segunda-feira, junho 01, 2009

O Cristo (Joel S. Goldsmith)

Joel S. Goldsmith


Uma antiga escritura revela: "É difícil de se entender: doando nosso pão, nos tornamos mais fortes; dando nossas roupas aos outros, ganhamos em formosura; fundando moradas de pureza e verdade, adquirimos grandes tesouros".

Abraão, pai dos hebreus, baseou a prosperidade do seu povo na idéia do dízimo — doar um décimo dos ganhos para propósitos espirituais e caritativos, sem pensar em retorno ou recompensa.

"A imortalidade pode ser alcançada apenas pela prática contínua de atos de benevolência, e a perfeição se obtém pela compaixão e pela caridade." Quanto maior o degrau de amor altruísta que galgamos, mais nos aproximamos da compreensão do Eu universal como nosso ser real.

O sentido pessoal de "eu" (ego) está ocupado em ter, em obter, em desejar, em conseguir e acumular; enquanto nosso Eu verdadeiro está empenhado em dar, conceder, repartir e abençoar.

O sentido pessoal de "eu" representa a corporificação de todas as nossas experiências humanas, muitas das quais limitadas e indesejáveis. O Eu verdadeiro corporifica as idéias e atividades infinitas, espirituais, que se manifestam continuamente, sem limites ou restrições.

O pequeno "eu" preocupa-se basicamente com seus problemas pessoais e seus negócios, dilatando seus limites para incluir neles seus parentes próximos e seus amigos. O sentido pessoal, muitas vezes, avança além, envolvendo-se em trabalhos caridosos e de assistência comunitária, mas quando analisamos seus motivos percebemos tratar-se de ação governada pelo próprio sentido pessoal.

O "Eu" verdadeiro alimenta sua vida do centro do seu próprio ser, abençoando todos os que dele se aproximam; é reconhecido pelo seu altruísmo e desinteresse, por não buscar o reconhecimento, a recompensa ou qualquer engrandecimento pessoal. Não se trata de uma entidade sem vigor ou de um boneco que possa ser manipulado pelos mortais — de fato não pode nunca ser visto nem compreendido pelos mortais.

Recordo-me de dois belos exemplos que, em quadros comoventes, revelam as diferenças entre o pequeno eu pessoal e o Eu imortal.

Sidharta, que abandonara o lar e a família em busca da Verdade, recebeu por fim a iluminação, tornando-se o Buda, o Iluminado ou, poderíamos dizer, o Cristo do seu tempo. Seu pai, grande rei, sentindo a morte se aproximar e desejando rever o filho, mandou procurá-lo, pedindo que retornasse. Ao rever o filho, percebeu que o perdera, em sentido pessoal de pai e filho, mas assim mesmo tentou reconquistá-lo. Disse o rei: "Eu te daria meu reino, mas se o fizesse, teria para ti o mesmo valor da cinza". Buda respondeu-lhe: "Sei que o coração do rei transborda de amor... mas deixe que os laços do amor que te prendem ao filho que perdeste enlacem igualmente todos os teus súditos; assim em lugar de Sidharta receberás algo muito maior: receberás o Iluminado, o Mestre da Verdade, o Pregador da Retidão e ainda a Paz de Deus em teu coração".

O outro exemplo diz respeito ao grande Mestre. "E falando ainda à multidão, estavam fora sua mãe e seus irmãos que desejavam falar-lhe. E disse-lhe alguém: Eis que estão lá fora tua mãe e teus irmãos querendo te falar. Mas ele respondeu àquele que o chamara: Quem é minha mãe? E quem são meus irmãos? E abrindo seus braços, apontando seus discípulos, disse: Pois qualquer um que faça a vontade do meu Pai que está no céu, este é minha mãe, minha irmã e meu irmão."

À medida que nos tornamos espiritualmente iluminados, somos procurados por aqueles que buscam se libertar de diversas formas de trevas materiais — da doença, do pecado, do medo, da limitação, da agitação e da ignorância. E nós podemos defrontar estas necessidades impersonalizando tanto o bem como o mal, e compreendendo que a harmonia é uma atividade e uma qualidade da Alma, que se expressa universal e individualmente.

Na meditação, ou comunhão, nos tornamos receptivos à Verdade que se desdobra dentro de nós — e a isto nós chamamos de oração. Nosso orar não deve ter ligação com o chamado paciente. De fato, a oração não é um processo, uma combinação de palavras ou pensamentos, de colocações, de declarações, de afirmações ou de negações. A oração é um estado de consciência no qual experimentamos a percepção da harmonia, da perfeição, da unidade, da alegria, da paz e do domínio. Com freqüência, a meditação ou comunhão traz ao indivíduo alguma verdade específica, e esta verdade aparece externamente como o fruto de sua própria conscientização do ser real.

Foi revelado, vezes incontáveis, que o talento, habilidade, educação e a experiência de cada indivíduo são de fato a Consciência que se desdobra em caminhos individuais — como artista, músico, vendedor, homem de negócios ou ator. Segue-se disso que a Consciência, que expressa a Si mesma, nunca está sem oportunidade, reconhecimento e aceitação. Assim, não pode haver dom sem reconhecimento, um talento ou habilidade sem expressão, um esforço sem recompensa, uma vez que todos os esforços e ações são Consciência expressando suas infinitas capacidades e possibilidades. A percepção consciente desta verdade fará dispersar a ilusão de desemprego, a falta de recompensa ou de reconhecimento. Contudo, guarde isso muito bem: a repetição destas palavras sem uma parcela de "sentimento" da verdade que encerram, será como "nuvens sem chuva", "vãs repetições", nada.

Desta mesma maneira já foi revelado que há apenas uma Vida, e que esta única Vida nunca está sujeita ao perigo de doença, de acidente ou morte. Esta Vida é a vida do ser individual. Nunca é necessário tratar diretamente uma pessoa ou um animal, mas estar sempre alerta para nunca aceitar a idéia ou sugestão de qualquer outra presença, poder ou atividade que não a única Vida, a única Lei, a única Alma. O viver constantemente nesta consciência do bem, da harmonia, dissipará a ilusão dos sentidos, quer se manifeste como pessoa doente ou pecadora. O simples declarar ou afirmar constante desta verdade nos seria de bem pouca valia, enquanto sua conscientização ou sentimento se nos manifestará como cura, como modificação, como renovação e até mesmo como ressurreição.

Recentemente, escrevi a um amigo por ocasião de seu aniversário, e creio que ele gostaria que eu compartilhasse com vocês as idéias que me ocorreram no caso:

“Quanto aos votos de aniversário, eu apenas gostaria que não tivesse qualquer aniversário, de modo que se lhe tornasse familiar a idéia de continuidade da existência consciente, sem parada ou interrupção — a conscientização do desenvolvimento progressivo.”

Na verdade, não há interrupção na continuidade da consciência que desenvolve, nem pode a consciência deixar de estar cônscia do corpo, assim como você jamais perde a consciência musical ou artística, ou qualquer outro talento que porventura possua.

A consciência se desdobra de dentro para fora de uma fonte ilimitada, da infinitude do seu ser, para a percepção individual de si mesma, em infinitas variedades, formas e expressões.

A morte é a crença de que a consciência perde a percepção do seu corpo. A imortalidade é a compreensão da verdade de que a consciência está eternamente ciente de sua própria identidade, corpo, forma ou expressão.

A consciência, cônscia do seu infinito ser e corpo eterno, é a imortalidade atingida no aqui e agora. A percepção de que "a consciência mantém sua própria identidade e forma" é a vida eterna. A percepção de que a consciência se desdobra eternamente nas formas individuais da criação ou manifestação, é a imortalidade demonstrada aqui e agora. "Esta consciência é VOCÊ."

A consciência espiritual é o abandono do esforço pessoal na realização de que a harmonia é algo que "já é". Esta consciência, com a renúncia ao esforço pessoal, é atingida quando percebemos o Cristo dentro de nós como uma realidade presente. O Cristo é a atividade da Verdade na consciência individual. É mais uma receptividade à Verdade do que a sua verbalização. Na medida em que conseguimos a quietude interior, tornamo-nos sempre mais receptivos à Verdade que se nos revela, dentro de nós mesmos. A atividade desta Verdade na nossa consciência é o Cristo, a própria presença de Deus. A Verdade recebida e mantida continuamente em nossa consciência é a lei da harmonia em todas as nossas vicissitudes. Ela governa, dirige, orienta e suporta todas as nossas atividades da vida cotidiana. Quando nos aparecer a idéia de doença ou carência, esta Verdade onipresente será o nosso curador e nosso recurso; será mesmo nossa saúde e nosso suprimento.

Para muitos, a palavra Cristo continua sendo um termo mais ou menos misterioso, uma entidade desconhecida, algo raramente ou nunca vivenciado diretamente. Se, porém, quisermos nos beneficiar com a revelação da Presença divina ou Poder dentro de nós, feita por Cristo Jesus e outros, teremos de modificar este estado de coisas. Devemos chegar à experiência do Cristo como uma revelação permanente e contínua. Temos de viver com a percepção consciente e contínua da verdade interior ativa; mantendo sempre uma atitude receptiva — ouvidos atentos —, não demorará para que tenhamos a experiência do despertar interior. Esta é a atividade da Verdade dentro da consciência, ou o Cristo que alcançamos.

Uma tal compreensão do Cristo nos esclarecerá a respeito da oração. Todas as definições do dicionário são unânimes em conceituar a oração com base na crença errônea de que haja um Deus, em algum lugar, a esperar que Lhe imploremos de algum modo. Então, se pudermos encontrar este Deus bem disposto, teremos nossas orações respondidas favoravelmente; a menos que, logicamente, nossos pais ou avós, até a terceira ou quarta geração tenham pecado e, neste caso, seremos imputáveis pelos seus pecados e teremos nossas orações jogadas na cesta de lixo do céu.

Nós temos um sentido diferente do que seja a oração. Percebemos que qualquer bem que nos aconteça é o resultado direto da nossa própria compreensão da natureza do nosso próprio ser. Nossa compreensão da vida espiritual se desenvolve à medida da nossa receptividade à Verdade, não orando a Deus, mas deixando que Deus Se revele e Se manifeste a nós. Este é o mais alto conceito de oração; é alcançado quando dedicamos alguns minutos, tanto de dia como de noite, à meditação, a comungar, a escutar. Na quietude, chegamos a um estado de receptividade que nos abre o caminho para sentir ou para perceber a presença real de Deus. Esta percepção, ou sentimento, é a atividade de Deus, a Verdade em nossa consciência, é o Cristo, nossa Realidade.

Normalmente, vivemos imersos num mundo sensorial (material), e nos preocupamos apenas com o objeto de nossos sentidos. E isso nos traz nossa experiência de bem e de mal, de dor e de alegria. Se nós, através do estudo e da meditação, nos voltarmos mais para o lado mental da vida, veremos que nossos pensamentos se tornam mais elevados e, com isso, teremos melhores condições. A medida que refinamos nossas qualidades mentais e manifestamos mais paciência, mais gentileza, caridade e perdão, estas qualidades se refletirão sobre nossa experiência humana. Mas não paremos por aqui.

Mais alto que o plano do corpo e da mente está o domínio da Alma, o reino de Deus. Aqui encontramos a realidade do nosso ser, nossa natureza divina — não que o corpo e a mente estejam separados ou afastados da Alma; apenas que a Alma é o recôndito mais profundo do nosso ser.

Nos domínios da Alma encontramos completa tranqüilidade, paz absoluta, harmonia e domínio. Aqui não encontramos nem bem nem mal, nem dor nem prazer, apenas a alegria de ser. Estamos no mundo, mas não pertencemos a ele, pois não mais vemos o mundo dos sentidos como aparenta ser, mas, tendo despertado nosso sentido espiritual, nós o "vemos como ele é" — vemos a Realidade através das aparências.

Até aqui, buscamos nossa felicidade no universo objetivo, em pessoas, lugares ou coisas. Agora, porém, através do sentido espiritual, do sentido da Alma, o mundo todo tende a nos trazer seus presentes, embora não mais pela busca direta de pessoas ou coisas, mas servindo-se destas como canais. No sentido material, pessoas e coisas são os objetivos — aquilo que desejamos. Através do sentido da Alma, nosso bem se desdobra a partir do nosso interior, embora se apresente como pessoas e condições melhoradas. O sentido da Alma não nos priva dos amigos, da família e do conforto da existência humana, mas nos dá isso com maior segurança, num nível de consciência mais alto, mais belo e duradouro.

Por muitos séculos, a atenção foi focalizada em Jesus Cristo como o Salvador do homem, e ao longo deste século o sentido espiritual da vida oscilou entre dois extremos, entre a luz e as trevas. Um mestre do século XVI escreveu: "Cristo (Jesus) chamou a Si mesmo de Luz do mundo, mas completou dizendo que Seus discípulos também eram a Luz do mundo. Todo cristão em quem esteja vivo o Espírito Santo, isto é, os verdadeiros cristãos, são um com o Cristo em Deus e são como o Cristo (Jesus). Portanto, eles terão experiências semelhantes, e o que Cristo (Jesus) fez, eles também farão".

Nossa tarefa é a descoberta do Cristo na própria consciência. Reconhecemos com alegria e amor profundo o quanto do Cristo foi alcançado, não só por Jesus, mas por muitos videntes espirituais e profetas de todos os tempos. Nosso coração está cheio de gratidão pela revelação do Cristo para tantos homens e mulheres de nossos dias. E olhamos agora para a frente, para a realização do Cristo em nossa própria consciência. "O reino de Deus está em vós, e aquele que o procura fora de si mesmo nunca o encontrará, pois fora de si mesmo ninguém pode ver ou achar Deus; pois aquele que procura Deus, em verdade já O tem."

Temos de compreender a palavra "consciência", pois só podemos comprovar aquilo de que estamos conscientes. Como estamos em termos de consciência? Somos ainda mortais? Ou já renunciamos à nossa individualidade material e reconhecemos ser o Cristo a plenitude, a presença de Deus? Algum dia teremos de abandonar o esforço para tudo conseguir e reconhecer a nós mesmos como sendo o eterno Doador em ação. Temos de alimentar cinco mil pessoas sem ter a preocupação de onde virá o alimento. A multidão pode ser alimentada pela nossa cristicidade. E onde estaria, pois, a carência a não ser na crença de que somos apenas humanos? Temos de nos livrar desta crença e proclamar nossa verdadeira identidade.

Quando nos deparamos com pessoas ou circunstâncias que têm aparência de mortalidade, devemos reconhecer: "Tu és o Cristo, o Filho de Deus vivo", e aquilo que nos aparece como mortal é ilusão, é nada. Não temos de temer nenhuma circunstância mortal ou material, uma vez que reconhecemos sua nulidade.

A Verdade é simples. Não há verdade metafísica profunda ou misteriosa. Ou é verdade ou não é verdade; e não pode haver verdade profunda ou superficial nem pode haver diversos graus de verdade. Para a verdade ser verdade, deve ser verdade absoluta. Ocupamo-nos agora com a verdade de que nós individualizamos o poder infinito. Não devemos procurar um poder fora ou separado de nós mesmos. Nós individualizamos o poder infinito na medida de nossa conscientização da Verdade.

A Vida, que é Deus, é nossa vida. Há apenas uma Vida, e esta é a vida de todos os seres, de todos os indivíduos. Nós individualizamos esta vida eterna, e não há menos Deus em alguns seres do que em outros. E esta vida, em todos, é sem doença e imortal. Nossa consciência desta verdade é a influência curadora dentro de nós.

Existe apenas uma Consciência, Deus. Esta Consciência onipotente e onisciente se indivualiza em nós; por isso, nossa consciência é o socorro sempre presente em qualquer circunstância. Por esta razão não oramos ou buscamos a um Ser longínquo, mas percebemos a onipresença da divina Consciência como nossa consciência, e deixamos que o aparente problema se vá. A percepção desta verdade nos confirma na consciência da presença da Vida, da Verdade, de Deus. A compreensão da unidade da Consciência como a nossa consciência, da Vida como a nossa vida, é a Verdade eterna.

O próximo passo no desenvolvimento é a descoberta de que, como individualização da Consciência, nós incorporamos em nossa própria consciência nosso corpo, nossos negócios e nosso lar. Podemos comprovar nosso domínio sobre o tempo, o clima, a renda, a saúde e o corpo apenas na medida em que sabemos serem idéias da consciência que somos. O lar, o trabalho e o corpo são idéias nossas, sujeitas à nossa compreensão, e a conscientização desta verdade nos confere o domínio. Isto não nos exalta como seres humanos nem nos torna divinos: isto varre de nós a natureza humana e revela nossa divindade.

Podemos medir nosso desenvolvimento espiritual observando se estamos, ou não, tentando melhorar uma condição física. Temos de lembrar que a vida orgânica do homem, do animal ou da planta não é a Vida, Deus, e sim conceitos humanos e limitados da Vida real; assim, qualquer tentativa de curar, mudar ou corrigir o universo físico é uma evidência de que não temos desenvolvido o suficiente a consciência espiritual.

A Cristo-consciência reconhece que toda a vida é Deus — mas percebe que aquilo que nos aparece como visão ou som materiais não é a Vida, mas mera ilusão ou um falso sentido de existência. A consciência espiritual distingue a vida que é real.

Já que não podemos resolver um problema em seu próprio nível, temos de subir além das aparências para trazer às claras a harmonia do ser. Aquilo que recai sob os cinco sentidos não é a realidade das coisas; assim não podemos julgá-las neste nível. Deixando de lado as aparências, damos as costas ao quadro que se apresenta aos nossos sentidos e começamos a ter consciência da Realidade — daquilo que é eterno.


Nenhum comentário:

Postar um comentário

Devido aos spams que chegam constantemente, os comentários estão sujeitos à moderação.
Grato pela compreensão!