domingo, setembro 04, 2016

O "mundo mental" antecede o "mundo das formas" - 2/2

- Masaharu Taniguchi -


O que foi dito anteriormente aplica-se também à questão de casamento: um enlace matrimonial ocorre primeiramente no mundo imaterial e pouco a pouco vai surgindo no mundo das formas. Assim, por mais que uma pessoa anseie ou se apresse no "mundo das formas", não se concretizará o seu casamento, se este ainda não estiver "consumado" no mundo da mente. O que é preciso fazer é orar a Deus, tornar-se um com ele, e com Sua orientação deixar "formado" um bom casamento no mundo da mente. Assim, esse bom casamento se concretizará naturalmente no mundo das formas, sem que seja necessário apressar-se ou ansiar por ele. 

Numa das viagens que fiz à região de Kansai, contaram-me o seguinte caso: Reside em Kyoto uma adepta da Seicho-No-Ie, que aqui vou chamar de sra. A, mãe de três filhas. A filha mais velha, na época, já estava com 24 anos, sem ainda ter casado, o que preocupava seus pais. Achando que sua filha estava demorando demais para arranjar um marido, a sra. A foi consultar uma amiga sua, a sra. I, que então lhe deu o seguinte conselho:

– Como você sabe, a Seicho-No-Ie ensina que a pior coisa é ficar com a mente presa, ou seja, ficar obcecado. Portanto, pare de se preocupar com esse problema e confie tudo a Deus. Não é preciso ter tanta pressa para casar sua filha. O melhor é deixar os fato acontecerem de forma natural. Mas também não é preciso chegar ao extremo de ficar esperando que "caia do céu" um bom partido para sua filha, achando que não convém recorrer aos amigos e conhecidos. Sentir vontade de recorrer aos outros é também uma coisa natural. Certa vez, o Mestre Masaharu Taniguchi disse que as pessoas que têm filha casadoura poderiam levar as fotografias dela a diversos conhecidos, e depois deixar que as coisas aconteçam naturalmente, conforme a vontade de Deus.

A sra. A ouviu com atenção esses conselhos da sra. I e, chegando em casa, contou tudo à sua filha, que então respondeu:

– Eu não me casarei com um homem que se apaixone por mim só de ver uma fotografia minha. Eu só vou me casar com alguém que passe a me amar sinceramente, e a quem eu também passe a amar, depois de nos termos visto pessoalmente e trocando ideias...

Achando que sua filha não deixava de ter razão, a sra. A desistiu de "distribuir" fotografias dela a seus amigos e conhecidos. Mas já estava mais tranquila, lembrando-se das palavras da sra. I: "Não é preciso ter tanta pressa para casar sua filha. A Seicho-No-Ie ensina que nada deve ser forçado. O melhor é deixar os fatos acontecerem naturalmente". É verdade – pensou a sra. A. – A atitude da minha filha também é natural, e não há o que reprovar. Agora sei que Deus, sendo onisciente, resolverá tudo da melhor maneira. Vou, pois, entregar tudo nas mãos d'Ele.

Dias depois, a sra. I veio visitar a sra. A, trazendo consigo a fotografia de um jovem. Mostrando o retrato à sra. A, ela disse:
– Que tal arranjarmos o casamento deste rapaz com sua filha?
Como se tratava de um "bom partido", e a moça não fez nenhuma objeção, o "arranjo matrimonial" prosseguiu sem nenhum empecilho.

Por essa época, um sobrinho da sra. A veio de Tóquio para visitar os tios. A sra. A contou-lhe a respeito do "arranjo matrimonial" de sua filha, que estava em andamento, e mostrou a fotografia do pretendente. O sobrinho ficou olhando fixamente para o retrato durante alguns minuto, e depois disse: – Tia, não sei por que, mas não consigo simpatizar com ele. Talvez seja o seu jeito de olhar... Eu acho que esse casamento não vai dar certo.

Acontece que esse sobrinho tinha bons conhecimentos de Fisiognomonia (arte de conhecer o caráter das pessoas pelos traços fisionômicos) e também era capaz de perceber a compatibilidade ou incompatibilidade entre as pessoas.

– Se possível, ponha um fim nesse caso – disse o sobrinho. – Dentre os meus amigos, há um rapaz que pode ser um ótimo candidato à mão de sua filha. Que tal eu apresentá-lo a ela?

Mas os pais da moça acharam que o caso não era tão simples assim. Apesar dos conselhos do sobrinho, não poderiam recusar, por um motivo tão vago, o prosseguimento daquele "arranjo matrimonial", principalmente porque a sra. I, que apresentara o rapaz, era uma amiga muito chegada. Vendo a relutância dos pais da moça, o sobrinho disse:

– Existe uma maneira de recusar esse pretendente de sua filha, sem ofender nem a ele nem a sra. I. Em primeiro lugar, vocês vão consultar um vidente. Se este disse que tal casamento vai dar certo, a solução é deixar que sua filha se case com esse pretendente. Caso contrário, recuse-o, argumentando que "o vidente prevê má sorte nesse casamento". Desse modo, nem o rapaz nem a sra. I irão ficar magoados ou ofendidos.

Seguindo o conselho do sobrinho, a sra. A foi consultar um vidente. Assim que a sra. A forneceu alguns dados sobre sua filha e seu pretendente, o vidente disse categoricamente: – Esse casamento não vai dar certo. Não há nenhuma afinidade entre os dois.

Assim, os pais da moça tomaram a decisão de recusar aquele pretendente. Já que o vidente previra, de fato, má sorte nesse casamento, eles puderam encerrar as conversas sem ferir nenhuma das pessoas envolvidas.

O sobrinho levou a prima para sua casa em Tóquio, onde residia desde que se casara há três anos. Ele tinha a intenção de apresentar à prima um amigo seu. Sendo músico, ele tinha muitos amigos músicos, que frequentavam sua casa. Certo dia, um desses amigos, que lecionava num conservatório, veio visitá-lo e, vendo a prima do amigo, apaixonou-se por ela. "Que moça encantadora! Queria tê-la como esposa..." – pensou ele. Mas não disse nada a ninguém. Quando um homem ama verdadeiramente uma mulher, ele não a pede logo em casamento, sem antes pensar no destino que poderia oferecer a ela.

"Eu estou apenas começando minha carreira como músico e ganho muito pouco. Por isso, mesmo que me case com ela, não serei capaz de fazê-la feliz. Gostaria de pedi-la em casamento, mas não devo fazer isso" – assim pensando, o jovem e sensato professor de música manteve em segredo os seus sentimentos.

Nas férias do conservatório, ele voltou à casa de seus pais, na província. E seu pai surpreendeu-o com a seguinte pergunta:

– Meu filho, você não gostaria de se casar?
– Casar?! – disse o jovem. –Mas pai, eu ainda não tenho condições para isso.
– Mas se houvesse uma "candidata" ideal para você, gostaria de se casar, não é?
– Claro que gostaria; mas, como já disse, o que eu ganho mal dá para o meu próprio sustento...
– Ora, não precisa se preocupar com isso. Eu lhe darei uma ajuda financeira até que a sua situação melhore. O que importa é você se casar com uma boa moça. A propósito, a sra. A tem uma filha, que é uma jovem excelente. Será que você a conhece? É esta aqui. Você não gostaria de desposá-la?

Assim dizendo, o pai mostrou-lhe uma fotografia, onde se via um grupo de pessoas, e apontou uma moça. Vendo-a, o filho ficou muito surpreso, pois era a moça que ele conhecera há dias na casa de seu amigo, e por quem se apaixonara à primeira vista.

O pai conhecera a moça no dia do casamento do sobrinho da sra. A, três anos atrás, e simpatizara com ela à primeira vista. Naquela ocasião, ele pensara: "Gostaria que meu filho se casasse com essa moça daqui a dois ou três anos, quando ele tiver se formado e arranjado um emprego". Desde então, vinha aguardando uma oportunidade para falar com o filho a respeito dessa moça.

Como vemos, o pai do jovem músico já tinha "escolhido" aquela moça como futura esposa de seu filho, e este, por coincidência, conheceu-a na casa de seu amigo e passou a amá-la em segredo. Qual não foi a surpresa e a alegria do rapaz, ao saber que seu pai desejava vê-lo casado com aquela moça! Nem é preciso dizer que ele concordou imediatamente quando seu pai sugeriu que fosse marcado um encontro com ela em Tóquio. O pai do rapaz entrou em contato com outro parente da sra. A, que morava em Tóquio, solicitando-lhe providências. E assim, alguns dias depois, a sra. A recebeu desse parente um telegrama convidando a ela e sua filha para irem visitá-lo em Tóquio o mais breve possível. Chegando lá, as duas ficaram sabendo dessa proposta de casamento, que parecia vir "sob encomenda", e a moça não teve dúvidas em aceitá-la.

Concluindo, essa união feliz já havia ocorrido no mundo da mente há três anos, quando representantes de ambas as famílias haviam comparecido ao casamento do sobrinho da sra. A. Mas, enquanto os pais da moça viviam ansiosos por vê-la casada, tardava a concretização dessa união no mundo das formas, devido ao obstáculo chamado "obsessão". Porém, quando eles conheceram a Seicho-No-Ie, suas mentes se libertaram dessa obsessão. Eles deixaram de se preocupar em casar sua filha e passaram a confiar tudo a Deus. Foi então que apareceu um ótimo pretendente à mão de sua filha, e realizou-se o feliz enlace.

A atitude mental obstinada desaparece quando a mente se torna livre, dócil, receptiva e disposta a pôr em prática tudo aquilo que é possível realizar agora. E então, manifesta-se neste mundo as melhores coisas que Deus já providenciou para nós no mundo da "mente".

Conforme está escrito no "Yuishin-ge" da sutra budista Kegon-kyo, a mente pode "desenhar" qualquer coisa na tela chamada "mundo dos fenômenos", como se fosse um exímio pintor. Assim como o receptor de rádio, a mente atrai apenas coisas que sintonizam com suas próprias "ondas" ou "vibrações". E depois ela "projeta" essas coisas na tela do "mundo dos fenômenos", da mesma forma que um pintor reproduz na tela os traços e as figuras que revelam a sua personalidade.

Mesmo que não pensemos concretamente em doenças ou infelicidades, esses males virão a nós se mantivermos quaisquer outros pensamentos igualmente sombrios. Ocorre isso em razão da lei mental segundo a qual "os semelhantes se atraem". Assim, ainda que não "desenhemos" mentalmente determinada doença ou determinada forma de infelicidade, elas poderão se manifestar concretamente devido à capacidade criadora da mente, se mantivermos quaisquer pensamentos sombrios. O aparelho de rádio faz "soar concretamente" as transmissões da emissora com que estiver em sintonia. A mente também funciona de forma semelhante: se estiver emitindo constantemente vibrações negativas, pessimistas, sombrias, deprimentes, cheias de ódio e ressentimentos, ela se sintonizará somente com vibrações mentais igualmente negativas, que passarão a se manifestar concretamente, sob a forma de doença, infelicidade, etc.

Acho que ninguém se casa pensando, desde o princípio, na possibilidade de um dia se divorciar. Mas, o infeliz acontecimento chamado "divórcio" está ocorrendo, a cada momento, em algum lugar do mundo, e a "ideia" do divórcio está repleta em toda a parte. Portanto, mesmo que uma pessoa não tenha nenhuma intenção de se divorciar, seu casamento poderá acabar em divórcio, se sua mente ficar preenchida de pensamentos sombrios e agressivos que sintonizam  com coisas tristes e infelizes como o "divórcio". Isto porque a ideia do "divórcio", que está repleta em toda parte do mundo, é captada pelo "receptor" da mente sombria e agressiva, e acaba se manifestando concretamente na vida da pessoa. Quando uma pessoa emite vibrações mentais negativas, sombrias e agressivas, estas agem como ímãs que atraem ideias infelizes (como a do "divórcio") que estão sendo emitidas constantemente em alguma parte do mundo, e fazem-nas manifestar-se concretamente.

As "infelicidades" não existem realmente. No entanto, quando mantemos pensamentos negativos, elas são concebidas pela nossa mente e aparecem concretamente em nossas vidas. Por que é que surgem "as infelicidades que não existem realmente"? Porque frequentemente deixamo-nos dominar pelo apego a nós mesmos. Esse "apego" não nos permite compreender que "todos os seres são, na verdade, uma só Vida", e leva-nos a pensar que "nós" e os "outros" somos criaturas separadas umas das outras. A "Vida de Deus", a "nossa Vida" e a "Vida dos outros" estão intrinsecamente ligadas umas às outras, como as águas oceânicas. No entanto, muitos pensam que as pessoas estão separadas umas das outras, e que cada um tem que "se virar" apenas com suas próprias forças. Esse pensamento provém do "apego a si mesmo". Quando vivemos preocupados apenas com nós mesmos, não conseguimos ver a Unidade de todos os seres e coisas que, na verdade, são inseparáveis em sua essência. Então, da mesma forma que a grande massa de água oceânica nos parece dividida em incontáveis ondas, e da mesma forma que a lua cheia refletida nessas ondas nos parece quebrada em mil pedaços, a vida nos parece cheia de infelicidades, que "não existem realmente".

Portanto, quem quiser atrair a felicidade para si, precisa deixar de apegar-se a si mesmo e passar a viver com a mente livre de apegos, dócil, receptiva, positiva, alegre e sem ansiedades, confiantes na Providência Divina e no "curso natural de todas as coisas". Havendo "apego a si mesmo", o homem não consegue ser realmente alegre e feliz. Abandonando o "apego a nós mesmos", podemos nos tornar alegres e felizes. As sombras tenebrosas não conseguem infiltrar-se no mundo repleto de alegria e paz. Portanto, se vivermos sempre com a mente positiva, pacífica, purificada e repleta de alegria, tudo neste vida correrá bem, tudo se arranjará da melhor maneira, sem que precisemos lutar contra o curso natural das coisas.


Do livro, "A Verdade da Vida, vol. 29", pp. 94-102

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