"O homem de Virtude Superior não está preocupado com sua virtude porque ele é virtuoso.
O homem comum fica preocupado com suas virtudes porque não é virtuoso.
O Sábio parece que nada faz pois permanece na não-ação.
Certamente nada fica sem ser feito.
O homem inferior se movimenta muito e certamente deixa de realizar o essencial.
A Benevolência precisa atuar mesmo sem objetivos.
A Justiça precisa atuar e procura um objetivo.
O Dogma precisa atuar através da observação e a força para submeter os homens.
Por isso quando o Tao se perde, aparece a virtude.
Quando a virtude se perde, aparece a benevolência.
Quando se perde a benevolência aparece a Justiça.
Quando a Justiça se perde, aparecem os dogmas e o moralismo.
Os dogmas e o moralismo são a casca da fidelidade e da lealdade e o começo da confusão.
Os adivinhos e falsos profetas são a aparência do Tao e o começo da estupidez.
Por isso o Sábio conserva-se na Infinita Profundidade e não na superfície.
Habita no fruto e não na flor.
Vive no ser, e não na aparência."
(Lao-Tsé)
Queria comentar algumas coisas...
"O homem de Virtude Superior não está preocupado com sua virtude porque ele é virtuoso."
Essa frase resume todo o conteúdo do verso 38 do livro de Lao-tsé. Ela é muito importante, e há muitas coisas que estão implícitas nela. O Tao é virtude, mas a virtude não é o Tao. A virtude que existe separada do Tao não é a verdadeira virtude; ela é uma virtude forçada. Tudo o que decorre do Tao é espontâneo/natural.
É por isso que o homem de virtude superior não se preocupa com sua virtude. Claro que não! Ele já é virtuoso, já vive o Tao... já compreendeu que ele está dentro! Assim, não é necessário fazer força alguma para ser, nem para manter-se virtuoso.
É como quando você está saudável. Você nunca tenta ficar saudável. Se você já é saudável, pra que se incomodar com a saúde? Quando o seu corpo está saudável, você sequer se lembra que ele está saudável. Isso é natural. O estado de saúde não pode ser sentido. Você só toma conciência da saúde do corpo quando este se torna doente. É só o contraste que propicia a visão do estado de saúde.
Saúde/doença, bom/mal, alto/baixo... todas essas coisas só podem ser contempladas à partir dos seus opositores.
Quando você É -- simplesmente É --, você não pode estar consciente disso. Assim como você não fica consciente do seu estado de saúde, você não fica consciente do seu ser. Entretanto, isso não deveria ser um incômodo. Porque, embora você não esteja consciente da saúde, você É saudável (isso é o que realmente importa). Assim, quando você perder a consciência do seu ser -- quando você não souber que É --, você será. Esse é o único modo. Não há outra maneira.
Sempre que tentarmos sondar o nosso ser, iremos perder contato com ele. Esse é o paradoxo.
Quando se vive no Tao a virtude existe, você é virtuoso. Só que você sequer sabe disso... sequer sabe que é virtuoso, e o principal: você nunca tenta ser virtuoso. E, por isso, você possui a verdadeira virtude.
Pra quê querer ficar sondando se somos virtuosos, bonitos, sábios, ricos, etc? Isso não é necessário. Você não é capaz de confiar que todas as coisas -- tudo! -- já existe no Ser? É o ego quem quer saber dessas coisas. É o ego que tem necessidade de entender. Ele é quem fica preocupado com tudo isso, poque ele está sempre com medo... medo de não ser quem ele pensa que é: daí, ele tenta (ele precisa disso!) ficar se afirmando o tempo todo. Ele sonda, ele é inseguro quanto ao seu ser. Está sempre desconfiado de que, talvez, alguma coisa não esteja dentro dos conformes. Ele tem sempre de ficar verificando tudo.
Por isso, quem vive no Tao não enxerga nenhuma virtude. Pergunte a qualquer iluminado se ele se considera um iluminado... e você verá que ele dirá: "iluminado, eu? de lanterna ou de lampião?". Quem é sábio também nunca se considera sábio. As pessoas que são bonitas não estão tentando ser bonitas. Existe um grande segredo aqui... percebem?
Para as pessoas bonitas, ser bonito não é nada demais. É natural. Para as pessoas virtuosas, a virtude não significa nada.
É por causa disso que, mais adiante, no verso 38, está escrito: "Por isso quando o Tao se perde, aparece a virtude."
Você só pode enxergar a virtude quando você se separa do Tao. Mas, então, essa virtude não mais será a virtude verdadeira. Vai ser uma falsa. Você vai ficar TENTANDO ser virtuoso, ao invés de simplesmente sê-lo.
Lembre-se: quando você é, você não tem consciência de que você é. Você só pode tomar consciência "daquilo-que-É", quando você cria 'aquilo que não-é', e passa a experimentar 'aquilo-que-é" à partir do que ele não é. Mas, aí então, você perdeu o Ser.
Por isso, a mensagem de todos os mestres é esta: "Seja! apenas seja!" E, a partir daí, tudo irá acontecer por si mesmo.
Que tradução é essa?
ResponderExcluirOlá!
ResponderExcluirEssa tradução é do livro "Tao Te King" – Trad. Albe Pavese (Ed. Madras)