- Joel S. Goldsmith -
Quando nos conscientizamos da existência de UM só poder, cessamos não só de procurar poderes materiais para prover às nossas necessidades, mas também de andar em busca de poderes espirituais. Se existe UM só poder, então nada há sobre o quê, contra o quê ou a favor do quê, possamos usá-lo.
Que quer isto dizer, em essência? Que significa alcançar um nível de consciência em que se abandona todo desejo de empregar Deus como uma força? Não será isto libertar a Deus de responsabilidade? Não será exatamente isto o que temos que aprender a fazer?
Deus está em permanente atividade. Deus é a influência criadora, sustentadora e mantenedora do Universo espiritual. Deus o governa e o governará pela Graça, não a partir de amanhã ou da próxima semana.
A Graça divina tem estado em ação de eternidade em eternidade, e continuará de eternidade à eternidade, insubornável e insuscetível às influências das nossas orações ou súplicas ou ao que quer que façamos para persuadi-lo a fazer Sua obra de acordo com o nosso parecer.
Deus É, e esta afirmação encerra a verdade de que Ele está eternamente ocupado com Sua tarefa, a tarefa de Ser Deus.
O que nos incumbe, na oração e meditação, é conhecer a verdade para que a verdade nos liberte; e conhecer a verdade de que existe somente um poder; conhecer a verdade de que "Não terias poder algum sobre mim, se não te fosse dado do alto"; conhecer a verdade de que, no reino de Deus, "luz e trevas são a mesma coisa".
Esta firme e constante dedicação à compreensão da verdade, desenvolverá um estado de consciência que não oscila entre o bem e o mal: um estado de consciência que, pelo menos com certa estabilidade, adere ao caminho e à realização espiritual.
Deus é, mas, para sabermos espiritualmente que Deus é, temos que nos elevar acima do tempo e do espaço.
O que Deus é, é de eternidade à eternidade. Portanto, coisa alguma pode estar fora da jurisdição de Deus; coisa alguma jamais poderá funcionar mal no reino de Deus. Precisamos substituir a base material do nosso estado de consciência, em que esta funciona sob a crença em dois poderes, pelo apoio da essência de Deus.
No reino de Deus não há nada de natureza mutável, coisa alguma de natureza discordante ou desarmoniosa, nada que precise ser curado ou aperfeiçoado. Em tal estado de consciência, já não somos hipnotizados por aparências, nem compelidos a tentar insistentemente mudar o mal em bem, ou a procurar apegar-nos a qualquer coisa de bom aspecto, seja ela o que for. Isto de modo nenhum afeta nossa vida externa.
Quando atingimos esta realização, a nossa vida se torna mais harmoniosa, e já não nos preocupamos com a mutação das aparências, que antes eram más e agora são boas, e sim com a realidade espiritual que desponta no campo da nossa consciência.
Algumas vezes os estudantes da ciência espiritual não se sentem felizes com o desinteresse pelas coisas do mundo, que surge quando prosseguem na busca. Sentem-se como se estivessem perdendo algo de valor. Seus tesouros de arte, seus animais de estimação e os velhos amigos já não lhes são tão importantes. Passam a encarar o mundo – o corpo e até mesmo a vida – mais objetivamente. Perdem muitas das emoções que constituem grande parte da vida humana.
Enquanto avançam pelo caminho espiritual, são reorientados quanto aos valores humanos, e assim não sofrem muito com os aspectos negativos da vida humana, mas também não se alegram tanto com as coisas boas, como outrora. As emoções ou sentimentos mundanos já não entram tanto em sua vida de rotina. Em compensação, há vantagens que ultrapassam em muito as perdas.
Quando nos tornamos espectadores, não olhamos a vida com ansiedade pelo que esteja para acontecer. Contemplamos o que Deus está fazendo. No caminho espiritual, ao acordar pela manhã o espectador se compenetra de que "Este é o dia de Deus, este é o dia que o Senhor fez", e pergunta-se a si mesmo: Que experiência me trará hoje a atividade de Deus?
Nesta atitude objetiva, isenta de apego às coisas materiais, passamos o dia inteiro na expectativa de algo prestes a acontecer, na certeza de que o que quer que aconteça nesta hora, na próxima ou depois, terá sido produzido por Deus, será o efeito da Sua atividade.
Começamos então a conhecer por experiência própria certo estado de harmonia profunda, imutável, em que os efeitos externos já não nos interessem como em outros tempos: chegamos àquele nível de consciência que nos permite discernir espiritualmente a natureza ilusória das aparências boas ou más.
O interesse pelas aparências apenas favorece e perpetua sua influencia hipnótica.
Pela manhã, ao meio-dia e à noite, precisamos afirmar intimamente nosso equilíbrio espiritual, baseados na compreensão de que no reino de Deus não existe bem nem mal, mas somente o Espírito, e que o bem e o mal que aparecem no reino deste mundo são igualmente ilusórios.
Se desejarmos efetuar uma demonstração espiritual da natureza do Cristo, ou seja de natureza cristã, não podemos preocupar-nos com aparências transitórias, mas precisamos apegar-nos à Verdade espiritual, interna. Embora incorpóreo e invisível à vista humana, o reino de Deus é real e tangível para aqueles que possuem visão espiritual para contemplá-lo.
A individualidade espiritual, inerente ao Reino de Deus, não pode ser vista a não ser pela percepção espiritual, ou seja, pela Consciência Crística que Somos. Não podemos ver a identidade espiritual com nossos olhos físicos, mas, assim como Deus pode olhar a luz e as trevas e vê-las como uma só coisa, também os espiritualmente iluminados podem olhar para além das boas ou más condições humanas e contemplar as qualidades do Cristo.
De acordo com o ensino místico, nós não temos direito de olhar para um ser humano com o intuito de mudar o mal em bem, a doença em saúde ou a pobreza em abundância. O que devemos fazer – e é imperioso que o façamos – é olhar para além das aparências e nos compenetrarmos de que: "Embora invisível aos meus olhos humanos, este é o Cristo, o filho de Deus. Não pretendo mudá-lo, melhorá-lo reformá-lo. Olho para além da aparência e me lembro de que embora não possa vê-la, o que aqui está é identidade espiritual."
Para aqueles que tenham sido treinados para perceber a irrealidade das aparências, isso talvez não pareça muito difícil, mas a razão por que a maioria de nós não alcança maior êxito nessas tentativas de ver além das aparências, é o fato de não aplicarem este princípio quando vêem as boas aparências humanas.
Por que nos contentamos com as aparências de saúde, riqueza, sucesso e felicidade, se todo o quadro é suscetível de inversão de um momento para outro? Não é fácil a qualquer um, nem mesmo ao buscador espiritual, ser capaz de olhar para si mesmo, para os amigos ou para os parentes, quando eles gozam da melhor saúde e são ricos e puros, e compenetrar-se de que tudo isto é aparência, porque a Realidade, o Cristo, o Filho espiritual de Deus, é invisível aos olhos dos humanos.
Contudo, quem for capaz disto, estará sempre convivendo com a individualidade espiritual de seus amigos, parentes e estudantes. É o próprio amor divino, fluindo através dele, o que lhe estará fechando os olhos às aparências e mostrando-lhe a Alma de cada pessoa, tanto das boas como das más – a mesma Alma pura, que é Deus.
À medida que pudermos estar neste mundo sem pertencermos a ele – em que pudermos estar nele e, não obstante, não sermos fascinados pela identidade humana das pessoas, e que compreendermos que toda pessoa é realmente a Alma de Deus manifestada nesta terra – estaremos vivendo no Meu reino. Isso exige visão interna desenvolvida, capaz de perceber a presença de Deus em cada pessoa.
É surpreendente como ocorrem milagres quando abandonamos todas as tentativas de transmutar pessoas más em boas ou enfermas em sadias, e começamos a viver nesta conscientização: "Senhor, revela-me Tua Individualidade espiritual; revela-me Teu Filho espiritual; mostra-me o filho de Deus em cada individuo."
Com essa visão, começamos a perceber e sentir a filiação espiritual de todos aqueles com quem convivemos, e eles passam a agir diferentemente com relação a nós, e o mesmo acontece conosco com relação a eles, porque já não os tratamos como julgávamos que merecessem ser tratados. A ninguém condenamos, porque então sabemos que o mal que alguém faça será por ignorância quanto à sua divina filiação.
Os crimes contra a sociedade e o individuo, tais como a mentira, o roubo, o embuste, a fraude, só podem ser cometidos enquanto pensamos que tu és tu e eu sou eu. Tudo isto cessa no momento em que descobrimos que somos todos irmãos, filhos do mesmo Pai, que pertencemos à mesma casa.
De imediato isso torna o mundo menos real aos nossos olhos, e mais real o "Meu reino", revelando o Universo como um reino espiritual, onde nada precisa ser conseguido pela força.
Eis a vida mística: não nos rejubilemos com a boa aparência humana, mas olhamos para além do bem e do mal, para além das aparências humanas, e contemplamos a natureza do Cristo. Podemos fazer isto. Todos podemos fazê-lo.
É verdade que isto requer alguma disciplina, algum treino, porque o que estamos procurando fazer é superar os efeitos de centenas de gerações daqueles que nos deixaram como herança a crença em dois poderes.
Estamos pondo de lado tanto o bem como o mal, para contemplar o que é o Espírito; estamos pondo de lado a saúde e a doença, a fim de nos identificarmos com o Cristo – nossa individualidade permanente em Deus. Somente nossa individualidade espiritual de filhos de Deus nos permite comer do manjar que o mundo não conhece.
Não é por sermos boas criaturas humanas que qualquer de nós pode proclamar-se co-herdeiro com Cristo, porque as boas qualidades humanas estão tão longe do céu tanto quanto as más.
Os escribas e fariseus eram o que havia de melhor entre os hebreus, eram os mais religiosos, os maiores adoradores do Deus único, os maiores protetores do templo. Ser bons, era a sua obsessão. Não obstante, Jesus disse aos seus seguidores que a bondade deles precisava transcender a dos escribas e fariseus. Isso, humanamente, teria sido quase impossível, porque estes, praticamente, já haviam atingido a perfeição.
A verdadeira bondade depende de nossa capacidade de compreender que o Reino de Deus nos pertence em virtude de nossa identidade espiritual, e não de nossa bondade humana.
Isso implica em sermos bastante corajosos para lançar fora os pensamentos relacionados com todas as nossas maldades do passado e do presente e, ao mesmo tempo, todos os pensamentos referentes à nossa bondade – e não em condenarmos o mal que tenhamos feito e tomarmos a nosso crédito o bem que tenhamos praticado –, e afirmar somente a nossa identidade espiritual em Deus.
Nesta ligação com Deus, descobriremos que somos um com Ele, que somos co-herdeiros com Cristo de todas as riquezas celestes. Mas enquanto pensarmos que os nossos maus caminhos estejam nos mantendo afastados dessas riquezas, ou que o bem que pratiquemos esteja nos aproximando delas, estaremos em caminho errado.
Tão longe da Luz está o que crê que algum pecado, alguma desgraça temporária ou algum erro por ação ou omissão o separa de Deus, quanto aquele que acredita que sua bondade humana lhe esteja granjeando a graça de Deus. Ninguém alcança a graça de Deus apenas por sua bondade humana: a graça de Deus se alcança pela realização de identidade espiritual. Em reconhecendo nossa identidade espiritual, seremos espiritualmente bons sob todos os aspectos.
Não há meios de se saber como essa Bondade corresponde à bondade humana, mas a integridade espiritual vem somente através de nossa Unidade com Deus – a Realidade Espiritual Una, indivisível. Não vem como conseqüência de nossas qualidades ou de nossos sacrifícios ou esforços pessoais.
Nossas experiências humanas do passado e do presente, tanto boas como más, constituem o sonho mortal, mas, em nossa Alma, somos Luz interna, somos o Ser-de-Deus, isto é, somos criaturas divinas; em nossa Luz interna, somos filhos de Deus; nas profundezas de nosso ser interno, somos um com Deus; e temos um manjar que, embora possamos não ter conquistado ou merecido, recebemos por herança divina.
Sabemos em nosso íntimo que muitos de nós temos recebido ou recebemos mais do que merecemos. E ainda receberemos muito mais em nossa vida espiritual, quando virmos a bondade de Deus derramar-se sobre nós mais depressa do que podemos reconhecê-la, e compreendermos que nada em nossa vida nos dá direito a isto, que nos vem como graça de Deus, da qual nem a vida nem a morte nos pode separar.
Em lugar algum onde possamos ir, estaremos privados da proteção de Deus, fora de Sua jurisdição, de Sua vida ou de Sua lei. Tanto faz vivermos neste ou no outro lado do véu, isso é de importância secundária, exceto para aquelas poucas pessoas que acharão falta de nossa presença física. Mas logo que esse estado emocional desaparece, tudo volta ao normal, porque, na verdade, nada muda, nada se perde, ninguém foi ferido; pois em Deus, vida e morte são a mesma coisa.
Vida humana e morte física são meras aparências mortais, ilusões humanas. A compreensão de que ambas são da mesma substância – urdidura feita do nada –, e que não há diferença entre uma e outra, nos permite discernir o significado da imortalidade.
A imortalidade nada tem a ver com a vida ou morte físicas, porque vida e morte são quadros ilusórios, enquanto que a imortalidade, ou qualidade do que é eterno, incorpóreo, é o espiritualmente real. Vida e morte são duas fases características da ilusão humana, assim como doença e saúde, pobreza e riqueza, pecado e pureza.
No caminho espiritual, temos que superar o mal e o bem, e embora seja verdade que em nosso primeiro estágio procuramos mudar a doença em saúde, à medida que avançamos, nós vamos identificando conscientemente com o reino e a presença de Deus como Espírito; vamos compreendendo que temos de nos elevar acima tanto da doença quanto da saúde.
Para a consciência iluminada, trevas e luz são a mesma coisa.
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