Pergunta: "Por favor, você poderia dizer algo sobre o perdão?"
Osho: É uma das coisas mais fundamentais para entender.
As pessoas geralmente pensam que o perdão é para aqueles que são dignos disso, que ele apenas para aqueles que o merecem. Mas, quando somente alguém que merece ser digno de receber o perdão é perdoado, isso não é muito um perdão. Você não está fazendo nada de sua parte - é ele quem merece. Você não está sendo amoroso e compassivo. Seu perdão só será autêntico quando até mesmo aqueles que não merecem puderem recebê-lo. Não se trata de se a pessoa merece ou não. A questão é se seu coração está preparado ou não.
Recordo-me de uma das místicas mais significantes, Rabiya al-Adabiya. Ela era uma mulher Sufi conhecida pelo seu comportamento muito excêntrico. Porém, em todo seu comportamento excêntrico havia um grande insight.
Uma vez, outro místico Sufi - Hasan - esteve com Rabiya. Devido ao fato de ele ter ido para estar com Rabiya, ele não trouxe seu sagrado Corão, que ele costumava ler toda manhã como parte de sua disciplina. Ele pensou que poderia pegar emprestado o sagrado Corão de Rabiya, e foi por isso que ele não trouxe a sua própria cópia.
Pela manhã ele pediu a Rabiya e ela lhe deu uma cópia sua. Ele não podia acreditar no que via. Quando ele abriu o Corão ele viu algo que nenhum Maometano podia acreditar: em muitas partes a Rabiya o tinha corrigido. Isso é o maior pecado para os Maometanos pois, segundo eles, o Corão é a palavra de Deus. Como você pode alterá-lo? Como é que você pode até mesmo se achar capaz de melhorá-lo? Ela não apenas o mudou, ela simplesmente eliminou algumas palavras, algumas linhas - ela as removeu.
Hasan disse a ela: "Rabiya, alguém destruiu seu Corão!" Rabiya disse: "Não seja tolo, ninguém toca em meu Corão. O que você está olhando fui eu que fiz". Hasan disse: "Mas como é que você pode fazer uma coisa dessas?". Ela disse: "Eu tinha que fazê-lo, não havia outro jeito. Por exemplo, veja aqui: o Corão diz, 'Quando você encontrar o diabo, odeie-o'. Desde que me tornei desperta não posso encontrar nenhum ódio dentro de mim. Mesmo se o diabo ficar diante de mim só posso banhá-lo com meu amor, porque não tenho mais nada para dar. Não importa se é Deus ou o diabo que está diante de mim; ambos irão receber o mesmo amor. Tudo que tenho é amor; o ódio desapareceu. No momento em que o ódio desapareceu de mim, eu tinha que efetuar mudanças no meu livro do sagrado Corão. Se você não o mudou, isso simplesmente significa que você ainda não chegou no espaço onde só o amor permanece."
Eu vou lhes dizer: pessoas que são dignas ou pessoas que não são dignas... não faz nenhuma diferença para o homem que chegou no espaço do perdão. Ele irá perdoar sem considerar quem o merece. Ele não pode ser tão mesquinho que só os dignos possam recebê-lo. E onde ele irá encontrar essa implacabilidade para perdoar? Essa é uma perspectiva totalmente diferente. A resposta não está relacionada com o outro. Quem é você para julgar se o outro é digno ou indigno? O próprio julgamento é feio e medíocre.
Há um homem, Rudolph Hess... Ele certamente é um dos maiores criminosos já conhecidos. E o crime dele se torna um milhão de vezes maior porque no julgamento de Nuremburg, com os outros companheiros de Adolf Hitler - que matou quase oito milhões de pessoas na Segunda Guerra Mundial -, ele disse diante da corte: "Não me arrependo de nada!". Não apenas isso, ele também disse: "E se eu pudesse começar do princípio, eu faria o mesmo novamente". É muito natural achar que esse homem não merece nenhum perdão; esse será o entendimento comum. Todos irão concordar com você.
Mas não posso concordar com você. Não importa o que Rudolph Hess tenha feito, o que ele está dizendo. O que importa é que você é capaz de perdoar até mesmo ele. Isso irá elevar sua consciência às alturas. Se você não puder perdoar Rudolph Hess você irá permanecer apenas um ser humano comum, com todo tipo de julgamento de merecimento ou de não merecimento. Mas basicamente você não pode perdoá-lo porque seu perdão não é suficientemente grande.
Posso perdoar o mundo inteiro pelo simples motivo de que meu perdão é absoluto; não depende de julgamento. Vou lhe contar uma pequena história Tibetana que irá tornar o ponto absolutamente claro para você.
Um antigo grande mestre, adorado por milhões de pessoas, recusou-se a iniciar qualquer um como discípulo. Durante toda sua vida, consistentemente, reis lhe pediram, pessoas ricas lhe pediram, grandes ascetas lhe pediram - homens santos! -, para serem iniciados como seus discípulos, e ele continuou recusando. Ele sempre dizia, "A menos que encontre um homem que o mereça, a menos que eu encontre um homem digno disso... Não vou iniciar nenhum."
Ele tinha um jovem que costumava cozinhar para ele, lavar suas roupas, comprar vegetais no mercado. O próprio garoto foi lentamente crescendo, e por toda sua vida ele escutou o velho homem, que havia vivido quase cem anos, e que sempre recusava quem quer que o procurasse. Sem exceção: ninguém era digno! "Posso morrer sem iniciar ninguém", ele dizia, "mas não irei iniciar alguém que seja indigno".
As pessoas ficaram cansadas, frustradas. Elas amavam o homem, ele tinha qualidades imensas, mas não podiam entender aquela atitude tão teimosa, a qual mostrava-se sem nenhuma ternura, nenhuma compaixão.
Mas, numa manhã, o velho acordou seu companheiro, que já tinha envelhecido, e lhe disse: "Corra imediatamente morro abaixo até o mercado e diga a todos que quem quiser ser iniciado deve vir logo, porque nesse entardecer, quando o sol se pôr, eu vou morrer".
Seu companheiro respondeu: "Mas e quanto ao merecimento? Não sei quem é digno e quem é indigno. A quem devo trazer?"
O velho homem falou: "Não se preocupe com isso. Era apenas uma tática, porque eu mesmo não era digno de iniciar ninguém. No entanto, era contra minha própria dignidade dizer isso. Então escolhi outro modo. Eu estava dizendo, 'A menos que encontre alguém bastante digno, bastante merecedor, eu não irei iniciar'. Mas a verdade é que eu não era digno de ser um mestre. Agora sou, só que agora o tempo é curto. Somente na manhã de hoje quando o sol estava surgindo, minha própria consciência atingiu o pico supremo. Agora estou pronto. Agora não importa quem é digno e quem é não é. O importante agora é que eu sou digno. Vá e traga qualquer um! Vá e avise a toda a vila que esse é o último dia da minha vida e qualquer um que queira ser iniciado deve vir imediatamente. Traga tantos quanto possível".
O companheiro do velho homem ficou perplexo, mas não havia tempo para argumentar. Ele desceu o morro correndo, chegou ao mercado e gritou por toda a vila: "A todos que queriam se tornar um discípulo, o velho homem agora está pronto!"
As pessoas não podiam acreditar nisso. Mas por curiosidade alguns pensaram: "Não há nenhum problema em ir pelo menos para ver o que está acontecendo". O homem havia se recusado por toda sua vida, e no último dia da sua vida uma mudança tão grande havia ocorrido. A esposa de alguém tinha falecido e ele estava se sentindo muito só, então ele pensou, "Isso é bom. Se ele vai iniciar todo mundo, sem nenhuma questão de merecimento...". Alguém havia sido libertado da prisão na noite anterior, e igualmente pensou, "Ninguém vai me dar emprego; isso é uma boa oportunidade de virar um santo".
Todo tipo de pessoas estranhas foram para a caverna do velho homem, e seu companheiro ficou tão embaraçado pelo tipo de pessoas que ele tinha trazido: Um é criminoso, a esposa de outro havia falecido, é por isso que ele pensa, "Assim é melhor... oq ue mais farei agora?" Alguém tinha ido a falência e estava pensando em cometer suicídio, mas agora pensava que isso era melhor que o suicídio.
Alguns tinham vindo por curiosidade; eles não tinham nenhum outro trabalho. Eles estavam tocando jazz e pensaram: "Podemos tocar jazz amanhã, mas hoje não há nenhum problema, nós vamos lá ver o que é essa iniciação. De qualquer maneira, esse homem vai morrer ao entardecer e assim estaremos livres para permanecermos discípulos ou não. Podemos tocar jazz amanhã - não há nenhum problema".
O companheiro do velho homem estava se sentindo muito embaraçado. "Como irei apresentar essa gente estranha quando esse velho homem recusou reis, santos, sábios, que tinham vindo com profunda seriedade para ser iniciados? E agora ele vai iniciar esse bando!" Ele estava até mesmo envergonhado, mas ele entrou e perguntou: "Devo chamar as pessoas? Onze deles estão aí".
O velho homem disse: "Chame-os rápido, porque já entardeceu. Você demorou muito tempo e só pôde trazer onze pessoas?"
Seu companheiro disse: "O que posso fazer? É um dia de trabalho; não é um feriado. Só consegui esses. Todos são absolutamente inúteis; mesmo eu não poderia iniciá-los. Não apenas que eles não sejam dignos - eles são absolutamente indignos. Porém você insistiu em trazer alguém; só ninguém mais estava disponível".
O velho homem disse: "Não há nenhum problema. Traga-os para dentro". E ele os iniciou a todos. Mesmo eles estavam chocados. E disseram para o velho homem: "Esse é um comportamento estranho. Toda sua vida você insistiu que nós precisávamos merecer ser um discípulo. O que aconteceu com o seu principio?"
O velho homem sorriu. Ele disse: "Isso não era um principio, era apenas para esconder minha própria indignidade. Eu ainda não estava preparado para ser um mestre. E não posso trapacear ninguém, não posso enganar ninguém. Daí eu ter me ocultado atrás da atitude julgadora de que, a menos que vocês mereçam, não conseguirão a iniciação".
Obviamente ninguém é digno.
Todo mundo tem seus próprios defeitos, fraquezas. Todos fizeram coisas que nunca quiseram fazer. Todo mundo se desviou. Ninguém pode dizer que é absolutamente puro, todos estão poluídos. Assim quando o velho homem insistiu dizendo: "A menos que você seja digno não volte para mim", ninguém discutiu com ele - ele estava certo. Primeiro eles tinham que ser merecedores!
No último dia, ele disse para aqueles onze discípulos: "Eu os abençôo e inicio vocês. Não importa se vocês são merecedores ou não, mas pela primeira vez sou digno. E se sou realmente digno, basta minha presença para purificar vocês. Meu mérito de ser um mestre irá tornar vocês discípulos dignos. Agora não preciso depender do merecimento de vocês. Meu mérito é suficiente."
"Sou como uma nuvem carregada de chuva; irei banhar todo o lugar - sobre as montanhas, nas ruas, nas casas, nas fazendas, nos jardins. Irei banhar todo lugar, porque estou sobrecarregado demais com minha água de chuva. Não importa se o jardim merece... Não faço qualquer distinção entre o jardim e as pedras. Irei simplesmente chover a partir da minha abundância".
Se sua Meditação lhe traz para esse estado de nuvem de chuva, você irá perdoar sem nenhum julgamento a partir da sua abundância, do seu amor, da sua compaixão.
De fato, eu gostaria de declarar que o homem que é indigno merece mais do que aquele que é digno. O homem que não merece, merece mais - porque ele é tão pobre! Não seja duro com ele. A vida tem sido difícil para com ele. Ele se perdeu, ele tem sofrido por causa de seus atos errados. Agora não seja duro com ele. Ele precisa de mais amor do que aqueles que são merecedores. Ele precisa de mais perdão do que aqueles que são dignos.
Essa deve ser a única abordagem de um coração religioso.
Essa questão foi trazida perante Gautama Buda, porque ele estava prestes a iniciar um assassino no sannyas - e o assassino não era um assassino comum. Rudolph Hess não é nada comparado a ele. Seu nome era Angulimala. Angulimala significa "um homem que usa um colar de dedos humanos".
Ele fez o juramento de que mataria mil pessoas, e não menos que isso, porque a sociedade não o tratava bem. Ele jurou que de cada dessas mil pessoas ele retiraria um dedo e faria um rosário de dedos em volta do pescoço. Na ocasião da história, ele já tinha novecentos e noventa e nove dedos coletados - no seu colar só estava faltando um. E esse último dedo estava faltando devido ao fato que a estrada onde esse homem ficava estava fechada; ninguém passava por esse caminho. Ele matou 999 pessoas. Ninguém ia onde ele estava; quando as pessoas ficavam sabendo onde ele estava, o tráfego deixava de ir para aquela direção. E assim ficou muito difícil para ele encontrar uma pessoa, e apenas mais uma era necessária.
Gautama Buda, porém, entrou naquela estrada fechada. O rei tinha colocado guardas na estrada para impedir as pessoas, principalmente estrangeiras, que não sabiam que um homem perigoso vivia por trás das colinas. Os guardas deram o aviso a Gautama Buda: "Essa não é uma estrada para ser usada. Você terá que tomar um caminho mais longo, mas é melhor caminhar um pouco mais do que penetrar na boca da própria morte. Esse é o lugar onde Angulimala vive. Até mesmo o rei não tem coragem de andar por essa estrada. Esse homem é simplesmente louco."
A mãe dele costumava chegar até ele. Ela era a única pessoa que podia ir de vez em quando vê-lo, mas até mesmo ela deixou de ir. Na última vez que ela foi, ele disse a ela: "Agora só está faltando um dedo e apenas porque você é minha mãe... quero lhe avisar que se você vier outra vez, você não voltará mais. Preciso desesperadamente de um dedo. Até agora não lhe matei porque outras pessoas estavam disponíveis, mas agora ninguém mais passa por essa estrada exceto você. Então quero que você saiba que da próxima vez, se você vier, será sua responsabilidade, não minha." Desde aquela vez a mãe dele não veio mais.
Os guardas disseram a Buda: "Não corra um risco tão desnecessário". E vocês sabem o que Buda disse a eles? "Se eu não for, então quem irá? Apenas duas coisas são possíveis: Ou eu conseguirei mudá-lo - e não posso perder esse desafio -, ou irei provê-lo com mais um dedo para que o desejo dele seja realizado. De qualquer maneira, irei morrer algum dia. Dar minha cabeça para Angulimala pelo menos será de alguma utilidade. Do contrário, um dia certamente morrerei e vocês me colocarão na pira funerária. Acho que é melhor me arriscar a realizar o desejo de alguém e lhe dar paz mental. Ou ele irá me matar ou irei matá-lo, mas esse encontro irá acontecer. Agoram, mostrem-me o caminho."
As pessoas geralmente pensam que o perdão é para aqueles que são dignos disso, que ele apenas para aqueles que o merecem. Mas, quando somente alguém que merece ser digno de receber o perdão é perdoado, isso não é muito um perdão. Você não está fazendo nada de sua parte - é ele quem merece. Você não está sendo amoroso e compassivo. Seu perdão só será autêntico quando até mesmo aqueles que não merecem puderem recebê-lo. Não se trata de se a pessoa merece ou não. A questão é se seu coração está preparado ou não.
Recordo-me de uma das místicas mais significantes, Rabiya al-Adabiya. Ela era uma mulher Sufi conhecida pelo seu comportamento muito excêntrico. Porém, em todo seu comportamento excêntrico havia um grande insight.
Uma vez, outro místico Sufi - Hasan - esteve com Rabiya. Devido ao fato de ele ter ido para estar com Rabiya, ele não trouxe seu sagrado Corão, que ele costumava ler toda manhã como parte de sua disciplina. Ele pensou que poderia pegar emprestado o sagrado Corão de Rabiya, e foi por isso que ele não trouxe a sua própria cópia.
Pela manhã ele pediu a Rabiya e ela lhe deu uma cópia sua. Ele não podia acreditar no que via. Quando ele abriu o Corão ele viu algo que nenhum Maometano podia acreditar: em muitas partes a Rabiya o tinha corrigido. Isso é o maior pecado para os Maometanos pois, segundo eles, o Corão é a palavra de Deus. Como você pode alterá-lo? Como é que você pode até mesmo se achar capaz de melhorá-lo? Ela não apenas o mudou, ela simplesmente eliminou algumas palavras, algumas linhas - ela as removeu.
Hasan disse a ela: "Rabiya, alguém destruiu seu Corão!" Rabiya disse: "Não seja tolo, ninguém toca em meu Corão. O que você está olhando fui eu que fiz". Hasan disse: "Mas como é que você pode fazer uma coisa dessas?". Ela disse: "Eu tinha que fazê-lo, não havia outro jeito. Por exemplo, veja aqui: o Corão diz, 'Quando você encontrar o diabo, odeie-o'. Desde que me tornei desperta não posso encontrar nenhum ódio dentro de mim. Mesmo se o diabo ficar diante de mim só posso banhá-lo com meu amor, porque não tenho mais nada para dar. Não importa se é Deus ou o diabo que está diante de mim; ambos irão receber o mesmo amor. Tudo que tenho é amor; o ódio desapareceu. No momento em que o ódio desapareceu de mim, eu tinha que efetuar mudanças no meu livro do sagrado Corão. Se você não o mudou, isso simplesmente significa que você ainda não chegou no espaço onde só o amor permanece."
Eu vou lhes dizer: pessoas que são dignas ou pessoas que não são dignas... não faz nenhuma diferença para o homem que chegou no espaço do perdão. Ele irá perdoar sem considerar quem o merece. Ele não pode ser tão mesquinho que só os dignos possam recebê-lo. E onde ele irá encontrar essa implacabilidade para perdoar? Essa é uma perspectiva totalmente diferente. A resposta não está relacionada com o outro. Quem é você para julgar se o outro é digno ou indigno? O próprio julgamento é feio e medíocre.
Há um homem, Rudolph Hess... Ele certamente é um dos maiores criminosos já conhecidos. E o crime dele se torna um milhão de vezes maior porque no julgamento de Nuremburg, com os outros companheiros de Adolf Hitler - que matou quase oito milhões de pessoas na Segunda Guerra Mundial -, ele disse diante da corte: "Não me arrependo de nada!". Não apenas isso, ele também disse: "E se eu pudesse começar do princípio, eu faria o mesmo novamente". É muito natural achar que esse homem não merece nenhum perdão; esse será o entendimento comum. Todos irão concordar com você.
Mas não posso concordar com você. Não importa o que Rudolph Hess tenha feito, o que ele está dizendo. O que importa é que você é capaz de perdoar até mesmo ele. Isso irá elevar sua consciência às alturas. Se você não puder perdoar Rudolph Hess você irá permanecer apenas um ser humano comum, com todo tipo de julgamento de merecimento ou de não merecimento. Mas basicamente você não pode perdoá-lo porque seu perdão não é suficientemente grande.
Posso perdoar o mundo inteiro pelo simples motivo de que meu perdão é absoluto; não depende de julgamento. Vou lhe contar uma pequena história Tibetana que irá tornar o ponto absolutamente claro para você.
Um antigo grande mestre, adorado por milhões de pessoas, recusou-se a iniciar qualquer um como discípulo. Durante toda sua vida, consistentemente, reis lhe pediram, pessoas ricas lhe pediram, grandes ascetas lhe pediram - homens santos! -, para serem iniciados como seus discípulos, e ele continuou recusando. Ele sempre dizia, "A menos que encontre um homem que o mereça, a menos que eu encontre um homem digno disso... Não vou iniciar nenhum."
Ele tinha um jovem que costumava cozinhar para ele, lavar suas roupas, comprar vegetais no mercado. O próprio garoto foi lentamente crescendo, e por toda sua vida ele escutou o velho homem, que havia vivido quase cem anos, e que sempre recusava quem quer que o procurasse. Sem exceção: ninguém era digno! "Posso morrer sem iniciar ninguém", ele dizia, "mas não irei iniciar alguém que seja indigno".
As pessoas ficaram cansadas, frustradas. Elas amavam o homem, ele tinha qualidades imensas, mas não podiam entender aquela atitude tão teimosa, a qual mostrava-se sem nenhuma ternura, nenhuma compaixão.
Mas, numa manhã, o velho acordou seu companheiro, que já tinha envelhecido, e lhe disse: "Corra imediatamente morro abaixo até o mercado e diga a todos que quem quiser ser iniciado deve vir logo, porque nesse entardecer, quando o sol se pôr, eu vou morrer".
Seu companheiro respondeu: "Mas e quanto ao merecimento? Não sei quem é digno e quem é indigno. A quem devo trazer?"
O velho homem falou: "Não se preocupe com isso. Era apenas uma tática, porque eu mesmo não era digno de iniciar ninguém. No entanto, era contra minha própria dignidade dizer isso. Então escolhi outro modo. Eu estava dizendo, 'A menos que encontre alguém bastante digno, bastante merecedor, eu não irei iniciar'. Mas a verdade é que eu não era digno de ser um mestre. Agora sou, só que agora o tempo é curto. Somente na manhã de hoje quando o sol estava surgindo, minha própria consciência atingiu o pico supremo. Agora estou pronto. Agora não importa quem é digno e quem é não é. O importante agora é que eu sou digno. Vá e traga qualquer um! Vá e avise a toda a vila que esse é o último dia da minha vida e qualquer um que queira ser iniciado deve vir imediatamente. Traga tantos quanto possível".
O companheiro do velho homem ficou perplexo, mas não havia tempo para argumentar. Ele desceu o morro correndo, chegou ao mercado e gritou por toda a vila: "A todos que queriam se tornar um discípulo, o velho homem agora está pronto!"
As pessoas não podiam acreditar nisso. Mas por curiosidade alguns pensaram: "Não há nenhum problema em ir pelo menos para ver o que está acontecendo". O homem havia se recusado por toda sua vida, e no último dia da sua vida uma mudança tão grande havia ocorrido. A esposa de alguém tinha falecido e ele estava se sentindo muito só, então ele pensou, "Isso é bom. Se ele vai iniciar todo mundo, sem nenhuma questão de merecimento...". Alguém havia sido libertado da prisão na noite anterior, e igualmente pensou, "Ninguém vai me dar emprego; isso é uma boa oportunidade de virar um santo".
Todo tipo de pessoas estranhas foram para a caverna do velho homem, e seu companheiro ficou tão embaraçado pelo tipo de pessoas que ele tinha trazido: Um é criminoso, a esposa de outro havia falecido, é por isso que ele pensa, "Assim é melhor... oq ue mais farei agora?" Alguém tinha ido a falência e estava pensando em cometer suicídio, mas agora pensava que isso era melhor que o suicídio.
Alguns tinham vindo por curiosidade; eles não tinham nenhum outro trabalho. Eles estavam tocando jazz e pensaram: "Podemos tocar jazz amanhã, mas hoje não há nenhum problema, nós vamos lá ver o que é essa iniciação. De qualquer maneira, esse homem vai morrer ao entardecer e assim estaremos livres para permanecermos discípulos ou não. Podemos tocar jazz amanhã - não há nenhum problema".
O companheiro do velho homem estava se sentindo muito embaraçado. "Como irei apresentar essa gente estranha quando esse velho homem recusou reis, santos, sábios, que tinham vindo com profunda seriedade para ser iniciados? E agora ele vai iniciar esse bando!" Ele estava até mesmo envergonhado, mas ele entrou e perguntou: "Devo chamar as pessoas? Onze deles estão aí".
O velho homem disse: "Chame-os rápido, porque já entardeceu. Você demorou muito tempo e só pôde trazer onze pessoas?"
Seu companheiro disse: "O que posso fazer? É um dia de trabalho; não é um feriado. Só consegui esses. Todos são absolutamente inúteis; mesmo eu não poderia iniciá-los. Não apenas que eles não sejam dignos - eles são absolutamente indignos. Porém você insistiu em trazer alguém; só ninguém mais estava disponível".
O velho homem disse: "Não há nenhum problema. Traga-os para dentro". E ele os iniciou a todos. Mesmo eles estavam chocados. E disseram para o velho homem: "Esse é um comportamento estranho. Toda sua vida você insistiu que nós precisávamos merecer ser um discípulo. O que aconteceu com o seu principio?"
O velho homem sorriu. Ele disse: "Isso não era um principio, era apenas para esconder minha própria indignidade. Eu ainda não estava preparado para ser um mestre. E não posso trapacear ninguém, não posso enganar ninguém. Daí eu ter me ocultado atrás da atitude julgadora de que, a menos que vocês mereçam, não conseguirão a iniciação".
Obviamente ninguém é digno.
Todo mundo tem seus próprios defeitos, fraquezas. Todos fizeram coisas que nunca quiseram fazer. Todo mundo se desviou. Ninguém pode dizer que é absolutamente puro, todos estão poluídos. Assim quando o velho homem insistiu dizendo: "A menos que você seja digno não volte para mim", ninguém discutiu com ele - ele estava certo. Primeiro eles tinham que ser merecedores!
No último dia, ele disse para aqueles onze discípulos: "Eu os abençôo e inicio vocês. Não importa se vocês são merecedores ou não, mas pela primeira vez sou digno. E se sou realmente digno, basta minha presença para purificar vocês. Meu mérito de ser um mestre irá tornar vocês discípulos dignos. Agora não preciso depender do merecimento de vocês. Meu mérito é suficiente."
"Sou como uma nuvem carregada de chuva; irei banhar todo o lugar - sobre as montanhas, nas ruas, nas casas, nas fazendas, nos jardins. Irei banhar todo lugar, porque estou sobrecarregado demais com minha água de chuva. Não importa se o jardim merece... Não faço qualquer distinção entre o jardim e as pedras. Irei simplesmente chover a partir da minha abundância".
Se sua Meditação lhe traz para esse estado de nuvem de chuva, você irá perdoar sem nenhum julgamento a partir da sua abundância, do seu amor, da sua compaixão.
De fato, eu gostaria de declarar que o homem que é indigno merece mais do que aquele que é digno. O homem que não merece, merece mais - porque ele é tão pobre! Não seja duro com ele. A vida tem sido difícil para com ele. Ele se perdeu, ele tem sofrido por causa de seus atos errados. Agora não seja duro com ele. Ele precisa de mais amor do que aqueles que são merecedores. Ele precisa de mais perdão do que aqueles que são dignos.
Essa deve ser a única abordagem de um coração religioso.
Essa questão foi trazida perante Gautama Buda, porque ele estava prestes a iniciar um assassino no sannyas - e o assassino não era um assassino comum. Rudolph Hess não é nada comparado a ele. Seu nome era Angulimala. Angulimala significa "um homem que usa um colar de dedos humanos".
Ele fez o juramento de que mataria mil pessoas, e não menos que isso, porque a sociedade não o tratava bem. Ele jurou que de cada dessas mil pessoas ele retiraria um dedo e faria um rosário de dedos em volta do pescoço. Na ocasião da história, ele já tinha novecentos e noventa e nove dedos coletados - no seu colar só estava faltando um. E esse último dedo estava faltando devido ao fato que a estrada onde esse homem ficava estava fechada; ninguém passava por esse caminho. Ele matou 999 pessoas. Ninguém ia onde ele estava; quando as pessoas ficavam sabendo onde ele estava, o tráfego deixava de ir para aquela direção. E assim ficou muito difícil para ele encontrar uma pessoa, e apenas mais uma era necessária.
Gautama Buda, porém, entrou naquela estrada fechada. O rei tinha colocado guardas na estrada para impedir as pessoas, principalmente estrangeiras, que não sabiam que um homem perigoso vivia por trás das colinas. Os guardas deram o aviso a Gautama Buda: "Essa não é uma estrada para ser usada. Você terá que tomar um caminho mais longo, mas é melhor caminhar um pouco mais do que penetrar na boca da própria morte. Esse é o lugar onde Angulimala vive. Até mesmo o rei não tem coragem de andar por essa estrada. Esse homem é simplesmente louco."
A mãe dele costumava chegar até ele. Ela era a única pessoa que podia ir de vez em quando vê-lo, mas até mesmo ela deixou de ir. Na última vez que ela foi, ele disse a ela: "Agora só está faltando um dedo e apenas porque você é minha mãe... quero lhe avisar que se você vier outra vez, você não voltará mais. Preciso desesperadamente de um dedo. Até agora não lhe matei porque outras pessoas estavam disponíveis, mas agora ninguém mais passa por essa estrada exceto você. Então quero que você saiba que da próxima vez, se você vier, será sua responsabilidade, não minha." Desde aquela vez a mãe dele não veio mais.
Os guardas disseram a Buda: "Não corra um risco tão desnecessário". E vocês sabem o que Buda disse a eles? "Se eu não for, então quem irá? Apenas duas coisas são possíveis: Ou eu conseguirei mudá-lo - e não posso perder esse desafio -, ou irei provê-lo com mais um dedo para que o desejo dele seja realizado. De qualquer maneira, irei morrer algum dia. Dar minha cabeça para Angulimala pelo menos será de alguma utilidade. Do contrário, um dia certamente morrerei e vocês me colocarão na pira funerária. Acho que é melhor me arriscar a realizar o desejo de alguém e lhe dar paz mental. Ou ele irá me matar ou irei matá-lo, mas esse encontro irá acontecer. Agoram, mostrem-me o caminho."
É isto o que os budas fazem: arriscam a própria vida. Buda foi, e mesmo os discípulos mais íntimos que juraram permanecer com ele até o final começaram a ficar para trás, pois era perigoso! Assim, quando Buda chegou à colina onde Angulimala estava sentado sobre uma pedra, não havia ninguém atrás dele; ele estava sozinho, pois todos os discípulos haviam desaparecido. Angulimala olhou para aquele homem inocente, como uma criança, tão belo, e pensou: "mesmo um assassino sentiria compaixão por esse homem". Ele pensou: "esse homem parece não saber que eu estou aqui, porque ninguém vem por esse caminho."
Angulimala estava sentado sobre sua rocha observando. Ele não podia acreditar em seus olhos. Um homem muito bonito, de um carisma tão imenso, estava vindo em sua direção. Quem seria tal homem? Ele nunca tinha ouvido falar de Gautama Buda, mas mesmo o coração duro de Angulimala começou a sentir uma certa ternura para com aquele homem. Ele parecia tão belo... e estava vindo na direção dele. Buda estava chegando cada vez mais perto.
Finalmente, Angulimala desembanhou sua espada e, com ela em mãos, gritou, "Volte! Pare aí mesmo e volte!" Gautama Buda estava a alguns metros de distância, e Angulimala disse: "Não dê outro passo porque então a responsabilidade não será minha. Talvez você não saiba quem sou!".
Buda disse: "Você sabe quem você é?".
Angulimala disse: "Isso não tem importância. Esse não é o lugar nem a hora para discutir tais coisas. Sua vida está em perigo!"
Buda disse: "Penso de outra maneira - sua vida é que está em perigo."
Angulimala disse: "Eu costumava pensar que era louco - mas é você que é simplesmente louco. E você continua chegando mais perto. Assim não diga que matei um homem inocente. Você parece tão inocente e tão bonito, que quero que você volte. Pode passar. Encontrarei outra pessoa. Posso esperar, não há nenhuma pressa. Se já consegui novecentos e noventa e nove... é somente mais um, mas não me force a matá-lo". Mas Buda continuou a se aproximar.
Então Angulimala pensou: "Ou esse homem é surdo ou é louco!". De novo ele gritou: "Pare, não se mova!"
Buda disse: "Eu parei há muito tempo, Angulimala, não estou me movendo - você é que está. Pare você. Você está cego. Você não pode ver uma simples coisa: eu não estou me movendo na sua direção, você está se movendo na minha direção."
Angulimala estava sentado sobre uma pedra e começou a rir; ele disse: "Você é realmente louco! Estou sentado e você está me dizendo que estou me movendo. E você está se movendo e diz que está parado. Você realmente é um tolo, um louco ou alguém muito estranho!"
Buda disse: "Bobagem! A verdade é que, desde o dia que me tornei iluminado não me movi mais nem uma simples polegada. Estou centrado, totalmente centrado, nenhum movimento. E sua mente está perdida, movendo-se continuamente em círculos."
Buda chegou muito perto, e as mãos de Angulimala estavam tremendo. O homem era tão belo, tão inocente, tão infantil. Ele já estava apaixonado. Ele havia matado tanta gente... nunca antes ele tinha sentido essa fraqueza. Ele nunca havia conhecido o que é amor. Pela primeira vez ele estava cheio de amor. Assim, havia uma contradição: a mão dele estava segurando uma espada para matar a pessoa, mas seu coração estava dizendo "ponha a espada de volta na bainha".
Buda disse: "Ouvi dizer que você precisa de mais um dedo. No que se refere a este corpo, o meu objetivo foi alcançado; este corpo é inútil. Você pode usá-lo, seu juramento pode ser cumprido. Corte meu dedo e corte a minha cabeça."
Angulimala ficou parado e olhando perplexo.
Buda continuou: "Estou pronto, mas porque suas mãos estão tremendo? Você é um grande guerreiro, até mesmo os reis e os generais o temem, e eu sou apenas um pobre mendigo. Exceto a tigela de esmolas, não tenho mais nada. Você pode me matar e sentir-me-ei imensamente satisfeito de que pelo menos minha morte realiza o desejo de alguém. Minha vida tem sido útil. Assim minha morte também será útil. Mas antes que você corte minha cabeça tenho um pequeno desejo, e acho que você pode me conceder um pequeno desejo antes de me matar"
Diante da morte, até mesmo o maior inimigo tem boa vontade de realizar qualquer desejo.
Angulimala disse: "O que você deseja?"
Buda disse: "Quero que você apenas corte da árvore um galho que esteja cheio de flores. Nunca mais verei essas flores novamente. Quero ver essas flores bem de perto, sentir a fragrância delas e sua beleza nessa manhã ensolarada".
Então Angulimala cortou com sua espada todo um galho cheio de flores. E antes que ele pudesse dá-lo a Buda, Buda lhe disse: "Isso era somente metade do desejo. A outra metade é: por favor, ponha o galho de volta e junte-o novamente à árvore".
Angulimala disse: "Eu achava desde o começo que você era maluco. Agora este é o desejo mais louco. Como é que posso colocar esse galho de volta?"
Buda disse: "Se você não pode criar, você não tem o direito de destruir. Se você não pode dar a vida, você não tem o direito tirar a vida de nenhuma coisa viva".
Foi momento de silêncio e um momento de transformação... A espada caiu de suas mãos. Angulimala fechou os olhos, jogou-se aos pés de Gautama Buda e disse: "Não sei quem você é, mas quem quer que seja, conduza-me por esse cmainho, por favor me inicie".
Nesse momento, os seguidores de Gautama Buda chegaram cada vez mais perto. Vendo que Buda estava agora de pé na frente de Angulimala, já não havia mais nenhum problema, nenhum receio, a despeito do fato de ele precisar apenas de mais um dedo. Eles ficaram ao redor e, quando ele caiu aos pés de Buda, eles imediatamente se aproximaram.
Alguém levantou a questão: "Não inicie esse homem, ele é um assassino. E ele não é um assassino qualquer, ele assassinou novecentos e noventa e nove pessoas, todos inocentes. Eles não fizeram nada de errado a ele. Ele nunca os tinha visto antes!"
Buda disse novamente: "Se eu não iniciá-lo, quem irá fazê-lo? E eu amo esse homem, amo sua coragem. Posso ver tremendas possibilidades nele: um simples homem lutando contra o mundo inteiro. Quero um tipo de pessoa assim que pode enfrentar o mundo inteiro com uma espada; agora ele irá enfrentar o mundo com uma consciência que é muito mais afiada do que qualquer espada. Eu lhes disse que um assassinato estava para acontecer, mas não tinha certeza de quem iria ser assassinado: ou eu iria ser assassinado, ou Angulimala. Agora vocês podem ver que Angulimala foi morto. E quem sou eu para julgar?"
Ele iniciou Angulimala.
No dia seguinte, ele era um bikkhu, um mendigo, um monge de Buda, e pedia esmola na cidade. Toda a cidade se fechou, pois as pessoas estavam com muito medo e diziam: "Mesmo que ele tenha se tornado um mendigo, não se pode confiar nele. Esse homem é muito perigoso!" As pessoas não saíam às ruam. Quando Angulimala foi pedir esmolas, ninguém lhe deu comida, pois quem correria o risco? As pessoas estavam na cobertura de suas casas olhando para baixo. E então começaram a atirar pedras nele, pois ele havia matado 999 pessoas, incluindo muitas pessoas daquela cidade. Praticamente todas as famílias tinham sido vítimas, então elas começaram a jogar pedras.
Angulimala caiu na rua, sague escorria por todo o seu corpo; ele tinha muitos machucados. E Buda foi até ele e perguntou: "Angulimala, como você está se sentindo?"
Angulimala abriu os olhos e disse: "Estou muito grato a você. Eles podem matar o meu corpo, mas não podem me tocar. E foi isso que por toda minha vida fiz, e nunca percebi." Graças à compaixão de Buda, Angulimala iluminou-se, tornou-se um brâmane, um conhecedor de Brahma.
A questão não é se alguém merece ou não, se é digno ou não. A questão é se você possui a consciência, a abundância de amor: assim o perdão irá surgir dele espontaneamente. Isso não é um cálculo, isso não é aritmética.
Vida é amor, e viver uma vida de amor é a única vida religiosa - é a única vida de oração, paz, a única vida de gratidão, grandeza, esplendor. "
Angulimala estava sentado sobre sua rocha observando. Ele não podia acreditar em seus olhos. Um homem muito bonito, de um carisma tão imenso, estava vindo em sua direção. Quem seria tal homem? Ele nunca tinha ouvido falar de Gautama Buda, mas mesmo o coração duro de Angulimala começou a sentir uma certa ternura para com aquele homem. Ele parecia tão belo... e estava vindo na direção dele. Buda estava chegando cada vez mais perto.
Finalmente, Angulimala desembanhou sua espada e, com ela em mãos, gritou, "Volte! Pare aí mesmo e volte!" Gautama Buda estava a alguns metros de distância, e Angulimala disse: "Não dê outro passo porque então a responsabilidade não será minha. Talvez você não saiba quem sou!".
Buda disse: "Você sabe quem você é?".
Angulimala disse: "Isso não tem importância. Esse não é o lugar nem a hora para discutir tais coisas. Sua vida está em perigo!"
Buda disse: "Penso de outra maneira - sua vida é que está em perigo."
Angulimala disse: "Eu costumava pensar que era louco - mas é você que é simplesmente louco. E você continua chegando mais perto. Assim não diga que matei um homem inocente. Você parece tão inocente e tão bonito, que quero que você volte. Pode passar. Encontrarei outra pessoa. Posso esperar, não há nenhuma pressa. Se já consegui novecentos e noventa e nove... é somente mais um, mas não me force a matá-lo". Mas Buda continuou a se aproximar.
Então Angulimala pensou: "Ou esse homem é surdo ou é louco!". De novo ele gritou: "Pare, não se mova!"
Buda disse: "Eu parei há muito tempo, Angulimala, não estou me movendo - você é que está. Pare você. Você está cego. Você não pode ver uma simples coisa: eu não estou me movendo na sua direção, você está se movendo na minha direção."
Angulimala estava sentado sobre uma pedra e começou a rir; ele disse: "Você é realmente louco! Estou sentado e você está me dizendo que estou me movendo. E você está se movendo e diz que está parado. Você realmente é um tolo, um louco ou alguém muito estranho!"
Buda disse: "Bobagem! A verdade é que, desde o dia que me tornei iluminado não me movi mais nem uma simples polegada. Estou centrado, totalmente centrado, nenhum movimento. E sua mente está perdida, movendo-se continuamente em círculos."
Buda chegou muito perto, e as mãos de Angulimala estavam tremendo. O homem era tão belo, tão inocente, tão infantil. Ele já estava apaixonado. Ele havia matado tanta gente... nunca antes ele tinha sentido essa fraqueza. Ele nunca havia conhecido o que é amor. Pela primeira vez ele estava cheio de amor. Assim, havia uma contradição: a mão dele estava segurando uma espada para matar a pessoa, mas seu coração estava dizendo "ponha a espada de volta na bainha".
Buda disse: "Ouvi dizer que você precisa de mais um dedo. No que se refere a este corpo, o meu objetivo foi alcançado; este corpo é inútil. Você pode usá-lo, seu juramento pode ser cumprido. Corte meu dedo e corte a minha cabeça."
Angulimala ficou parado e olhando perplexo.
Buda continuou: "Estou pronto, mas porque suas mãos estão tremendo? Você é um grande guerreiro, até mesmo os reis e os generais o temem, e eu sou apenas um pobre mendigo. Exceto a tigela de esmolas, não tenho mais nada. Você pode me matar e sentir-me-ei imensamente satisfeito de que pelo menos minha morte realiza o desejo de alguém. Minha vida tem sido útil. Assim minha morte também será útil. Mas antes que você corte minha cabeça tenho um pequeno desejo, e acho que você pode me conceder um pequeno desejo antes de me matar"
Diante da morte, até mesmo o maior inimigo tem boa vontade de realizar qualquer desejo.
Angulimala disse: "O que você deseja?"
Buda disse: "Quero que você apenas corte da árvore um galho que esteja cheio de flores. Nunca mais verei essas flores novamente. Quero ver essas flores bem de perto, sentir a fragrância delas e sua beleza nessa manhã ensolarada".
Então Angulimala cortou com sua espada todo um galho cheio de flores. E antes que ele pudesse dá-lo a Buda, Buda lhe disse: "Isso era somente metade do desejo. A outra metade é: por favor, ponha o galho de volta e junte-o novamente à árvore".
Angulimala disse: "Eu achava desde o começo que você era maluco. Agora este é o desejo mais louco. Como é que posso colocar esse galho de volta?"
Buda disse: "Se você não pode criar, você não tem o direito de destruir. Se você não pode dar a vida, você não tem o direito tirar a vida de nenhuma coisa viva".
Foi momento de silêncio e um momento de transformação... A espada caiu de suas mãos. Angulimala fechou os olhos, jogou-se aos pés de Gautama Buda e disse: "Não sei quem você é, mas quem quer que seja, conduza-me por esse cmainho, por favor me inicie".
Nesse momento, os seguidores de Gautama Buda chegaram cada vez mais perto. Vendo que Buda estava agora de pé na frente de Angulimala, já não havia mais nenhum problema, nenhum receio, a despeito do fato de ele precisar apenas de mais um dedo. Eles ficaram ao redor e, quando ele caiu aos pés de Buda, eles imediatamente se aproximaram.
Alguém levantou a questão: "Não inicie esse homem, ele é um assassino. E ele não é um assassino qualquer, ele assassinou novecentos e noventa e nove pessoas, todos inocentes. Eles não fizeram nada de errado a ele. Ele nunca os tinha visto antes!"
Buda disse novamente: "Se eu não iniciá-lo, quem irá fazê-lo? E eu amo esse homem, amo sua coragem. Posso ver tremendas possibilidades nele: um simples homem lutando contra o mundo inteiro. Quero um tipo de pessoa assim que pode enfrentar o mundo inteiro com uma espada; agora ele irá enfrentar o mundo com uma consciência que é muito mais afiada do que qualquer espada. Eu lhes disse que um assassinato estava para acontecer, mas não tinha certeza de quem iria ser assassinado: ou eu iria ser assassinado, ou Angulimala. Agora vocês podem ver que Angulimala foi morto. E quem sou eu para julgar?"
Ele iniciou Angulimala.
No dia seguinte, ele era um bikkhu, um mendigo, um monge de Buda, e pedia esmola na cidade. Toda a cidade se fechou, pois as pessoas estavam com muito medo e diziam: "Mesmo que ele tenha se tornado um mendigo, não se pode confiar nele. Esse homem é muito perigoso!" As pessoas não saíam às ruam. Quando Angulimala foi pedir esmolas, ninguém lhe deu comida, pois quem correria o risco? As pessoas estavam na cobertura de suas casas olhando para baixo. E então começaram a atirar pedras nele, pois ele havia matado 999 pessoas, incluindo muitas pessoas daquela cidade. Praticamente todas as famílias tinham sido vítimas, então elas começaram a jogar pedras.
Angulimala caiu na rua, sague escorria por todo o seu corpo; ele tinha muitos machucados. E Buda foi até ele e perguntou: "Angulimala, como você está se sentindo?"
Angulimala abriu os olhos e disse: "Estou muito grato a você. Eles podem matar o meu corpo, mas não podem me tocar. E foi isso que por toda minha vida fiz, e nunca percebi." Graças à compaixão de Buda, Angulimala iluminou-se, tornou-se um brâmane, um conhecedor de Brahma.
A questão não é se alguém merece ou não, se é digno ou não. A questão é se você possui a consciência, a abundância de amor: assim o perdão irá surgir dele espontaneamente. Isso não é um cálculo, isso não é aritmética.
Vida é amor, e viver uma vida de amor é a única vida religiosa - é a única vida de oração, paz, a única vida de gratidão, grandeza, esplendor. "
Osho - "The Great Pilgrimage: From Here To Here" - cap. #24
Grata pelas palavras de Luz!
ResponderExcluirParabéns pelo texto ! As vezes tomamos a conduta de devolver a msm energia de quem nos faz mal. Porém reagir com amor é perdoar e exalar positividade à pessoas perdidas. Obrigadaa
ResponderExcluirObrigado existência!
ResponderExcluirLindo!
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