categoria inferior que vagueiam pela mata, adquirindo assim a clarividência por ação de parte do sexto sentido e passar a enxergar imagens de espíritos ou uma parte do mundo espiritual. Há também quem comece a dizer "palavras de Deus", afirmando que obteve esse poder sobrenatural. Ocorre isso porque a pessoa adquire uma espécie de mediunidade em consequência de sua sensibilidade espiritual ter se tornado mais aguçada. Há grande perigo de se desviar do caminho, ludibriado pela orientação desses espíritos, porque esse não é um estado em que a pessoa despertou para a Verdade, conscientizando-se da natureza divina da Imagem Verdadeira. Portanto, é melhor que não se retirem para as montanhas para praticar ascetismo.
Deus é onipresente e não há necessidade de ir para as montanhas. O melhor para alcançar o despertar é praticar a Meditação Shinsokan.
A Meditação Shinsokan
Apresentador - Dizem que para praticar a Meditação Shinsokan é muito importante tomar a postura física correta, mas, se a postura mental estiver correta, a pessoa não poderia praticá-la mesmo deitada?
Taniguchi - A postura física influencia a postura mental e vice-versa. Mesmo o aparelho de rádio não capta uma onda se mudarmos um pouco a posição do condensador variável, que é um dispositivo circular de metal que fica dentro do rádio, em local invisível. A pessoa não deve negligenciar a postura só porque sente um pouco de dor nos pés. Ao praticar a Meditação Shinsokan, é preciso ficar em postura realmente correta.
Há pessoas que, ao praticar a Meditação Shinsokan, atingem o despertar rapidamente, enquanto outras demoram. Isso é inevitável porque depende do grau de desenvolvimento espiritual de cada pessoa. Em todo ser humano está alojado o Espírito de Deus, mas cada um partiu em diferentes momentos e, mesmo que a alma da pessoa esteja com o seu desenvolvimento atrasado, não significa que seja de categoria inferior. Apenas nasceu mais tarde de Deus. Há espíritos adestrados porque renasceram inúmeras vezes, enquanto outros renasceram poucas vezes neste mundo. É natural que estes demorem mais para atingir o despertar do que aqueles.
Entretanto, dificilmente alguém consegue alcançar o derradeiro despertar. Ninguém consegue atingir o último despertar, supremo e perfeito, porque este é um mundo de evolução infinito. Significa que, por mais que a pessoa evolua, ainda resta um longo caminho pela frente. Se alguém pensar "Já sou iluminado. Já atingi o último despertar. Sou o mais erudito dos homens", significa apenas que se tornou presunçoso.
Há diversos níveis de despertar. E se, lendo livros e ouvindo palestras, a pessoa compreender, mesmo que apenas intelectualmente, que sua natureza real é Deus, significa que a Imagem Verdadeira – Deus – já se manifestou de alguma forma nessa pessoa. Por isso, sente "Sim, Deus existe, minha vida veio de Deus, e compreendo isso racionalmente", sem se antipatizar com o teísmo. Consegue aceitar isso porque a sua Imagem Verdadeira já se manifestou até esse grau. Se, porém, houver quem pense "Que idiotice! Tudo que prega a existência de Deus é crendice", a Imagem Verdadeira dessa pessoa ainda não se manifestou. Muita gente pensa assim. Ainda que seja um intelectual do naipe de professor universitário, se ele não admite a existência de Deus, ainda não manifestou a sua Imagem Verdadeira até o devido grau. Significa, portanto, que espiritualmente ainda está em nível inferior.
Mesmo que a pessoa compreenda intelectualmente a existência de Deus, ainda não atingiu, logicamente, o último estágio do despertar, apesar de a Imagem Verdadeira ter se manifestado até certo grau. Se tal pessoa praticar a Meditação Shinsokan, ler livros da Verdade, irá adquirindo progressivamente a convicção "Sou filho de Deus" e chegará o dia em que sentirá um inefável êxtase e uma alegria incontida.
Mesmo assim, não atingiu o último estágio do despertar. No entanto, ao adquirir essa convicção, sentimental e emocionalmente, atingiu um estado mental bem mais elevado do que aquele em que compreendeu a Verdade apenas racionalmente. Portanto, a Imagem Verdadeira se manifestou até um grau superior. É impossível expressar em palavras esse estado mental mais elevado. A seita zen-budista prega que, não sendo possível explicar sobre o despertar por meio de palavras escritas e faladas, deve-se "Ouvir a voz silenciosa" e "Sentar-se e meditar". O mestre Dogen também disse: "Sente-se e medite com toda a seriedade".
A apreensão prática do despertar
Há, no entanto, casos de pessoas que não entenderam a Verdade praticando a meditação zen durante vinte anos, mas a entenderam quando praticaram a Meditação Shinsokan. Não estou falando da superioridade ou não da Meditação Shinsokan em relação à zen, pois diferem os efeitos conforme o ensejo. Tanto a Meditação Shinsokan como a zen, levam ao despertar, porém, não ao derradeiro, pois até mesmo o mestre Hakuin disse que alcançou dezoito grandes despertares e infinitos pequenos despertares. Quando ele sentia que atingira o último grande despertar, percebia que fora apenas um estágio; quando achava que agora era o despertar absoluto, ainda era um estágio; e assim teve dezoito grandes despertares. Se alguém pensar que já chegou ao último estágio, não terá crescimento infinito.
Sendo assim, devemos ainda nos adestrar muito mais. A Verdade deve ser apreendida primeiro racionalmente, depois emocionalmente e posteriormente na prática. A caridade leva à apreensão prática da Verdade. Quando dedicamos amor ao próximo, sentimos a alegria de sermos filhos de Deus e a verdadeira razão de ser. Assim é a apreensão prática da Verdade. A apreensão pela ação não se restringe ao emocional nem ao racional. É uma compreensão mais concreta e significa atingir um estágio mais elevado do despertar.
Conclui-se, assim, que sentirmos a alegria do despertar verdadeiramente duradouro quando lermos livros da Verdade, praticarmos realmente a Meditação Shinsokan, atingirmos desse modo o despertar em nível sentimental e emocional e depois participarmos de um movimento concreto para salvar o próximo. Limitar-se a atingir o despertar apenas praticando a meditação zen ou Shinsokan é em certo sentido uma prática de egoísmo. Mesmo que alguém se sinta bem com esse despertar, mesmo que fique inebriado com a meditação zen ou sinta um júbilo divino com a prática da Meditação Shinsokan, essa alegria é apenas individual, restrita, pois está dissociada do desejo de salvar os outros. Não se deve ficar estacionado nesse estágio.
Não se deve praticar arbitrariamente a caridade
Não se deve pensar que basta salvar o outro. São inúmeros os casos de pessoas que pensam estar salvando o próximo, mas que na verdade estão prejudicando-o. Muitas pessoas incomodam os outros, pensando que estão lhes fazendo o bem. Ocorre isso porque praticam caridade com raciocínio egoístico. Desejam com o seu ego praticar uma bondade a alguém, mas agindo de modo errado impedem o crescimento da pessoa.
A pessoa pode ser salva temporariamente por receber algum dinheiro, mas isso pode contribuir para que ela deixe de se esforçar. Ou, então, podemos advertir o outro apontando-lhe o seu defeito, certos de que assim ele se corrigirá, mas isso poderá piorá-lo, fazendo com que ele fique sugestionado com a ideia de que é um sujeito imprestável, ao se conscientizar desse defeito.
Desse modo, a prática da caridade pode se tornar um ato arbitrário. A pessoa poderá estar pensando "Estou ajudando o próximo" e, na realidade, não estar ajudando ninguém, ou pior, estar prejudicando-o. É importante realizar a Meditação, unir-se e praticar a caridade com a Sabedoria que vem dEle.
Conclui-se, assim, que a apreensão de Deus se torna cada vez mais sólida quando a pessoa lê livros da Verdade, faz a Meditação Shinsokan, depois pratica a caridade, executando sempre, concreta e simultaneamente, essas três práticas. Bem, encerro este assunto por aqui.
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